Tem a palavra a família Aguiar e os seus amigos. Vamos abrir o "Círculo", com duas alternativas, que proponho: Este "Aguiaríssimo" ou o "blogguiar.blogspot.com"
quarta-feira, 6 de julho de 2022
MARIA ARCHER E OUTRAS MULHERES DE REFERÊNCIA E DE (IR) REVERÂNCIA - Porto jan 2021 - Programa da Conferência
Programa - Conferencistas
MESA 1 | 10h30 -12h30 Moderação: Rosa Simas
• MARIA LUISA MALATO (FLUP - ILC), “Catarina de Lencastre e o tema da guerra no limiar do século XIX”
Maria Luísa Malato é Professora Associada, com Agregação, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Com vários estudos sobre Utopia, Teatro e Retórica, a sua investigação debruça-se essencialmente sobre a literatura dos séculos XVIII e XIX. Tem Mestrado (1988, pela Universidade de Coimbra) Doutoramento e Agregação (1999 e 2007, pela Universidade do Porto) em Literatura Comparada e Estudos Românicos. Numa perspetiva comparatística, os seus trabalhos visam comprovar a necessidade de uma prática que alargue o corpus de análise às relações que a Literatura estabelece com a Filosofia, os textos impressos com os textos manuscritos, os autores canónicos com os "menores". Membro ativo do Instituto de Literatura Comparada Margarida Losa e colaboradora do Instituto de Filosofia (UP) e Centro de Estudos de Teatro (UL), unidades financiadas pela FCT. Vice-Presidente da Associação Portuguesa de Literatura Comparada (2013- 2018). Co-editora da Revista online de Filosofia e Literatura Pontes de Vista.
• CLAÚDIA PAZOS-ALONSO (Univ. Oxford - ILC), “Onde se lê ‘feminismo pioneiro’... leia-se Francisca Wood”
Cláudia Pazos-Alonso é professora de Estudos Portugueses e de Gênero, na Universidade de Oxford e na Fellow of Wadham College. Os seus interesses de pesquisa variam amplamente em literatura lusófona dos séculos XIX e XX. Atualmente é co-diretora de mestrado em Estudos da Mulher em Oxford e vice-presidente da Associação Internacional de Lusitanos. As principais publicações de livros incluem “Antigone Daughters? Gênero, Genealogia e Política de Autoria na Escrita de Mulheres Portuguesas do século XX” (2011, com Hilary Owen), “Imagens do Eu na Poesia de Florbela Espanca” (1997) e volumes co-editados, como “Reading Literature in Portuguese“, “Um Companheiro para a Literatura Portuguesa” (2009) e “Mais Perto do Coração Selvagem.
Ensaios sobre Clarice Lispector” (2002). Juntamente com Fábio Mário da Silva, é responsável pelas recentes edições de Florbela Espanca (Estampa) e Judith Teixeira (Dom Quixote). Cláudia Pazos-Alonso acaba de publicar em Portugal o livro Anticlericalismo e feminismo na imprensa oitocentista. Os artigos de fundo de Francisca de Assis Martins Wood (2021, Edições Afrontamento).
• M. LUÍSA TABORDA (FLUP - ILC), “Ana Plácido e uma cela só para si”
Maria Luísa Taborda Santiago, licenciada em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, mestre e doutoranda em Estudos Literários Culturais e Interartísticos pela Universidade do Porto. Atualmente é colaboradora de um projeto de pesquisa Luso-Brasileiro que pretende publicar as obras completas da escritora portuguesa oitocentista Ana Plácido, objeto de estudo da sua tese de doutoramento. Trabalha com literatura brasileira e portuguesa e interessa-se particularmente pela escrita de autoria feminina, questões de género e poéticas e políticas do corpo.
• ANA COSTA LOPES (Univ. Católica-CEPCEP), “Elisa Curado: uma progressista em tempos de cólera”
Ana Costa-Lopes, Doutorada em Língua e Cultura Portuguesa pela Universidade Católica Portuguesa com Imagens da Mulher na Imprensa Feminina de Oitocentos, Tese publicada pela Quimera, Lisboa (2005) e Mestre em Estudos Luso-Asiáticos com a Tese Confluências e divergências culturais nas tradições contísticas portuguesa e chinesa, publicada pelas Universidades de Macau (2000) e Católica de Lisboa (2000). Investigadora do CECC e CEPCEP (Universidade Católica). Colaboradora do CLEPUL, Universidade de Lisboa com uma biografia sobre Elisa Curado (1858-1933) e, também, como Conselheira Científica (Portugal) da publicação das «Senhoras do Almanaque» do Almanaque de Lembranças Luso-Brasileiro. Autora de livros e artigos e de comunicações em congressos sobre a imprensa periódica feminina e história das mulheres; literatura tradicional; associações femininas.
MESA 2 | 14h30 - 16h00 Moderação: Maria de Lurdes Sampaio
~• ANA PAULA FERREIRA (Univ. Minnesota) - “Discurso imperialista e posicionamento anti-colonial: Maria Archer (1935-1963)”
Ana Paula Ferreira é Professora Titular de Estudos Portugueses na Universidade de Minnesota. Fez o doutoramento na New York University, sendo colega de Margarida Losa. A sua investigação tem-se centrado na ficção portuguesa contemporânea, com ênfase no neorealismo, em mulheres escritoras e feminismos, raça e colonialismo tardio, bem como seus efeitos e restos pós-coloniais. Entre as suas publicações em livro, A urgência de contar: contos de mulheres, anos 40 (2002), trouxe `a luz muitas das escritoras esquecidas do período do Estado Novo, entre elas Maria Archer. Desde meados da década de 1990 tem publicado estudos parciais dos romances de Lídia Jorge, editando o volume, Para um leitor ignorado: Ensaios sobre o O Vale da Paixão e outras ficções de Lídia Jorge (2009). Editou ainda, com Margarida Calafate Ribeiro, Fantasmas e fantasias imperiais no imaginário português contemporâneo (2003); e com Ana Luísa Amaral e Marilena Freitas, New Portuguese Letters to the World: International Reception (2015). O seu último livro, Women Writing Portuguese Colonialism in Africa (2020), traça a história da agência que várias mulheres escritoras tiveram para a produção simbólica e não só do colonialismo português na África, desde finais do século XIX `a segunda década do século XXI.
• ANA PAULA COUTINHO (FLUP - ILC), “Maria Archer: deslocação e (in) conveniência”
Ana Paula Coutinho é Professora Associada com Agregação do Departamento de Estudos Portugueses e Românicos da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, onde tem lecionado sobretudo nas áreas da Literatura Comparada e dos Estudos Franceses. Doutorada em Literatura Comparada (1998) e com Agregação em Literaturas e Culturas Românicas (2010), sempre se dedicou à literatura contemporânea numa perspectiva comparatista, tendo nos últimos anos desenvolvido particular investigação no domínio das interculturalidades e das representações literárias e artísticas das migrações e do exílio. Foi Coordenadora Científica do Instituto de Literatura Comparada de Abril de 2015 até Janeiro de 2022. Coordena igualmente a base digital Ulyssei@s. Membro colaborador do CRIMIC (Université Paris IV), colabora ainda com o Programa Non-Lieux de l’Exil (Collège d’Études Mondiales – FMSH). É vice-presidente da Alliance Française do Porto. Dos livros publicados ou editados, destacam-se António Ramos Rosa. Mediação Crítica e Criação Poética (Quasi Edições, 2003. Prémio Ensaio Pen-Club); Lentes Bifocais – Representações literárias da Diáspora Portuguesa (Afrontamento, 2009), Passages et Naufrages migrants. Les fictions du détroit (com Maria de Fátima Outeirinho e José Domingues de Almeida), Paris, Harmattan, 2012; Nos & leurs Afriques. Images identitaires et regards croisés Constructions littéraires fictionnelles des identités africaines cinquante ans après les décolonisations (com Maria de Fátima Outeirinho e José Domingues de Almeida) Frankfurt, Berlin, Peter Lang, 2013.
ELISABETH BATTISTA (UNAMAT) Da dominação à resistência: percurso de Maria Archer
Elisabeth Battista é docente no Programa de Pós-graduação, Mestrado e Doutorado em Estudos Literários - PPGEL, da Universidade do Estado de Mato Grosso - UNEMAT. Autora dos livros: MARIA ARCHER - O legado de uma escritora viajante, Editora Colibri, Lisboa, 2015; Sem o direito fundamental de voltar para casa? Maria Archer? Uma jornalista portuguesa no exílio, Editora Espaço Acadêmico, Goiãnia, 2019. Cultura e Literatura de Mato Grosso (organizado em parceria com Elizete Dall-Comune Hunhoff), Editora Espaço Acadêmico, Goiânia, GO, 2020; A Experiência Literária: Ensino e Leituras (organizado em parceria com Dagoberto Rosa de Jesus), Editora Espaço Acadêmico, Goiânia? GO, 2020. Possui quatro livros orgs; 40 capítulos de livros, 19 artigos publicados em periódicos; Pós-Doutorado na Universidade de Lisboa (2011-2012), e Pós-doutorado sênior pela Universidade de Aveiro (2018), no Centro de Línguas e Culturas. Integrou a Equipe do Programa Novos Talentos, CAPES/UNEMAT, Subprojeto: LINGUAGEM E TECNOLOGIARESSIGNIFICANDO A RELAÇÃO UNIVERSIDADE/ESCOLA; Fundadora do Centro de Pesquisa em Literatura - CEPLIT/UNEMAT (2007-2010); Diretora da UNEMAT Editora (2011); Editora da Revista ATHENA - periódico de alunos de Pós-graduação (atual); Editora da Revista de Estudos Acadêmicos do Curso de Letras (2002); Membro do Conselho Universitário - CONSUNI/UNEMAT (2011-2013); Membro do Conselho Regional por dois mandatos (2013- 2016); Presidiu o Conselho da Faculdade de Educação e Linguagem (2015-2018); Coordenadora da Pesquisa em Grupo: No Centro Oeste da margem: Cem Anos de relações entre Cultura e Literatura em Mato Grosso. (2013-2016); Editora do periódico Revista Ciência e Estudos Acadêmicos de Medicina da UNEMAT (2013-2018); Coordenou o Projeto de Extensão Revista Ciência e Estudos Acadêmicos de Medicina da UNEMAT; Formação: Licenciatura Plena em Letras - Português/Inglês (UNEMAT), Mestrado (FFLCH-USP - 2002) e Doutorado (FFLCH-USP - 2007), com a Tese: Entre Literatura e Imprensa: Percursos de Maria Archer no Brasil; Pós-Doutorado na Universidade de Lisboa (2011-2012), com Organização do Acervo Literário de Maria Archer, no Centro de Estudos Comparatistas, da Faculdade de Letras, da Universidade de Lisboa. Pós-doutorado Sênior pela Universidade de Aveiro, sob a supervisão de Maria Fernanda Brasete, Portugal (2018)
MESA 3 | 16h30 - 18h00
Moderação: Cláudia Pazos-Alonso
• ISABEL PIRES DE LIMA (FLUP - ILC), “Mulheres na Revolução: das Três Marias a
Agustina”
Professora Emérita da Universidade do Porto. Doutora Honoris Causa pela Universidade de Sófia. Investigadora do Instituto de Literatutra Comparada Margarida Losa (I&D da FCT). Estudos em Literatura Portuguesa e Comparada e em Interartes. Autora de As Máscaras do Desengano - para uma
leitura sociológica de ‘Os Maias’ de Eça de Queirós (1987), Trajectos -o Porto na memória naturalista (1989), Retratos de Eça de Queirós (2000), Visualidades – A Paleta de Eça de Queirós (2008) e editora de Eça e "Os Maias" cem anos depois (1990), Antero de Quental e o Destino de uma Geração (1993), Eça de Queirós / Paula Rego, O Crime do Padre Amaro (2001), Vozes e Olhares no Feminino (2001), C. Castelo Branco / Paula Rego, Maria
Moisés (2005); co-editora de obras sobre Agustina Bessa-Luís, José Gomes Ferreira, Óscar Lopes,Vergílio Ferreira. Centenas de artigos em revistas como Camões, Colóquio/Letras, Dedalus, Metamorfoses, Portuguese Cultural Studies, Revista da Faculdade de Letras da UP, Semear, Trans-Humanities,
Via Atlântica. Deputada à Assembleia da República (1999-2005/2008-9). Ministra da Cultura (2005-8). VicePresidente da Fundação de Serralves (desde 2016).
• MÁRCIA OLIVEIRA (Univ. Minho/CEHUM), “Womanart: Mulheres, Artes, Ditadura”
Márcia Oliveira é bolseira de pós-doutoramento FCT em Estudos Artísticos/História da Arte no CEHUM (SFRH/BPD/110741/2015) e pertence ao grupo de investigação em Género Artes e Estudos Pós-Coloniais. Licenciada em Jornalismo pela Universidade de Coimbra e mestre em Estética pela FCSH-
Universidade Nova de Lisboa concluiu o doutoramento pela Universidade do Minho em 2013 com tese sobre arte e feminismo em Portugal no contexto pós-revolução. Foi visiting scholar no Centre for Women in the Arts, Rutgers University, NJ, USA, de Agosto a Novembro de 2016. É Investigadora Co-Responsável do Projeto WOMANART: Women, arts and dictatorship: Portugal, Brasil and Portuguese speaking African countries, financiado pela FCT PTDC/ARTOUT/28051/2017) tendo como investigadora responsável Ana Gabriela Macedo.
• DEOLINDA ADÃO (Univ. Berkeley), “A audácia de escrever: uma abordagem da produção literária feminina”
Deolinda Adão é Professora e Directora Executiva do Programa de Estudos Portugueses na Universidade da Califórnia, em Berkeley. É licenciada em Literatura e Línguas Hispânicas na Universidade da Califórnia em Berkeley em 2002 e doutorada em Literaturas e Culturas Luso-AfroBrasileiras pela mesma universidade em 2007, com especialização em mulheres, género e sexualidade. O tema da sua dissertação foi “A study of the construction of feminine identity in Portuguese literature”. Publica regularmente livros e artigos sobre o género feminino, com destaque para migrações
femininas incluindo “As Herdeiras do Segredo: As Personagens Femininas na Ficção de Inês Pedrosa”. Em 2018, foi eleita Presidente da Luso-American Education Foundation, da qual já era membro desde 1996. Esta fundação dedica-se à promoção da Língua e Cultura Portuguesas no Estado da
Califórnia. É membro do Conselho da Diáspora Portuguesa desde 2013
quinta-feira, 9 de junho de 2022
quarta-feira, 1 de junho de 2022
BALBINA
VERSÃO MAIS LONGA
1 - BALBINA MENDES está de volta a Espinho,12 anos depois, na Galeria Amadeo Souza Cardoso, para preencher as longilíneas paredes de um branco neutral e expectante com a miríade de cores e a luz, de que se faz a intensidade da sua narrativa pictórica
.
Em 10 de julho de 2010, Balbina era uma pintora com um já fulgurante, um percurso artístico de duas décadas, e o Fórum de Arte e Cultura de Espinho, inaugurado a 16 de junho de 2009, dava os primeiros passos na sua trajetória de afirmação. Na verdade, tal como um ser humano, no tempo e na geografia da sua passagem pela terra, os museus e galerias de arte ganham nome e prestígio com a vivência do lugar, com a marca das pessoas que, sucessivamente, convidam para o habitar, cruzando o seu "curriculum" com a deles, numa apropriação desejada e consentida.
Balbina cedo entrou na História deste espaço, singular a tantos títulos. Foi a primeira Mulher a ocupá-lo, por inteiro, numa exposição individual e a primeira a trazer, com a temática das `'Máscaras Rituais do Douro e Trás-os Montes", numa pintura de raízes etnológicas e etnográficas, toda a magia de tradições primordiais aflorando, repensadas e dispostas em novos contextos, em telas de grande dimensão e impacto.
Nesse verão de 2010, Balbina tornou-se a primeira numa outra vertente, ao abrir um precedente desafiante, promovendo um espetáculo cultural inédito no ato de inauguração: trouxer às Galerias, metamorfoseadas pelas suas telas, as danças dos caretos vindos de Podence. A "Festa dos Rapazes" foi acontecendo por toda a cidade, nas ruas, entre um sem número de passantes que se manifestavam em gestos de aplauso, ou espontaneamente, se juntavam com eles, partilhavam o espírito dos folguedos, que, por fim, contagiou os presentes nos corredores e salões do Museu...Aí, os intérpretes de ritos, mistérios, ritmos nordestinos como que teatralizavam a realidade transfigurada nos quadros, cirandando nas duas galerias que correm, paralelamente, para a panorâmica janela rasgada sobre o mar atlântico... Assombrosa experiência, olharmos os caretos, por minutos, parados frente à sua própria figuração pictoral, vendo-se ao espelho, entre gestos lúdicos de espanto e de contentamento!...
No ano seguinte, a 1ª Bienal, com Balbina Mendes presente, antecipou, em cerca de uma década, a memorável exposição de pintura no feminino da iniciativa da Fundação Calouste Gulbenkian, em cujo escopo adivinhamos semelhanças com o que animara o Museu de Espinho. Não era, como é evidente, o de excluir, segundo o sexo, ou o de erguer as barreiras entre dois guetos que se confrontam, mas, pelo contrário, o de uma descoberta e valorização da metade ancestralmente invisível, no sentido do alargamento e universalização das Artes. Já quanto ao modo, estilo, correntes, temáticas, como o "género" se expressa, para uns, ou umas,com uma criatividade própria, para outros, em facetas comuns e indistintas, não há consenso à vista - no domínio das Artes, ou em qualquer outro, das Letras, às Ciências, da Política a uma infinidade de misteres, outrora masculinos. Nas Bienais de Espinho, a organização guardou-se de tomar partido em querelas que prometem alongar-se, reconhecendo, antes de mais, que o masculino avulta, desde sempre e ainda, como "padrão", enquanto o feminino tende a ser visto como "alteridade", e admitindo a tese de que o sucesso das "mulheres-exceção" (as que estão entre os nomes cimeiros da pintura portuguesa na atualidade), não deve deixar no esquecimento a persistente desigualdade que os números, na sua globalidade, friamente denunciam, no que concerne às outras.
Em 2011, a partir de uma mostra coletiva de mulheres, em preparação, foi um homem, o Diretor da Museu, Armando Bouçon, quem teve a ideia de lhe dar um caráter recorrente, bienalmente. Acompanhamo-lo na sua citação de Michelle Perrot: "escrever foi difícil. Pintar, esculpir, compor música foi ainda mais difícil", assim como na sua avaliação do estado de coisas, que traça no catálogo da 1ª Bienal: "Uma análise correta de toda a história da Arte dá-nos uma perceção muito transparente de como o campo
das artes plásticas foi ocupado durante muitos séculos pelo género masculino". Foi. E ainda é?
De facto, até um Museu tão sensível e aberto a esta questão pode servir-nos para comprovar, como, no que respeita a mega exposições individuais, se mantém o largo predomínio masculino, enquanto, pelo contrário, nas exposições abertas nos pequenos e graciosos recantos em que o Museu abunda, ou nas exibições coletivas, as mulheres começam a ultrapassar os homens. São, assim, presença crescente, contudo, ainda muito aquém do arrojo, da dimensão da obra que a Galeria Amadeo Souza Cardoso reclama - quase como se estivessem ainda em transição gradual, segura mas lenta, do espaço privado para o público. É um exemplo que podemos, sem grande receio de erro, extrapolar a nível nacional e internacional. Na verdade, foi essa constatação que deu origem e força ao movimento de afirmação da "Arte no feminino", em que uma das líderes de vanguarda, no plano mundial, é Paula Rego. Nas suas próprias palavras: "As minhas pinturas são pinturas feitas por uma artista mulher, As histórias que eu conto são histórias que as mulheres contam. O que é isso de uma arte sem género? Uma arte neutra?". [...] "Há histórias à espera de serem contadas, e que nunca o foram antes,
Tem a ver com aquilo em que jamais se tocou - as experiências de mulheres".
Um discurso com que este particular domínio se insere na nova vaga feminista do último quartel do século XX, mas que não tem, necessariamente, uma interpretação unívoca. Qualquer que seja a área considerada, a da expressão artística, como a da intervenção cívica e política - aquela em que, durante uma vida inteira me movi - o enfoque esencial, capaz de reunir correntes que vão em diferente direções, será o de querer, como Gisele Breitling: "uma nova e verdadeira universalidade em que o feminino assuma o seu lugar de direito e o masculino as suas verdadeiras proporções".
2 - Balbina Mendes tem, a meu ver, contribuído, poderosamente, para que as mulheres portuguesas assumam, na vida cultural do país, o seu "lugar de direito".
Fá- lo, ocupando, simplesmente, esse lugar, com força anímica e talento de sobra, sem em nada se julgar discriminada, sem se sentir diferente, isto é, do lado de de lá de uma linha de fronteira... É um caso a seguir, no campo, que se vai alargando, das exceções à regra. Mulheres que, à partida, se sentem consideradas como iguais, e cuja atitude de despreocupação com disparidades de género, contém, implícita, a exigência desse tratamento igualitário!
.À margem do discurso reivindicativo, alcançaram, por si, as metas que o movimento se propõe.
E será que a proclamação dogmática da especificidade de género, pode, no limite, paradoxalmente, dar azo `persistência de formas larvadas de discriminação?. É uma pergunta pertinente. A "arte com género" de que fala Paula Rego, pode, ou não, abaixo do patamar do génio a que ela subiu, transformar-se "de per si" não em sinal vanguardista de contracultura, mas em âncora de estereótipos de género, conotando o feminino com características convencionais que são, afinal, uma menos valia? O ponto
de interrogação vale para qualquer setor... Recordo o crítico literário João Gaspar Simões, que, ao elogiar a força imanente da prosa de Maria Archer, o realismo puro e duro com que ela aborda temáticas ousadas, a qualificava não apenas como uma grande escritora, mas como"um grande escritor"... E não é verdade que às poetisas consagradas, como Sophia, ou Ana Luísa Amaral, ainda hoje preferimos chamar poetas? Ambíguo cumprimento, a que subjaz a conceção da masculinidade intrínseca do cânone... Certo é que para esta escola de pensamento, Balbina é uma das mulheres que merece o cumprimento, ainda que não se reveja na categoria "nobre" de "um grande pintor".
A sua arte não procura rivalizar com quem quer que seja, nem obedece a ditames ou limitações de qualquer natureza, numa trajetória ascensional de inovação, das temáticas, da estética e policromia, do ensaio de técnicas ou da fusão de materiais... É genuína e livremente Ela, transpondo para a pintura a experiência dos muitos mundos que a sua vivência atravessa e o seu olhar penetra. É original e inconfundível. Se me é permitida uma outra adjetivação, direi que tão carismática é a obra quanto a Autora... Uma
admirável contadora de histórias, de vários tempos, do tempo presente a tornar-se passado, ou do passado no movimento e nas significações que o trouxeram até nós, em memórias, rituais, crenças, que se reinventam no convívio com a natureza e as pessoas, figuradas em toda a sua magia e em todo o seu mistério.
No percurso narrativo de Balbina, para mim, no princípio era o rio... porque a conheci na exposição em que nos oferecia a história do Douro, deslizando entre margens, da nascente até à foz, incorporado na beleza encantatória de paisagens, onde as gentes apenas se pressentiam, sem se verem... . Reencontrei, depois, Balbina em novo e surpreendente ciclo temático, na exposição das Máscaras Rituais do Douro e Trás os Montes, em que os homens se faziam presentes, mas ainda sem se verem... O início de um tropo narrativo em torno da máscara, incursão etnográfica, num entrelaçamento telúrico de emoções e saberes, reinventados na tela, em explosões de cor... Voltando a uma visão feminista, que não sendo a da Artista, me é aqui permitida, noto a esplêndida audácia com que se apodera, para a eternizar em arte, da tradição masculina damáscara, símbolo por excelência, da superioridade e camaradagem de sexo, da festa e do cerimonial rigorosamente interditos à mulher... É já um prenúncio da força subversiva e libertária da sua aventura artística. E, logo depois, vai ultrapassar uma última fronteira, no momento em que a fragmentação ou transparência da máscara põe a descoberto... o rosto feminino, numa definitiva rutura pela transgressão, que Paula Rego saudaria com " o gozo pela inversão e desalojar da ordem estabelecida",.. Por isso, Balbina Mendes poderia estar, se quisesse, entre as maiores referências do movimento emancipatório de contracultura feminina nas Artes, como a emblemática Paula sobre quem Ana Gabriela Macedo (U Minho) escreve: [...] ela questiona continuamente os chamados "corolários naturais" da diferença de sexos, bem assim como a suposta "ordem natural das coisas", que se traduz na passividade, dependência e submissão, desmistificando o discurso estético e desmascarando o seu papel eminentemente ideológico e as relações do poder, que aí se encontram camufladas [...].
Nesta mostra intitulada "Segunda pele" o tropo narrativo da Pintora, não nos revela, antes adensa o segredo dos jogos entre a face desocultada e as suas máscaras, mas revela-a, definitivamente, como assombrosa retratista, do rosto e das suas metamorfoses, do tangível e do intangível. Confirma o seu incessante questionamento sobre o ser, as suas mutações e a sua aparência. É, agora, também, na literatura que busca inspiração, glosando em linguagem pictórica o mote Pessoano. As respostas que encontra na tela, serão sempre fonte de novas interrogações, no diálogo encetado com a literatura... Como diz Maria Anderson "Qualquer pessoa ficciona a sua própria identidade, Não nos ficcionamos sempre da mesma maneira. Vamos mudando o guião.... Ou Maria Velho da Costa: "Quem sou? Talvez seja quem vou sendo..." A pessoa, as personae
Quo vadis, Balbina Mendes? Para onde nos levará, no seu ímpeto de transcender limites, a grande cultora de mistérios e emoções, no seu diálogo com a literatura e com a vida, na sua cada vez mais acabada e fascinante mensagem visual??.
in DEFESA DE ESPINHO
O LUGAR DAS MULHERES NAS ARTES
A propósito do retorno de Balbina ao FACE
1 - Em 2010, quando Balbina Mendes veio a Espinho, pela primeira vez, o FACE, inaugurado a 16 de junho de 2009, dava os primeiros passos na que poderemos considerar o seu percurso de afirmação. De facto, os museus, as galerias de arte ganham nome e prestígio com a vivência do lugar, com a marca das pessoas que, sucessivamente, convidam para o habitar, cruzando o seu "curriculum” com o deles, numa apropriação desejada e consentida.
Balbina entrou na história das Galerias do FACE como a primeira Mulher a ocupá-las numa exposição individual, e a primeira a surpreender e a mobilizar largas audiências com as suas espantosas 'Máscaras Rituais do Douro e Trás os Montes" - uma pintura de matriz etnológica, que recuperava arquétipos primordiais emergindo, interpretados e recriados em toda a sua magia, nas telas de grande dimensão e impacto.
Nesse julho de 2010, ela foi também precursora numa outra vertente, ao promover no ato de inauguração um memorável espetáculo de danças dos caretos de Podence, que trouxeram o exotismo da "festa dos rapazes" às ruas de Espinho e, depois, aos corredores e salões do Museu.
No ano seguinte, com a Bienal, "Mulheres d' Artes", em que Balbina esteve presente, o Museu de Espinho antecipou, em cerca de uma década, a marcante exposição de pintura no feminino providenciada pela Fundação Calouste Gulbenkian. Em ambas as iniciativas, a de Espinho e a de Lisboa, adivinhamos o mesmo escopo - não, como é evidente, o de "excluir, segundo o sexo", mas o de valorizar a metade ancestralmente invisível, no sentido do alargamento e universalização das Artes.
Já quanto à complexa questão do modo como o "género" se exprime, (com caraterísticas próprias ou comuns e indistintas), a organização da 1ª Bienal guardou-se de tomar partido, reconhecendo, sim, por um ado, que o masculino avulta, desde tempos imemoriais e ainda hoje como "padrão", enquanto o feminino é "alteridade", e, por outro, a ideia de que o sucesso das "mulheres-exceção" não deve deixar no esquecimento a persistente desigualdade da maioria, que as estatísticas, na fria linguagem dos números, denunciam.
No catálogo da 1ª Bienal, o Dr. Armando Bouçon, Diretor do Museu, a quem se ficou a dever a proposta de a realizar, escrevia: "Uma análise correta de toda a história da Arte dá-nos uma perceção muito transparente de como o campo das artes plásticas foi ocupado durante muitos séculos pelo género masculino". Foi. E não continuará a ser?
2 - Até um Museu que fez história, em Portugal, com quatro históricas bienais de Arte no feminino (entre 2011-2017) pode servir-nos para mostrar como, ao nível de mega exposições individuais, se mantém, nas suas Galerias, o predomínio masculino, enquanto nas coletivas, ou nas exibidas, mais modestamente, em pequenos recantos do Fórum, as mulheres já ultrapassam os homens, numa trajetória positiva, mas como se estivessem, ainda, em transição gradual do espaço privado para o público… É um exemplo que poderemos extrapolar, em outras áreas, a nível nacional e até internacional. Na verdade, essa constatação terá estado na origem do movimento pela Arte no feminino, que teve, e tem, em Paula Rego uma das suas líderes mais insignes e mais ativas. Nas suas próprias palavras: "As minhas pinturas são pinturas feitas por uma artista mulher. As histórias que eu conto são histórias que as mulheres contam. O que é isso de uma arte sem género? Uma arte neutra?". [...] "Há histórias à espera de serem contadas, e que nunca o foram antes. Têm a ver com aquilo em que jamais se tocou-as experiências de mulheres".
Um discurso com que a nova vaga feminista do último quartel do século XX incorporou o plano da expressão artística na globalidade da sua luta - discurso que, diga-se, neste como em qualquer outro campo, é tudo menos pacífico. Mais consensual será, certamente, a exortação de Gisele Breitling em favor de "uma nova e verdadeira universalidade em que o feminino assuma o seu lugar de direito e o masculino as suas verdadeiras proporções".
3 - Balbina Mendes tem contribuído, poderosamente, para que as mulheres portuguesas assumam, na vida cultural e artística do nosso país, o seu "lugar de direito". Fá-lo, ocupando, simplesmente, o lugar, com ânimo e talento de sobra, sem em nada se julgar discriminada. É um caso exemplar, entre grandes artistas, cuja atitude de despreocupação com disparidades de género, contém implícita a exigência do tratamento igualitário. À margem de uma teorização reivindicativa, alcança as metas que esta se propõe, com isso abrindo caminho a outras mulheres, destruindo preconceitos de género, pela força do seu traço, pela singularidade de temáticas e de técnicas....
Embora, como velha militante da igualdade, desde os bancos da escola, não me situe exatamente nesta linha, tenho de reconhecer a sua eficácia, assim como, também, de admitir os riscos da defesa "à outrance" da "arte com género" em que Paula Rego acredita. O que, sendo, no seu patamar de genialidade, sinal vanguardista de "contracultura", pode, a outros níveis, redundar em novos estereótipos do feminino, que, em sociedades patriarcais, são, fatalmente, menos valia. Por essa razão, num outro domínio, o literário, reservamos o feminino” poetisa” para o comum das mulheres, mas chamamos "poetas" a uma Sophia, ou a uma Ana Luísa Amaral... E, precisamente por isso, o crítico João Gaspar Simões, elogiando a força imanente da prosa de Maria Archer, o realismo puro e duro com que abordava as problemáticas mais ousadas, a qualificava como "um grande escritor". Ambíguo cumprimento, a que subjaz a conceção da masculinidade intrínseca do cânone! Balbina não o apreciaria, mas é uma das mulheres a quem se poderia, nessa lógica, aplicar. A sua obra é original, audaciosa, inovadora, (nos temas, na estética, policromia, fusão de materiais...). Transpõe para a pintura a experiência dos muitos mundos que a sua vivência atravessa e o seu olhar penetra, numa vontade constante de transcendência.
Conheci-a na exposição em que nos contava a história do Douro, o “seu” rio, correndo entre margens, da nascente até à foz, incorporado na beleza encantatória de paisagens. Reencontrei-a no ciclo temático sobre as máscaras rituais, incursão telúrica à infância em terras de Miranda, em que se entrelaçam emoções e saberes, reinventados na tela, em explosões de cor...
Numa "leitura feminista”, é de notar a naturalidade com que se apoderou, para a transfigurar em arte, da tradição masculina da máscara, símbolo da superioridade e camaradagem de sexo, em cerimoniais rigorosamente proibidos à mulher... Um sinal da força subversiva e libertária da sua aventura artística. Com o passo seguinte, ultrapassa uma última fronteira, na fase em que a fragmentação ou transparência da máscara deixa o rosto a descoberto... o rosto feminino! É a definitiva rutura do interdito, que Paula Rego saudaria com o seu "gozo pela inversão e desalojar da ordem estabelecida"...
Na mostra agora aberta ao público nas Galeria Amadeo Souza-.Cardoso, intitulada "Segunda pele", o tropo narrativo de Balbina não nos revela, antes adensa o mistério dos jogos entre a face desocultada e as suas máscaras, mas revela-a como assombrosa retratista do rosto e confirma o seu incessante questionamento sobre o ser, a aparência, o tangível e o intangível. Para o que vai encontrar inspiração na heteronímia Pessoana, glosando em linguagem pictórica um mote literário. O resultado é, pura e simplesmente, fantástico!
A não perder, até 28 de maio, em mais este capítulo do roteiro do FACE e da vida cultural que Espinho nos propicia.
Maria Manuela Aguiar
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O PORTO É UMA NAÇÃO!
Na era de Jorge Nuno Pinto da Costa
1 - Há um FCP antes e outro depois de Pinto da Costa. Como portista de nascença, prestes a fazer 80 anos, posso dizer que vivi 40 com cada um deles...
O FCP que vai da minha infância à meia idade era um dos clubes grandes de um país pequeno no mundo do futebol, mas raramente ganhava um campeonato e não pensava em altos voos internacionais. Tinha eu já uns 13 ou 14 anos quando, pela primeira vez na minha vida, em 1956, vi o Porto ser campeão nacional - o Porto de Dorival Knipel, brasileiro de origem alemã, oriundo de Minas Gerais. O mítico Yustrich!
Quanto à Seleção Nacional, digamos que o seu forte, por essa altura, eram as chamadas "vitórias morais". A exceção, que confirma a regra, foi um 3º lugar no Mundial de 1966, sob o comando de um outro famoso treinador brasileiro Otto Glória. Os escolhidos de Otto Glória (que receberam a honrosa designação de "Magriços", ou não fosse a fase final do torneio disputada na Inglaterra...) exemplificam bem a profunda desigualdade Norte/Sul, que se vivia no antigo regime: Dos 23 convocados, 19 eram do sul (mais exatamente,18 de Lisboa, a capital do Império, e um dos arredores, de Setúbal) e só 4 eram do norte (3 do FCP e 1 do Leixões). Na realidade, o fosso era ainda maior, pois desse quarteto nortenho, composto pelo guarda-redes Américo, por Custódio Pinto e Festa, do FCP, e por Manuel Duarte do Leixões, apenas o defesa Festa era titular. Para os mais jovens, há que dizer que, nessa remota era, não havia substituições de jogadores durante os noventa minutos, nem sequer por lesão, e que poucas alterações se registavam no onze base de qualquer equipa, durante uma época inteira.
Mas havia mais e pior! Todos os cargos das instâncias dirigentes do futebol português eram, exclusivamente, repartidos entre os clubes dominantes da capital (Sporting, Benfica e Belenenses), que temos de considerar decisores e juízes em causa própria, com fama e proveito, dentro e fora do campo. Lisboa tratava as colónias e a "província", da mesma maneira, ou, pelo menos, com a mesma sobranceria - na política, nas áreas económicas, no desporto, etc, etc, etc... Em suma, Lisboa (ou o seu sinónimo "Terreiro do Paço"), era o Poder absoluto, autocrático! A capital mandava, sem preocupação de equilíbrio, sem controle, sem oposição (a que havia, mais tarde ou mais cedo, acabava nas prisões ou no exílio...).
A Revolução de 1974 trouxe aos Portugueses a Liberdade, deu-lhe direitos de cidadania proclamados na letra da Constituição e das Leis. Os progressos, não foram, porém, alcançados, a idêntico ritmo ou velocidade, por todo o lado. Não basta declarar a igualdade, é sempre preciso sempre saber conquistá-la contra o "status quo", contra interesses instalados. E em nenhum setor foi mais e melhor conseguida do que no futebol. Não porque fosse mais fácil, mas porque houve quem fizesse a revolução fática, no terreno: Jorge Nuno Pinto da Costa.
2 - Sem prévia revolução democrática não teria havido Pinto da Costa, com o seu inigualável currículo de vitórias, em termos planetários, e sem Pinto da Costa não teria havido revolução no futebol português! Com a sua visão e liderança, ele alcandorou o FCP ao topo do mundo do Desporto (do Desporto-Rei) e, por natural repercussão, levou o País, anos depois, a um protagonismo crescente. Portugal, os Portugueses!. Os nossos Mourinhos.... os Decos, os Ronaldos, os Pepes.. .as equipas técnicas, os gestores, os agentes das estrelas... os dirigentes federativos,... o reconhecimento que nos entregou a (sempre impecável) organização de grandes competições internacionais... O que era, antes do 25 de Abril, uma absoluta impossibilidade, e, depois do 25 de Abril, extremamente improvável, aconteceu.
Não estou com isto a dizer que esta extraordinária evolução se deve diretamente ao Presidente do FCP, mas não tenho dúvida de que deriva da dinâmica por ele criada, de uma verdadeira "regionalização" no futebol nacional. Ou seja, a partilha ou o equilíbrio de poder de "fazer coisas", de progredir, de ser uma bandeira do País em qualquer ponto geográfico, de acordo somente com a capacidade de empreendimento, o querer, o mérito dos cidadãos e das suas coletividades.
Pinto da Costa foi eleito presidente do FCP há 40 anos, em 23 de abril de 1982, exatamente oito anos depois da Revolução (um ano, por sinal, tão importante no futebol como na política, pois foi o da primeira Revisão Constitucional, que consagrou a democracia plena, com a extinção do Conselho da Revolução...). O clube tinha ganho, até então, meia dúzia de campeonatos... Este ano festejou o seu 30º título de campeão! Cumpriu, ao longo das últimas quatro décadas, o nosso sonho de sermos os melhores do País. E foi muito, muito mais longe, ao cumprir o projeto de Pinto da Costa, aquele que, para nós, era pura utopia: tornar o FCP campeão da Europa e campeão do mundo! Por duas vezes. Sete títulos internacionais só em futebol sénior!
E, ele próprio, como presidente de clube, mais titulado do mundo, um recordista insaciável, à espera de mais e mais vitórias no futuro... O seu fabuloso legado inclui ainda um Estádio e um Pavilhão desportivo, que são duas obras de arte arquitetónicas, e um Museu como não há outro igual - o mais visitado da cidade, um seu autêntico "ex-libris.
3 - No 40º ano do mandato de Pinto da Costa é tempo de lhe dizer: obrigada! Não apenas como portista, mas como portuense e portuguesa, porque considero que tem um lugar na História do País e não só estritamente na História do futebol português e universal.
O seu feito maior, que o leva a transcender as fronteiras do desporto é ter mostrado, de uma forma muito concreta, a Portugal, (porventura o Estado mais centralizado da Europa!), quanto a macrocefalia da capital, ao criar uns "mais iguais do que os outros", é inimiga fatal do progresso. E como, quando alguém a consegue afrontar e abrir caminho à ascensão dos melhores, toda a sociedade ascende com eles. Nenhum político conseguiu, ainda, seguir-lhe o exemplo. O centralismo continua a asfixiar as energias e as potencialidades de um país mal gerido. E, assim continuando, não há solução para os nossos males. Meio século após a democratização, e quase quatro décadas após a adesão à CEE/UE, Portugal permanece "na cauda da Europa". É urgente, a todos os níveis do País, em todos os setores, a Revolução que Pinto da Costa fez no campo do Desporto
quinta-feira, 12 de maio de 2022
APRESENTAÇÃO DA COLETANEA SOBRE MARIA ARCHER
COLETÂNEA COMEMORATIVA DO 40° ANO DE MORTE DE MARIA ARCHER
“É o esquecimento e não a morte que nos faz ficar fora da vida".
Mia Couto
Há uma intensa movimentação nos centros envolvidos com a dinamização da Cultura, da Literatura, da Ciência e das Artes em torno da homenagem ao 40° aniversário da morte da autora e jornalista portuguesa Maria Archer (1899-1982).
O Círculo de Culturas Lusófonas Maria Archer se institui como espaço para a dinamização das culturas, literaturas e da produção de conhecimentos dos países que se comunicam através da língua Portuguesa, promovendo as bases para um ambiente fecundo na valorização da vivência democrática, aproximação entre povos, de comunicação inter, trans, pluri e multicultural, muito em particular os do universo da lusofonia e suas diásporas.
O Lançamento do referido Círculo deu-se em 11 de outubro de 2019, na sessão de lançamento do livro "Sem o direito de voltar a casa" Maria Archer - uma jornalista portuguesa no exílio", de Elisabeth Battista, na da Casa da Beira Alta, na cidade do Porto.
Desde o seu lançamento, o Círculo, em parceria com a Associação Mulher Migrante, deu início a um roteiro de reflexões, debates e uma série de jornadas e colóquios, que nesta coletânea temos a satisfação de disponibilizar no apêndice desta publicação. Quais as principais razões que nos levam a fazer de Maria Archer uma companheira de jornadas e de diálogos sobre as temáticas de género? Da Diáspora Portuguesa e do mundo plural da Lusofonia ela é um nome que se destaca, como intelectual, jornalista e romancista, e como precursora na observação e registo, em preciosos textos,sobre os usos e costumes das gentes com as quais, por largas décadas, tanto gostou de conviver, em Moçambique, na Guiné-Bissau, em Angola, (nos anos de juventude acompanhando os pais e, depois, o marido), e, já sexagenária, no solitário exílio brasileiro de mais de duas décadas.
O Círculo Maria Archer tem por assumida finalidade recolocar o nome de Maria Archer no lugar vazio que é seu na história da nossa Literatura e do feminismo português, e, também, na história do pioneirismo na construção de pontes entre as culturas lusófonas. Revisitar a obra desta Mulher de Letras, através da divulgação e do debate dos seus escritos, visa desocultar o passado, lançar luz sobre a realidade insuficientemente analisada e realçada da sociedade portuguesa de 40 e 50, e fazer futuro com a modernidade do seu pensamento e das prioridades da sua luta cívica e cultural. A coletânea intitulada "Maria Archer e a Partilha do Sensível" perfaz uma reunião de textos sob o signo do encontro e seus prolíficos desdobramentos. De certa forma, a vida de cada autor deste livro foi tocada pela vida e obra de Maria Archer. A autora promoveu aproximação de pessoas de lugares e áreas diferentes, pessoas que antes nem imaginavam se encontrar. O título foi inspirado no ensaio "A Partilha do Sensível", do filósofo Jean Jacques Rancière[1].
"Uma Leve Matéria", poema que abre a coletânea, é de autoria da poeta coimbrã Maria Albertina Mitelo. Um poema para celebrar oencontro e os laços que nos unem desde o início da jornada quanto, em 2005,trilhamos os primeiros passos, na cidade do Porto, em busca de elementos para o corpus da pesquisa sobre Maria Archer. Maria Albertina Mitelo foi professora de História durante alguns anos e, desde cedo, se interessou por Arte, com relevo para a Poesia e a Pintura a Óleo. Possui seis livros publicados: Entre Pássaros e o Mar, (2002), O Corpo das Aves (2004), Uma Leve Matéria (2007), Matéria Brevíssima (2009). O Tempo das Aves (2015) e Lugar das Rosas (2019). A sua poesia é marcadamente voltada ao transcendente, o mesmo se podendo dizer da sua pintura, de tal maneira que é possível considerar uma como extensão da outra.
“Maria Archer e o Retorno Definitivo 40 anos depois”, de Maria Manuela Aguiar. Trata-se de texto para a Sessão de abertura do Colóquio Internacional "Maria Archer Reflexos e Reflexões", que aconteceu em 24 de janeiro de 2022, na Biblioteca Nacional, por ocasião das homenagens à Maria Archer no 40° ano de sua morte. Manuela Aguiar traça um elucidativo roteiro sobre o percurso da autora e assinala o movimento iniciado nos meios acadêmicos do Brasil, com uma plêiade de investigadores, que, desde há alguns anos, vem dando visibilidade à obra intemporal da escritora e jornalista, protagonista da luta pelo direito de pensar, de falar e de viver livremente em Portugal. Nesta direção afirma quão imperioso se faz restituí-la à História da Literatura, da democracia e do feminismo em Portugal e na construção de um espaço alargado de diálogo entre os povos e as culturas da lusofonia.
“Musa entre Medusas – Maria Archer e a Partilha do Sensível”, de Elisabeth Battista, ao selecionar romances representativos da obra ficcional de Maria Archer, no lapso de duas décadas, indo de sua estreia em Luanda com a novela Três Mulheres (1935), passando por Ela é Apenas Mulher (1944); Filosofia duma Mulher Moderna,(1950); A primeira Vítima do Diabo,(1954); vemos que a autora lança mão de incontáveis elementos para descrever a vida social nos vilarejos, colocando em cena figuras subalternas nas casas de família e o seu cotidiano. A reflexão indaga qual a influência do meio social sobre os seus textos ficcionais? O que a construção dos perfis femininos fornece de elementos para a compreensão da maneira como estas estão condicionadas social e culturalmente à vida portuguesa em meados do Século XX? Como a autora abordou e compartilhou em sua escrita as situações que observou? Como a análise crítica e historiográfica levou à profundas reflexões sobre opercurso crítico e criativo da autora que circulou entre Portugal, África e oBrasil?
“Só Quero um Futuro” da autoria de sua sobrinha-neta Olga Archer Moreira. Trata-se do texto relativo à sua intervenção na mesa de abertura do Colóquio Internacional "Maria Archer Reflexos e Reflexões", que aconteceu em 24 de janeiro de 2022, na Biblioteca Nacional de Portugal por ocasião das homenagens à Maria Archer no 40° aniversário de morte da sua tia-avó. Olga Archer apresenta o testemunho da vida e obra de Maria Archer, assinalando que esta sempre considerou que “valia a pena correr riscos para fazer aquilo que sonhava. Ficar em silêncio não era solução. Existia um futuro. Maria queria um futuro.” Revela o percurso oneroso e os desafios enfrentados pela da autora sempre em busca de um horizonte, de estabilidade econômica, tranquilidade financeira e um alvissareiro futuro pela contribuição à cultura e literatura lusófonas.
“Maria Archer: Uma Preceptora Singular”, de autoria de Blanche de Bonneval relata as suas experiências no convívio com Maria Archer pelo período aproximado de cinco anos, quando fora preceptora desta, desde os 11 anos idade. Blanche relata o fascínio exercido pela mulher alta e robusta, pitoresca, sempre bem vestida e pintada, Maria Archer deixava a todos impressionados pela sua vastíssima cultura e personalidade forte. Nessa altura, escreveu África sem Luz, (1962);Brasil Fronteira d´África, (1963). Além de também escrever artigos para grandes jornais e revistas paulistas. Nesta época, Blanche tinha começado a escrever poesia e, com a ajuda da preceptora, chegando a publicar várias delas. Revela que Maria Archer era uma costureira de “mão cheia”. Ela mesma confeccionava suas roupas e as pintava (assim como sapatos e bolsas). Blanche guardou muito tempo um broche que era de sua autoria representando um belíssimo buquê de rosas.
“Associação Mulher Migrante Versus Maria Archer”, de Maria da Graça Sousa Guedes, atuante presidente da Associação que tem sido um “fórum” interassociativo de reflexão e debate, que toma para si o papel e a função de colocar na ordem do dia as questões da emigração feminina e a repensar o papel das mulheres na diáspora a fim de repensar estratégias e desencadear dinâmicas de mobilização para a mudança. O texto recupera a história do percurso da Associação, ao tempo em que sintetiza elucidativo panorama de contribuição à divulgação do percurso da vida e obra de Maria Archer. Da diáspora portuguesa e do mundo plural da Lusofonia Maria Archer é,sem dúvida, um nome maior, como intelectual, jornalista e romancista, e como precursora na observação e registo da cultura dos países que viveu e tem o português como língua de comunicação.
"Maria Lamas e Maria Archer: Síntese de Discursos Diversos na Unidade de Acção",de autoria do Professor Salvato Trigo, Reitor da Universidade Fernando Pessoa. O texto é o resultado da intervenção na abertura do 3º Encontro Mundial de Mulheres Portuguesas da Diáspora, promovido pela Associação Mulher Migrante.A abordagem elege como fio condutor as confluências entre os percursos das autoras e traça um paralelo entre os percursos notáveis: “a odisseia da nossa diáspora da qual estas duas mulheres, agentes ativas do resgate português da cidadania feminina, foram símbolos maiores.” Neste sentido assinala: “[...] só na pseudonímia Maria Archer não acompanhou Maria Lamas; na militância pelos direitos cívicos das mulheres, sim.” Chama atenção para a forma audaciosa como Maria Archer militava a favor da causa da dignificação da mulher portuguesa.
O estudo dos primeiros passos da autora no campo da literatura de ficção encontra-se em “Três Mulheres (1935): Maria Archer – Primeiros Passos de Romancista”, de autoria de Elisabeth Battista e Rosane Alves da Silva. Neste ensaio, a novela Três Mulheres examina aspectos da vida social, as relações entre o amor, o casamento, a felicidade e o sucesso profissional. Lançado em período de intensa instabilidade social no cenário político, econômico e cultural, a década de 30, não só deixa marcas profundas no cotidiano, como estampa as transformações ocorridas dentro e fora das mentes femininas. Indaga-se: é possível inferir que a novela seria um veículo das aspirações individuais, mas profundas de um determinado coletivo de mulheres do seu tempo? Como se define a posição social da mulher que quer seguir carreira artística?
Qual o seu lugar na sociedade altamente estratificada? Maria Archer e a Seara Nova (1937): sobre “Tradução e Tradutores” de autoria de Dagoberto Rosa de Jesus volta-se para o texto veiculado na imprensa periódica portuguesa Seara Nova, editado em 1937 e, faz notar que este possui o carimbo de “visado pela censura” posto que Portugal, neste período, estava sobre a égide do Estado Novo. O artigo faz apontamentos a respeito do texto “Tradução e Tradutores”, em resposta ao comentário de Castelo Branco Chaves inserto no número 527 do periódico Seara Nova. O texto de Archer em resposta foi publicado em 9 de outubro de 1937, no número 530 deste periódico. Neste texto a jornalista Maria Archer debate com Castelo a questão da tradução de obras e da publicação de autores portugueses. Ao examinar o artigo, evidencia-se a agilidade discursiva do argumento e a contundência do posicionamento de Archer que se coloca francamente em favor de uma produção local, fazendo esta ponderação que maior que o interesse de uma ou outra pessoa é preciso pensar no coletivo e na cultura do povo. O artigo “Eu e Elas” (1945)
– Maria Archer e a Vocação para Sherazade, de autoria de Suelen dos Santos Silva Aburaya e Elisabeth Battista toma como ponto de partida o ano de lançamento da coletânea ocorre-nos indagar em que medida é possível captar, a partir da organização textual das narrativas breves, a crise na vida social e a condição feminina no contexto pós-guerra? Levando-se em conta o nível de elaboração estética da realidade, o seu registro literário, gestado no clima de destruição, poderá ser significativo para entender as complexidades da década perante as devastadoras consequências da Guerra Mundial na estrutura social,econômica e política e o embrião de um amadurecimento crítico do esboço do perfil de uma nova mulher?
O ensaio intitulado “Da Dominação à Resistência – Percursos de Maria Archer”, de Elisabeth Battista tem como objetivo fundamental colher elementos que possibilitem a captação de momentos cruciais que permitam a compreensão, no âmbito de sua atuação intelectual de Maria Archer, como se dá o trânsito da arte para dominar à arte para resistir?
O artigo “Maria Archer Cronista: Modo de Ver, Viver e Narrar a Condição Feminina” elaborado por Janaina Aparecida da Silva Cruz Barbosa e Elisabeth Battista, volta-se para a atuação da escritora Maria Archer em periódicos e tem como objetivo fundamental a leitura de narrativas breves de sua autoria produzidas para a imprensa periódica. Como a prática intelectual da autora portuguesa, produtora de literatura, põe em circulação dadas ideias, fazendo funcionar uma espécie de (re)visão de conceitos sobre a condição feminina?
“Andamos na Saudade de Maria Archer”, título da intervenção de Maria Manuela Aguiar que refere-se à evocação de Maria Archer, em sucessivas iniciativas - no Encontro Mundial da Mulheres Portuguesas da Diáspora, em Novembro de 2011, na comemoração do Dia Internacional da Mulher, 2012, na cidade de Espinho e, em Lisboa, nesta sessão solene que teve como palco o Teatro Nacional da Trindade. Maria Archer, de acordo com Manuela Aguiar, a mais feminista escritoras portuguesas, é uma "feminista muito feminina", que ousou ser um “ícone de beleza e de distinção”, fazer umacarreira no jornalismo e nas Letras, e, em simultâneo, e lutar pela dignidade epela afirmação das capacidades intelectuais e profissionais então negadas à mulher. A sua escrita servida pelo talento, pela capacidade de observação e pela coragem foi uma arma de combate político - como dizia Artur Portela "a sua pena parece por vezes uma metralhadora de fogo rasante".
O texto depoimento intitulado Maria Archer: O encontro com uma escritora viajante, de Elisabeth Battista foi elaborado para apresentação e posteriormente integrou a publicação do Colóquio dedicado às Memórias de Maria Archer e Maria Lamas,promovido pela Associação Mulher Migrante. O texto narra o percurso desde oprimeiro contato com a obra, a vida, os familiares e o acesso ao espólio da autora. Considerando o seu percurso extraordinário, solicitamos dos familiares em Portugal maiores informações sobre a produção crítica de e sobre o autora, recolhida durante toda sua vida.Tal trabalho culminou com a publicação: Maria Archer – O Legado de Uma Escritora Viajante (2015).
A organização desta coletânea em homenagem ao 40° aniversário de morte de Maria Archer traduz-se na atualização da memória vem, de certa forma, colmatar uma falha que pesa sobre o nome da autora que não merece ser deixada ao abandono dos investigadores, uma vez que é amplamente reconhecida pelo público-leitor.
Elisabeth Battista (Brasil) Maria Manuela Aguiar (Portugal) Organizadoras
sábado, 7 de maio de 2022
CCP - na Entrevista à revista DESCENDÊNCIA (2021)
CCP - ENTREVISTA a DESCENDÊCIA
A Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP) era o instrumento que, no verão de 1979, o Programa Eleitoral da coligação AD (PSD, CDS , PPM e Reformadores) apresentava para levar a cabo novas "políticas de reencontro", de proximidade com os Portugueses da Diáspora. Sabia-se que o associativismo nas nossas comunidades constituia a base da sua vida coletiva, da preservação da língua, dos costumes e tradições, da identidade - fortíssimo a nível de cada cidade, ou, quando muito, de cada país, todavia, sem dimensão internacional. No panorama das migrações europeias do século XX éramos uma exceção, faltava-nos essa plataforma de ligação e colaboração entre comunidades dispersas. Os principais objetivos da criação de um Órgão representativo e consultivo das Comunidades foram, por isso, por um lado,favorecer a federalização do movimento associativo, à nível mundial, sem a interferência do Estado, e, por outro, a audição da voz livre dos emigrantes, que pudesse trazer ao Governo a valoração das políticas públicas, na sua maior ou menor adequação a realidades diversificadas, com um apelo à sua cooperação em projetos partilhados. Em suma, um fórum para o pleno exercício da democracia participativa! Com ele, o estatuto de cidadania que a Revolução de 1974 já reconhecia aos expatriados dava um passo em frente - o espírito da revolução igualitária ultrapassava fronteiras, chegava às comunidades extra-territoriais.
Esta ideia de um diálogo, de igual para igual, Governo/Sociedade Civil para a definição e execução de políticas públicas, no campo das migrações, vinha contrariar uma longa tradição de paternalismo (quando não de indiferença) do Estado e não foi fácil de compreender, até por governantes da mesma área partidária. Um deles decidiu extingui-lo, em 1990, justamente com o argumento de que a prática do CCP se tornara invasiva da área da "soberania do Estado" e "anti constitucional".
Para além desta dificuldade de aceitação de um relacionamento democrático, que alguns políticos viam como demasiado "civilista", o desafio maior que o CCP enfrentou foi a convivência entre as "geografias" da nossa emigração, entre portugueses de estratos sociais e económicos e, sobretudo, de convicções ideológicas muito diversos. Foi deveras inesperada e excelente a forma como, logo em 1981, eles souberam derrubar estereótipos, criar solidariedades, procurar e conseguir compromissos e acordos. O consenso sobre o próprio Conselho e a seu papel tem sido o fio condutor, que o manteve, com idêntico espírito, através de múltiplas reestruturações, durante 40 anos. E é nele - nesse "pacto" entre os próprios Conselheiros - que antevejo o melhor do seu futuro. O CCP, a funcionar assim, nunca envelhecerá! É como uma organização parlamentar, onde o rejuvenescimento se opera pela permanente atualização das matérias tratadas, pela renovação dos eleitos, e pela qualidade dos seus contributos voluntários.
Na emigração e na Diáspora, a língua e, mais latamente, a Cultura estão sempre no centro das preocupações, com um reflexo direto na vida do CCP, que é, verdadeiramente, uma grande instituição do mundo da lusofonia. E espero que, para além de agregar os Portugueses de passaporte, possa, também, unir, um dia, outras comunidades lusófonas e lusófilas, como propunha a legislação original, ao não exigir aos Conselheiros o requisito da nacionalidade. Um caminho possível para atingir essa meta será promover o grande encontro das migrações lusófonas (no espaço da CPLP), ou, em alternativa, no eixo bilateral, com o Brasil, Cabo Verde e as demais nações da nossa língua.
A reforma que mais ambiciono, e há muito defendo, para o Conselho das próximas décadas é a sua "constitucionalização", um maior grau de autonomia e de recursos funcionais e a obrigatoriedade de ser consultado em matérias relevantes para as comunidades portuguesas.
Episódios? Estou a lembrar-me da última vez em que, na nossa embaixada, em Paris, estive com o Dr. Francisco Ribeirinho, um histórico, um dos ideólogos do 1º Conselho (1981/90), e uma das vozes mais importantes e mais críticas, na relação com o Governo. Estávamos em vésperas de relançamento do CCP, em novo formato, e ele surpreendeu-me ao dizer, nostalgicamente: "Oh, Manuela, o nosso Conselho é que era!..."
Mas, apesar das diferenças, o Conselho seguinte manteve, no essencial, o ânimo e o ritmo de trabalho que o carateriza desde o início. O segredo da sua sobrevivência, afrontando tantos obstáculos e situações de rutura, é, a meu ver, a originalidade matricial de ser de todos, sem controle ou supremacia de uma das partes. Ser "nosso".
CCP - A QUESTÃO DE GÉNERO
O CCP e as POLÍTICAS de GÉNERO
1- Num momento em que o CCP, renovado por um processo eleitoral, tem de repensar a sua atuação, para ocupar, mais e melhor, o espaço privilegiado, que é o seu, no diálogo e cooperação entre portuguesas e portugueses do mundo inteiro e na sua representação perante o Governo, a diplomacia, as entidades públicas de Portugal e a sociedade civil), isto é, num momento em que está essencialmente voltado para tempos vindouros, julgo útil que lancemos um olhar retrospetivo sobre o seu processo evolutivo, em especial no que respeita ao equilíbrio de participação de género, de gerações, de formação profissional e experiência de vida, de comunidades antigas e recentes...
Como tornar esta singular instituição mais inclusiva, mais democrática, mais capaz de levar a Lisboa toda uma grande diversidade de situações em mudança e de problemas, novos ou recorrentes, a solucionar na emigração.
São aspetos de crucial importância para que o CCP cumpra as expetativas e os meios nele investidos. Todavia, nesta breve reflexão iremos considerar, antes de mais, a primeira forma de equilíbrio acima mencionada, por ser uma daquelas em que o CCP tem progredido e em que a Venezuela se converteu num exemplo concreto de intervenção feminina..
2- Na sua primeira vida, entre 1981 e 1988, o CCP era eleito dentro do círculo das associações de nacionais, tal como à época, acontecia com o Conselho francês, a única instância consultiva de expatriados então existente na Europa. E espelhava, naturalmente, a realidade de um universo associativo de rosto masculino: não havendo entre os seus representantes uma única mulher... Um outro segmento era composto por membros dos órgãos de comunicação social, numa rotação entre os da imprensa escrita e dos meios audiovisuais, e foi no interior deste segundo grupo que se registou uma isolada presença feminina, vinda de França (a jovem Custódia Domingos).
Era de menos, e, em 1984, a reação veio de dentro do próprio Conselho, durante a reunião regional da América do Norte, pela iniciativa de Maria Alice Ribeiro, jornalista do Canadá . Foi ela que propôs a convocação de um encontro mundial de Portuguesas do estrangeiro, A ideia obteve aí um fácil consenso e o governo deu-lhe sequência logo no ano seguinte, na cidade de Viana do Castelo. A seleção das participantes foi feita com base em comunicações apresentadas por mulheres envolvidas na esfera associativa e no jornalismo - as duas componentes principais do CCP. Mulheres com voz, influência, cargos diretivos eram, nos anos 80, uma minoria - como, apesar de inegáveis avanços, ainda são, agora, na generalidade das comunidades. A elite feminina presente em Viana distinguiu-se pela sageza e abertura ao diálogo e deu a um encontro histórico a marca da sua qualidade, da sua capacidade ímpar de chegar a consensos (bem difíceis no primeiro Conselho ...) e de pensar a mudança.
Falaram da especificidade de género nas migrações, mas também da emigração como um todo,- o ponto de vista feminino, até essa altura ignorado, sobre sociedades em transformação, às quais queriam poder dar, livre e responsavelmente, a sua parte - e, por isso, ousaremos concluir que essa primeira audição governamental foi uma espécie de CCP no feminino, preenchendo um vazio, convertendo-se em prenúncio de leis e programas visando a paridade, que tardaram décadas. De facto, logo em 1987, a SECP iniciou o processo de instituição de uma Conferência para a Igualdade de Participação, que, a par de outras conferências (como a da educação ou a do empreendedorismo), iria funcionar na órbita do Conselho. Mas, no verão desse ano, caiu o Governo, e com o novo Executivo caiu o CCP e tudo o que com ele se relacionava, como era o caso das conferências periódicas.
3- Um parêntesis para realçar o facto do Encontro de Viana ser inédito, em termos europeus (e, ao que elas próprias afirmavam, universais, pois ninguém tinha conhecimento de convocatória semelhante por parte de um governo face às suas expatriadas). Portugal era, por sinal, um Estado improvável para se tornar vanguardista neste domínio, pois as suas políticas foram, desde a era da colonização à das migrações contemporâneas, um exemplo negativo e retrógrado, quando comparado com Espanha e outros países culturalmente próximos, como destaca um dos maiores historiadores da Expansão, CR Boxer.
A discriminação manteve-se ao longo do século XX, até à revolução do 25 de abril. A saída das mulheres foi sempre mais dificultada do que a dos homens, apesar desta ser, também, quase continuamente, condicionada ou limitada por leis e repressão policial. E nem mesmo a revolução democrática, que trouxe a completa liberdade de emigrar para mulheres e homens, significou, de imediato, ação concreta para promover a igualdade de participação, que só foi encorajada dentro de fronteiras, sobretudo pela meritória ação da Comissão para a condição feminina..
Esta visão territorialista da questão da igualdade de género foi, pois, subita e inesperadamente, invertida em 1984/85, rompendo com o descaso tradicional e antecipando medidas que as organizações internacionais e o direito comparado só viriam a adotar muitos anos depois. Lembrá-lo é uma forma de homenagear as pioneiras do Conselho das Comunidades, que eram tão poucas quanto notáveis e estiveram, em 1993, entre as fundadoras da Associação Mulher Migrante.
4- Na sua segunda vida, a partir de 1996, o CCP torna-se um órgão eleito por sufrágio direto e universal, seguindo os novos moldes dos congéneres espanhóis, italiano e francês (este devido a grandes alterações introduzidas em 1982). , mas prossegue, em muitos domínios, causas, objetivos, recomendações que se situam numa na linha de preocupações constantes- caso do ensino e e da cultura nacional, da segurança social, da melhoria da lei da nacionalidade, da participação cívica e política. Contudo, apesar da fraca proporção de mulheres conselheiras, não retomou, a nível das reuniões plenárias ou regionais, a ideia de um forte chamamento cívico da metade feminina a uma partilha mais ativa no quotidiano do Conselho e das comunidades.
O impulso para a participação igualitária acabou por vir de fora, não em cumprimento de qualquer recomendação dos conselheiros, mas em consequência da aplicação a este órgão dos princípios básicos da Lei da Paridade, que rege a composição do Assembleia da República, das Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas e das Autarquias
E, por puro acaso, fruto da cronologia eleitoral, a primeira experiência da aplicação do chamado "sistema de quotas" foi justamente a elaboração das listas para o Conselho. Um teste positivo, já que a proporção da mulheres aumentou graças ao novo dispositivo legal e elas provaram igual capacidade para o exercício das funções. Porém, não se pode dizer que o reconhecimento da sua competência se tenha traduzido no relevo dos cargos institucionais, a que (não) têm sido chamadas. Refiro-me, por exemplo, à presidência do CCP ou das suas múltiplas comissões.
No passado distante ou próximo, esta verdadeira "assembleia" dos portugueses do estrangeiro foi, sempre, no que respeita a cargos formais, um "mundo de homens", ficando muito longe do que vimos na Assembleia da República, onde presidência, vice-presidência, chefia de delegações internacionais, dos grupos parlamentares, de comissões por deputadas já entrou no domínio da normalidade.
Esperemos que assim seja também no CCP, de 2015 em diante.
5- No momento em que aguardamos informação sobre a composição do novo Conselho , com uma certeza: nos podemos já regozijar: a Venezuela figura nos anais da instituição, com a liderança feminina das listas vencedoras no conjunto das duas áreas consulares, com os nomes de Milú de Almeida e de Fátima Pontes .- listas que eram rigorosamente paritárias.
Isto aconteceu, evidentemente, em função de uma realidade comunitária, concretamente do associativismo em que esta se estrutura e da posição que as mulheres nela conquistaram pelo seu trabalho. A força da sua intervenção cívica e associativa teve reflexos diretos nas candidaturas e no voto popular. Mulheres e homens unidos na mesma luta por valores éticos, sociais e culturais, pela satisfação de projetos e justas ambições da sua comunidade, dentro do todo nacional!
Há anos que eu venho elogiando, em outras regiões do mundo português, os patamares de igualdade alcançados na Venezuela, graças a um associativismo feminino em rápida e consistente expansão. Sem esquecer o papel desempenhado há décadas pela Sociedade de Beneficência das Damas Portuguesas de Caracas, penso na recente proliferação de movimentos de solidariedade, de convívio, de cultura - entre os quais, as Academias da Espetada e a Associação Mulher Migrantes da Venezuela, integrada num círculo internacional, que está em crescendo.
6- O movimento feminino em algumas - raras - comunidades lusas, sobretudo das Américas (EUA, Venezuela), tem um longa e brilhante trajetória, mas a sua vertente internacional nasceu daquela proposta inédita do 1º CCP . Agora, 30 anos depois, portuguesas da Venezuela, vindas do relançamento desse movimento, com a Associação Mulher Migrante e prometem fazer história no CCP - história da própria instituição, história do feminismo e história da nossa emigração e Diáspora.
O programa que Milú de Almeida e Fátima Pontes defenderam em "Somos Portugalidade"´, é para ser cumprido. Conhecemos bem o seu carater, o seu ânimo, a sua força. Elas são o presente, e vão fazer parte do envolvimento futuro das mulheres na vida cívica, mulheres agindo, lado a lado, com os homens, para resolver as grandes questões que se põem na sua comunidade, ao serviço do País - é para isso que querem direitos iguais. Concretamente no CCP, para lutarem por mudanças, que lhe permitam não só trabalhar bem, como divulgar o trabalho feito, impulsionar os estudos sobre as migrações, contribuir para a união mundial do associativismo, sobretudo na vertente cultural lusófona, para a inclusão dos grupos mais marginalizados (como têm sido coletivamente as mulheres), dar no interior do país a imagem das portuguesas e dos portugueses da Diáspora e a cada comunidade a imagem do país, na sua modernidade
É um percurso ascensional de décadas que, neste breve apontamento, procurei relembrar, sem saudosismo, simplesmente como o início de uma esplêndida caminhada, em que as mulheres seguem em frente, pelos valores da Portugalidade.
19 set 2015
MULHERES MIGRANTES no Conselho das Comunidades Portuguesas
MARIA VIOLANTE MARTINS, presidente da Associação das Mulher Migrantes Portuguesas da Argentina, MILÚ DE ALMEIDA e FÁTIMA PONTES, Presidente e Vice-presidente da Associação da Mulher Migrante da Venezuela, concorreram às eleições para o CCP, neste mês de setembro de 2015, como cabeças de lista e venceram. Entraram no Conselho pelo voto das suas comunidades e entraram também na história desta instituição e na do movimento associativo, que lhe dá força identitária e personalidades com um saber de experiência feito em terra estrangeira..
Chegam as três de um associativismo feminino, que, pela primeira vez, na nossa Diáspora ultrapassa as fronteiras de uma região ou de um país, e inclui nos seus principais objetivos a igualdade de participação cívica e política das mulheres. Pela primeira vez, vimos as suas dirigentes a tomar a iniciativa de constituir listas para o CCP - listas abertas, paritárias - a fim de assumirem a defesa dos intereses das comunidades a que pertencem e dos seus compatriotas no interior do órgão que os representa face ao governo de Portugal.
O CCP foi inicialmente um universo de homens, que dominavam as intituições das comunidades - sua primordial base de recrutamento, nos termos da lei fundadora. Aliás, ainda hoje, num modelo de eleição por sufrágio universal, a maioria dos seus membros são homens, a que acresce uma minoria de mulheres, quase todas e todos provenientes do viveiro de lideranças e de notoriedade, que é o associativismo.
É certo que, desde o começo do século XX, coexistiam em algumas das então chamadas "colónias" da emigração portuguesa um amplo círculo das organizações masculinas e um pequeno círculo feminino, uma elite pioneira, que, em casos contados, deu vida a empreendimentos de ampla dimensão - por exemplo, as sociedades fraternais da Califórnia. Todavia, as mulheres dirigentes de ONG's, qualquer que fosse o seu poder de facto, nos anos 80, não se sentiram suficientemente motivadas para intervir numa instância consultiva, à qual o Governo reconhecia uma enorme importância, como plataforma para debate de questões prioritárias e definição das grandes linhas das políticas públicas neste setor. A que se deve o alheamento mais ou menos voluntário das mulheres? Não é fácil dar respostas a uma interrogação que, de início, não se colocou, talvez por se considerar - tal era a desproporção da sua presença no todo institucional - uma inevitabilidade. Talvez pelo facto de funcionarem em paralelo, à margem do associativismo-padrão, onde pontificava o outro sexo. Ou - é uma outra hipótese plausível - por terem o seu enfoque matricial em domínios que julgaram fora das prioridades do CPP - a entreajuda entre as próprias associadas, o voluntariado beneficente, o puro bem-fazer, em conformidade com a tradição.
Como sabemos, o movimento feminista de novecentos veio colocar a tónica na defesa dos direitos de cidadania e no acesso à educação e ao trabalho profissional ( sem abandonar a vocação beneficente e humanitário), mas não curou nunca, diretamente, da situação das mulheres migrantes. Estas foram, de facto, insolitamente esquecidas. Marginalização, na altura, tanto mais definitiva quanto nas Diásporas, não surgiu, de uma forma autónoma e espontânea, militância num ativismo norteado pela ideia da igualdade, no campo político e social. O obra visível das portuguesas expatriadas na esfera pública floresceu, como dissemos, sobretudo, em moldes menos reivindicativos, mais consonantes com uma configuração consevadora dos papéis de género.
As primeiras conselheiras do CCP ganharam o lugar nessa magna assembleia de líderes comunitários, não pela dinâmica coletiva (feminina), antes tão só pela vontade de intervenção cívica e pelo prestígio individualmente grangeado entre os seus pares. Não é surpreendente que tenham vindo sobretudo do jornalismo - caso de CUSTÓDIA DOMINGUES, de MARIA ALICE RIBEIRO, desde 1983 e , depois, de MANUELA DA LUZ CHAPLIN, advogada, que mantinha uma colaboração regular e importante na imprensa luso americana..
Creio que MANUELA DA ROSA, fundadora da Liga da Mulher Portuguesa da África do Sul, terá sido a primeira conselheira oriunda de uma estrutura feminina (aliás não "feminista", no sentido revolucionário ou, pelo menos, fortemente reivindicativo, da palavra). Não tendo tido, provavelmente em razão do sexo, acesso a cargos de relevo na hierarquia do Conselho, nem por isso deixou de ter sempre uma voz influente, tal como aquelas cujos nomes acima lembrámos.
A uma conselheira deve o CCP o ficar na história como o improvável, mas autêntico, impulsionador do embrião de políticas atentas às especificidades da situação das migrantes . Foi Maria Alice Ribeiro, quem propôs, em 1984, uma audição governamental de portuguesas da Diáspora, que a SECP levou a cabo logo em 1985. Foi um auspicioso primeiro passo, que se queria continuar, com a formação de uma organização internacional, no plano da sociedade civil, e, a nível das políticas governamentais, através de conferências periódicas na órbita do Conselho - uma forma hábil de inclusão das mulheres na vertente consultiva do Conselho.
A Associação "Mulher Migrante" foi criada, quase uma década depois, em 1993, para reavivar aquela valiosa herança, levando por diante o projeto de ampla cooperação transnacional para uma participação igualitária na vida das comunidades e do país.
O segundo CCP é posterior (1996) e não tem manifestado, até agora, particular propensão para agir no domínio da igualdade de género, apesar de em muitos outros campos ter sido um poderoso e insubstituível instrumento de co -participação nas políticas de emigração, de expansão da língua e da cultura portuguesas, de aprofundamento dos laços com o País de origem e de integração no país de residência.
É a hora de o CCP se preocupar mais com os fenómenos de exclusão não só da metade feminina, como também dos mais idosos e experientes, dos jovens, da nova emigração. Para isso, contamos com a intervenção das Mulheres Migrantes e com os aliados que, com toda a probabilidade, encontrarão no interiror do Conselho.
Apesar de a Associação Mulher Migrante - a que está sedeada em Lisboa, com ramificações pelo mundo - não ter tido qualquer interferência na apresentação das candidaturas ou nas campanhas vitoriosas das suas associadas da Argentina e da Venezuela, vè nelas a comprovação da eficácia de uma estratégia de envolvimento cívico das portuguesas do estrangeiro, desenvolvida, em colaboração com sucessivos governos, sobretudo a partir dos "Encontros para a Cidadania", nas Américas, África e Europa entre 2005 e 2009, continuados com os Encontros mundiais de 2011 e 2013 e outras ações integradas no que podemos chamar "congressismo". Daí que partilhemos o sabor e o significado destas vitórias, com um sentimento de esperança num CCP mais próximo da realidade das comunidades e mais eficaz, porque o equilíbrio de género é, obviamente, uma mais valia. da representação democrática
25 set 2015
TERÇA-FEIRA, 2 DE JULHO DE 2019
Sobre a proposta das Conselheiras do CCP para o reforço da Paridade no "Conselho
2 de junho de 2019
Senhora Conselheira Luísa Semedo
Cara Amiga
Agradeço a informação recebida e muito me regozijo com esta histórica iniciativa das Conselheiras do CCP,
Estou inteiramente de acordo com as propostas avançadas e quero felicitá-las pela forma tão objetiva e tão convincente como a defendem, pondo o acento na incompatibilidade entre a própria definição de democracia e a situação de discriminação de género subsistente no CCP, quase 40 anos depois de ter sido instituído.
Tive o privilégio de acompanhar de perto o seu nascimento e evolução, enquanto membro do Governo e Deputada da emigração, desde a a feitura da lei em 1980 e a realização da reunião plenária inaugural, em abril de 1981. Nesse primeiro encontro mundial, não havia uma única mulher eleita pelo colégio eleitoral formado, então, por dirigentes associativos das Comunidades. o que não podia deixar de prejudicar a imagem, credibilidade democrática e eficácia de um Órgão de representação e consulta tão importante. Essa inadmissível discriminação espelhava, porém, a realidade de um movimento associativo caraterizado pela absoluta predominância masculina e tornava-se, por isso, extremamente difícil de combater. Nas eleições de 1983, apenas duas mulheres ganharam acesso ao Conselho, ambas jornalistas, uma de Paris, outra de Toronto e só em 1985 surgiram as primeiras conselheiras oriundas do movimento associativo, notáveis pioneiras de reconhecida competência, apesar da qual nunca foram escolhidas pelos seus pares para qualquer cargo de direção.
Após um longo interregno, que se estendeu de 1988 a 1996, a adoção, nesse ano, de um novo modelo de Conselho, a eleger por sufrágio directo e universal, parecia abrir perspetivas ao maior equilíbrio de sexo, logo frustradas, pois a componente feminina manteve-se diminuta e afastada das lideranças, por mais qualificada e influente que fosse - e era!
Só a imposição de quotas, (de que, há muito, sou adepta declarada), tanto nas eleições nacionais e autárquicas como no CCP, se revelou decisiva para os progressos registados na última década, ficando embora ainda aquém das metas da paridade. E, infelizmente muito mais no Conselho das Comunidades do que, por exemplo, na Assembleia da República. Ora quanto maior for a continuada resistência a uma intervenção feminina igualitária, mais necessário é reforçar a eficácia da aplicação das regras da paridade, procurando detetar, denunciar e impedir os desvios concretos ao espírito e aos ditâmes da lei. É exatamente o que, em relação ao caso particular do CCP, vêm propor, com rigorosa argumentação, as Senhoras Conselheiras,
Acredito que conseguirão alcançar os objetivos e, com isso, dignificar a Instituição, dar-lhe a sua verdadeira dimensão representativa, e contribuir, em simultâneo, para um novo fôlego, na Diáspora, das políticas públicas para a igualdade, que constituem, nos termos da Constituição, "tarefa fundamental" da Estado. No passado, o CCP teve já, por sinal, um papel relevante na génese das políticas para a igualdade, graças à recomendação de uma Conselheira de Toronto, Maria Alice Ribeiro, que levou, em linha reta, à convocatória, pelo Governo, do "1º Encontro de Mulheres no Associativismo e no Jornalismo", em 1985. Uma reunião inédita, em que grandes mulheres das Comunidades de todo o mundo mostraram o seu conhecimento das problemáticas da emigração, capacidades de diálogo e criação de consensos, comprovando, assim, a medida exata da falta que a sua voz fazia no Conselho,.
Permitam-me, por último, felicitá-las pelos resultados já atingidos, sobretudo a nível regional, redobrando fundadas esperanças no futuro Conselho, no impacte que nele terá, certamente, a sequência desta tomada de posição conjunta das Conselheiras.
Para todas envio cordiais saudações, com a minha inteira solidariedade e muito apreço
Maria Manuela Aguiar
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