domingo, 4 de dezembro de 2022

DECO - O MÁGICO VOLTOU AO PORTO 1 - Se (um "se" cujo rasto de incertezas cresceu após recente e inesperado empate caseiro...) o FCP interromper, este ano, a sua deprimente hibernação de títulos, terá de reconhecer que o deve, em larga medida, a Anderson Luís de Sousa, ou Deco, como ficou eternizado na história do desporto. De facto, Deco continua a espalhar magia, agora já não sobre os relvados, mas, digamos, de fora para dentro do campo. Por sua mão, chegou ao Porto, no "mercado de inverno", Francisco (Tiquinho) Soares. E, com Soares, em pleno inverno, começou, mais cedo, a primavera portista! Diz o ditado popular que "uma andorinha não faz a primavera"... Mas poderá um homem, num jogo tão essencialmente coletivo como é o futebol, fazer a diferença? Em determinadas circunstâncias, pode, e aí está Tiquinho para o provar. Desde que "chegou, viu e venceu" a equipa só não ganhou jogos em que ele não marcou (dois da Champions e um do campeonato) O FCP, esta época, tal como nas precedentes, tardava em se afirmar, apesar de ter, aparentemente (quase) tudo o que era preciso para o sucesso: um "monstro sagrado" na baliza; uma dupla de centrais que o próprio presidente Pinto da Costa elogia superlativamente (num clube habituado a ter os melhores centrais do mundo de Aloísio a Jorge Costa, de Ricardo Carvalho a Pepe, sem falar de outros, através dos tempos), uma sólida defesa, em suma; uma superabundância de bons médios (a ponto de raramente sair do banco o que me parece o mais talentoso e promissor de todos, Rúben Neves); e, à frente, uma plêiade de jovens, justamente incensados pela elevada qualidade técnica, que, note-se, subiu, repentinamente, quando Nuno Espírito Santo (NES) se lembrou de convocar Brahimi, que por ali andava esquecido ou proscrito. Todavia, sabido que as vitórias resultam da diferença entre os golos que se marcam e os que se evitam, e dado que o FCP de NES defendia com a devida eficácia, mas não marcava, com a devida regularidade, o percurso era feito de altos e baixos, numa competição que exige regularidade global. Assim, o título, que foge há três longos anos, parecia extremamente improvável. 2 - Não era difícil detetar a maior lacuna do plantel. o difícil era achar o homem com perfil para preencher o vazio deixado por Jackson Martinez, hoje no Guangzhou Evergrande de Scolari, em boa posição para ser campeão da China. NES acreditava piamente no promissor André Silva (que é, realmente, muito promissor) e, para as suas faltas, foi comprar ao estrangeiro, impressionado, talvez, antes de mais, pela dimensão física, o colosso belga Depoitre, (por seis milhões de euros), despachando, sem hesitação, as alternativas ao seu dispor, Aboubakar, estrela que cintila, agora, lá longe, no Besiktas da Turquia, e Marega, que tal como Hernâni, brilha, aqui bem perto, em Guimarães. Ora, justamente em Guimarães, vindo do Nacional da Madeira, estava Tiquinho Soares, tesouro oculto, cujo potencial só Deco soube adivinhar... Nem o Rudolfo Reis, que tanto gosto de ouvir, domingo à noite, no "Play off", acreditava nas capacidades do reforço de inverno. Com o desassombro e o humor muito portuense que o caraterizam, colocava o Tiquinho na classe futebolística do operariado menos qualificado - e, depois que ele se impôs, no onze do Dragão, os" compagnons de route" daquele programa não o deixam esquecer o erro inicial de avaliação. (Rudolfo, o mítico capitão portista, que nunca envergou outra camisola além da do clube do coração - feito, hoje em dia, praticamente impossível de igualar, pois a lei do mercado, que passou a reger os negócios do futebol, depressa o teria expatriado para um qualquer campeonato milionário). 3 - Deco disse, numa pequena entrevista, que Soares não era um novo Derlei, nem jogava na mesma posição, mas tinha características de Derlei. Bem visto! Tem muito mais de Derlei do que, por exemplo, do ídolo que, na canção de Rui Veloso, com letra de Carlos Té, realiza os nossos impossíveis desejos, voar - “voar como o Jardel sobre os centrais". De facto, Jardel dominava o jogo, em poucos metros de terreno, entre os centrais, e precisava de um Drulovic (no FCP) ou de um João Vieira Pinto (no SCP) para receber a bola em posição de voar para o remate imparável... E que saudades de tantas obras-primas de finalização! Soares promete satisfazer a nossa sede de golos, num futebol moderno, de vaivém entre espaços ofensivos e defensivos. É, como Derlei, viajante do campo inteiro - joga e faz jogar, embora agradeça e aproveite a precisão de passe dos companheiros. Um fenómeno, combinando força, técnica, visão, veia goleadora e, também, porte físico, para satisfazer quem valoriza nos atletas a altura e a corpulência (únicos predicados em que Depoitre poderá rivalizar com ele). Até Luís Freitas Lobo, superior autoridade doutrinal neste domínio, o refere como " o fator que muda tudo". E, em linguagem mais poética, vai ao ponto de falar do "novo mundo azul de Soares". Ao lê-lo, com prazer e com esperança no futuro, recordei o passado, o antigo "mundo azul de Deco", que foi, a meu ver, o melhor nº 10 nos anais do futebol portista (e do português, igualmente...), o cérebro das suas equipas, o grande mestre do desenho de um futebol que aliava a arte à eficácia! Ele poderá, de agora em diante, usar essa mesma inteligência e mestria na descoberta de novos talentos. Espero que Soares tenha sido, para o FCP, o primeiro de muitos…" HOMEM CERTO NO LUGAR CERTO. NO TEMPO ERRADO... (a propósito do Aeroporto Cristiano Ronaldo) O País continua a discutir, apaixonadamente, dentro e fora dos debates televisivos, numa espécie de multiplicação do programa "Prós e contras", o "batismo" deste aeroporto. Para além da própria denominação, um outro caso se levantou com a inauguração de um busto do patrono de muito duvidosa qualidade. Esta segunda controvérsia tornou-se mais importante porque se constituiu no melhor indício da ligeireza (para não dizer leviandade) com que o processo decorreu de princípio a fim - se é que chegou ao fim, visto ter sido suscitada a questão jurídica da legitimidade do Governo regional interferir em domínio que será (ou não!) do poder de Lisboa. O bronze foi produzido em escassos 15 dias e é de autoria de um generoso dador, desconhecido nos meios artísticos - exemplo de amadorismo, particularmente inadequado para prestigiar o mais profissional dos atletas, em cerimónia abrilhantada pela presença do Presidente da República e do Primeiro Ministro. Pressa, voluntarismo, incompetência. E, segundo alguns avisados comentadores, porventura, um gesto não assumido de rotura geracional na vida política da Região. Ou seja, o meio eficaz de precludir a possibilidade de um futuro Aeroporto Alberto João Jardim. E para a missão de descartar o Homem ao qual, substancialmente, se deve a modernização da Madeira e o avanço do projeto autonómico, quem melhor do que o madeirense mais popular do mundo? A razão porque esta hipótese parece plausível é o desacerto do "timing" da "alternativa Ronaldo". De facto, o jogador está apenas a alguns anos do termo da carreira. a alto nível, e, por isso, não se vislumbra motivo para não adiar, por quatro ou cinco anos, se tanto, um tributo que seria absolutamente oportuno e indiscutível no preciso momento da despedida dos relvados. Março de 2017 é, definitivamente, o tempo errado, para entronizar um " homem certo, no lugar certo". Lamento ter de criticar uma deliberação que, noutras circunstâncias, veria com agrado, pois sou uma declarada defensora das vantagens de "dar o nome às coisas" - desde aeroportos a instituições culturais e quaisquer outras, sempre que esse ato contribua para a preservação da memória dos feitos e das pessoas com que se construiu ou se constrói a história de um país, de uma região,de uma comunidade, de uma entidade, e com cujo exemplo se conduz essa história ao seu futuro. É justo, é edificante conferir, assim, visibilidade a laços de pertença, a personalidades que são fonte de inspiração para as novas gerações. Reclamar, deste modo, a herança dos nossos maiores, significa não só valoriza-los como valorizar-nos.
Comemorar 80 anos de vida do jornal "Defesa de Espinho" é, bem vistas as coisas, lembrar e festejar 80 anos de vida do concelho, da terra e de várias gerações de Espinhenses, que o são pela naturalidade ou, simplesmente, pelo afecto. Assim é, antes de mais, porque a qualidade do seu jornalismo, a percepção e tradução da realidade, que serve de matéria-prima à "Defesa de Espinho", lhe tem permitido cumprir o projecto que faz jus ao próprio título: um projecto de defesa dos valores e de afirmação das singularidades do espaço geográfico e das vivências de que se constrói a identidade desta terra tão extraordinária, e a sua memória, de que todos nos orgulhamos. Através da informação e da opinião plural, da crónica e das notícias do quotidiano, se pode acompanhar um longo percurso colectivo de oito décadas e se guarda a recordação de eventos sociais e culturais, de vicissitudes e de problemáticas que marcaram cada época - em suma, da evolução e das transformações da história local. Há um património riquíssimo da cidade e das suas gentes, que se expande em muitos e muitos milhares de páginas - reflectindo as tradições piscatórias, que sempre conviveram bem com o vanguardismo da estância balnear dos tempos de juventude de meus Pais, assim como, depois, com o bulício da vila alegre e ainda bastante cosmopolita dos meus anos de "teenager" - os banhos na "Praia Azul", o rinque de patinagem à beira-mar, os bailes no salão da Piscina, as sessões de cinema" do São Pedro ou do Casino, as noites de vaivém no Picadeiro, entre as mesas dos cafés e as palmeiras... E ainda hoje encontramos na "Defesa de Espinho" a cidade em retrato de corpo inteiro, de corpo e alma! Os parabéns, numa data tão significativa, têm de ser repartidos, igualmente, pelos directores, pelos jornalistas, pelos leitores, por um alargado colectivo que interage e partilha uma grande aventura jornalística, que há-de prosseguir num longo futuro, a viver por muitas geraçõe

Diáspora (2014)

Portugal tem de ser a aventura que vive do passado presente. O país da saudade do futuro. O nosso passado é uma história que não cabe numa terra pequena. E o futuro? O futuro ainda menos.... Somos mais mar do que terra, somos gente dispersa universalmente, somos língua e cultura em expansão, somos povo que partilha com outros o espaço imenso da lusofonia. uma herança comum para a eternidade. Temos de saber gerir o legado antigo em novas formas de relacionamento, novas viagens, novos encontros. Entre Portugueses e entre lusófonos. Connosco e com eles. Temos de saber.incorpor nos grandes projetos nacionais uma dimensão, por demais esquecida pelo Estado e pela sociedade que ficou no território: a dimensão que lhe conferem os que se encontram fora, mas mantêm laços da mais diversa ordem com a Mátria, as comunidades portuguesas em que se recriam formas culturais e padrões de comportamento, que são, desde há séculos, património vivo Na base desse esquecimento, que vem das origens de imparáveis correntes migratórias, estará a forma como, de dentro de um projeto estatal de expansão, aquele movimento se autonomizou e seguiu trajetória própria, que a Coroa, em vão, quis condicionar e limitar nos fluxos considerados excessivos, ou até na direção que tomava, de oriente, a ocidente, de sul a norte, nas sete partidas do mundo, primeiro integrado, depois cada vez mais fora do enquadramento colonial. Olhando retrospetivamente esta pulsão permanente entre os poderes públicos e o seu plano imperial, e os cadadãos anónimos, e a sua ambição individual, o seu modo fácil de se relacionar com os outros, (partindo em massa, contra ditâmes e proibições), temos de concluir que efémero foi o império que se fez e desfez, enquanto as comunidades nascidas da expatriação antiga e de continuadas migrações resistiarm, multiplicaram-se, existem - a Diáspora. Pura sociedade civil, que o Estado sempre ignorou e, que, por isso, ao Estado nada deve! Desde o século XVI, um terço da popução portuguesa escolheu viver fora da sua terra. Um êxodo multissecular, desmesurado que parecia acentuar a desmesura da Expansão, nas suas rotas de comércio, ou de colonização de colossais parcelas do planeta, a que nunca faltaram voluntários... O futuro deu, fundamentalmente, razão aos homens comuns, aos emigrantes - muitos homens e algumas mulheres que, contrariando leis e práticas, em número crescente, os acompanharam, sobretudo para o Reino do Brasil, após a independência, incessantemente - para o Império, como, depois, para a República, alheios a mudanças de regime. . Somos tanto mais europeus quanto mais formos portugueses...