domingo, 17 de julho de 2022

Maria da Conceição Vassalo e Silva da Cunha Lamas é uma mulher verdadeiramente intemporal, que tem um lugar ímpar na história portuguesa do jornalismo e das Letras, do movimento feminista em meados de novecentos, da luta contra a violência de uma longa ditadura. Protagonista maior, em todos estes domínios, senhora de um destino extraordinário, num dado tempo, particularmente ingrato, que, sobretudo por ser mulher, a obrigou a vencer mil obstáculos, preconceitos misóginos e perseguições da polícia política, muitas vezes a levando a interrogatórios e prisões e, por fim, a um doloroso exílio. Figura intemporal, antes de mais, como paradigma de cidadania vivida audaciosa e apaixonadamente, com uma visão clara do devir português, uma crença na força criativa e subversiva das mulheres para mudar o velha Ordem, e o velho mundo anacrónico do chamado “Estado Novo”, sempre numa atitude coerente de generosidade. Nascida ainda no século XIX, foi aluna do “Colégio das Teresianas Jesus, Maria e José”, estudando num ambiente religioso mas acolhedor, onde se sentia bem tratada, e onde cedo terá despontado o sentido de missão, que, mais tarde, alargando horizontes com projetos de carreira profissional e de intervenção cívica, se consumou no humanismo laico e fraternalista com que fez percurso, em gestos quotidianos de solidariedade, num combate sem fim pela justiça, pela igualdade e pela paz. Casou aos 18 anos, com um republicano, Oficial de Cavalaria, e com ele viveu três anos em Angola. No regresso a Torres Novas, tão jovem ainda, já vislumbramos em iniciativas diversas, a militante de ideias e causas que não tardaria a revelar-se plenamente: é voluntária da Cruz Vermelha, organiza saraus de beneficência para ajudar famílias dos soldados, publica na imprensa local artigos sobre a guerra (a 1ª Grande Guerra). Aos 26 anos, depois do divórcio – que, à época, era ainda de considerar um ato de rebeldia, de afrontamento dos "bons costumes", que postulavam a submissão feminina – fixa-se em Lisboa e torna-se pioneira no jornalismo, que era ofício de homens. Trabalha, primeiro, no diário “A Capital”, depois no grupo editorial de “O Século”, dirigindo, durante muitos anos, a revista feminina “Modas e Bordados” – o mais improvável dos instrumentos instrumento para empreender o que ousou: promover uma revolução de mentalidades, mobilizar as jovens da sua geração para à vivência cidadã e profissional. para tal, usa o seu habilmente o “correio de leitoras”, constrói o seu "poder de aconselhamento que, para ela, é também, uma tomada de consciência dos problemas e dilemas das mulheres de todas as idades. A sua obra mais emblemática, que podemos classificar como “monumental” , " As Mulheres do meu País”, terá tido aí a sua pré-história. É nesta sua forma de dar concretização pragmática e eficiente aos valores e ideais que a norteiam, numa rara capacidade de realizar coisas grandes com meios parcos e banais, com persistência e incomparável brilho, que Maria Lamas me parece singularmente inspiradora, hoje e sempre. O “correio” da popular revista feminina teve um enorme sucesso e impacto, o mesmo se podendo dizer de grandiosas exposições que, sob o patrocínio de “O Século”, organizou, para dar do papel mulher sua contemporânea, em diversas sociedades, domínios e condicionalismos, uma visão empolgante e mobilizadora, confirmada por factos e por feitos, com que desmentia, categoricamente, a ideologia misógina e opressiva do salazarismo - a última das quais, patenteando obras de mulheres escritoras de todo o mundo, lhe custou o emprego, uma sólida carreira e até a segurança pessoal. A partir de então, seria alvo de repetidos atos persecutórios do regime, que queria bani-la, implacavelmente, do espaço público.. Em tempo de repressão e declínio do primeiro movimento feminista português, foi ela a última presidente do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas, expressão máxima desse associativismo revolucionário, que começara com Adelaide Cabete, nos primórdios da República. Um Decreto do Governador Civil de Lisboa extinguiu o CNMP, mas não conseguiria silencia-la, ou erradicar os ideais de igualdade, que, a par de algumas, poucas companheiras, encarnou, durante o interregno que vai até à formação da segunda vaga do movimento feminista, na década portuguesa de setenta . Maria Lamas estava, então, divorciada do segundo marido, o jornalista monárquico Alfredo da Cunha Lamas, tinha as filhas a cargo, dependia de si e do seu trabalho... Não se deixou abater, pelo contrário, recomeçou, com redobrado ânimo, um solitário e fecundo exercício de jornalismo de investigação, abraçando desafios cada vez maiores. Munida de uma máquina fotográfica, papel e caneta foi, pelo país adentro, em toda a espécie de deficientes transportes, recolher depoimentos e testemunhos de mulheres de todos os misteres e condições, até às aldeias mais remotas e inacessíveis. Deu-lhes, livremente, voz e visibilidade num retrato coletivo, de alta precisão, de incomensurável valor humano, literário e científico. Uma obra prima do jornalismo português, que é também, um grito de revolta contra a exploração económica, a pobreza, quando não miséria, o confinamento de horizontes, num todo em que a metade feminina era duplamente vítima de subjugação. Maria Lamas viveu, assim, corajosamente, nas décadas seguintes, sem ceder, sem abrandar ... tão eficaz a usar a escrita, como a recorrer à ação concreta. E não menos admirável foi na sua veste privada. Sozinha educou as duas filhas, influenciou e cativou as netas, os netos, através de cujos testemunhos sobre a “Avó Maria”, ficamos a conhecer melhor o seu encanto como pessoa, a sua irradiante beleza de rosto e de espírito, o seu temperamento afável e bondoso, a sua constante dedicação, num círculo alargado dos que tratava como família. Durante os anos de exílio, em Paris, tornou-se a Avó Maria de um sem número de expatriados, que nela encontravam, invariavelmente, amizade e apoio. A terra voltou para gozar os seus últimos anos na democracia que ajudara a refundar. Lúcida e combativa, aberta à modernidade! Ao Estado coube atribuir-lhe, como não podia deixar de ser, a Ordem da Liberdade. Aos Portugueses, em cada nova geração, cabe guardar na memória do exemplo de vida que legou às Mulheres e aos Homens do seu País
O LUGAR DAS MULHERES NAS ARTES A propósito do retorno de Balbina ao FACE 1 - Em 2010, quando Balbina Mendes veio a Espinho, pela primeira vez, o FACE, inaugurado a 16 de junho de 2009, dava os primeiros passos na que poderemos considerar o seu percurso de afirmação. De facto, os museus, as galerias de arte ganham nome e prestígio com a vivência do lugar, com a marca das pessoas que, sucessivamente, convidam para o habitar, cruzando o seu "curriculum” com o deles, numa apropriação desejada e consentida. Balbina entrou na história das Galerias do FACE como a primeira Mulher a ocupá-las numa exposição individual, e a primeira a surpreender e a mobilizar largas audiências com as suas espantosas 'Máscaras Rituais do Douro e Trás os Montes" - uma pintura de matriz etnológica, que recuperava arquétipos primordiais emergindo, interpretados e recriados em toda a sua magia, nas telas de grande dimensão e impacto. Nesse julho de 2010, ela foi também precursora numa outra vertente, ao promover no ato de inauguração um memorável espetáculo de danças dos caretos de Podence, que trouxeram o exotismo da "festa dos rapazes" às ruas de Espinho e, depois, aos corredores e salões do Museu. No ano seguinte, com a Bienal, "Mulheres d' Artes", em que Balbina Mendes esteve presente, o Museu de Espinho antecipou, em cerca de uma década, a marcante exposição de pintura no feminino providenciada pela Fundação Calouste Gulbenkian. Em ambas as iniciativas, a de Espinho e a de Lisboa, adivinhamos o mesmo escopo - não, como é evidente, o de "excluir, segundo o sexo", mas o de valorizar a metade ancestralmente invisível, no sentido do alargamento e universalização das Artes. Já quanto à complexa questão do modo como o "género" se exprime, (com caraterísticas próprias ou comuns e indistintas), a organização da 1ª Bienal guardou-se de tomar partido, reconhecendo, sim, por um ado, que o masculino avulta, desde tempos imemoriais e ainda hoje como "padrão", enquanto o feminino é "alteridade", e, por outro, a ideia de que o sucesso das "mulheres-exceção" não deve deixar no esquecimento a persistente desigualdade da maioria, que as estatísticas, na fria linguagem dos números, denunciam. No catálogo da 1ª Bienal, o Dr. Armando Bouçon, Diretor do Museu, a quem se ficou a dever a proposta de a realizar, escrevia: "Uma análise correta de toda a história da Arte dá-nos uma perceção muito transparente de como o campo das artes plásticas foi ocupado durante muitos séculos pelo género masculino". Foi. E não continuará a ser? 2 - Até um Museu que fez história, em Portugal, com quatro históricas bienais de Arte no feminino (entre 2011-2017) pode servir-nos para mostrar como, ao nível de mega exposições individuais, se mantém, nas suas Galerias, o predomínio masculino, enquanto nas coletivas, ou nas exibidas, mais modestamente, em pequenos recantos do Fórum, as mulheres já ultrapassam os homens, numa trajetória positiva, mas como se estivessem, ainda, em transição gradual do espaço privado para o público… É um exemplo que poderemos extrapolar, em outras áreas, a nível nacional e até internacional. Na verdade, essa constatação terá estado na origem do movimento pela Arte no feminino, que teve, e tem, em Paula Rego uma das suas líderes mais insignes e mais ativas. Nas suas próprias palavras: "As minhas pinturas são pinturas feitas por uma artista mulher. As histórias que eu conto são histórias que as mulheres contam. O que é isso de uma arte sem género? Uma arte neutra?". [...] "Há histórias à espera de serem contadas, e que nunca o foram antes. Têm a ver com aquilo em que jamais se tocou-as experiências de mulheres". Um discurso com que a nova vaga feminista do último quartel do século XX incorporou o plano da expressão artística na globalidade da sua luta - discurso que, diga-se, neste como em qualquer outro campo, é tudo menos pacífico. Mais consensual será, certamente, a exortação de Gisele Breitling em favor de "uma nova e verdadeira universalidade em que o feminino assuma o seu lugar de direito e o masculino as suas verdadeiras proporções". 3 - Balbina Mendes tem contribuído, poderosamente, para que as mulheres portuguesas assumam, na vida cultural e artística do nosso país, o seu "lugar de direito". Fá- lo, ocupando, simplesmente, o lugar, com ânimo e talento de sobra, sem em nada se julgar discriminada. É um caso exemplar, entre grandes artistas, cuja atitude de despreocupação com disparidades de género, contém implícita a exigência do tratamento igualitário. À margem de uma teorização reivindicativa, alcança as metas que esta se propõe, com isso abrindo caminho a outras mulheres, destruindo preconceitos de género, pela força do seu traço, pela singularidade de temáticas e de técnicas.... Embora, como velha militante da igualdade, desde os bancos da escola, não me situe exatamente nesta linha, tenho de reconhecer a sua eficácia, assim como, também, de admitir os riscos da defesa "à outrance" da "arte com género" em que Paula Rego acredita...O que, sendo, no seu patamar de genialidade, sinal vanguardista de "contracultura", pode, a outros níveis, redundar em novos estereótipos do feminino, que, em sociedades patriarcais, são, fatalmente, menos valia. Por essa razão, num outro domínio, o literário, reservamos o feminino” poetisa” para o comum das mulheres, mas chamamos "poetas" a uma Sophia, ou a uma Ana Luísa Amaral...Por essa mesma razão, o crítico João Gaspar Simões, elogiando a força imanente da prosa de Maria Archer, o realismo puro e duro com que abordava as problemáticas mais ousadas, a qualificava como "um grande escritor". Ambíguo cumprimento, a que subjaz a conceção da masculinidade intrínseca do cânone! Balbina não o apreciaria, mas é uma das mulheres a quem se poderia, nessa lógica, aplicar. A sua obra é original, audaciosa, inovadora, (nos temas, na estética, policromia, fusão de materiais...). Transpõe para a pintura a experiência dos muitos mundos que a sua vivência atravessa e o seu olhar penetra, numa vontade constante de transcendência. Conheci-a na exposição em que nos contava a história do Douro, o “seu” rio, correndo entre margens, da nascente até à foz, incorporado na beleza encantatória de paisagens. Reencontrei-a no ciclo temático sobre as máscaras rituais, incursão telúrica à infância em terras de Miranda, em que se entrelaçam emoções e saberes, reinventados na tela, em explosões de cor... Numa "leitura feminista” noto a naturalidade com que se apoderou, para a transfigurar em arte, da tradição masculina da máscara, símbolo da superioridade e camaradagem de sexo, em cerimoniais rigorosamente proibidos à mulher... Um prenúncio da força subversiva e libertária da sua aventura artística. Com o passo seguinte, ultrapassa uma última fronteira, numa fase em que a fragmentação ou transparência da máscara deixa o rosto a descoberto... o rosto feminino! É a definitiva rutura do interdito, que Paula Rego saudaria com o seu "gozo pela inversão e desalojar da ordem estabelecida"... Na mostra agora aberta ao público nas Galeria Amadeo Souza-.Cardoso, intitulada "Segunda pele", o tropo narrativo de Balbina não nos revela, antes adensa o mistério dos jogos entre a face desocultada e as suas máscaras, mas revela-a como assombrosa retratista de rostos belíssimos e confirma o seu incessante questionamento sobre o ser, a aparência, o tangível e o intangível. Para o que vai encontrar inspiração na heteronímia Pessoana, glosando em linguagem pictórica um mote literário. O resultado é, pura e simplesmente, fantástico! A não perder, até 28 de maio, em mais este capítulo do roteiro do FACE e da vida cultural que Espinho nos oferece.

terça-feira, 12 de julho de 2022

Maria Manuela Aguiar segunda, 27/06, 02:42 para mim O MEU VERÃO EM ESPINHO 1 - Tenho saudades do verão em Espinho, nos anos da minha infância. Esse verão, essa cidade (que ainda não o era), tinha a sua mítica Avenida bordejada de palmeiras gigantes, sempre cheia de multidões elegantes, nos seus trajes de passeio, sentadas em mesas coloridas nas esplanada dos cafés, ou desfilando num vaivém infindável, vagaroso, quase solene. Tinha quiosques graciosos - daqueles que Maluda gostava de pintar - , e onde eu, desde que aprendi as primeiras letras, comprava, às terças e sextas, "O Mosquito", e mais a sul, diariamente, chocolates. Chocolates sorteados...Éramos convidadas a perfurar a superfície de papelão de bonitas caixas retangulares, libertando bolinhas de cores, que tombavam, em baixo, num mostrador de vidro. A cada cor correspondia um diferente tamanho do produto. Uma espécie de máquinas de jogo para crianças - o nosso casino... Minha irmã acertava, muitas vezes, no prémio maior, que correspondia à pequena esfera dourada. Eu jamais! Ao Casino, é claro, só íamos ver cinema, alternando com as sessões do Teatro São Pedro. Ambas as salas de espetáculos eram grandes e esplêndidas, e ofereciam um filme por dia - o que elevava dava ao cartaz mensal uns fabulosos 60 títulos! A programação era divulgada quinzenalmente, em mini- livrinhos colecionáveis, que se desfolhavam como livros de contos - com sínteses de guiões muito chamativas. Ainda tenho alguns, guardados como relíquias. Felizmente, os pais e os avós eram grandes cinéfilos, pelo que, em Espinho, raro era o dia em que, ou uns ou outros, não nos levavam ao seu e nosso “show” favorito. Semanalmente, pelo menos uma vez (talvez à 4ª ou 5ª-feira, já não tenho a certeza), o Casino oferecia um bónus extraordinário, num dos dois intervalos mediante um ligeiro aumento do preço do bilhete: a exibição de um cantor ou cantora dos mais famosos do País - dos que, habitualmente, davam concertos nos seus salões. Recordo-me bem, por exemplo, de Tony de Matos ou das rivais Simone de Oliveira, ainda muito jovens e com vozes fantásticas... Os intervalos eram obrigatórios, para ir ao barzinho tomar uma bebida, comer um bolo, porque os baldes de pipocas ainda não tinham sido inventados. No casino - que era um belo edifício, então moderno - até se podia vir às varandas ver o mar ou o movimento da Avenida.. 2 - No que respeita à cronologia da minha agenda de férias espinhenses, devo dizer que comecei pelo meio, ou mesmo pelo fim, porque tanto os passeios na avenida, como as sessões da Sétima Arte ou eram noturnas, ou, quando muito, ocupam as tardes. Uma excelente alternativa era jogar dominó ou damas nos cafés – o Café Palácio, ou o Costa Verde, os nossos favoritos. O Chinês já não existia – era ainda do tempo de juventude da geração anterior, já não da nossa. Mas a tradição das tertúlias e do jogo no café, estavam bem vivas. Pedíamos uma limonada e uns pasteis, mais um tabuleiro de damas…(nada de Coca-cola, note-se, que fora banida pelo “Estado Novo” salazarista) De manhã, com bom ou mau tempo, o destino era a Praia Azul, com as suas riscas azuis e brancas, à FCP. Ainda hoje mantenho o gosto de nadar com sol ou chuva - tanto me faz. Água por baixo, e água caindo do céu ligam bem – cedo aprendi isso com meu pai. Não que chuva fosse coisa frequente, em agosto ou setembro. A ventania, sim, todavia, as mais das vezes, só levantava a partir da tarde (do princípio da tarde). E o “nosso mar” nem sempre se mostrava hospitaleiro, mas quando se encrespava em vagas altas, e a corrente arrastava, à hora do banho havia, logo ali ao lado, sucedâneo de uma piscina, que era a quinta essência da modernidade. Para os frequentadores habituais, os preços atrativos (lembro-me de comprar as senhas de entrada em pacotes), e, em qualquer caso, nunca lhe faltava uma abundante e elegante clientela. E não tinha, ainda, a concorrência da verdadeira “piscina natural”, que é a praia da baía, mais recentemente formada por novo paredão, um mais eficiente quebra-mar… No plano atmosférico, Espinho continua obviamente na mesma – com um clima que é, para mim, uma das suas simpáticas invariáveis, porque detesto o excessivo calor estival do nosso interior - e, neste aspeto, o interior começa a poucos quilómetros da costa. E à vista, à superfície, havia o comboio, que chagava a apitar e atravessava o centro da vila com as suas máquinas negras, lançando nuvens de fumo para o ar. Comboios de passageiros, que paravam, todos, na estação, e logo seguiam viagem, e comboios de mercadorias, que, não poucas vezes, sabe-se lá porquê, na Rua 7, suspendiam a marcha e bloqueavam a passagem para a praia por tempo indeterminado. (o que nos levava, com alguma ousadia, a atravessar as carruagens, pelas extremidades). Ponte sobre a linha férrea só havia na Rua 19 – e bem pitoresca! Sempre gostei de comboios, como quase todas as crianças e muitos adultos, entre os quais me conto ainda… Sempre imaginei Espinho, com uma série se pontes, ao longo da linha, entre o Rio Largo e o bairro piscatório – pontes de desenho variável, que poderiam tornar-se um original cartaz turístico, fazendo da nossa cidade, digamos, uma “Veneza ferroviária”. Um amigo arquiteto, a quem eu, já muito depois de consumado o fatal enterramento da linha, descrevia o meu projeto imaginário, disse-me que não era tão mirabolante como eu julgava, e que teria, de facto, sido equacionado por uma minha alma gémea… 3 - Com este olhar nostálgico sobre uma outra época, que é de uma geração envelhecida, não pretendo sequer esboçar um julgamento da evolução que nos trouxe ao presente. Compreendo que Espinho mudou, em larga medida, enquanto parte de um todo, (o país, o mundo...). Esteve na vanguarda do turismo balnear, quando oferecia tudo quanto o veraneante esperava dos areais, do mar, de distrações lúdicas. O próprio conceito se transformou, deslocando geograficamente a massa de turistas, os mais e menos ricos, por igual, para os “paraísos” de sol escaldante e águas tépidas. E, assim, até os mais bairristas dos espinhenses natos, no verão, rumam aos Algarves, tal como o comum dos nortenhos. (o que eu só faria por penitência!). Contudo, Espinho continua a ser uma terra perfeita para residir e não como “cidade-dormitório, mas como verdadeira comunidade, que mantém o seu caráter identitário, com as tradições populares, o admirável tecido organizacional, e, com ele, uma vida cultural absolutamente invejável, que anima a rede de modernas infraestruturas, públicas e privadas – de que são “ex-libris”, nomeadamente, a programação musical, os festivais de cinema, o desporto, o ballet, o teatro, a universidade sénior… Nesta vertente cultural devo, porém, apontar a mais estranhas das lacunas: a falta de sessões regulares de cinema, apesar da existência de duas salas, que são das melhores do país inteiro - a do Casino e a do Multimeios. Não se lhes pede qua abram para oferecer 60 filmes por mês… só quatro, um por semana! Tenho tudo o que preciso na cidade do Cinanima e do FEST - só vou ao Porto ou a Gaia para ver cinema nos centros comerciais, onde as salas são exíguas, mas a escolha é grande...

quarta-feira, 6 de julho de 2022

MARIA ARCHER E OUTRAS MULHERES DE REFERÊNCIA E DE (IR) REVERÂNCIA - Porto jan 2021 - Programa da Conferência

Programa - Conferencistas MESA 1 | 10h30 -12h30 Moderação: Rosa Simas • MARIA LUISA MALATO (FLUP - ILC), “Catarina de Lencastre e o tema da guerra no limiar do século XIX” Maria Luísa Malato é Professora Associada, com Agregação, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Com vários estudos sobre Utopia, Teatro e Retórica, a sua investigação debruça-se essencialmente sobre a literatura dos séculos XVIII e XIX. Tem Mestrado (1988, pela Universidade de Coimbra) Doutoramento e Agregação (1999 e 2007, pela Universidade do Porto) em Literatura Comparada e Estudos Românicos. Numa perspetiva comparatística, os seus trabalhos visam comprovar a necessidade de uma prática que alargue o corpus de análise às relações que a Literatura estabelece com a Filosofia, os textos impressos com os textos manuscritos, os autores canónicos com os "menores". Membro ativo do Instituto de Literatura Comparada Margarida Losa e colaboradora do Instituto de Filosofia (UP) e Centro de Estudos de Teatro (UL), unidades financiadas pela FCT. Vice-Presidente da Associação Portuguesa de Literatura Comparada (2013- 2018). Co-editora da Revista online de Filosofia e Literatura Pontes de Vista. • CLAÚDIA PAZOS-ALONSO (Univ. Oxford - ILC), “Onde se lê ‘feminismo pioneiro’... leia-se Francisca Wood” Cláudia Pazos-Alonso é professora de Estudos Portugueses e de Gênero, na Universidade de Oxford e na Fellow of Wadham College. Os seus interesses de pesquisa variam amplamente em literatura lusófona dos séculos XIX e XX. Atualmente é co-diretora de mestrado em Estudos da Mulher em Oxford e vice-presidente da Associação Internacional de Lusitanos. As principais publicações de livros incluem “Antigone Daughters? Gênero, Genealogia e Política de Autoria na Escrita de Mulheres Portuguesas do século XX” (2011, com Hilary Owen), “Imagens do Eu na Poesia de Florbela Espanca” (1997) e volumes co-editados, como “Reading Literature in Portuguese“, “Um Companheiro para a Literatura Portuguesa” (2009) e “Mais Perto do Coração Selvagem. Ensaios sobre Clarice Lispector” (2002). Juntamente com Fábio Mário da Silva, é responsável pelas recentes edições de Florbela Espanca (Estampa) e Judith Teixeira (Dom Quixote). Cláudia Pazos-Alonso acaba de publicar em Portugal o livro Anticlericalismo e feminismo na imprensa oitocentista. Os artigos de fundo de Francisca de Assis Martins Wood (2021, Edições Afrontamento). • M. LUÍSA TABORDA (FLUP - ILC), “Ana Plácido e uma cela só para si” Maria Luísa Taborda Santiago, licenciada em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, mestre e doutoranda em Estudos Literários Culturais e Interartísticos pela Universidade do Porto. Atualmente é colaboradora de um projeto de pesquisa Luso-Brasileiro que pretende publicar as obras completas da escritora portuguesa oitocentista Ana Plácido, objeto de estudo da sua tese de doutoramento. Trabalha com literatura brasileira e portuguesa e interessa-se particularmente pela escrita de autoria feminina, questões de género e poéticas e políticas do corpo. • ANA COSTA LOPES (Univ. Católica-CEPCEP), “Elisa Curado: uma progressista em tempos de cólera” Ana Costa-Lopes, Doutorada em Língua e Cultura Portuguesa pela Universidade Católica Portuguesa com Imagens da Mulher na Imprensa Feminina de Oitocentos, Tese publicada pela Quimera, Lisboa (2005) e Mestre em Estudos Luso-Asiáticos com a Tese Confluências e divergências culturais nas tradições contísticas portuguesa e chinesa, publicada pelas Universidades de Macau (2000) e Católica de Lisboa (2000). Investigadora do CECC e CEPCEP (Universidade Católica). Colaboradora do CLEPUL, Universidade de Lisboa com uma biografia sobre Elisa Curado (1858-1933) e, também, como Conselheira Científica (Portugal) da publicação das «Senhoras do Almanaque» do Almanaque de Lembranças Luso-Brasileiro. Autora de livros e artigos e de comunicações em congressos sobre a imprensa periódica feminina e história das mulheres; literatura tradicional; associações femininas. MESA 2 | 14h30 - 16h00 Moderação: Maria de Lurdes Sampaio ~• ANA PAULA FERREIRA (Univ. Minnesota) - “Discurso imperialista e posicionamento anti-colonial: Maria Archer (1935-1963)” Ana Paula Ferreira é Professora Titular de Estudos Portugueses na Universidade de Minnesota. Fez o doutoramento na New York University, sendo colega de Margarida Losa. A sua investigação tem-se centrado na ficção portuguesa contemporânea, com ênfase no neorealismo, em mulheres escritoras e feminismos, raça e colonialismo tardio, bem como seus efeitos e restos pós-coloniais. Entre as suas publicações em livro, A urgência de contar: contos de mulheres, anos 40 (2002), trouxe `a luz muitas das escritoras esquecidas do período do Estado Novo, entre elas Maria Archer. Desde meados da década de 1990 tem publicado estudos parciais dos romances de Lídia Jorge, editando o volume, Para um leitor ignorado: Ensaios sobre o O Vale da Paixão e outras ficções de Lídia Jorge (2009). Editou ainda, com Margarida Calafate Ribeiro, Fantasmas e fantasias imperiais no imaginário português contemporâneo (2003); e com Ana Luísa Amaral e Marilena Freitas, New Portuguese Letters to the World: International Reception (2015). O seu último livro, Women Writing Portuguese Colonialism in Africa (2020), traça a história da agência que várias mulheres escritoras tiveram para a produção simbólica e não só do colonialismo português na África, desde finais do século XIX `a segunda década do século XXI. • ANA PAULA COUTINHO (FLUP - ILC), “Maria Archer: deslocação e (in) conveniência” Ana Paula Coutinho é Professora Associada com Agregação do Departamento de Estudos Portugueses e Românicos da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, onde tem lecionado sobretudo nas áreas da Literatura Comparada e dos Estudos Franceses. Doutorada em Literatura Comparada (1998) e com Agregação em Literaturas e Culturas Românicas (2010), sempre se dedicou à literatura contemporânea numa perspectiva comparatista, tendo nos últimos anos desenvolvido particular investigação no domínio das interculturalidades e das representações literárias e artísticas das migrações e do exílio. Foi Coordenadora Científica do Instituto de Literatura Comparada de Abril de 2015 até Janeiro de 2022. Coordena igualmente a base digital Ulyssei@s. Membro colaborador do CRIMIC (Université Paris IV), colabora ainda com o Programa Non-Lieux de l’Exil (Collège d’Études Mondiales – FMSH). É vice-presidente da Alliance Française do Porto. Dos livros publicados ou editados, destacam-se António Ramos Rosa. Mediação Crítica e Criação Poética (Quasi Edições, 2003. Prémio Ensaio Pen-Club); Lentes Bifocais – Representações literárias da Diáspora Portuguesa (Afrontamento, 2009), Passages et Naufrages migrants. Les fictions du détroit (com Maria de Fátima Outeirinho e José Domingues de Almeida), Paris, Harmattan, 2012; Nos & leurs Afriques. Images identitaires et regards croisés Constructions littéraires fictionnelles des identités africaines cinquante ans après les décolonisations (com Maria de Fátima Outeirinho e José Domingues de Almeida) Frankfurt, Berlin, Peter Lang, 2013. ELISABETH BATTISTA (UNAMAT) Da dominação à resistência: percurso de Maria Archer Elisabeth Battista é docente no Programa de Pós-graduação, Mestrado e Doutorado em Estudos Literários - PPGEL, da Universidade do Estado de Mato Grosso - UNEMAT. Autora dos livros: MARIA ARCHER - O legado de uma escritora viajante, Editora Colibri, Lisboa, 2015; Sem o direito fundamental de voltar para casa? Maria Archer? Uma jornalista portuguesa no exílio, Editora Espaço Acadêmico, Goiãnia, 2019. Cultura e Literatura de Mato Grosso (organizado em parceria com Elizete Dall-Comune Hunhoff), Editora Espaço Acadêmico, Goiânia, GO, 2020; A Experiência Literária: Ensino e Leituras (organizado em parceria com Dagoberto Rosa de Jesus), Editora Espaço Acadêmico, Goiânia? GO, 2020. Possui quatro livros orgs; 40 capítulos de livros, 19 artigos publicados em periódicos; Pós-Doutorado na Universidade de Lisboa (2011-2012), e Pós-doutorado sênior pela Universidade de Aveiro (2018), no Centro de Línguas e Culturas. Integrou a Equipe do Programa Novos Talentos, CAPES/UNEMAT, Subprojeto: LINGUAGEM E TECNOLOGIARESSIGNIFICANDO A RELAÇÃO UNIVERSIDADE/ESCOLA; Fundadora do Centro de Pesquisa em Literatura - CEPLIT/UNEMAT (2007-2010); Diretora da UNEMAT Editora (2011); Editora da Revista ATHENA - periódico de alunos de Pós-graduação (atual); Editora da Revista de Estudos Acadêmicos do Curso de Letras (2002); Membro do Conselho Universitário - CONSUNI/UNEMAT (2011-2013); Membro do Conselho Regional por dois mandatos (2013- 2016); Presidiu o Conselho da Faculdade de Educação e Linguagem (2015-2018); Coordenadora da Pesquisa em Grupo: No Centro Oeste da margem: Cem Anos de relações entre Cultura e Literatura em Mato Grosso. (2013-2016); Editora do periódico Revista Ciência e Estudos Acadêmicos de Medicina da UNEMAT (2013-2018); Coordenou o Projeto de Extensão Revista Ciência e Estudos Acadêmicos de Medicina da UNEMAT; Formação: Licenciatura Plena em Letras - Português/Inglês (UNEMAT), Mestrado (FFLCH-USP - 2002) e Doutorado (FFLCH-USP - 2007), com a Tese: Entre Literatura e Imprensa: Percursos de Maria Archer no Brasil; Pós-Doutorado na Universidade de Lisboa (2011-2012), com Organização do Acervo Literário de Maria Archer, no Centro de Estudos Comparatistas, da Faculdade de Letras, da Universidade de Lisboa. Pós-doutorado Sênior pela Universidade de Aveiro, sob a supervisão de Maria Fernanda Brasete, Portugal (2018) MESA 3 | 16h30 - 18h00 Moderação: Cláudia Pazos-Alonso • ISABEL PIRES DE LIMA (FLUP - ILC), “Mulheres na Revolução: das Três Marias a Agustina” Professora Emérita da Universidade do Porto. Doutora Honoris Causa pela Universidade de Sófia. Investigadora do Instituto de Literatutra Comparada Margarida Losa (I&D da FCT). Estudos em Literatura Portuguesa e Comparada e em Interartes. Autora de As Máscaras do Desengano - para uma leitura sociológica de ‘Os Maias’ de Eça de Queirós (1987), Trajectos -o Porto na memória naturalista (1989), Retratos de Eça de Queirós (2000), Visualidades – A Paleta de Eça de Queirós (2008) e editora de Eça e "Os Maias" cem anos depois (1990), Antero de Quental e o Destino de uma Geração (1993), Eça de Queirós / Paula Rego, O Crime do Padre Amaro (2001), Vozes e Olhares no Feminino (2001), C. Castelo Branco / Paula Rego, Maria Moisés (2005); co-editora de obras sobre Agustina Bessa-Luís, José Gomes Ferreira, Óscar Lopes,Vergílio Ferreira. Centenas de artigos em revistas como Camões, Colóquio/Letras, Dedalus, Metamorfoses, Portuguese Cultural Studies, Revista da Faculdade de Letras da UP, Semear, Trans-Humanities, Via Atlântica. Deputada à Assembleia da República (1999-2005/2008-9). Ministra da Cultura (2005-8). VicePresidente da Fundação de Serralves (desde 2016). • MÁRCIA OLIVEIRA (Univ. Minho/CEHUM), “Womanart: Mulheres, Artes, Ditadura” Márcia Oliveira é bolseira de pós-doutoramento FCT em Estudos Artísticos/História da Arte no CEHUM (SFRH/BPD/110741/2015) e pertence ao grupo de investigação em Género Artes e Estudos Pós-Coloniais. Licenciada em Jornalismo pela Universidade de Coimbra e mestre em Estética pela FCSH- Universidade Nova de Lisboa concluiu o doutoramento pela Universidade do Minho em 2013 com tese sobre arte e feminismo em Portugal no contexto pós-revolução. Foi visiting scholar no Centre for Women in the Arts, Rutgers University, NJ, USA, de Agosto a Novembro de 2016. É Investigadora Co-Responsável do Projeto WOMANART: Women, arts and dictatorship: Portugal, Brasil and Portuguese speaking African countries, financiado pela FCT PTDC/ARTOUT/28051/2017) tendo como investigadora responsável Ana Gabriela Macedo. • DEOLINDA ADÃO (Univ. Berkeley), “A audácia de escrever: uma abordagem da produção literária feminina” Deolinda Adão é Professora e Directora Executiva do Programa de Estudos Portugueses na Universidade da Califórnia, em Berkeley. É licenciada em Literatura e Línguas Hispânicas na Universidade da Califórnia em Berkeley em 2002 e doutorada em Literaturas e Culturas Luso-AfroBrasileiras pela mesma universidade em 2007, com especialização em mulheres, género e sexualidade. O tema da sua dissertação foi “A study of the construction of feminine identity in Portuguese literature”. Publica regularmente livros e artigos sobre o género feminino, com destaque para migrações femininas incluindo “As Herdeiras do Segredo: As Personagens Femininas na Ficção de Inês Pedrosa”. Em 2018, foi eleita Presidente da Luso-American Education Foundation, da qual já era membro desde 1996. Esta fundação dedica-se à promoção da Língua e Cultura Portuguesas no Estado da Califórnia. É membro do Conselho da Diáspora Portuguesa desde 2013