sexta-feira, 29 de junho de 2012

Pré memórias



TÓPICOS

1 - 1965 - Coimbra: baile de gala de capa e batina, com as fitas, como exigiam os praxistas (a única mulher - porque todas as outras optaram pelos vestidos cerimoniais e estavam lindas, mas sem as fitas a que sempre tinham tido direito, antes do "diktat" dos praxistas...)

2 -  1988? " Dragona", segundo Pinto da Costa. Numa gala anual do FCP. No dia seguinte era o que os colegas me chamavam nos corredores da AR. Estranhei, mas logo percebi que os jornais tinham dado a notícia

3 - 2010 - Prefácio dos "apitos finais, dourados e outros mais" do Dr. Sardoeira Pinto. Uma honra e um prazer, evidentemente. Li o livro por email (o meu 1º e-book) e tive de escrever o texto de um dia para o outro, com percalços à mistura, porque o computador ficou subitamente sem rede (avaria!)... Apresentação com uma ilustre audiência no salão dos Fenianos.

4 - 2008 - Aderi à Net em Agosto - e aprendi a escrever, digitalizando fotos de família, (milhares) e etiquetando-as. Assim nasceu o blogue "Círculo Aguiar. Para contar a história da Avó Maria, na data do seu 120º aniversário. E, depois, de outros Aguiares e não só...

5 - 2000 -  USA: reencontro com o americano que tinha preparado a visita de Mota Pinto, a convite de Secretary of Defense, Shultz, em 84, salvo erro. 
Visita da comissão de defesa da AUEO, num longo circuito pelos EUA, coast to coast, em avião militar. 
Só quase na última  hora, ao almoço num restaurante japonês. ficámos lado a lado. começo por me dizer que tinha grandes amigos em Portugal, de nome Mota Pinto, Surpreendida, perguntei se era o prof Mota Pinto e a Drº Mª Fernanda. Afirmativo!...
Era o teste para ver se eu era quem ele pensava que eu era - reconhecera-me e eu, má fisionomista uma década ou mais, após o nosso diálogo, na comitiva do Doutor Mota Pinto, não imaginei que ele era ele - o excelente organizador da viagem de Estado do Mª da Defesa de Portugal. que teve uma breve pausa em SF para ele se encontrar com os emig port em San Jose.
O americano contou-me, então, que Mota Pinto lhe tinha dito no voo para S Francisco:"Vai conhecer uma jovem política com grande futuro". Bom, teria sido mais futuro com ele. Sem ele, na república dos seus sucessores foi o que se viu....
De qlq modo, que esse inesperado relato do americano veio desfazer uma ideia feita que eu tinha no meu relacionamento com o Político que me levou para a política. Era um grande e lealíssimo amigo, mas como, com ele, eu enveredava sempre pelo tom jocoso e excessivo, achava que ele náo podia levar-me completamente a sério (um risco que se corre no país, quando de usa o humor...mas não com MP, pelo visto). claro que me levava suficientemente "a sério", ou não me teria feito SET do seu Governo).
(lembrei o almoço com a Mª Luísa:"fomos todos colegas no mesmo governo", não a Mª L , essa era colega de curso ...)

6 - 1986 - Demissionária no governo Cavaco por corte do Orçamento.
Braço de ferro com o chamado "petroleiro", Pires de Miranda, que teve de restituir 300.000 contos do orç do seu gabinete à paupérrima SEC, depois de os ter cortado sem sequer prevenir - quase um terço do total. Mesmo assim foi um retrocesso... Recusei candidatura pela emig e saí do MNE, de vez, qd o governo foi derrubado pela moção de censura do PRD em 1987.

7 - 1987 - Candidata pelo Porto, a convite da Distrital, e, depois, feita Vice Presidente da AR "par le fait du prince", embora teoricamente eleita (a eleição tem de ser ganha por voto secreto, é certo, depois da indicação do nome pelo partido - e há os que têm dificuldade em conseguir, ou não conseguem mesmo, os votos necessários... mas não foi o caso da 1ª mulher proposta para o cargo,seria machismo a mais...). Suponho que a escolha se ficou a dever ao Prof Cavaco, lui-même.

8 - 1981 - 1ª estada na AR qd saí do governo Balsemão em Agosto de 1981. Primeiros debates no hemiciclo com o PCP Custódio Gingão. A partir do momento em que lhe agradeci o tirocínio que me estava a proporcionar, esmoreceu.
Acabamos num relacionamento cordial. Não com o PCP, mas com muitos membros do partido, ele incluído. Tinha sido emigrante, conhecia os problemas e era bem simpático!

9 -  1985 (e anos seguintes) 
Momentos felizes a ouvir os cantores de Coimbra - o grupo de António Bernardino - por esse mundo fora.
Cabo Verde, Brasil, Uruguai, Argentina, EUA, França... Iam a nosso convite, como voluntários da cultura, sem cobrar "cachet". Como o orçamento era de miséria, nós agradecíamos. E eram fabulosos! Que voz, a de "Berna" - incomparável!

10 - qd, uma vez, o António Portugal foi ao meu gabinete perguntar porque convidava sempre os mesmos, expliquei que eles iam por amor à arte e ao convívio com as comunidades, sem qualquer cachet. Não tiveram nunca concorrência.

11 - Outros que, anteriormente, em 1980, foram ao Brasil, RAS, etc, também sem cachet, a pedido deles, eram os amigos do Dr Vieira Araújo, essa personalidade encantadora, um Coimbrão genial, humorista, poeta, músico, médico, um conversador brilhante (colega do meu pai desde os bancos do colégio dos Carvalhos). São dele alguns dos melhores dos fados eternos de Coimbra - letra e música...

12 - 2004 - O princípio do fim da política, para mim, começou em Paris 2004, estava eu numa reunião semestral da UEO, com toda a Delegação portuguesa. Apanhados de surpresa, recebíamos novas por telemóvel. Muito nos divertimos  -  era a única coisa a fazer, vivendo os últimos tempos do mandato! O resto não dependia de nós. De nós dependia manter a boa disposição através da crise... 
Decidi que terminava ali mesmo, dando lugar aos mais novos... Não que me sentisse velha ou que os achasse necessariamente melhores do que nós, os demais "sortants" e eu. (E havia a questão dos funcionários de Macau em impasse, com o veto do Mº das Finanças à solução que era uma promessa do PSD qd  oposição).

13 - Que jantar! Num restaurante parisiense muito exclusivo, com toda a delegação a analisar a situação política, numa mesma mesa redonda, na qual se sentou um inglês que estava eufórico e bebia imenso - ou vice-versa. Fazia comentários pró-salazaristas, que ninguém partilhava, evidentemente. Não entendia nada, mas achava-nos animados...
E Anacoreta Correia a dar entrevistas pelo telemóvel - os outros CDS's, no país, estavam todos em black out

14 - 1965  -  Recusei que o Padre (Zacarias de Oliveira, amigo do noivo) dissesse a epístola de S Paulo no meu casamento. Ele resistiu, houve discussão forte. Por fim acedeu, ou o casamento seria celebrado sem missa...
Pelo mesmo motivo, já tinha primeiro convidado e depois desconvidado o Padre Sebastião, prof de Direito Romano em Coimbra... (escreveu-me um telegrama de 2 páginas, terminado por um dubitativo "Oxalá sejam felizes"). Tudo isto porque o Padre Leão, que me compreendia, estava nessa data em férias no estrangeiro. Quando lhe contei pormenores destas peripécias, riu-se imenso! E comentou que a 14 de Agosto, véspera da assumpção de Nossa Senhora, se devia mesmo ler a epístola do dia. Bem escolhido, o 14 de Agosto. Estava escrito nas estrelas...

15 - Escritura antenupcial - separação absoluta de bens e a condição de passar ao regime do novo código mais favorável à igualdade.
O notário só cedeu qd apresentei pareceres dos meus prof. de Coimbra...(que se divertiram a dá-los, pois conheciam o meu "radicalismo" feminista - do ponto de vista deles, claro. O senhor julgou que eu era milionária, a defender o património vasto - quie saber se eu era dos Aguiares (ricos) de Matosinhos.
Bens dos nubentes, perguntou: E nós, em coro: nenhuns! A sua cara de espanto...

16 - 1966 - Escrevi os dizeres da autorização marital para sair do País (tirar o passaporte), assinei-a, em nome dele e, depois, mandei o reconhecer a assinatura ao notário... O Manel achava a coisa uma inutilidade, mas lá foi... A minha maneira de lutar contra uma verdadeira aberração - humilhante para qualquer ser humano, adulto e em seu perfeito juízo.

17 - Ganhei também a guerra de registar o carro comprado por mim, com o meu dinheiro, sem autorização do marido. O Notário onde fazia o estágio (que simpatia!), escreveu sobre o assunto um cartão ao conservador do registo (um colega a quem chamavam o João das Espanholas), dizendo: "Ela tem razão" .
O dono do stand ficou admirado, quando consegui o registo. Era a 1ª mulher casada a comprar carro sem intervenção marital, tanto quanto ele sabia. Mas até a lei era bem clara a permiti-lo. A prática é que era ilegal... O carro era comprado com dinheiro ganho em trabalho profissional...

18 - 2004 - Grande momento quando me coube, como VP da Comissão da Igualdade, em substituição da presidente, uma luxemburguesa,(L Eerr) impugnar, em plenário, as credenciais da Irlanda, porque não cumpria o Regimento que interditava delegações "uni sexo". Ora a Irlanda, República que foi presidida por Mary Robinson, não tinha na Delegação uma só Mulher.
Portugal cumpria uma quota de 1/3, muito graças aos esforços que eu própria desenvolvi dentro do meu grupo parlamentar - Mª Elisa, Eduarda Azevedo e eu, só à conta do PSD. Acho que o PCP indicou a Luísa Mesquita. Do PS only men, se bem me lembro...

19 - 1984 - Entrevistei o Capitão Sarmento Pimentel em São Paulo (na altura já promovido, mas sempre capitão, como acho que gostava de ser tratado). Entrei com o Prof Soares Amora e uma equipa da TV Cultura, que começou logo a filmar. Depois, como a conversa corria animadamente, ninguém quis interromper o seu curso. Acenavam-me detrás das câmaras para eu continuar a fazer perguntas. E, assim, um simples e cordial diálogo substituiu  o que estava planeado. Sarmento Pimentel tinha em mim muito mais uma ouvinte encantada do que qualquer outra coisa - e ele sentia-se feliz. a falar das suas aventuras, servido por uma excelente memória e um humor natural... não deu trabalho nenhum a uma neófita. 
 O episódio vem contado num jornal, mas situando a entrevista num espaço público. Não foi - foi mesmo em casa do Herói português, que ele era... Mítica figura, que falava de Mário Soares e de Mota Pinto, como se eles fossem muito novos, uns rapazes... É tudo relativo.

20 - Amizades, para mim, foram sempre indiferentes a cores políticas. Só nas delegações internacionais, Miguel Urbano Rodrigues (PCP), Anacoreta Correia (CDS), Luísa Mesquita (PCP), Pedro Roseta (PSD), Raul Brito e Carlos Luíz (PS) - e outros, num relacionamento mais formal,  como Vera Jardim, Medeiros Ferreira, Alberto Martins...

21 - 1988 - A primeira mulher a chefiar delegações parlamentares, começando pelo Japão (com os partidos todos a indicarem líderes parlamentares - Correia Afonso, Narana Coissoró, Octávio Machado, ou VP Jorge Lacão, Rui Silva).
 Mais difícil liderar mulheres - sempre a quererem falar, mesmo a despropósito ( na delegação que visitou o Iraque, por exemplo ). Homens mais disciplinados?... Aceitando melhor a liderança feminina? Sei lá... Mas registei a diversidade.

22 - 1984 - Numa visita a Atenas a convite do meu homólogo, deambulei, num fim de tarde, pela cidade, com escolta (dois homens e uma mulher, elegantemente vestidos, muito agradáveis de todos os pontos de vista). A certa altura, despistei-os, involuntariamente, com o meu passo rápido, nas ruas estreitas da Plaka. Tive de ir procurá-los... Eram tão simpáticos - seria mau chegar sem eles ao hotel.
Nunca gostei de seguranças - qd me deixavam a opção prescindia. A segurança causa-me insegurança...  (Já andar  com batedores, a alta velocidade é uma boa experiência...).
Os seguranças mais conviviais foram os da RAS.
Em 1980, a Milú e eu viajámos sempre enquadradas por uma dupla muito simpática: um tenente e uma sargento, de origem portuguesa. Acompanharam-nos até à fronteira da Suazilândia e lá nos esperaram para regressarmos. Boa companhia, sabiam conversar, sabiam estar...
Os gregos tinham também bom aspecto. mas não entravam na conversa com a naturalidade dos sul-africanos (a África, continente mais caloroso, até nestas questões). E notava-se que os gregos estavam armados, a saliência das armas não totalmente disfarçada nos fatos de bom corte... Não assim os sul-africanos, mais discretos e, certamente, não menos eficazes. Graças a Deus, nunca houve ocasião para comparar.
Essa primeira visita, num fim-de-semana, à Suazilândia - M'Babane e Manzini  - não estava no meu programa. O fim-de-semana devia ter sido passado no Kruger Park, um convite do governo aceite pelo Embaixador Coutinho, que acompanharia. Mas o Cônsul-Geral de JNB, Carlos Teixeira da Mota (um diplomata  em rota ascendente, tão cedo desaparecido, alguns anos depois, em Brasília -  onde eu  tinha estado uns dias, pouco antes, na sua casa, dessa vez também com a  Mary e ele eram  amigos) convenceu-me de que o ideal era visitar essas comunidades tão esquecidas . E eu transmiti a minha decisão ao Emb. - que colocou muitas objecções:
A Suazil. dependia da Embaixada de Moçambique (R:"Não há problema. Informa-se o Emb e não se espera que ele tenha de acompanhar a viagem")
As autoridades Suazis não estavam informadas (R: "É uma visita não oficial")
Os hoteis estão cheios (R: "Algum portugês nos há-de acolher!") etc. etc.
E fomos em frente. Grande reunião em M'Babane numa moderna e grande assoc portuguesa. Surpreendente também a recepção em Manzini. Ao chegar, contra um pôr do sol africano, flutuava uma imensa bandeira azul e branca do FCP. Que emoção!
Na parede da sala da direcção, dois retratos retirados dos pregos da parede, mas colocados sobre as estantes: Salazar e Marcello Caetano. Não perguntei porquê (não comentava as opções políticas das ONG's da emigração), mas imaginei uma votação a terminar em empate e aquela solução de compromisso (retira da parede, mas deixa à vista na estante...).

23 - Atenas 84  
Hotel onde a adjunta, Isabel, ia morrendo de susto qd abriu a porta para colocar o impresso do breakfast e deu de caras com um soldado armado de metralhadora - a minha segurança nocturna...
O ambiente andava agitado, manif's na rua contra a reunião da NATO, que se realizaria na Turquia, e na qual participou o Prof Mota Pinto.

24 - Também fui à Turquia, de seguida, mas para uma reunião em Izmir, sobre migrações e desenvolvimento, onde participaram o Manuel Porto e o Silva Peneda. Ainda estive, com o Prof. Mota Pinto em Istambul, de passagem.
No Hotel de Izmir, um gang de empregados do Hotel assaltou-nos, a mim e à Isabel, na última noite. A ela roubaram-lhe bastante dinheiro. A mim, nada, porque não tinha dinheiro vivo, só cartões... foi um susto ao retardador, no aeroporto, quando nos apercebemos da falta de dinheiro turco e relacionamos as dores de cabeça de que ambas sofríamos. com a possibilidade de nos terem dado um sedativo (ao jantar?), para entrarem nos quartos, que tinham, lembrei-me depois, portas de comunicação.

25 - Em Atenas, recebida por Melina Mercouri, Ministra da Cultura, responsável pelo apoio aos gregos no estrangeiro. Ela chiquíssima, eu com um vestido tão feio, de malha preta, raiada de amarelo! A conversa foi banal, embora ela não fosse banal. A diáspora estava, pareceu-me, mais entregue ao Secretário de Estado do que à ministra. Lá como cá...
Dei-me sempre muito bem com os homólogos gregos, e todos me convidaram a visitar Atenas.
O último praticamente não falava inglês, só grego e alemão. O meu alemão é paupérrimo, mas mesmo assim conseguíamos conversar sem intérprete! Entre palavras cruzadas nas duas línguas germânicas e pura empatia.

26 - 1989  Em Israel, a convite do Governo, por intermédio da Embaixadora. Colette Avital - mulher diplomata excepcional. No domingo de Páscoa, visita à Cidade Santa, rodeada de segurança ostensiva, soldados de metralhadora. Sentia-me um alvo... detesto segurança e, sobretudo, armas de fogo à minha volta.

27 - Também a convite de Colette falei numa manifestação em Lisboa, de apoio a Israel, então sob ataque de mísseis iraquianos. Falei de nós como uma nação em que os portugueses de dividem entre os que sabem que são judeus e os que sabem que talvez o sejam também...
Já toda a gente tinha dito o que eu me preparava para dizer. Depois de mim, só falou, por minha insistência, nessa ordem de precedência. o Doutor José Hermano Saraiva

29 - Israel: o mar da Galileia, o barco dos pescadores do tempo de Cristo... O Mar Morto, a fortaleza de Massada, o Museu do Holocausto. Os jovens acompanhantes tão simpáticos, mas em rotação, um, e logo, outro.
Senti muito mais a presença de Cristo em Belém do que em Roma, na sumptuosidade do Vaticano...

30 -  1987/1991 VP da AR - o carácter representativo do cargo obrigava a vida social. Grandes amigos, entre diplomatas, como Colette Avital, Vera e Alberto da Costa e Silva e, depois, José Aparecido de Oliveira. Gente notável... Com Alberto comecei as geminações entre as cidades do mesmo nome. Amarante de Portugal com Amarante do Piauí, terra de origem do pai de Alberto, o poeta da saudade, Da Costa e Silva. Mais uma das semelhanças entre as Amarantes. Ambas com culto a São Gonçalo, versinhos brejeiros, rimos atravessando a cidade.
Lá um Poeta da saudade, cá outro. Bela cerimónia na nossa Amarante. Que bem falava Alberto - orador, para além de ser um grande escritor!
E a memória de Pascoaes sempre connosco.

31 - Com José Aparecido tudo começou por acaso. Nem sabia que ele, ainda futuro embaixador, já estava em Lisboa. Fui à chancelaria dar um abraço de solidariedade ao Encarregado de Negócios, amigo de longa data e ele insistiu em me apresentar a Aparecido. Naquele momento o meu espontâneo gesto sensibilizou-o muito, como escreveu mais tarde num jornal brasileiro (ver recorte) 
Estavam em causa brasileiros a aguardar expulsão na Portela, enquanto Cavaco se limitava a reafirmar que "eram estrangeiros como outros quaisquer". Eu totalmente em desacordo!
J. Aparecido de Oliveira convidou-me a almoçar com ele na cantina, familiarmente. Uma conversa de cinco previsíveis minutos durou o dia...
 Anos depois, no clube português de Belo Horizonte, José Aparecido contou essa história e o significado que o gesto de uma VP da AR tivera para ele. Confesso que não me tinha apercebido da singularidade do gesto. Para mim, tinha sido uma reacção normalíssima...

32 - Voltando a Istambul. Estava apenas acompanhada da adjunta, Isabel, uma jurista ainda jovem e bastante assustada, primeiro com o soldado de metralhadora de Atenas e, ali. com o ambiente, também um pouco crispado e, ainda por cima, exótico, muçulmano, com poucas mulheres na rua e muitos homens, para ela com ar ameaçador. O Carlos Correia, que devia ter-se encontrado connosco, não conseguiu. Erro no nome do Hotel que, por erro lhe deram, e nós não sabíamos o dele (depois eu era a"má da fita", quando estas descoordenações se tornavam um problema, qd eu me sentia mais competente do que a entourage... Sempre preferi trabalhar com gente mais capaz e sabedora do que eu. Com o génios nunca tive confrontos!).

33 - 1987? - para mim tb foi normal viajar no autocarro 24 para o MNE (nem sei porquê - avaria no carro da SECP, à última hora? Não aparecia táxi?). Viu-me Pedro Cid e nem queria acreditar - um membro do governo nos transportes públicos...
Não era o equivalente a viajar na económica da TAP, atrapalhando meio mundo e, quando a económica vai cheia, obrigando a companhia a fazer "upgrade" a quem paga bilhete de económica (ministros na TAP vão de graça...)

34 - Nunca viajei com despesas de representação, enquanto no MNE.
Haver 2º exemplo? Limitava-me a ajudas de custo, como as de funcionários públicos e com elas pagava os hotéis e o resto. E as embaixadas a reservarem-me suites enormes e caras, julgando que eu gozava das tais verbas para despesas de representação... Ainda por cima nem gosto de grandes suites! Em algumas até me perdia lá dentro.

35 - E as viagens que paguei do meu bolso, quando recebia convites das comunidades, na qualidade de VP da AR! Victor Crespo achava sempre muito bem que eu os aceitasse, mas à minha conta. Até perdia o subsídio diário a que os deputados têm direito quando estão em trabalho, em Lisboa.
Mas eu fazia-o com gosto. Pelos amigos das Comunidades, e para irritar o SECP Correia de Jesus, que entendia que eu estava a "invadir" os seus domínios... Foi uma alegre guerra de alecrim e manjerona.
Mais tarde contei-lhe: gastei muito dinheiro, em parte por sua causa, porque sabia que as minhas visitas o incomodavam e isso divertia-me... Não sei se ele achou graça.

36 - Aos EUA, não faltei a um só Dia Nacional nesse período de 4 anos. Em Connecticut, Adriano Seabra da Veiga telefonava-me a comunicar: "Tem de vir, já pus o seu nome nos cartazes do 10 de Junho". E eu ia. A Newark, com o Sr Coutinho e a Dona Maria, também não podia faltar.

37 - Uma vez, em Waterbury, ofereceram-me uma vistosa águia. E eu não percebia porquê. Seriam benfiquistas? (o FCP tinha ganho pouco antes o campeonato). Seria uma inspiração do meu apelido? De repente, lembrei-me: é a águia símbolo da América! Viajou comigo no avião da TAP. (em executiva)

38 - Mais difícil foi trazer uma cadelinha "Yiorkie", oferecida por Rita e Adriano, na minha 2ª ida a Connecticut, em Novembro de 1980.
Eu gostava muito dos cães deles, do Champions e dos outros - uma colecção, 6 ou 7, pequenos e saltitantes "yorkies", a contrastar com o enorme São Bernardo. o Tighny...
Foi uma surpresa... e uma preocupação. Como a traria na travessia aérea do oceano (embora com a papelada em ordem)? E como a poderia cuidar em Lisboa? (a Maria Póvoas já tinha morrido)
Mudei o voo de uma outra companhia para a TAP. Entrei com a pequenina cadela ao colo e um funcionário olhou e exclamou: "Oh, it looks real!" "It is real" foi a resposta.

39 - A travessia foi incrível. Todos os passageiros vinham ver a cadelinha, que se tornou muito popular, e falavam comigo - não dormi nada!
Eu trazia toda a documentação necessária para a cadela entrar em Portugal, mas, à cautela, não fosse surgir uma burocracia de última hora. avancei sem a declara. Foi sempre uma americana clandestina no país...

40 - Uma espantosa cadela, inteligentíssima, como é uso norma naquela raça, (mesmo assim, ela era uma inteligência superior, mas mázinha, mordia criancinhas, mordia os calcanhares dos meus pais, qd queriam sair de casa, contra sua opinião.
Esteve comigo em Lisboa durante apenas um mês. Depois, tive de trazê-la para casa dos pais, em Espinho, porque vivia em solidão. Teve uma alergia a comida de cão trazida da América, teve de ser tratada pelo veterinário conhecido da Milú - uma sumidade que a pôs boa, rapidamente. Qd ia à consulta, perto do Largo do rato, levava-a, depois, comigo para o MNE , onde também era uma visitante clandestina, escondida nos meus casacos, até chegar ao meu gabinete. Uma vez até me cruzei com o MNE Freitas do Amaral, com ela aninhada debaixo de uma conveniente capa preta...
Nos tapetes do gabinete fez inconveniências, uma vez por outra, mas um Embaixador, que era criador de cães, ensinou-nos o remédio: agua gasosa, em cima da carpete, no sítio carecido de limpeza.

41 - Anos 80 Os amigos da América
O Doutor Cachadinha, Padre, hoje Monsenhor José Alves Cachadinha, tão Sá Carneirista  como eu. O mesmo se diga de Adriano Seabra da Veiga. Nos anos 70, recebeu Sá Carneiro, António Maria Pereira numa 1ª visita aos EUA, após o 25 de abril. Julgo que o amigo de longa data era o António. sei que os levou ao Governador do estado de Connecticut e os acompanhou a Boston, para o encontro com o Cardeal Medeiros,  um amigo de casa do Adriano.
 Muitos outros lá estiveram, antes e depois dessa data - Amândio de Azevedo, Leonor Beleza (então Secretária de Estado) . Também Zeca Afonso, para tratamento, Spínola e Veiga Simões, no exílio, a prima Amália Rodrigues... etc etc...
Era uma casa magnífica, sempre aberta para os portugueses. Uma mansão esplêndida, na zona do "country club" e na vizinhança de várias celeberidades de Hollywood. 
Quantas vezes os visitei? Inúmeras. Adriano era o Cônsul Honorário e, muito mais do que isso, um líder da comunidade, sempre a organizar eventos imperdíveis!



42- Macau
A questão da não reintegração de funcionários públicos de Macau na administração portuguesa foi uma das que me levou a abandonar a política. A não aceitar um lugar nas listas de deputados da emigração, pelo PSD, em 2005.
A promessa de reintegração daqueles que prematuramente tiveram de optar por Macau, antes da entrega do território à China, fora feita pelo PSD (na altura eram já poucos os funcionários nessas condições - uns 150? - e não regressariam todos de imediato...).
Um requerimento ao governo em que era exigida essa decisão foi assinado por mim, pelo José Luís Arnault e pela Natália Carrascalão. Um longuíssimo requerimento, com extensa e boa fundamentação jurídica. O mais longo que jamais subscrevi - limitando-me a enquadrar nas fórmulas de estilo uma exposição bem elaborada pelos juristas da secção do partido de Macau. Recebi essa incumbência do próprio Secretário- Geral J L Arnault.
Reafirmei, naturalmente, a posição do PSD numa visita à Região, como deputada. Dei a minha palavra., absolutamente convencida que o partido honraria a promessa.
Que ingenuidade! Não cumpriram coisíssima nenhuma. O Arnault, que era Ministro desapareceu desta história, como se nunca tivesse estado nela. E uma jovem Secretária de Estado de Manuela Ferreira Leite veio à Comissão de Negócios Estrangeiros dizer "não", com os mesmíssimos argumentos que o PS invocava no passado.
Pedi públicas desculpas aos Portugueses de Macau, com a devida publicitação, pelo menos a Oriente. Quis mesmo lá ir, dizê-lo de viva voz aos portugueses, mas não consegui, no tempo certo. Usei o sucedâneo. E deixei de ter condições de me recandidatar por um partido que lhes tinha mentido.
Sei que não é comum levar a sério estas coisas. Mas eu levava. Senti-me traída, como eles.

43 - Lembro-me a propósito (não a propósito de Macau, mas do respeito pela palavra dada...) do ultimato que o PSD lançou, em 1985, ao General Firmino Miguel, dando-lhe um prazo para responder se aceitava candidatar-se a PR com o apoio do PSD. A resposta só podia ser "não" (que era o que o ultimato, congeminado pelos opositores do Prof Mota Pinto, realmente visava...) .
Umas semanas depois, eu (grande admiradora de Firmino Miguel) falava do assunto num grupo de amigos. Alguns achavam que o General ainda podia repensar, invocando alteração de circunstâncias e interesse nacional. Responde um outro: " um político faria isso, um militar não. A palavra está dada, é para cumprir".
Neste aspecto sou certamente mais militar do que política.

44 - Sem Mota Pinto, o PSD iria mudar muito... O sucessor acabou sendo Cavaco Silva, inesperado vencedor na Figueira (com o meu apoio -  com a de todos os chamados "críticos").
Com o General F M fora da corrida, apoiava, espontâneamente e qualquer que fosse a posição do partido, Freitas do Amaral para PR.
Por coincidência, Cavaco conseguiu impo-lo ao PSD, mas eu já antes tinha participado nas primeiras iniciativas de campanha. Por distracção, até fui à conferência de imprensa de apresentação da candidatura, que confundi com o lançamento de um livro do Professor. Na sala só estavam jornalistas...e eu ! O professor saudou-me efusivamente e eu lá fiquei a tentar não dar nas vistas, o que era impossível.

45 - Em eleições para o PR faço o que quero, não sigo necessariamente o partido. Votei Eanes na 1ª eleição, depois Soares Carneiro, depois Freitas do Amaral, depois não votei Soares (porque achava a colagem do PSD um acto de profunda hipocrisia política), depois Cavaco (apesar da admiração por Jorge Sampaio - aí segui o conselho de Fernando Nogueira, presidente do PSD, a cuja comissão política pertencia) e, finalmente, Mário Soares!
Nunca tinha votado no Doutor Soares, um dos verdadeiros fundadores desta democracia e, como pessoa, uma pessoa fantástica! Achava mesmo que a idade, a experiência, o imenso prestígio internacional, o tornavam o candidato ideal. Mas não para este povo, que idolatra a juventude. Sabia que, por isso, a vitória de Mário Soares era utopia, mas deu-me uma grande satisfação moral votar nele! Hoje faria o mesmo.

46 - 1985  Visita a Cabo Verde, viagem ao paraíso!
Fui a convite do MNE Silvino da Luz. Fiquei ao seu lado num jantar no Palácio das Necessidades e tive de confessar que ainda não conhecia C Verde. O convite foi feito logo ali, mas a viagem teve de ser adiada, porque, entretanto, mudou o Sec de Estado da Cooperação (Luís Gaspar da Silva, com quem tão bem me entendia, deixou o cargo para continuar a carreira diplomática em Paris e foi substituído pelo chefe de gabinete de Gama, Eduardo Âmbar). Naturalmente, Âmbar queria ir antes de mim ao Arquipélago. E foi, levando os cantores do regime, a Lena d' Água e a Banda Atlântica (tenho mais certezas quanto à Lena do que quanto à "Banda", mas acho que se chamava assim ...), inaugurando centros culturais e bibliotecas. Belos gestos de cooperação, muito meritórios e vistosos.
Parti duas ou três semanas depois, com a Presidente do IAECP, a Mª LuísaPinto, e com os 4 fadistas de Coimbra (a pedido do Embaixador Baptista Martins, que nos disse que o fado era muito apreciado naquele país).
Foi a Margarida Serra e Moura, do meu gabinete, que conseguiu convencer o grupo de Bernardino a fazer a "tournée". Como eram os quatro funcionários públicos, pedimos aos respectivos serviços que os dispensassem - o que foi, milagrosamente, conseguido em tempo útil.
O sucesso foi imenso! Salas de espectáculos cheias por todo o lado, aplauso infindáveis. E quando, a encerrar, convidavam os antigos estudantes de Coimbra a subirem ao palco para cantar "Coimbra tem mais encanto na hora da despedida" o palco ficava repleto. Políticos, funcionários, quadros, empresários... Será que ainda hoje isso aconteceria?

47 - E, para além das conversações sobre temáticas da emigração, organização de estruturas e serviços, que obviamente interessavam a um país de grande diáspora (sobretudo na Europa e na América do Norte), queriam também que fosse naquela precisa altura assinado um acordo sobre os seus imigrantes em Portugal. O Ministro Maldonado Gonelha e a Sec De Estado Leonor Beleza eram os governantes responsáveis pelas negociações e decisão. Pela parte de Leonor, todas as facilidades. Não assim da parte daquele ministro. Mas a sua oposição cedeu quando foi o próprio homólogo de Cabo Verde a pedir-lhe urgência na assinatura... (sugestão minha - que resultou plenamente). E fi-la não porque tivesse interesse pessoal, mas porque era importante para eles, para os imigrantes!

48 - Estávamos nas vésperas da celebração dos 10 anos de independência de CV . Levei comigo uma medalha com os símbolos de CV e de Portugal e estes dizeres: "10 anos de renovada amizade". Foi muito apreciada. 
Tudo correu às mil maravilhas. Poucos meses depois foi editado um livro sobre essa primeira década. Lá vem uma grande foto minha tirada com os amigos de CV. Nenhuma do Âmbar. E, se é que Gama lá aparece, estárá em ponto bem mais pequeno.
Não era um objectivo, nem imaginava que pudesse acontecer, mas, depois de tantas pequenas quezílias domésticas, acabou por dar algum gozo (um gozo coimbrão...).
 Estou convencida que os fadistas, que eram amigos de meio mundo naquelas terras, ( e do meio mundo mais influente) tiveram nisso uma importância inesperada! Foram convidados como músicos, mas a sua mais valia do ponto de vista político não foi menor do que a musical. Criaram o "ambiente" humano em que me movi.
 E o Embaixador também foi inexcedível. No banquete final na residência havia ministros por todo o lado e mais de 400 convidados! Ouviu-se o fado, em palco improvisado num recanto do jardim. Um espectáculo feérico, numa noite quente e ventosa.

49 - 1986? 
 Inauguração de uma estátua ao emigrante em São Pedro do Sul - promovida por portugueses da RAS. Levaram lá uma multidão de personalidades, Embaixadores, Ministro Louis Nell, líderes da comunidade, jornalistas. etc.
 Missa campal, sob um sol impiedoso. Tive de discursar nas duas línguas e para as câmaras da RTP. Grande almoço no antigo hotel das termas. Seguranças à volta do Ministro. Convidei-o a ir comigo dar uma volta pela terra. Não estava previsto... Começaram a levantar muitas objecções... ainda e sempre a segurança. Até que o ouvi dizer, decididamente: "Se ela vai, eu também vou". 
E fomos, em pequeno grupo excursionista, gozar as belezas da terra, e o remanso da "pax" portuguesa. Perigo só mesmo na cabeça deles (dos serviços de segurança, que talvez nos tenham seguido, mas de longe).

50 - 1991?
  O encontro com Walter SISULU, o famoso companheiro de prisão de MANDELA
O Emb Cutileiro organizou quando de uma ida minha a Capetown um encontro com Albertina Sisulu, feminista e notável senhora. Achou que gostaríamos uma da outra. 
Meeting no escritório do advogado (indiano) de Mandela e Sisulu. Chegámos cedo. O advogado era  pessoa introvertida, a conversa não fluía. Até que se abre a porta do gabinete e entra, não a senhora esperada, mas um homem de braços abertos e grande sorriso a iluminar -lhe o rosto. Walter, evidentemente. A dizer, depois de um abraço cordial, que estava a substituir a Mulher, que caíra subitamente na cama, com gripe. Foi encantador!
 Como foi possível uma atitude de tão grande simpatia e abertura aos outros (qualquer que fosse a cor,  a nacionalidade, a religião, a ideologia) por parte de alguém que o apartheid tinha mantido prisioneiro até umas poucas semanas atrás?
Mas foi essa atitude, essa qualidade humana que tornou possível o milagre da nova RAS, em liberdade, em convivência democrática. Há problemas, mas não os que se esperariam, o afrontamento e o ódio racial.

51 - 1983, Roma -  Conferência dos Ministros responsáveis pelas migrações do Conselho da Europa. 
Anita Gradin, Ministrada Imigração da Suécia e eu, Vice-Presidentes da conferência, juntamente com o homólogo grego. Presente a Sec Estado da Imig da França Georgina Dufois.
Aí se traçou uma "entente" que durou anos. Aliadas, com visões semelhantes da imigração e das questões de género (elas socialistas, eu, nestas matérias, ainda que não, porventura, em outras, tanto ou mais esquerda do que elas...). Fiz a ponte, até do ponto de vista linguístico entre as  duas Ministras - inglês com Anita, francês com Georgina. Era amiga das duas,  mas elas nunca tiveram entre si o mesmo grau de intimidade ou à vontade.
Já nem sei ao certo o que disse em Roma - só em termos de linha política, que essa foi sempre a mesma: defesa da dupla cidadania, com factor de integração, igualdade de direitos face aos dois países. E sei que fui bastante convincente.
Anita convocou, de seguida, uma grande conferência sobre a dupla nacionalidade em Estocolmo (embora ainda hoje seja menos adepta da solução do que eu...).

52 - Difícil converter os nórdicos à dupla nac... mas correu o melhor possível.
No fim os ministros partiram todos, menos eu. Acompanhada da Mª José Cabugueira, adjunta do meu gabinete, segui com Anita e Bertil para a casa de campo numa ilha encantada...
Vizinhos eram dois ou três, dispersos pela pequena ilha. A casa ficava entre bosques.

53 - Fui com Anita apanhar cogumelos, com Bertil pescar de barco. Eu remava, enquanto ele lançava as redes. Salvei a vida de muito peixes, porque, apesar dos seus avisos, remava depressa demais. Só trouxemos um peixe graúdo para casa, que foi o nosso jantar. A Anita sabe mesmo cozinhar! Para mim, cozinha é laboratório de química, onde todas as fórmulas, comigo, dão erradas.(só consigo fazer chá e café  - como dizia um amigo inglês sei "ferver água").
Anos depois, estiveram ambos no meu apartamento de Espinho. Visitamos Aveiro e o castelo da Feira, mas no domingo o ICEP trocou-nos os planos... Souberam que ela (então Ministra do Comércio) já estava em Portugal e insistiram em lhe oferecer um passeio pelo rio Douro, para o qual, naturalmente, tiveram de me convidar.
Esta era uma visita pessoal, seguida da oficial. 
Em várias ocasiões, primeiro a meu convite, depois, trazida por outras entidades veio muitas vezes a Portugal. um ano fez férias na madeira. Fui lá para estar com eles. Anita arranjava sempre maneira de nos encontrarmos. Tinha e tem dois amigos em Portugal: o António Guterres e eu (De Guterres foi colega na APCE, ele sucedeu-lhe como presidente da Comissão das Migrações - cargo para o qual também fui eleita, mas bastantes anos depois).

54 - 1988 - Numa dessas visitas convidei-a a ir à Comissão da Igualdade na AR (que então presidia), falar sobre o sistema de quotas, que ambas defendemos. Ela era presidente da Internacional Socialista de Mulheres - e explicou-nos como dentro do PSD sueco tinha conseguido, décadas antes, introduzir as quotas.
Os homens davam sempre a desculpa de que não havia candidatas. Ela e outras organizaram uma lista de voluntárias com excelente curriculum e, assim, responderam ao velho argumento. Vingaram as quotas, apesar da relutância de muitos.
Em Portugal, na 1ª tentativa de introduzir as quotas (na lei, não internamente num partido, à sueca) fui a única a votar a favor do projecto do PS. E andei fazendo campanha nos media com o António Costa, que é um convicto da causa, como eu!

REP? 55 - 1984 -  Atenas -  com escolta pela cidade (dois homens e uma mulher, elegantemente vestidos e muito agradáveis). E despistei-os, involuntariamente, com o meu passo rápido, nas ruas estreitas da Plaka. Tive de ir procurá-los. Eram tão simpáticos - seria mau chegar sem eles ao hotel...

56 - A outra grande aliada: Georgina Dufois.
Uma dona de casa que Mitterrand trouxe para a política. Muito inteligente, uma mulher excepcional, generosa e aberta, com grandes preocupações sociais, protestante num país de maioria católica. Foi 1º Sec Estado da Imigração (nessa qualidade a conheci, em 83), depois Ministra dos Assuntos Sociais e porta-voz do governo. Carreira meteórica, terminada pelo caso do sangue contaminado (semelhanças com Leonor). "Sinto-me responsável, mas não culpada" afirmou no julgamento. Tudo tramitara pela Sec de Estado da Saúde e creio que ficou provado que o principal culpado foi o Director Geral. Mas ela afastou-se para sempre da política. Nessa fase e depois tentei contacta-la, sem conseguir.

57 - Enquanto fui SEE e SECP, entre 83 e 87, sempre contei com ela.
A relação ficou mais no plano oficial, mas foi de uma constante sintonia. Emigrantes -emigrantes eram gente de quem gostávamos, genuinamente. E éramos feministas, também.
Com Georgina fui Vice-Presidente de uma Conferência do Conselho da Europa - convidaram-nos porque sabiam dessas afinidades ideológicas e do bom entendimento pessoal, julgo eu.
Com Anita estive no Conselho da Europa, em Estrasburgo, na 1ª  Conferência de Ministros responsáveis pelas questões femininas (em 84?)
Tº conjunto, para mudar atitudes e preconceitos contra a emigração, contra as mulheres.

58 -Dufois já era ministra quando integrou a comitiva do 1º ministro em visita oficial a Portugal. Passamos horas e horas em negociações, numa sala cheia de ministros... Depois, reunimos nós as duas, no MNE, para prepararmos os temas de uma próxima comissão mista. Em 5 minutos acertamos tudo - agenda e viabilidade de encontrar soluções. Eu dizia o que queríamos. Ela respondia, indicando até onde podia ir (para espanto dos nossos diplomatas, pouco habituados a esta franqueza e pragmatismo)
Confidenciava-me ela à saída: "Que diferença entre a nossa reunião e a dos homens. Eles gastaram horas para tratar menos coisas do que as que nós resolvemos em cinco minutos".
Eu poderia ter dito o mesmo - como Dupond e Dupont (je dirai même plus...)

59 - 1987  -  Creio que a última vez que Georgina veio a Portugal, a meu convite, foi para participar numa série de conferências com que inaugurámos um simpático auditório na Rua do Passadiço (tudo isso depois desapareceria rapidamente, como o Fundo Documental e Iconográfico das Comunidades Portuguesas, o Centro de Estudos, as publicações... E não sei mesmo se sobrevive todo o material que foi então digitalizado, através de um protocolo com o Instituto Rainha Dona Leonor).

60 - Bem, passando a um tom mais ligeiro, seguiu-se um restrito jantar em que as mulheres predominavam. Algum equilíbrio era dado pelo quarteto de fados de Coimbra - Berna e os seus amigos, voluntários, sem "cachet", mais uma vez.

61 - Falando de equilíbrio de género: houve, em Lisboa, por essa altura, uma comissão mista luso-alemã, em que, por acaso, a parte alemã era constituída só por homens e a portuguesa só por mulheres. Como estava fazendo sucesso a telenovela "Guerra dos sexos", a referência foi coisa inevitável. As negociações correram muito bem - como quase sempre acontecia com a RFA. Porque nós defendíamos os emigrantes com dados e estatísticas deles (muito favoráveis!). Não participei nos trabalhos, porque era um grupo técnico, mas ofereci-lhes o jantar de despedida e glosei, para gáudio geral, o tema da guerra dos sexos.
Falo demais dos jantares, mas o bom relacionamento pessoal não passa só, mas também passa, pela mesa dos restaurantes.

62 - Não que eu goste muito de recepções os jantares oficiais, mas aguento firme. A verdade é que quase nunca me entusiasmava a perspectiva desses eventos gastronómicos, mas, depois, divertia-me imenso. Quanto mais informal, mais me agradava. E vice-versa. No fundo da escala estavam os banquetes, quando o vestido comprido era obrigatório...
Lembro-me de ir inúmeras vezes em direcção aos palácios da Ajuda, Queluz ou, ocasionalmente, Sintra, no carro oficial, com o motorista, à hora em que as pessoas faziam filas longas nas paragens de autocarro. E eu pensava que eles me olhavam como uma privilegiada, querendo estar no meu lugar, enquanto eu queria estar no deles. Apanhar o autocarro e ir para casa jantar e ver tv, ouvir um disco ou ler um livro! 
Mas, depois, lá nos salões dos palácios, encontrava amigos e sentia-me bem.

63 - Não foi desagradável, mas esteve perto disso, o caso do banquete no Kremlin, na comitiva do Presidente Soares. Segredou-me a Maria Santos a certa altura: "Tens uma grande malha caída nas meias pretas, mas descontrai-te! Acontece, não tem importância". E eu tive de me descontrair. Se o tempo estivesse bom, era mais fácil. Ía aos lavabos, e deitava as meias no caixote do lixo. Ali, com temperaturas negativas, não era solução.

64 - 1980  O 1º jantar de gala do governo AD, no Palácio da Vila, em Sintra. Quase morri de frio! Mas sobrevivi.
Por acaso, tinha mandado perguntar ao protocolo se as salas do Palácio eram aquecidas e a resposta foi positiva.
Resolvi, confiadamente, levar um vestido (comprado na Ayer) de chiffon azul, muito bonito e muito fresco... O Palácio era um gelo! Havia alguns pequenos e pré-históricos aquecimentos a gás, tão inestéticos quanto inúteis. Eu nem queria acreditar...
A noite estava frigidíssima, mas eu levava um casaco de peles comprido. Cá fora, tudo bem. Só que, claro, deixei o casaco no vestiário...

65 - O convite era do Primeiro-ministro e Senhora de Sá Carneiro. Por um momento pensei que Sá Carneiro tinha cedido a pressões e chamado a primeira mulher, ida do Porto para a ocasião. Mas isso era inconcebível.,, À entrada, lá estavam a receber os convidados, dois casais; Snu e Francisco SC, Mizé e Diogo FA, Que alívio!
Conheci Snu ali mesmo. Como não havia mais convidados a chegar, nessa altura, fiquei a conversar, mas já sem casaco de peles. Foi Snu (bem agasalhada e lindíssima!) que me aconselhou, com a sua sagesse nórdica, a ir lá para cima, para não me constipar. No átrio, de facto, estava ainda mais frio do que nos salões gelados do piso de cima.

66 -1985 -  Falei das mulheres, minhas aliadas na emigração. Mas houve um homem, que acabou por merecer também essa qualificação, no masculino: Jean Claude Junker, que era, então, Secretário de Estado da Imigração (do Trabalho e da Imigração, suponho) do Luxemburgo. Muito jovem e já muito promissor. "Vai ser um futuro 1º Ministro", dizia o nosso embaixador. Não se enganou!

67 - Coube-lhe vir a Portugal transmitir as reservas do seu governo à liberdade de circulação dos emig. Na chamada sala dos embaixadores do Palácio das Necessidades, conversações em linguagem franca e dura, de parte a parte. Para mim, era mais importante garantir todos os direitos da cidadania europeia aos já residentes no Lux do que facilitar a ida de novos emig. Como lhe disse, sem rodeios,  até preferia outros destinos na emig por causa das dificuldades experimentadas pelos filhos dos migrantes num sistema de ensino dado em várias línguas difíceis... 
Ele era, de facto muito novo, parecia introvertido, áspero, inflexível. E eu, se não parecia, também era... Acordo impossível. 
Não era razão para não o tratar o melhor possível, fora da sala de reuniões. O almoço foi o absoluto contraste da reunião. Descobri logo ali um homem inteligente, comunicativo e com um surpreendente sentido de humor. Descontraímos, falamos de coisas agradáveis e encontramos sintonias... De volta às negociações, mais do mesmo dissenso. Ninguém cedia. Na conferência de imprensa não disfarçamos as fundas divergências - nenhum de nós era pessoa para isso. Assim o desentendimento nos aproximou. Os povos do norte, ao contrário dos sulistas, preferem sempre a verdade à hipocrisia diplomática, às palavras redondas. Neste aspecto, sou excessivamente nórdica e entendo-me bem com eles.
Na altura, o Luxemburgo impôs a cláusula de salvaguarda, mas JC Junkers iria ser um dos defensores dos trabalhadores portugueses (ao fim de apenas 3 anos, como Ministro do Trabalho, garantiu a livre circulação para os Portugueses. E, como ele já previa, não houve "invasão" do território pelos portugueses, embora sejam muitos (uma elevada percentagem do total de estrangeiros no mercado de tº).
Estive há dois dias, a 24 de Junho, no Encontro dos Luso Eleitos em Cascais, ao lado do Emb da Luxemburgo. Foi ele que me enviou o texto do discurso de JCJ na Gulbenkian, em 2011, em que ele começa por relatar essa visita a Portugal, a sua 1ª visita ao estrangeiro (facto que eu desconhecia). E em que confessa que se sentia constrangido por ter de exigir a cláusula de salvaguarda (o que eu não pressenti). Mas confirmou-se a minha 1ª impressão: um homem muito inteligente,  bem formado. leal.Um humanista, um europeu. Há poucos hoje na Europa...

68 - JCJ esteve mais vezes em Portugal nesse período. Fez questão de estar presente na Conf de Ministros do SE no Porto. Mas o contacto perdeu-se qd saí do governo em  87. Continuei mais solicitada pelas comunidades que representei como deputada antes de 87 - as de fora da Europa. Reencontro com ele cerca de 15 anos depois em Estrasburgo, qd discursou no hemiciclo na qualidade de Primeiro Mº. Admiti que nem me reconhecesse. Não foi o caso. Grande manifestação de amizade. Mª Elisa, então deputada, contou tudo com pormenores na sua crónica semanal do DN.

69 - 2012 - Um choque, ler, ao deitar-me, quando folheava o Expresso, o obituário de João Aurora, por Cutileiro.
Muitos Embaixadores que conheci no MNE, foram meus amigos, receberam-me em casa, como família, mas de nenhum guardo recordações, a um tempo, tão saudosas e tão alegres! Cutileiro dá essa nota perspicaz: mesmo nesta hora mais triste, em que sabemos a notícia da sua morte, é em histórias divertidas que pensamos. Porque ele era um verdadeiro Senhor do Minho - cheio de uma vivacidade muito minhota, sempre a fazer acontecer as coisas mais inesperadas! Um aristocrata de uma encantadora simplicidade, sem o mais leve traço de snobismo (snobismo em que, contrariando a significado da palavra, incorrem tantos descendente da nobreza pátria, de alto a baixo...).
Ficam para sempre entre os melhores momentos da minha vida os dias que passei no seu solar de Ponte de Lima. Ainda não recuperado, como viria a ser, mas, por isso mesmo, lugar de amiga e informal hospitalidade. 
Era Abril e fazia um frio medonho e no quarto, lá estava um pequeno aquecedor a gás, mas tudo o resto era grande, antigo e precioso, a começar pela colcha bordada de Castelo Branco. Pouco observadora que sou, não consigo descrever o resto - só mesmo a colcha em tons dourados.

70 -1984 -  Ocorreu esta visita a propósito da organização do dia 22 de Abril - comemoração do dia da Comunidade Luso-Brasileira, celebração com tradições no Brasil, mas que oficialmente, por iniciativa da SECP - ou do MNE - acontecia pela primeira vez em Portugal. Muito encorajada, evidentemente, pelo Embaixador João Sá Coutinho, então Secretário-Geral do Ministério. Não me recordo com rigor, mas a ideia de sedear a festa em Ponte de Lima foi certamente dele, em conversa comigo. Devia estar eu ainda indecisa quanto ao lugar "onde", dei-lhe conta da indecisão - e ele terá feito a proposta. Da minha parte, a probabilidade era apontar para o Porto...

71 - Em termos de comemoração foi o maior êxito, praticamente impossível de igualar - com conferencistas como Alberto da Costa e Silva, um orador espantoso, José Augusto Seabra e outras sumidade das nossas Letras. Claro que houve episódios de susto, mas tudo por detrás dos bastidores - alguma desorganização -  deram um copo de água gelada a Seabra, que quase ficou afónico, o discurso do MNE, que não chegava, etc. etc.

72 - Eu gosto de organização e não de improvisação. Mas não conseguia converter os mais próximos, menos ainda os serviços. Sempre a mesma coisa - um stress, luta contra o tempo, erros à mistura, às vezes intervenções minhas de salvação in extremis, mas, depois, tudo parecia fruto de um trabalho muito bem gerido... Bem eu dizia: prefiro que se organizem e falhem, do que assim, a fazer tudo sobre a hora, mesmo que acabe por correr bem... Não houve maneira...

73 - Em todo o caso, o grande mistério do desaparecimento da declaração do MNE, não foi culpa do meu staff... Na verdade, foi perdido por uma de duas pessoas: o Emb João Sá Coutinho ou eu...
Ìamos nós, muito despreocupados, para o centro da cidade, quando, ao sair do carro, me lembrei do discurso ministerial. Achamos boa ideia lê-lo e o Embaixador foi buscá-lo ao automóvel. Antes de abrir o envelope, disse-me: "Vai ver que começa assim: "Aproveito o ensejo para me associar... "
Eu também imaginava o Pires de Miranda a escrever (ou alguém por ele) uma trivialidade semelhante, mas quando Sá Coutinho começou a ler o papel, em voz alta, e as palavras eram precisamente aquelas, começamos os dois às gargalhadas, em simultâneo e em uníssono. Caminhamos, lado a lado, a rir imenso, pelas ruas velhas de Ponte de Lima. Até que, quando eu quis guardar a mensagem, que devia declamar nessa tarde, ele já não a tinha. Mas eu também não! Procuramos tudo - as carteiras, os bolsos dos casacos... fizemos o trajecto em sentido contrário, olhando as ruas, espreitando até as sargetas. Voltamos ao carro, que foi inspeccionado ao milímetro... Nada ... A mensagem sumira! Levara-a o vento, com certeza...
Houve que pedir cópia a Lisboa, com urgência. Isto aconteceu antes da era do fax. Chegou por telex, com vogais duplas. Foi lido assim mesmo, não houve tempo de mandar dactilografar...

74 - Pequenos almoços memoráveis, prolongados por quase toda a manhã. Com ele, a mulher Teresa e a cunhada, Mª Antónia, uma grande portista, que num dos dias até cantou o hino do FCP, a acompanhar as torradas.
Era um bom pretexto para conversarmos infindavelmente, a tomar mais e mais café. Nesta fase, Sá Coutinho levantava-se, ia ao jardim, voltava com uma flor que nos oferecia, e contava mais uma história incrível, acabada de acontecer...

75 - Se ele tinha graça, a Mª Antónia também tinha ( a Teresa era encantadora, mas um pouco menos loquaz). Recordo-me que me mostrou todos os perfis genéticos dos povos que se sucederam no Minho, através dos criados da casa - iberos, celtas, suevos, vickings... Veja aquela - é sueva pura! (grande e loira) A outra ali, celtibera...

76 - E as histórias de aldeia: o pilha galinhas. Vai conhecê-lo amanhã, no almoço. Conheci ("Olhe, é aquele"!) Era um empregado de mesa, distintíssimo (o roubar fazia parte de um ritual de gerações, não era por mal, segundo a própria Mª Antónia...).

77 - Teresa e Mª Antónia eram filhas de um grande constitucionalista de Coimbra, que foi meu professor no 1º ano da Faculdade de Direito (Prof Carlos Moreira) Lembro-me de o ouvir referir-se à filha, que era casada com o Conde de Aurora. Nos meus tempos de caloira, não poderia prever que os iria conhecer em tão felizes circunstâncias.

78 - 2004? Foi Coimbra que determinou o meu último encontro com o Conde de Aurora. Ele veio a um almoço organizado pela associação dos antigos estudantes de Coimbra em Braga - homenagem a 10 mulheres formadas por Coimbra (uma das quais eu). Estivemos à conversa - ele com um ar ainda e sempre jovem, a dizer-me que tinha vindo de propósito para me encontrar. Tão simpático!

79 - Voltando a 84: óptimo também o jantar oferecido pelos Sá Coutinho a Vera e Alberto da Costa e Silva.
Eles estavam há pouco em Lisboa - deve ter sido a 1ª visita fora da capital... Verinha trazia um casaco sumptuoso, para se proteger do frio. Ao tirá-lo comentou: "É bem quente, mas faz-me parecer muito mais gorda".
Resposta de uma das senhoras minhotas, já não sei qual: "Isso até é bom. Quando tira o casaco, as pessoas pensam: afinal e muito mais magra do que parece".
Verinha era linda, mas, ao contrário de Alberto, não muito magra.

80 - Outro minhoto divertido: o Embaixador Villas Boas. Uma vez passei um serão inteiro a rir na sua residência de Capetown. Algumas das história mais delirantes eram à volta da crença aldeã nas almas do outro mundo... Que pena não ter gravado - ou pelo menos registado...


81 - 1988? Durão Barroso e a não ida a JNB 
Era ele SENE e eu VP da AR. Eu tinha convite da org do 10 de Junho e ele foi, depois, indicado como representante do governo nas cerimónias. Para evitar dúvidas ou incidentes protocolares, telefonei-lhe, dizendo que não haveria problema, porque eu insistiria numa presença a título particular. Mesmo assim ele, homem muito prudente, achava que era melhor eu não ir. Preveni que poderia o cancelamento da minha visita causar perturbações, qualquer que fosse a elegante desculpa dada à última hora...Os meus amigos eram gente esplêndida, mas reagiam mal a este tipo de situação...
Aconteceu tudo conforme as minhas previsões - ou pior ainda... Choveram piadas - no jantar de gala deixaram uma cadeira vazia, com o meu nome em frente. Bastante mau para todas as partes.
Mas DB percebeu que eu tentei, o mais possível, evitar o desastre e penso que foi daí que nasceu uma duradoura relação de confiança. Dou-me muito bem com transmontanos! São francos e directos, como eu...

82 - Falando de transmontanos: uma sorte ter podido conhecer Adriano Moreira.! Um dos mais brilhantes portugueses nascidos no século XX. Pena Portugal não ter sabido dar-lhe mais oportunidades na vida pública... A verdade é que não há políticos com a sua inteligência e capacidade de pensar e executar. Não usar os melhores, em democracia, dá no que vemos. 
Adriano Moreira é, no convívio, semelhante a Barbosa de Melo: com eles é impossível conversar sem aprender , como nas aulas de grandes Mestres (que é coisa que ambos são, por gosto) Além disso são ambos - embora muito diferentes - dotados de um muito especial sentido de humor.
AM sabe sempre uns ditados antigos, que cita, bem a propósito, como estes (quando há uns anos falávamos da gente que nos governava nessa altura, não muito diferentes dos que nos governam hoje...) "Desconfiai de paredes velhas e autoridades novas. Caem-nos sempre em cima".

83 - 1980 - Conheci-o por intermédio de Zé Gama, meu amigo, meu irmão.
Acabada de chegar à SEECP, tinha de criar, a partir do zero, de imediato, o Conselho das Comunidades. Quem melhor para nos ajudar do que o grande mentor e organizador dos Congressos Mundiais das Comunidades dos anos 60? 
Foi de uma grande abertura e generosidade. Deu-nos as lições da sua experiência. E que privilégio ouvir relatos desses congressos fantásticos, tão esquecidos, infelizmente. Tenho as actas, oferecidas por ele - e quantas intervenções plenas de actualidade, apesar da diferença de contextos desse Portugal para o de hoje... Mas no campo da cultura as constantes predominam.
Que coisa rara é ter políticos que são homens de cultura...E não só em Portugal.
A sua falta explica a falência da Europa, tal como a nossa própria...

84 -1984/85  Génios no feminino: Agustina, Amália.
Agustina: Quem terá conseguido levá-la ao 1º Encontro de Mulheres Portuguesas da Diáspora em Viana, 1985?
Será que alguém sabe?
Há que perguntar a Mª Luisa, que era presidente do IAECP. Foi ela que levou Lúcia Lepecki a um 22 de Abril, em Guimarães 86 ( quase tão fantástico como o de Ponte de Lima em 85). Agustina terá sido também convidada por ela?...
Para mim, a maior (ou o maior) escritora (escritor) do nosso tempo, e que ganhava em ser conhecida de perto. Tal como Amália era, na convivência, uma anti-vedeta.
Geniais, mas com aquele ar e conversa de pessoas como nós, comuns mortais. Ambas, sendo mais velhas do que eu, me pareciam as minhas queridas tias. Agustina semelhante, até no aspecto físico, à Tia Celestina (Dá Mesquita). Amália parecia mais uma tia Aguiar - muito Aguiar mesmo! A Tia Lola, ou a Cristina, morenas, bonitas, cheias de bom humor  e vivacidade, como ela.

85 - Desde 85, Agustina participou em várias iniciativas da SECP. Sempre disponível, sempre irradiando graça e saber.
Em Amarante, por exemplo. Numa série de conferências, já não sei bem sobre quê. Emigração, evidentemente, como tema genérico. Inesquecível o final dos seu discurso: "Como se termina um encontro feliz? Não terminando....

86 - Vi-a pela última vez, até agora, em Fortaleza, há uns anos (2002? 2003?).
Ela estava na mesma, não tinha envelhecido - linda e graciosa, muito senhora do meio século XX português - e comentou com a Rita Gomes que a preocupava muito a minha magreza (tinha de facto emagrecido quase 15 quilos....)
Uma querida tia, mesmo! Adoro Agustina.  Tanto a escritora como a pessoa.

87 - Estava num seminário organizado pelo Comendador Aníbal de Araújo, jornalista e homem de todas as comunidades, que ali reunira o Zé Lello, o Sec Estado Feliciano Barreiras Duarte, o Emb Dário Castro Alves (tão querido, também!) e muitos mais. Agustina ficou, por acaso, no mesmo hotel - a convite do governo brasileiro, suponho (ou enviada pelo nosso?)

88 - 2000? Com Saramago apenas um encontro, num avião. Éramos os dois únicos passageiros de 1ª classe ou de Executiva, num voo de NY para Lisboa, já não sei de que companhia. Foi muito cordial, trocámos palavras de circunstância, ele estava de bom-humor, tinha sentido de humor. Muito mais alto do que supunha! E tão magro como parece nas fotos. Não voltaria a vê-lo.

89 - Também vi Collor de Mello apenas uma vez. Em Lisboa, pouco depois da sua eleição. Um almoço na Embaixada do Brasil. Homem atraente, mas com um discurso de plástico. Nada de comparável a Tancredo (que só vi de longe, a falar no Hemiciclo de S Bento) ou a Sarney (fantástico, emocionante (na Sociedade de Geografia? Penso que sim, em Lisboa, em qualquer caso). Ou mesmo a Fernando Henrique Cardoso. Tão simpático! Para além de sessões de cumprimentos, acompanhei, uma vez, Durão Barroso, (presidente do PSD, ainda não 1º ministro), a Brasília e participei numa reunião no seu gabinete. Extrema cordialidade. E, a pedido de DB, antecipou a audiência por umas horas. Que outro PR no mundo faria essa alteração, de véspera, sem problemas, mudando a agenda, que era naturalmente intensa?

90 - Houve  um almoço, oferecido pelo VP. Muito religioso, tinha na sala uma imagem de Nossa Senhora da Aparecida. Mais outra sintonia Brasil - Portugal, pois é uma outra imagem de Nª Sª da Conceição, nossa padroeira. Pelo menos foi isso que lhe disse - acho que não estou enganada.

91 -  1987?  Mas charme, charme genuinamente francês, tinha Jacques Chirac!
Fui na comitiva de Cavaco na sua visita oficial a Paris, (em 1987?). Estivemos várias vezes em reuniões, almoços e jantares nesses 3 dias. Eu não gostava nada da sua imagem, nem do seu discurso político. Pois bem! Converti-me, pelo menos à pessoa. Tão bem disposto e tão especialmente simpático comigo! Talvez intuísse que eu o achava bem interessante . Espontâneo, directo, divertido. Tudo qualidades que eu prezo no topo de uma lista... eu, se calhar, fazia a diferença, no grupo português, todo ele mais formal e introvertido, a começar por Cavaco Silva.

92 . A certa altura, voltou-se para mim e perguntou-me: "Qual é o maior problema para os emigrantes portugueses em França?"
Respondi que era o montante dos abonos de família para os jovens que estavam em Portugal (queríamos que recebessem o mesmo que era pago aos que viviam em França com os pais).
"Vou resolver isso" - garantiu-me.
Bernard Bosson, Ministre-adjoint disse-me que ele era homem para cumprir a promessa - se o papel lhe chegasse às mãos. Eu poderia ter enviado o pedido através de Bernard, mas isso foi obstaculizado em Lisboa... Em Portugal há canais onde as coisas ficam e a diplomacia (pela parte dos políticos, não dos bons diplomatas...) não gosta de diplomacia paralela. Não consegui fazer o"by pass", com o que perderam sobretudo os nossos emigrantes...

93 Bernard era Maire de Annecy - especialista de Assuntos Europeus, um seguro aliado de Portugal - Conheci-o através do seu homólogo português. Excelente anfitrião em Annecy, linddíssima vila antiga! Feérica, nas festas da cidade, onde estive, evidentemente, a seu convite...

94 - Bob Wong -o simpático Ministro do multiculturalismo do Ontário... Até discursei num comício da sua campanha em Toronto, em pleno centro da comunidade chinesa...

95 - 1980  Virgílio Teixeira.
Homem singular, grande actor, com carreira em Hollywood, português, sem traço nem de vedetismo, nem de estrangeirismo, cidadão exemplar, discreto, elegante, dedicado director dos serviços das Comunidades Madeirenses. Que outro famosos actor, regressaria à sua pequena ilha de origem e se ofereceria para trabalhar pelos emigrantes - sem cuidar de honrarias e de fama? Por puro voluntariado. Simples, generoso, um exemplo.
Foram anos de colaboração constante! Que grande amigo... muitas histórias para contar sobre ele
1ª Visita ao MNE
O CCP
Visitas ao Funchal. A homenagem. A Vanda e o Pedro
D Benvinda e o rancho Português (Neuza Amaral)
Tex em Hollywood - a autobiografia que não escreveu
1995 - encontro com os meus pais em Espinho
Ultimo encontro com Vanda e Pedro no Funchal - março 2005

97 - 1986? - Mécia de Sena em Santa Barbara - como em dois dias se faz amizade para sempre.
Aquela mansão de portas abertas - e tantos jovens, a entrar e sair.  Mª Lurdes Belchior (ma bonne elle est française)
Com Docas em rota para LA

98 - Natália Correia. Única e irrepetível- uma improvável amiga, que o foi... (dentro de 100 anos deste parlamento fica a Natália. os outros estarão todos mortos...)

99- F Sousa Tavarres. A minha época de ouro, na AR, graças a ele. os PPM's, Natália...
VP do grupo parlamentar ( bem queria que eu aceitasse,,,) Vizela... O papagaio da 5ª fila...


100 -1968 - O curso na OIT Genebra O eslovaco, o russo, os paquistaneses, a Docas...
Chamonix com nevoeiro cerrado. O japonês Maeda e as pedras para o jardim. Sekanina e o sonho da França. A primavera, a luta de classes (antes da rev. tb tinha criados) O cavalinho sans soucis. O carro vermelho
Yuri Yemelianov - quem fala russo? (ele ou eu - a maioria achava que eu falava russo, não que ele falava português. Não desmentimos...)
A visita a Lyon (Nasir, no seu inglês de paquistão : Manuela walked and walked and tired us all...).
A mulher de Rahman, a que falava melhor (a contradizer os dizeres do marido)
Mancham, que foi 1º Mº das Seychelles.
O indiano e a mulher Reka

101 - Anos 90
A amizade com Russel: 1ª conversa sobre zulus... Sintonias balcãs e outras o seu discurso como Presidente da APCE
Qd o deixei para trás na fronteira da Eslováquia com a Austria

102 - 1980  - Passeio de jangada no mar do Recife... Milú, Garcez Palha e o cação


103  1986 - Uma medalha para Roberto Leal S Paulo - palco de emoções... O incrível aconteceu, ambos em lágrimas...

104 - 2001  Medalha para o Sporting C deToronto
O engano, por lapsus linguae. O fato semi-bordeau ( Luis Duque). Artur Agostinho e o gooooooooooolo

105 - O FCP de Toronto
No mesmo ano, duas festas no mesmo local . a do FCP de Toronto e a do Sporting Clube de Toronto. Fantásticas festas, com centenas de participantes - 800, 1000 - onde fui, como deputada e não como adepta.
E, por acaso, do ponto de vista protocolar,  mais bem situada pelo Sporting. O que tem a ver com a visão das coisas e das pessoas (dirigentes locais), como é evidente. Antes assim! Ali não houve clubismo - apenas a forma como se encarou a deputada, numa iniciativa da comunidade.
Muito bem o SCT, que era, e acho que continua a ser, uma das maiores colectividades portuguesas de Toronto.

106 - Anos 80 -  Uma altura houve em que era convidada frequente do Benfica de Toronto! E porque não?
Eu era SECP . Todos tratados por igual e retribuindo a simpatia recebida...


107  -  1980 -   1ª Visita ao Canadá. Programa muito bem gizado pelo Embaixador Góis Figueira. Intenso! Grande Embaixador. Ministro Axworthy em Ottawa . Reunião com vários ministros e directores- gerais (nunca mais houve nada de semelhante...). Em Toronto. 1º Ministro, Mayor, Encontro com a comunidade na Rua Augusta, no Clube Transmontano - tarde inteira a responder a perguntas, depois, actuaram os pauliteiros (excelente grupo . mais tarde foi lá o Dr Mourinho de duas Igrejas, a meu pedido, para lhes dar apoio -  aprovados com 20 valores).

108 -1980 -Emb Navega e o leão da Rodésia (o 1º que conheci - em JNB - era do Cônsul_Geral, Carlos Teixeira da Mota e eu tomei-o por um simpático e alentado perdigueiro. Uma sorte ele ter confraternizado comigo, antes de eu saber que não era um manso perdigueiro...)

109 -  Milú e eu ficamos na residência em Pretória ( o Emb Coutinho convidou-a, tb. qd se apercebeu de que ele era toda a comitiva que me acompanhava...) e na do Cônsul- Geral em JNB. O Leão da Rodésia acordava a casa inteira a ladrar ao leiteiro, às 6.00 da manhã...

110 - 1980 -  No Brasil o Emb Menezes Rosa. Cuidou de me alertar para a necessidade de adaptar o modelo do CCP à realidade luso-brasileira... Com ele que visitei o Ministro da Justiça Abi-Hakel. Antes de eu dizer palavra já o Ministro me assegurava que a nova lei de estrangeiros não atingiria os portugueses. Bons tempos - antes de Portugal levantar tantos obstáculos aos brasileiros em Portugal (sobretudo com o caso dos dentistas e com as expulsões mediáticas do 2º governo de Cavaco), que levou o Brasil a retaliar...

111 -  Primeira visita ao Brasil logo a seguir à da América do Norte (o Brasil deveria ter sido a 1ª e só não foi porque eu, mulher tímida e pouco à vontade em público, quis fazer o tirocínio nos países que julgava serem mais informais. Mas por acaso, o protocolo nos States e Canadá, até é bem mais exigente . tinha de discursar por todo o lado). Foi bom - comparativamente a América do Sul pareceu fácil... Casa Das Beiras no RJ, para o dia da Comunidade Luso.brasileira, com o Dr António Gomes da Costa, presidindo.
 Fiquei com a Milú e Garcez palha no palácio de São Clemente. Grandioso, mas um pouco fantasmagórico, vazio de mobiliário que tinha voado para Brasília... Brasília, para onde tb voei - conheci o comendador Guilherme Silva, que enriqueceu a vender frascos de terra da nova capital - impressionante- ("poeira de Brasilía").
SP - grande recepção na "Portuguesa" de SP. Santos - os Elos Clubes, rosas lindísimas. Apartamento com jacusi, na altura, algo de novo...

112  - Os jornais brasileiros ressaltavam o avanço de Portugal, por ter uma Vice-Ministra ... Quase não havia brasileiras na política. Hoje têm uma presidente e uma participação feminina esplendorosa, em comparação connosco...

113 -  Primeira visita à Venezuela, nesse ano, pelo 10 de Junho. Festa no Clube Português de Caracas, inauguração da Av Camões (tive de saltar o muro para descerrar a placa, porque ninguém mais o fez e a bandeira emperrara...)
Emb Walter Rosa decide passar a cassette com o discurso do PR num pequeno aparelho"minable", com um som horrível, um despropósito em pleno cocktail! Perante o insólito insisti em ler uma mensagem de Sá Carneiro, que levara para distribuir pelos media... isso foi divertido. Porque o Emb não queria. Guerrilhas políticas...

114 - 2ª Visita a Caracas. Na afortunada ausência do Emb, o Encarregado de Negócios Rosa Lã conseguiu um reunião com o Vice Ministro Aristigueta - Gramko, para a legalização de imig port. (mantida em segredo, como era essencial, resultou, para além das expectativas, com ganhos para os países e os cidadãos...). Para mim, segredo é para manter. Nem aos dirigentes do IAECP dei conhecimento da diligência. Já lá vão mais de 30 anos. Prescreveu a obrigação de sigilo...

115 -  1980 - Buenos Aires. Emb Lencastre da Veiga (irmão de Alexandra, que eu conhecia da RTP). Reunião com dirigentes, alguns vindos do Uruguai, onde não pude ir e havia problemas - falta de embaixador)
Visitas aos clubes, às sedes campestres. Milú alérgica às picadas de mosquitos – esteve pra ser internada de urgência. com as pernas terrivelmente inchadas. Um susto!
Ficamos num hotel pequeno (o pior que vi na Argentina - talvez estivesse tudo cheio). Em plena Florida , onde se podia passear dia e noite, em segurança. Outros tempos! (antes da crise e da intervenção do FMI).

116 - 1985?  La Vilette
Festa de uma Companhia  de Seguros. Casa cheia. Emb Gaspar da Silva, cônsules da região. Um preveniu-me que se preparava manif contra mim - pediu-me que não fosse ao palco. Claro que agradeci o conselho, mas fui.
Assobiadela monstruosa, com excelente acústica. Resisti, sempre de braços erguidos a agradecer. Metade do teatro começou a aplaudir. Até que os assobios se calaram e eu falei. Curto, como convinha! Ali estava na festa, como noutras ocasiões estava para ouvir os problemasdos emig...
Antº Sala que fazia as apresentações estava lívido... Tudo acabou bem No dia seguinte uma pequena notícia do DL informava que a SEE tinha sido impedida de falar em La Vilette (manchete não ousaram). Não era
verdade... Verdade foi o que fizeram ao PR Eanes exactamente no mesmo local, masnoutra data, anterior. As Câmaras mostraram...

117 - O grupo de Bernardino... Em boa verdade um fenómeno de revivalismo coimbrão - ou de extra-territorialidade: sempre emCoimbra, onde quer que estivessemos

118 - 1999?  O relatório da UEO que bateu o record de emendas (dos italianos sobretudo). Mas mantive o essencial. defesa da não diluição da UEO naUE, enquanto esta comportasse países neutrais. Que sentido faz uma
aliança defensiva com países que não assumem qualquer compromisso de
entreajuda???.
 Mas assim se fez esta UE, em imparável queda para o abismo...( e lá se iria a UEO - mas alguns anos depois, não ainda então...)


126 -Anos 60 -
Por essa época já usava óculos e os meus pretendentes - não namorados, porque eu achava que era nova demais - manifestavam a suaafeição, limpando as lentes dos meus óculos, sempre muito sujas, suponho. Todos faziam o mesmo gesto. deviam ver a poeira,  em que eu nem
reparava...

127 - Tratava-os bem, ao contrário da Lecas, que tinha imensos e os mantinha à distância.
Mas alguns irritavam-me demais... Não os Maneis, os 3, que eram muito simpáticos  (dois deles muito divertidos).
Por ex. o cientista sueco ou o colega francês do curso de verão deEstocolmo - inspector dos impostos, o mais graduado do curso, masgordinho, calvo e ultra conservador... Um dia, clamou que se sentia umhomem do sec.XVIII. No dia seguinte, disse que era um homem do secXIX. Respodi, de imediato: De ontem para hoje recuperou um século...

129 - 1971 -  Havia uma participante romena - essa, sim, com um ar assustado. Mas predominavam franceses, belgas (um jovem casal simpático)...
 Alojamento em Lidingo, em instalações de um sindicato da LO. Esplêndidas! Um verão magnífico, calor e sol. Refeições óptimas. Aprendemos a etiqueta sueca  - a fazer os brindes,
os discursos. Visitamos Museus, o barco submersoWASA, de Gustavo II (?),
 estúdios de cinema (vimos o filme "os emigrantes" . emig paraMinesotta),  sindicatos, uma paróquia...Paróquia entregue a uma pastora, a 1ª numa zona "bem" de Estocolmo". A co -adjutora era uma jovem, muito jovem, de tranças louras Forte impressão!

130 - Daí segui para Oslo, por uns dias, com a Gesinne Fast. Tb muito calor!
Comecei a ver pintas saltitantes, descendo sobre o céu, o mar. a paisagem  - um susto-
 Cá ficaram até hoje... o Mário tranquilizou-me. Coisa normal,  em míopes, sobretudo...

131- 1981 -  Cursos portugueses da SEECP gizados  pela M B Rocha-Trindade e pelas universidades. Évora, Vila Rea (Portugal-Tradição e Futuro) em. Depois, nos 
anos seguintes de norte a sul.
Sempre que podia, assistia aos cursos, ficava o dia inteiro. Em VR conheci numa das aulas o Padre Fontes, que, depois, me levaria a visitar Pitões das Júnias. (tivemos um acidente na volta, um carro em contra-mão chocou  com o dele.  Saí pela janela, pois o carro tombou sobre um dos lados)- Há poucos anos, em  Toronto, o Padre Fontes contou a história com imensos pormenores. Que boa
memória!

132 -  Férias nunca tive no governo, porque em Agosto chegavam os emig e havia solicitações demais... Depois, já não dava, havia a agitação normal

133 - Publicações de trabalhos de investigação dos candidatos aos cursos - dezenas..

134 -  Na política, quantos amigos (ou conhecidos) de fora da política: Virgílio Teixeira, Amália, Agustina, Mécia de Sena, Maestro António Vitorino, David Mourão Ferreira, Gilberto Freyre, Austragésilo de Athaíde, Cutileiro, Cargaleiro, Mestre António Joaquim, Vera Lagoa,Roberto Leal, Tony de Matos...Saramago, Lídia Jorge, Sophia de Mello Breiner, Agostinho da Silva, António Quadros, Eduardo Lourenço,Sarmento Pimentel, Fernando Gomes, Victor Baía, Eusébio, Artur
Agostinho, Àlvaro Guerra,, o Bispo Tutu, Maria Kodama, Ruth Escobar, Fáfá de Belém, Neuza Amaral, Ruth Escobar

135 - 1983 - Victor Gil, jovem e brilhante funcionário, mal classificado num concurso, que eu tive de homologar, qd voltei à SEE em 1983. dados lançados, provas orais com a subjectividade implícita...Como provar a injustiça? Sabia que era injustiça, mas não via forma de a corrigir.
Homologuei. Mas ele argumentava em contrário. Como jurista, não via como negar a homologação, mas pu-lo à vontade para recorrer do meu
despacho. E ele assim fez!
De seguida, reparei a injustiça, a meu modo. Não o podendo promover na carreira, promovi-o a um lugar de escolha política: a Vice-Presidente do Instituto de emig (IAECP), com vantagens de vencimento e poder... Um governante promover assim um funcionário que levou um seu despacho a tribunal, não deve ser comum...

136 - Dei algumas boleias interessantes: a Eusébio - à saída de um lançamento de livro de Amália. A Sophia e Agustina, à saída de um jantar no pal´cio das Necessidades. Ouvi-as comentar (enquanto
recolhíamos os casacos no vestiário) que ninguém se lembrara de que elas não tinham carro e não sabiam como apanhar um táxi ali, àquela hora. Ofereci-lhes o meu. Olharam-me embaraçadas - "Não nos lembramos de que agora já há senhoras com carros de Estado"...(Agustina).

137 - 1984 Os anos sempre passados pelas comunidades, na véspera do Dia nacional, sempre sem dizer nada a ninguém (e o gabinete proibido de revelar...)
Só desobedeceu a Virgínia Estorninho - cantaram-me os parabéns em JNB, num jantar de 500 pessoas (fico sempre pouco à vontade...) Nos meus 50 anos também - juntou-se ao coro a voz de Amália (aí sabia, foi uma organização de Fernanda Ramos)
Nos meus 60, no preciso dia (um domingo), era Marshall da parada do Dia nacional em Newark - mas sem que dessem pela coincidência... Aos 69, em Espinho,  no fim de um concerto de música de Fausto Neves, não escapei aos "parabéns a você"...

138 -2009/2011 -  Curta a passagem pela vereação da Câmara de Espinho (diferenças de geração), Sai um mês depois desse concerto, também a um ritmo de música alegre. O Executivo decidiu dar-me a medalha da cidade, a 16 desse mês. O filme projectado, como é da praxe, não foi nada do que é
costume. Em vez dos testemunhos de amigos, um série de fotos privadas, desde o berço, e de intervenções públicas na cidade. O efeito foi hilariante, com selecção do talentoso Filipe Couto (Espinho TV). Nunca vi coisa mais heterodoxa e divertida. Depois, para maior surpresa os amigos do BE apresentaram na Assembleia Municipal um voto de louvor, que foi aprovado por unanimidade.  foi
uma despedida, com singularidades -  até parecia um daqueles jogadores que saem antes do fim do jogo, para receberem os aplausos do público...

139 -2009 - Uma sorte o "timing" da minha chegada a esse executivo, em Novembro de 2009 - isto é, qd se avizinhava o centenário da República. Apesar de monárquica foi um ocasião de repensar Espinho, Portugal, o mundo, em inúmeros colóquios, expo's, tertúlias, saraus - uma festa permanente...  mais de 30 eventos em  12 meses, com participações sempre multipartidária.  Nesse aspecto muito surpreendente. Feminismo e mulheres republicanas no centro de muitos debates.Aliás, em Espinho só havia em preparação uma expo "rostos da República" para o 5 de Outubro. Claro que dei luz verde -  a isso, e a tudo o mais que estava em curso
no meu pelouro, onde havia gente de alta competência. (em Portugal há o gosto de romper com tudo o que vem de trás, uma das causa maiores do nosso atraso).

Mas não resisti a por uma condição: que houvesse também rostos femininos! O dr Bouçon aceitou o repto e, no final, em cerca de 70 biografias, havia 23 mulheres. Passei a dizer que era um expo que respeitava a lei das quotas à portuguesa...

140 - Do meu ponto de vista, faltavam dois nomes importantes da história do feminismo no nosso País : Carolina Michaelis de Vasconcelos e Maria Archer. Foram realizados os painéis de uma e outra, embora não constem do catálogo (que, por sinal, é muito bonito - mais um feliz design do Dr Tiago).
O certo é que como a exposição se pode facilmente seccionar, a parte respeitante às mulheres circulou muito mais do que o conjunto!
Esteve em Guimarães (por altura de um colóquio), em Brunoy (idem), em Puteaux (La Défense), em Lisboa (numa homenagem a Maria Archer, no Teatro da Trindade).  E aí está disponível para futuras iniciativas...

141 - As homenagens a mulheres estão a entrar nos costumes (e ainda bem...)
Há uns 4 ou 5 anos, a Associação dos Antigos Estudantes de Coimbra em Braga, que é presidida por uma senhora, organizou uma homenagem a 10 mulheres da Univ de Coimbra. Fui uma das 10 (para surpresa minha) e tive, como todas as outras, de dizer umas palavras a uma enorme e coimbrã audiência.
Só me lembro da frase com que encerrei, ou. se não da frase exacta, da ideia que a animava). Disse que, para mim, Coimbra não tinha mais encanto na hora da despedida, pela simples razão de que eu nunca me tinha despedido de Coimbra..

142 - Possivelmente já tinha esquecido esse happy end, se não mo tivessem há pouco recordado. Tal como andava esquecida uma confissão que um dia fiz ao Prof Amorim, (agora deputado do PSD) sobre as minhas viagens de juventude à Galiza e ao Alentejo. Primeiro à Galiza, que é mais perto, e que me desiludiu um pouco, porque não me parecia nada terra estrangeira (tudo era tão igual...), Anos mais tarde, já com 17 ou 18  anos (depois de ter viajado por França, Inglaterra e Marrocos...) a fascinação do Alentejo, que me parecia absolutamente exótico.
Encontrei na AR o Prof, ( gosto sempre muito dever e ouvir na TV, mas há muito não o encontrava), e ele falou-me logo nessa minha constatação de sabor regionalista, que ele já tem citado, quando trata a temática da regionalização... 

143 - 1991 RAS
O Luís, excelente fotógrafo de JNB, queixou-se de que eu lhe estragava metade das fotos, porque ficava de olhos fechados. Muito preocupada, passei a estar mais atenta aos cliques da máquina e algum tempo depois perguntei-lhe se tinha melhorado. Ele respondeu prontamente: Não- agora em metade das fotografias está de olhos fechados  e na outra metade de olhos arregalados.

144 - 1986
 CCP Toronto (América do Norte)
Mais uma reunião regional. Havia quem vaticinasse problemas, porque o Conselho italiano não fora autorizado em solo do Ontário, por ser  considerado um órgão político "estrangeiro"...
 Ora, o importante é diálogo e boa informação recíproca. Tony Ruprecht, o Ministro da imigração do Ontário, tornara-se um amigo, estivera em Portugal, conhecia os nossos projectos, sabia que o CCP era uma instituição constituída por dirigentes de assoc luso -canadianas (de direito canadiano) e, por isso, a nossa reunião teve o apoio e participação do próprio Tony, que ofereceu a todos os conselheiros um grande banquete de despedida. Melhor era impossível,,,
Nessa grande gala, com muitos convidados - salão cheio! -  falámos, o Ministro, eu, e, em representação do 1ª Ministro do Ontário, o Tony Reis, assessor para as questões étnicas, que era o meu primo Tó Mané , António Manuel Soares de Albergaria Reis, na encarnação portuguesa e Tony Reis no Canadá (não iria continuar por muito tempo, mas foi o 1º português dessa forma envolvido no governo da província).

145 -  Somos, o António Manuel e eu, os únicos descendentes do bisavó João Dias Moreira (homem com 2 metros de altura e, também, grande altura moral e empresarial - um mito na família ).
 Ele muito mais novo do que eu, porque o pai casou bem mais tarde do que o meu (eram primos e, mais do que primos, irmãos). É o ramo avintense da família.
Não poderia o Bisavô sonhar que os seus únicos herdeiros, em fins de sec XX, estariam juntos em Toronto, um representando o governo de Portugal e outro o governo do Canada. Coisas que a  emigração engendra...

146 - Nessa altura, em Toronto, a única polémica que houve constituiu mais um capítulo das guerras das bandeiras... Mota Amaral estava de visita e o hotel onde se hospedava decidira hastear a bandeira dos Açores. Nada que me incomodasse. Gosto das Autonomias (mais do que de Mota Amaral pessoalmente) e não via a soberania em risco lá por estarem esvoaçando na bandeira azul e branca os açores de asas abertas...
Até convidei Mota Amaral para discursar na reunião do CCP - já não me lembro nem da sua nem da minha intervenção, mas sei que não houve discórdia. Era cônsul o meu amigo António Tânger.

147 - Amigo mesmo! Conheci-o no governo AD. Era um muito jovem diplomata, que assessorava o MNE Freitas do Amaral. Frontal e divertido, como não havia outro.
Vi-o uma vez num comício na Alameda empoleirado no alto de um poste de electricidade (nem queria acreditar - olhei porque temia que o rapaz caísse). Tornei o olhar e reconheci-o...

148 - 1980 - Gostava imenso daquele diplomata diferente dos outros. Quando Balsemão, que tutelava a Comissão da igualdade, me convidou para chefiar a Delegação Portuguesa à meia década da ONU para a Mulher, pedi ao MNE para Tânger me acompanhar. Não levei mais ninguém. O resto da delegação vinha da Comissão para a Igualdade - várias mulheres, entre elas Leonor Beleza, jovem técnica.
Fiquei de um dia para o outro, discursei e regressei, pois havia muito trabalho no Gabinete,
Tânger tomou  a chefia da delegação e iniciou, de motu proprio, negociações com os PALOPS para uma declaração conjunta sobre a inclusão do português como língua oficial nas conferências da ONU. O Brasil não aderiu - na altura, o diálogo com as ex-colónias parecia votado ao insucesso. Mas o charme de Tânger ultrapassou todos os obstáculos, a Brasil assinou à última hora e a declaração foi entregue. Histórica!

149 - Balsemão convidou-me para almoçar no dia em que manifestou o interesse em que fosse eu a chefiar essa Delegação, mas só me deu um conselho: "Não exceda o tempo de intervenção"
Fiquei muito admirada - para mim isso era mais do que óbvio.

150 -  1995, Apresentação dos cabeças de lista no Convento dos Capuchos. 
Não sei quem teve a ideia de pôr todos a falar um escasso minuto. Achei que iam todos ultrapassar o tempo curto, mas não - isso só aconteceu por excepção. Eu cumpri, como a maioria e isso apesar de percalço acontecido mal cheguei  ao palco: saltou-me e correu metros de palco um dos enormes botões de metal do meu "robe-manteau".. Em frente a uma bateria de fotógrafos e Câmaras de TV, para além dos presente na sala cheia, mantive a calma e a serenidade. 
Passei o resto da tarde com a mão esquerda a tapar o buraco  aberto no vestido. Ainda por cima,  tive de posar para os fotógrafos, ao lado de Fº Nogueira e Roberto Leal...
Entretanto, pedira a um dos funcionários do PSD para  procurar no palco o botão extraviado - que me foi discretamente restituido...


151 -1980 
 Nem sempre é fácil executar novos programas com antigos funcionários - sem que isso signifique o propósito de não colaborar da parte deles ou de não querer a colaboração da parte dos políticos, Adepta da continuidade das pessoas e do aproveitamento máximo do que vem de trás, sem deixar de inovar, tive essa experiência na SEECP, com os dois mais altos responsáveis, o DGE (Cassola Ribeiro) e o Presidente do Instituto de emigração (Gil Pereira).
Ambos deixaram os cargos, ao fim de poucas semanas - ambos viriam a ser, ao longo dos anos, dois esplêndidos e lealíssimos colaboradores, em outras funções. O Dr Cassola foi incentivado a publicar e publicou, pelo menos, 3 valiosos livros, dois sobre políticas de emigração e um outro dobre histórias da emigração portuguesa dos anos 60, que ele viveu como Inspector da Junta ( "Sinais exteriores de riqueza" - uma obra prima!) .
Gil Pereira foi, por exemplo, Secretário- Geral do CCP.
Espero que se tenham sentido apreciados e prestigiados, como tentei que fossem, porque mereciam.

152 -Anos 80 
O Dr Cassola era do PS. O Dr Gil não tinha qualquer filiação partidária. Quando ambos renunciaram ao cargo de chefia só o socialista mereceu referência nos media afectos ao PS (Portugal Hoje, por ex). Eu não respondi, mas respondeu ele, espontâneamente, contando a verdade e desmentindo formalmente a notícia -  a iniciativa da saída fora sua, não era vítima de nenhuma pressão ou perseguição. Não pude deixar de lhe agradecer e de lhe ficar reconhecida. Um Homem de carácter e de coragem. Admirava-o imenso. O ar austero com que enfrentava o mundo - e os governantes da República, na primeira impressão -  não fazia antever o especial sentido de humor, que tanta graça e leveza dava aos seus escritos.
Ri-me imenso quando ele, no 1º  CCP, que assessora, tal como a Rita Gomes, disse à colega (que com o seu perfeccionismo, nunca mais acabava a parte que lhe cabia no relatório): A Rita é uma daquelas pessoas que para contar um rebanho, começa por contar as patas e, depois. divide por quatro"..
Por sinal eram ambos alentejanos, mas com feitios tão diferentes! E ambos dinâmicos...

153 -  Nas obras de carácter científico e doutrinal o Dr. Cassola nunca se eximiu de criticar alguns aspectos da evolução das políticas, que lhe mereciam reparo. O que eu achava normal. Corajoso, também (não conhecia a palavra "subserviência", graças a Deus).
Fui criticada por permitir essas discordâncias pontuais em obras editadas pela SEECP. Não me incomodei nada com essas opiniões. Os livros são importantes para o estudo de uma época. Não ficaram na gaveta aonde estavam! 
Bizarra ideia, essa de que os governos só podem pagar propaganda...

154 - Dezenas de publicações da SEE  - através do Centro de Estudos. Pena não ter tido continuação...
Gil Pereira também era um homem culto e escrevia bem. Mas só publicou um estudo sobre o associativismo português em França - não a temática ideal para revelar os dotes literários.

155 - Apreciava muito o talento de ambos, mas não  foram nunca os meus "ghost writers" (salvo uma vez, o Dr G P, numa altura em que estava  em viagem e me pediram um depoimento  urgentíssimo). O depoimento foi altamente apreciado, mas eu senti-me embaraçada, porque não era aquela, de todo, a minha forma de escrever.
O meu único "ghost writer" foi o Carlos Branco. Discutíamos o teor das considerações, das mensagens. Se estávamos de acordo, ele redigia. Se não, redigia eu. Nas questões femininas era eu mesma, quase sempre. Nas outras ele era totalmente "reliable". E escrevia melhor do que eu o que eu, realmente, pensava!

156 . Fui a "ghost writer"  de um dos meus assessores - para os comunicados de imprensa. Ele trabalhava bem, mas escrever não era o seu forte...
E Carlos Branco não escrevia para os outros assessores. (nem isso lhe foi nunca pedido)

157 - Excelente assessor de imprensa (e bom a escrever, claro) foi o dr Marques de Freitas. O que eu aprendi com ele!
De princípio, teimava em fazer como eu queria, mas acabei desistindo, porque ele tinha sempre razão.

158 - 1984?
Cedo aprendi a viajar barato - nas melhores tarifas, com agências sérias e competentes (ultimamente com o sr Martinho - um génio!)
Um dia, durante o governo do BC, tive de ser a interlocutora de um desconhecido, de uma Agência que trabalhava com os serviços do MNE, para marcar uma viagem em que a acompanhante ía em classe económica (com  algumas restrições, de voos e companhias, naturalmente).
"Marque primeiro a viagem dela e depois a minha, que não tem restrições" - disse-lhe
Ele respondeu que era justamente isso que andava a propor, mas os serviços entendiam que a minha viagem devia ser marcada primeiramente... como se a lógica da coisa fosse a protocolar...
Enfim, o problema resolveu-se logo.

159 -1984?
 A muitas aprendizagens obriga a política. Um dia, em Ovar, quando esperávamos o Prof Mota Pinto, vieram comunicar-me que ele não poderia chegar ao início, pelo que tinha de o substituir (ele era Vice Primeiro Ministro e Ministro da Defesa). Primeiro acto: passar revista ao corpo de bombeiros, perfilados na parada. Não houve tempo para perguntar detalhes sobre o protocolo. Procurei lembrar-me de imagens da televisão - muitas, mas a que nunca tinha dado a devida atenção.
 Avancei em passo seguro, seguida pelo comandante dos bombeiros. A certa altura, vi a sua mão enluvada de branco, a fazer-me um sinal, à minha esquerda. que interpretei como instrução para me aproximar da formação - o que fiz, prosseguindo a marcha. Ora o que ele queria era que terminasse ali mesmo a revista, porque a formação seguinte era a charanga...
Passei revista à charanga! Não era suposto, mas um amigo militar a quem contei o episódio, riu-se e disse que até achava bem - foi um prestígio para os músicos...
Mas a ordália não estava terminada. No final o comandante disse-me de viva voz (baixinho) para "saudar a bandeira". E eu aflita: continência? (achava que não, mas nunca se sabe...)
"Apenas uma vénia", esclareceu. Essa parte correu muito bem.
Depois, o colóquio, igualmente.
De insólito só me recordo de um jornalista ter comentado, quando já estávamos em conversa informal
"A Srª Drª tem um discurso de quem não está no governo".
Achei imensa graça. E, de facto, as minhas sintonias vão mais para soc civil do que para o Estado...

160 -  Episódios da mesma espécie nas entregas de condecorações, durante a Dia das Forças Armadas. O 1º susto aconteceu no Porto. Lá estava eu, como VP da AR, em representação do PAR, agradavelmente sentada entre O PR Soares e o 1º Mº Cavaco, depois do PR ter imposto a primeira condecoração, quando ouço mais ou menos isto: "Vai entregar a condecoração a X...  a Senhora Vice - Presidente da AR Manuela Aguiar".
Nem pensar em pedir apoio a Cavaco... Virei-me logo para o Dr Soares e para a sua compreensão das falhas dos outros:  "E agora, o que faço"
"Faça como eu, há pouco"
"Não reparei bem..."
E ele, rápido: "Coloque do lado esqª, à altura do coração".
Foi fácil - ninguém notou a hesitação, cheguei a tempo e determinada...
O pior foi a entrega de condecorações no ano seguinte (em Braga). Caiu-me em sorte um oficial da Marinha e as belas fardas brancas têm, no preciso sítio, à esqª, sobre o coração, um rectângulo esponjoso, para receber outro tipo de emblemas, com certeza. Espetar uma medalha com "ganchos" muito compridos naquele material é obra!!!
Tinha dois receios: ou trespassar o coração do  marinheiro ou deixar os ganchos meio soltos, com o perigo da medalha cair ao chão - qual dos horrores o maior! Por fim. consegui...
No dia seguinte uma simpática funcionária da AR disse-me: "Então, ontem, foi difícil colocar a condecoração na farda do Marinheiro?"
"Foi - confessei - as fardas da Marinha são muito mais couraçadas do que as dos outros ramos das Forças Armadas. Mas como soube?"
"Ele é o meu marido|"

161 - 1981
1º Congresso das Comunidades Portuguesas, no Hotel que fica ali mesmo ao lado da Univ Católica (mudou de nome já várias vezes)
O PR Eanes fez-se substituir por Victor Alves. Alguns congressistas não gostaram. A sessão começou à bofetada, ainda nas escadas do hotel. Queriam que eu saísse da sala, para escapar aos tumultos. Nem morta sairia! Não que achasse bem, mas era um espectáculo imperdível,,, A televisão captava as cenas e as expressões, mas não era a mesma coisa

162 -  As interpretações do Prof M Pinto e de minha Mãe sobre o que revelava a minha expressão facial. Quem acertou foi o Professor... Bom psicólogo...

163 -   1983 o cartaz de campanha do Prof M Pinto - bem .mas estático... Dei a minha opinião contra corrente,, Bem e true to life só achava o slogan: MP, a pessoa  que é bom conhecer de perto

164- 1983-85
Viagens com MP ao  Canadá (qd, estando com ele e Mº Fernanda, quase perdi o avião, porque a Mª Luísa se atrasou, com o meu bilhete de avião na carteira  - ou a atrasaram, uns "castiços" que a levaram a ver as Niagara Falls.
Toronto e Montreal: os contrastes, dentro de uma sempre boa org. À conversa pessoal com uma multidão de gente. Uns faziam fila para o Prof Mota Pinto, outros para a minha... O hino tocado pela Banda do DES, as fantásticas entrevistas. (dentro de Portugal nunca reconheceram suficientemente a sua qualidade, nunca a quiseram ver e ela nunca transpareceu porventura, da mesma forma, no mesmo grau).
San Jose:  o famoso "sermão", melhor do que o do padre, na Igreja das 5 chagas....
SF:  pier 39, o jantar, os divertidos militares que me acompanharam na excursão a Castro....
Ria de Aveiro- qd desvendei a identidade dos cronistas inimigos...
Regressamos à Europa num DC10 canadiano. No take-off, ele perguntou-me qual era o tipo de avião em que estávamos. E eu respondi: "Um DC10, daqueles que costumam explodir ao levantar"(era nestas ocasiões que o Prof, exclamava, simplesmente: Oh, Manuela! Oh Manuela!


165 - 1980 O almoço na residência do Cônsul de JNB em que conheci joe Berardo. Alguns 
anos depois, por puro acaso, coube-me a missão de lhe impor a condecoração (num 10 de Junho).


166  - Aquele Congresso das Comunidades estava votado ao desastre global desde a 1ª hora - com um PSD chamado António Cabecinha no comando. Eu optei por não dizer uma só palavra, que, às vezes, é a maneira de falar mais alto. De resto, era bom não retirar a palavra aos emigrantes, que, por rateio tinham direito a 90 segundos" per capite". Uma loucura! Alguns limitavam-se a um "hello". Outros, se bem me lembram pediam minutos emprestados aos amigos, que aceitavam sair calados (como eu...)  Deprimente!
Comigo, a guerrilha vinha dos primórdios... Rosado Fernandes e Cabecinha uma estranha dupla Graças a Deus nunca mais vi o Cabecinha, e com o Prof Rosado F vim a ter uma pacífica convivência na AR, É até um homem divertido, para além de ser culto, mas no Congresso foi secundarizado pelo second in comand.
Uma das poucas vantagens daquele jogo dos disparates foi valorizar ex post o diálogo que, apesar de afrontamentos políticos, houvera no CCP, reunido dois meses antes (em Lisboa, no Palácio Foz), Com a minha presidência, coadjuvada por gente sensata...
Apesar de tudo, os bastidores do Congresso deram para contactos interessantes, ou mesmo importantes. 

166 - A conferência comemorativa dos 250º aniv da criação do MNE (com outra designação, juntando as relações exteriores e a guerra)
A conferência de Vasco Pulido Valente foi mais guerra do que diplomacia. Do alto da mesa de honra, onde era apenas figura decorativa, tinha a visão ideal das reacções do público. Foi espantoso,, sobretudo para quem, como eu,  acha  VPV um génio (com génio, mas tudo menos diplomata). Na 1º fila, sereno e confortável perante o discurso, Sá Machado. 
Quando uns dias depois, em conversa com ele, lhe disse que era a única pessoas bem disposta naquela audiência, ele rectificou:
"Bem dispostos estávamos dois, a Manuela e eu" 

167 - Muitos diplomatas actuais não mereciam a zurzidela geral de VPV. Mas um Walter Rosa a difundir no cocktail para o corpo diplomático , a 10 de Junho de 1980, o discurso do PR, num gravador de baixa gama, cheio de ruídos e intermitências, estava mesmo a reclamar as diatribes de VPV!
E um outro que no Brasil se queixava publicamente (fê-lo na Tv brasileira diante de mim!) de ganhar muito mal. Qd contei esse episódio ao MNE Jaime Gama, ele indignou-se: É o Emb de Portugal mais bem pago no mundo! (na altura ainda a vida em Brasília era barata).
E o outro, muito simpático, por sinal, que se opunha ao envio das exposições que a SECP tinha em circulação (uma de artesanato de qualidade -  com colchas de Castelo Branco e tudo! - e outra de serigrafias da Cooperativa Árvore). Foi um diálogo de surdos. Para o Emb aquela comunidade era particularmente rude e desinteressada. As outras podia conhecer eu, aquela conhecia ele. Por fim, informei-o de que as exposições também iriam àquela capital, porque eu assim tinha decidido. Ponto final. E rematei: "Recuso-me a encarar o meu trabalho nas comunidades como o pique-nique dos parolos"
E, por sinal, quem teve razão fui eu - as expo's foram um sucesso naquele País!

168 -  E qd me depositavam num hotel, para me repousar em pleno dia? Não fico em quarto de hotel de dia, excepto para ver um jogo de futebol, ou as olimpíadas...
Em Harare, de uma das vezes, o Emb recomendou que não saísse à rua, porque era muito perigoso (não se via um branco no centro da cidade, explicou). Mas eu quis saber ao certo de que perigo falava: "Matam?"
Ficou chocado: "Não, não matam, mas roubam"
Eu vinha de JNB, na altura epicentro de violência. Daí a pergunta. O roubo não me assustava nada . Mal o Emb virou costas, eu fui mesmo para a rua. Na verdade, os brancos não abundavam, Mas ninguém me incomodou. Comprei t-shirts, bananas a vendedores ambulantes... foi agradável.
Idêntica recomendação, muitas vezes, em São Paulo, no Rio... Nunca me abstive de andar na rua, com ar de quem pertence à cidade, e nunca fui incomodada...
Idem em S Petersburgo, onde usei o metro, constantemente. Parece que consideram cidade perigosa para estrangeiros, Não sei. Sei que o segredo para escapar incólume é não parecer estrangeiro. Em S Petersburgo, em 2 dias apenas, 3 ou 4 russas (sempre mulheres) vieram pedir-me informações.
Devo ter um ar credivelmente eslavo. E a indumentária não me distinguia das locais. Mas tinha de  lhes responder: Sorry, I can't speak russian"


169 - Susto só em Brasília qd o nosso Deputado Lourenço (nascido em Portugal!) me levou para dentro do hemiciclo, em plena sessão, e insistiu em interromper o orador, com quem tinha um passado de desavenças, para me apresentar. 
Para já, em Lx, ninguém entra no hemiciclo, os visitantes são recebidos nos camarotes.Assim, por uma questão "cultural", sentia-me uma intrusa... E, depois, estava à espera de me ver no centro de uma azeda discussão parlamentar. Mas não! Foram todos muito simpáticos ,O orador interrompido fez suas as palavras de Lourenço, para me elogiar, como grande amiga do Brasil.

170 - Simpático também Chávez, na sua visita ao hemiciclo (vazio) da AR. Eu era a única deputada, e estava lá, não porque, à data, pertencesse à Mesa da AR, mas porque me pediram para substituir alguém do PSD. Lembraram-se da deputada da emigração e Chávez  desfez-se em elogios aos nossos compatriotas, alguns dos quais gostarão dele, mas, certamente, não a maioria....

171 - São encontros breves, mas deixam-nos um determinada ideia das personalidades.
Simpático, numa versão trista, o Príncipe Bernardo da Holanda, que me coube acompanhar no cortejo até ao salão nobre e na volta - falamos de ambiente, era um dos seus temas. A Rainha era um encanto, cheia de vivacidade e de interesse pelas pessoas, pelas particularidades do sistema politico, Tínhamos sido industriados para evitar comentários políticos. Comentar, não comentamos... mas respondemos a muitas perguntas de Sua Majestade.  Não parava de disparar perguntas, à cada interlocutor que se lh e apresentava. Nós, os da Mesa da AR, ali estacionados, bem perto, pudemos testemunhar o desenrolar da conversa, no bom aproveitamento do um a um... disseram-me que a Raínha queria um debate com deputados, mas não lhe fizera, a vontade e aquele foi o processo que encontrou de chegar ao resultado.
Voltaria a vê-la no hemiciclo de Estrasburgo, onde Monarcas ou republicanos eleitos são recebidos da mesma maneira (não entre nós: na sala de sessões, só os eleitos, os outros no Senado - uma excepção apenas para Don Juan Carlos, que, aliás, até falou em bom Português). Mas aí, de longe, e vestida de uma forma extraordinária, a meio caminho entre uma soberana vestida para séculos recuados e para o nosso, numa indumentária solene...

172 -  A visita do PR da Índia. Na mesa do salão, colocados os presentes que seríam trocados. Um vistoso elefante cinza , recamado de pedrarias coloridas (coisa grandiosa) e. a seu lado, um simples livro, embrulhado sem espavento, Comentário ácido do PR Soares sobre o presente da AR...Eu não podia reclamar, Crespo ficaria irritado, mas podia transmitir ao chefe de gabinete o àparte presidencial. Agiu de imediato. No minuto seguinte um contínuo fardado de gala depositou um enorme jarrão da VA, ao lado do elefante, ganhando, pelo menos, na altura.. "Que bonito" - espontâea reacção do PR indiano ao ver o jarrão.
Pasmei com tão afortunada decisão, não sabia que a AR adquirira, finalmente, um stock de ofertas decentes.
Mas não! Era apenas um dos jarrões da casa, ao qual deram uma espanadela rápida, depois de terem despejado a areia do seu interior. 

173 -  Margarida Serra e Moura e o Rei Juan Carlos (viagem no interior da AR, com mostra do retrato de Dom Manuel II...) para o acompanhar à casa de banho dos homens (não seria mais "cozy" a do gabinete do PAR Crespo?
O sentido de humor da Margarida valorizava muito o relato do episódio...

174 -   En attendant Godinho, foi o que me saíu. Mas por pouco tempo, felizmente. (na transição do 1º para o 2º provedor, antes que este, sentindo talvez alguma latente hostilidade. Em breve seria o nosso bem-amado

175 - Almoço com Mário Neves e dr Godinho
Insisti em pagar e paguei. (é a 1ª vez na minha vida que uma senhora me paga um almoço). Ficaram desconfortáveis. Questão de género e de geração...

176 - Um dos versos divertidos do Dr Godinho (poeta repentista!) para mim (houve-os para todos)

Se a querem ver satisfeita
E com um ar prazenteiro
É darem vivas ao Porto
E ao Dr Sá Carneiro
)

177 -  Só eu discutia política com o PJ - da discordância à amizade, que não olha a essas questões...
Ele Soarista, eu Sá Carneirista... qt histórias da História. memória viva da 1ª República
 Fui eu que disse umas palavras, simples, de improviso, pela sua morte (na AR).

178 -  A ida para o SPJ com o Coronel Costa Bráz.
não esperava que eu gostasse das tarefas, mas gostei. Resolvia os processos, em bom tempo. Às 6.00 da tarde, sessão de cinema quase quotidiana... Dou-me bem com as rotinas agradáveis,,,

179
 Casos memoráveis: a pensão do ex.PIDE (que Luís da Siveira referiu no seu recente jantar de homenagem)
A inconstitucionalidade  da rejeição do serviço militar para mulheres ( a cabo da F Aérea)

 - Já no governo, o convívio com o ex Provedor e os colegas,

180
A bibliotecária de roxo
OIT explic de inglês (econ...

181 . Cabral Basto e o elogio lisboeta; "A Manuela nem parece de Coimbra"
Eu adoro Coimbra, mas percebi a magnitude do elogio, para alguém como ele. Um bom amigo,(herdou o meu artº sobre o corporativismo - uma libertação...)

182 -No Centro de Estudos havia um vasto leque partidária, como se viu depois de 74;
 CDS (N Brito, que foi Sec de Estado,  deputado - e que dizia, no gab de Cortez Pinto que as casas do povo tinham sido criadas à bofetada),  PSD (Rui Machete, que já lá não estava, Sérvulo, ambos membros de governos, eu própria, também) PS (Monteiro Fernandes, Sec Estado, Santos Ferreira, que esteve à frente da CGD e do BCP)
Sem partidos, mas com quadrante ideológico . Cortez Pinto e Geraldes Cardoso (que foi director do SNI, ambos do regime: Silva Leal, centro esquerda, sem partido, Bernardo Lobo Xavier, monárquico, conservador, Fernanda e Branca, centristas, - a Branca mais à direita -   o Eduardo Costa, suponho que da área do Bloco Central, o Luís Galvão Telles mais à esquerda. Carlos Branco, Nuno Cabral Basto, mais dados à filosofia do que a alinhamentos partidários - nem sei como os situar ao certo., mas esquerda não eram.

183 - 
Partilhei o gabinete do 1º andar da Praça de Londres com o Cabral Basto e, qd ele saiu para administração de uma empresa (antecessora da Galp),  com o C Branco, 
Ele debatia comigo os seus escritos do momento - em discurso caudaloso. Mais monólogo, muitas das vezes...

184 - 
Depois de 74, cada um de nós seguiu o seu curso, com o fim do Centro.
 Ao Carlos Branco fui eu buscá-lo a uma "prateleira". onde estava a ser desperdiçado (quadro geral de adidos, ou nome semelhante...). Uma sorte. Um assessor mais do que qualificado em domínios múltiplos, filosofia, sociologia, planeamento, gestão, finanças, direito do trabalho... E o meu precioso e único "ghost writer". Muito impaciente com as minhas pressas e impaciências... "Lá vem a Catarina de todas as Rússias ". Eu detestava a comparação - muito descabida!
Fiz no antigo Centro o "braindrain" possível - a Fernanda Agria, requisitada, a Branca . em comissão. o Eduardo, em voluntariado no CCP (tinha regressado milionário da emigração na Amazónia, não precisava de cachet...

185 - 
 Deste Centro de Estudos se dizia que era um "alfobre" de futuros directores.- gerais (frase do tio Manuel, qd soube do meu ingresso . mas eu nunca acreditei que fosse o meu caso...). Na verdade.. a profecia só não se realizou completamente porque quase todos vieram a ser mais do que isso, na política.
Foi-o o Geraldes Cardoso, de outras entidades públicas o Santos Ferreira. a Branca Amaral (equiparada, como Chefe de gabinete ministerial_), a Fª Agria (Sec Geral do CCP). Eduardo Costa (Banco de Fomento), houve os que permaneceram na carreira de investigação (Bernardo, Carlos Branco). ou seguiram a advocacia /Sáragga)  ou a vocação das Artes (LG Telles)
No governo, Machete, Sérvulo, Monteiro Fernandes, eu mesma...

186
Nestes centros de investigação, que todos os ministérios deviam ainda manter (para não recorrerem a "out sorcing"), só se entrava com média de 16 de licenciatura. A margem de manobra para promover amigos ficava bastante reduzida...
Primeiro acedíamos ao quadro de "auditores"  e só qd abria vaga éramos promovidos a "assistentes". Em regra, por antiguidade. no meu caso o Directo  Cortez  Pinto enganou-se e propôs-me antes do Eduardo. Abri logo o caminho à rectificação, mas vagou outro lugar e não foi precisa a rectificação..
Depois, não havia mais promoções, mais competitividade... o que muito facilitava as excelentes relações entre todos.

187
Não tínhamos horários - eu gosto de trabalhar concentrada - em minha casa de preferência, ou num café, à maneira de Coimbra. ..Os gabinetes do ministério eram para conviver, trocar impressões, trazer e levar papéis...
 No SPJ era quase a mesma coisa. Cada um tinha o seu pelouro, não queria os dos outros, e menos ainda, o lugar de coordenador, que era muito burocrático.,  Uma família feliz, sobretudo no tempo do encantador dr J Magalhães Godinho... Aí, redigia minutas de ofícios, mas os pareceres mais desenvolvidos continuavam a ser feitos em casa - às vezes na varanda, com uma cafeteira eléctrica de café e a companhia da minha "serra de Aires" Endora. ( a incrivel Endora, devorada de cantos de móveis e cadeiras. com a sua irrequietude e o seu altíssimo QI  - a menina querida da Maria Póvoas.
  Até dormia no quarto da Maria, mas qd trovejava, vinha apavorada ter comigo e só acalmava se a pegasse ao colo. Uma cadela enorme, que nem cabia no colo! 

188
  Sempre perigoso classificar politicamente colegas, que não se "acusam"... aconteceu-me no SPJ. 
Havia um que era PCP assumido e eu que era assumidamente Sá Carneirista,  tal como as duas secretárias do dr Godinho, a Mª da Luz e a Ana Maria  (ele socialista não levou "camaradas" para o gabinete...).
 Os  outros não andavam pelos corredores a anunciar o seu partido.  Havia, por exemplo o Caupers, que eu achava progressista e não me terei enganado), e o  Manuel Marcelino, que me parecia CDS. Não por isso, mas por ser grande especialista de Direito Administrativo, foi o que eu convidei para Chefe de gabinete no MT, em 78. Só vim a descobrir que ele era socialista, quando em 1980 lhe pedi que voltasse às mesmas funções, comigo, na SEECP . Disse-me que não podia, porque era anti-AD. No governo Mota Pinto não tinha tido problemas - era um gov de independentes e ele grande admirador do Prof . que lhe tinha dado Teoria Geral. Mas AD, não!
 Compreendi perfeitamente, mas fiquei surpreendida! E com muita pena, porque ele foi um fantástico chefe de gabinete  - sem ele teria vivido em stress permanente naqueles agitados 9 meses. Assim, não, bastava ele dizer-me : "podes assinar, eu li várias vezes",  que eu nem hesitava. Lia por alto e assinava por baixo... Não lhe escapava nada. Era sábio, atento aos menores detalhes, e honestíssimo, Por isso eu afirmei, no 1º encontro com Sá Carneiro que fora fácil ser SET  - para grande espanto dele...


189
Já que o Marcelino não integrava a equipa, convidei a mulher, a Graça (casais num gabinete é complicado...).  Ela era UEDS, mas não se importou de trabalhar para o gabinete AD . e, chegada às eleições, sem que ninguém a tentasse converter (era o que faltava!), confessou que deu o voto àquele governo, porque o achou competente, Depois, não sei mais que escolhas fez... 
De  princípio, gozei com ela: "Acabo de saber que a Graça é uma esquerdista!"
Ficou indignada: Quem  é que disse isso?"
E eu, prontamente: "Foi o seu marido"
De novo, muito irritada: "Esquerdista? Que ideia! Eu até votei UEDS"
Bem, em Economia, onde ela estava a terminar o curso, a UEDS era possivelmente a direita. É tudo relativo,,,

190 .  O colóquio na London School of Economics .  Doutor SLeal, Adelina SC, Bernardo LX . o episódio das escadas do metro...


191 -  Os primeiros gabinetes foram excepcionais;

No MT um equipa reduzida, de uma capacidade de tº incrivel . 
Chefe Gab M Marcelino (especialista em Dº Admin)
Adjuntos Fª Agria e um velho senhor, em part time (porque estava doente, mas dava óptimos pareceres) Eram ambos "da casa", especialistas em Dº do Tº. 
Secretárias: Mº Lurdes Escudeiro (Milú) e Ana Pinto de Sousa (ambas diplomadas pelo ISLA)
(agora, muitos gabinetes cheios de assessores fazem bem menos...)

Na SEECP
Chefe Gab Luís Garcez Palha (ex inspector.geral do Tº)
Adjuntos Gonçalves Pedro (diplomata) e Milú 
Secretárias: Mª Luísa Ribeiro Ferreira a Graça Marcelino 

192 -  Mª Luísa. mulher do Conselheiro da Revolução. Nos banquetes, ficava sempre no topo hierárquico das mesas. Eu acenava.lhe, lá de baixo. Achávamos a situação muito divertida.
Que choque, qd, anos depois, na AR, perguntei ao marido se ela estava bem e, el, mal escondendo a emoção, me disse que ela tinha morrido.
(fazia-me  lembrar a prima Cristina - pelo feitio e até fisicamente, morena e bonita, sempre bem-disposta)

193 - 
Os motoristas foram escolha mais problemática. Há uma longa sucessão, a que perdi a conta... Coisa difícil, encontrar um com todas as qualidades requeridas. O 1º, que não durou muito, começou com esta pergunta: "Como é que vossa excelência deseja ser tratada, por Senhor Secretário de Estado ou por Senhora Doutora?"
E eu, sem hesitação: "Senhora Doutora!"
(A lenda negra dos motoristas continua no MNE. Ainda há dias mo disse o Fº Castro Brandão, dando-me, aliás, toda a razão...).

194 - 
O masculino do cargo era coisa, ao tempo, muito discutida. Lembro-me do Bernardo ser um dos acérrimos defensores do "Senhora Secretário de Estado", ou "Senhora Ministro" (eu discordava, é claro...)
O motorista limitou.se a manter a concordância...

195 -
Então havia poucas mulheres no governo...A minha nomeação para a Sec Estado do Trabalho levou o Marcelo R de Sousa a dedicar-me um editorial do Expresso... (elogiando Mota Pinto pela decisão)

196
A Ana P S vinha do governo anterior, supostamente PCP. Quiseram que a despedisse. Não despedi.
Foi-me dito pelo Mº:"se houver fugas de informação é do seu gabinete" Os nossos são de confiança".
E eu: "com certeza, não há problema! Se houver fuga, é do meu gabinete. Ela fica".
Ai, se soubessem que, como funcionária da Presidência do Conselho de Ministros,a Ana tinha sido intérprete de Vasco Gonçalves!!!
O que ríamos no meu gabinete, a imaginar a cara deles, se eu lhes dessa essa informação. À cautela, não dei, para evitar crises cardíacas...

197
 Nomeações de Directores-gerais badaladas: Ela só nomeia directores.gerais com mais de 1,80m
Coincidências - eles eram o Garcez Palha e o Joaquim Fernandes Marques
Ao Garcez Palha o meu ex-colega Nuno, disse, um dia, que achava que estranhava que MP tivesse convidado  uma "comuna" para o MT. G Palha, para nos divertirmos, insistiu que eu o interpelasse sobre isso, para o ouvirmos responder, pois ele tem sempre resposta. Eu interpelei, num acto de posse de dezenas de funcionários - entre eles, o Nuno. Foi cómico, mas ele ficou atrapalhado... Por mim, sabia que tinha essa fama, pelo menos para quem estava no quadrante da direita. Lá estáva nova prova da relatividade destas coisas...



198

De facto! Lembro una conversa com o Doutor Pinto Coelho do Amaral - marido da Branca Amaral - 
"Nós, os de direita...".  Atalhei de imediato: "Senhor doutor, eu nunca fui de direita!
E ele: "É tudo relativo. Agora é!
Estávamos em 75 - à medida que o país guinava á esqª,  eu inclinava-me mais à dª.  Tinha razão,  o Doutor Amaral, embora fosse bem mais à direita do que eu... Um homem muito inteligente e muito mordaz, gostava imenso dele!
Foi assistente de Fiscal em Coimbra mas, nessa altura,já só  ensinava em Lisboa. No IES, onde o meu pai foi seu aluno no curso de Política Social, Encontrei-o num dia em que tinha ido saber a nota de um teste do Pai. Comentário dele: "Então agora é encarregada da educação do seu pai?".

199
A Branca estava feita uma contra-revolucionária - arrancava cartazes das paredes, provocava o povo em comícios da esquerda  e eu ao lado, sem fazer nada disso, arriscava as reacções. Como qd saímos do estádio 1 de maio, de táxi, apesar de ela morar a pouco mais de 100 m... Foi a salvação.
De outra vez, também perto do Estádio, mas num comício do PPD, apanhamos boleia de um camião de garagistas da Graça - e militantes de 1ª, todos empunhando grandes bandeiras laranja.
Comentava eu que devia ser interessante participar na marcha (lenta) do alto de um camião. E ela foi logo falar com um deles, que nos convidou a subir. Escalamos a  altura procurando apoio nos pneus, com a ajuda deles. O Doutor Amaral, que vinha também do comício, ficou a ver a cena de longe e voltou calmamente para casa. Não tinha perfil de viajante de camiões...
Nós as duas passamos uma noite cheia de alegria e de sustos. No fim da Av dos EUA, uns cidadãos de barras de ferro em punho,  amolgaram vários automóveis, mas não o nosso camião.  Mais vulnerável ficou ao apedrejamento dos participantes que saiam do comício do MES, no Campo Pequeno. A Branca e eu encostamos o mais possível à cabine fechada do camião, com as mãaos a proteger a cabeça. Pelo contrário, a mãe dos camionistas e os filhos foram à luta, tentando devolver as pedradas. Mas, pelo menos, ali ninguém ficou ferido... Dissemos adeus àqueles companheiros qd soaram as badaladas da meia noite - era fim de campanha, já não iríamos a tempo para ouvir os discursos do Parque Eduardo VII (uma desorganização, com centenas de militantes do PPD, como nós, retidos num trânsito infernal).
Cad qual tomou o seu táxi e. depois, como sempre fazíamos, nestas aventuras ligeiramente perigosas, telefonávamos uma à outra. Nessa noite a Branca bradava: "Viu o exemplo da Mãe dos camionistas? Há que imitá~la. A burguesia tem de perder o medo!".
Ri-me imenso... medo é palavra que eu não associo à Branca... as pedradas eram de evitar mesmo.

200
Inesquecível aquele velhinho que, nessa noite, ouvimos a dizer, à saída do Estádio: "Grande partido este. Tenho a certeza de que o Salazar, se fosse vivo, era do PPD"
Eu nem queria acreditar. Olhei a ver se ele tinha a intenção de provocar. Não tinha! Era genuíno. Ainda bem que o Dr Sá carneiro não estava ali para ouvir semelhante tirada.



201 - O inesperado na minha vida
(acontece a quem navega à bolina, como os antigos portugueses) A quem não procura  nada, ou, pelo menos, nada do que lhe é proposto. Enqt tive um projecto (de estudo, por exemplo), as coisas correram sem surpresas. Mas isso foi na infância, na adolescência. Até acabar o curso de Direito, a 2 de Nov de 1965. 15 meses depois, com o primeiro emprego, atingia outro objectivo - um lugar de assistente num Centro de Estudos onde éramos todos iguais, não havia promoções, nem competição, nem exames, provas de doutoramento, de agregação, e por aí adiante. O paraíso terrestre dos empregos, com amáveis chefes e colegas inteligentes.

202 - Mesmo nesta fase do previsível, já alguns happenings...
- Prémio dos Rotários do Porto (jantar no grande Hotel do Porto, Diploma e... 500 escudos  - uma grande surpresa, porque o presidente tinha lamentado não poder oferece-nos uma recompensa material e só vi a vistosa nota qd abri o envelope, à saída, já na rua. mas ainda em conversa com colegas do prémio
( estranho o preconceito que havia contra os Rotários- a família não queria que eu aceitasse e os Rev Padres, que foram consultados, deram parecer negativo, mas eu não cedi e fui, acompanhada do Pai...)

- 1960  - Prémio nacional pelo Liceu Rainha Santa Isabel no final do curso complementar do liceu e convite para uma viagem a Marrocos (era o ano do centenário do Infante - o SNI organizou e todos os liceus mandaram o seu representante). Primeira experiência de voo, na TAP, naturalmente.

 - 20 a História, 19 a Filosofia e Organização Política (mas onde é que eu pude falhar, para perder um valor numa matéria tão simples?), dispensa a Latim (a mais inesperada) e a alemão. Só fiz oral a Português (outra surpresa, para quem tinha tido sempre notas altas a contrastar com o latim) e subi para 17.
Curioso, como estes pormenores não esqueceram...

 - Beneplácito paterno para passar o verão de 57 na Inglaterra. Primeiro duas ou três semanas no St Catherine's, um lar de freiras no centro de Londres, depois "au pair", a tomar conta de crianças de uma família de judeus ricos no sul do País (Brighton- Hove) durante dois meses.
 Parti de São Bento, na primeira quinzena de Junho, de mala e mochila (cheia de enormes pacotes de bolacha araruta) com a Margarida Losa, minha colega do 6º ano do liceu, filha de Ilse Losa. Ficamos dois dias em Paris, no Grand Hotel St Michel, (com a esperança. infelizmente frustrada, de ver ao fundo de um corredor o vulto de Maria Lamas. hóspede ilustre.  Atravessamos a Mancha de ferry e despedimo-nos à chegada a Londres. na praça de táxis. No início. ainda nos encontramos para umas idas ao cinema e ao teatro. Ela contou-me um história sobre a velhinha que a  hospedada (não me  lembro se também estava contratada,"au pair") e que se enfureceu. na sapataria onde comprava sapatos, qd a Margarida comentou que lhe ficavam muito bem: não lhe interessava nada a estética, só o conforto. Era outro mundo, outra cultura...
Regressei em finais de Setembro, sozinha e desembaraçada, de novo, via Paris.

203 - E o que me aconteceu nesses dois meses de imigrante sazonal!... Lidar com crianças - coisa nova. Cães e gatos, sempre fizeram parte do meu mundo. Podia considerar-me uma competência nesse campo. Ainda a Madalena e eu andávamos na escola primária e já tínhamos no curriculum o salvamento de uma ninhada inteira de gatinhos, que a mãe-gata não podia amamentar (ministrando-lhes, à colherada, uma mistura adequada de leite e água).
Crianças não havia. Na minha geração os mais novos faziam pequena diferença de mim e a futura geração de "sobrinhos" (primos -sobrinhos) ainda não tinha nascido.
O que podia ter sido um desastre correu, afinal, bastante bem. Eu não gostava muito das duas meninas, mas elas gostavam de mim. Lilian, a mais velha ia nos 5 anos, era demasiado viva e irrequieta, fazia imensas perguntas. O meu inglês era básico, melhorou bastante naquele período, obviamente, mas eu dizia sempre  que só sabia responder em português. Lilian não se importava: "say it in portuguese". E eu bradava: "Menina chata!  Cala-te por um bocadinho. És insuportável".  
Enfim,  este género de desabafo, que, para Lilian, era música celestial. Olhava-me com uma atenção afectuosíssima. Hoje, penso que ela se parecia comigo, qd da mesma idade. Até fisicamente, magrinha, cabelo castanho  claro com reflexos aloirados, muito lisos, para não dizer espetados. Sempre em movimento. Há quem aprecie o género - que exige energia para corresponder à energia...
Ruth, de 18 meses fazia um contraste enorme. Era uma linda menina de caracóis loiros e olhos azuis, muito calma, não questionava ninguém, praticamente ainda nem falava. Sempre contente, sentada na cadeira rolante em que a passeava e em que às vezes até a deixava sobre a areia da praia. A outra brincava, à vontade, com amigos da sua idade que abundavam ali, em Hove. Como não entrava nas ondas sem ser comigo, por medo, não havia risco. Quantas vezes passei as manhãs e ler livros de Agatha Christie, oferecidos pelos pais das meninas - sem me ralar nada com elas.  (O 1º policial que li, na íntegra, foi o delicioso "A body in the library").
Poucos anos depois, na meia década de sessenta, os meus numerosos pequenos primos,  conviveram com uma Manuela bem diferente, que os levava à praia, à piscina, ao cinema, ao circo. Fazia a festa com eles, em puro voluntariado - e era muito popular, com bom fundamento.
Com a Lilian também o era, mas sem semelhante mérito. Creio que despertava tão inesperadas reacções da sua parte, por ser o oposto das "nannies" suiças a que estava habituada. Impunha a disciplina, para infinito espanto dos pais, porque era inflexível - o que os adultos não costumem ser com as pequenas e astutas criaturas. Qd a prevenia de que não a levaria ao mar se não comesse a sopa toda cumpria a ameaça, por muitas lágrimas que ela, depois, nesse dia, vertesse sobre as areias da praia... Consequência: passou a comer a sopa e tudo o mais que estivesse na sua dieta.
O que a Lilian chorou na minha despedida!
Lembro-me bem dessa genuína manifestação de tristeza infantil. Depois, durante uns tempos, a mãe escrevia-me a contar que a Lilian falava muito de mim e andava a juntar "pennies" para me vir visitar o "Portuguese"  - que para ela, além da minha nacionalidade, era o nome do meu país. 
De qlq modo estava mais próxima da realidade do que a velhinha da casa ao lado, que todos os dias me perguntava se tinha recebido boas notícias da Irlanda. E todos os dias lhe respondia que era portuguesa, não irlandesa.
Nunca percebi a razão do engano, tanto mais que não podia fundar-se na minha pronúncia, nem, infelizmente, na minha fluência na língua inglesa, que, ao tempo, estava num mínimo pessoal. Só muito recentemente me ocorreu outra explicação - de origem religiosa. Era católica numa vizinhança judia. Católica ou irlandesa seriam sinónimos para ela? May be! 


204 - Inesperada tb a forma como consegui o meu 1ª emprego, em 1967.
Depois, o  primeiro convite para assistente da universidade (Católica de Lisboa) em 1973, ou o  convite para assistente da Univ de Coimbra (1974) - posse a 23 de Abril, averbamento no BI a 24 de Abril...


205 - A 1ª experiência como docente deve-se ao Carlos Branco. Foi convidado, não sei por quem a dar aulas de sociologia na Fac de Ciências Humanas da Católica e declinou, de imediato, ou não fosse o Carlos Branco, homem de gabinete. De facto, não estou a ve-lo a entender-se com os aguerridos jovens da "Catho", como se dizia em Paris. Acho que foi ele mesmo que sugeriu o nome de Álvaro Melo e Sousa para o substituir e, na passada, sugeriu o meu nome para assistente, uma vez que tinha acabado de regressar de França, com uns vagos estudos de sociologia (depois de maio de 68 tudo tendia a ser vago, em paris, nesse domínio  ou, em alternativa demasiadamente centrado no "fenómeno Maio").
Era assunto urgente  - o Doutor Álvaro M S telefonou-me (com uma bela voz, impressionantemente calorosa) e tanto insistiu num encontro no dia seguinte, um sábado, que eu não consegui dizer "não"). Mas o C Branco não estava e nós não nos conhecíamos... recusou o velho expediente do cravo na lapela. Sugeri que nos descrevessemos mutuamente. Eu, 1.68 m, cabelos compridos, claros, óculos, fato de saia e casaco castanho. Ele moreno, forte...
15.00, Café Londres.
Cheguei antes da hora. Fui lendo "A Bola". Entrou um senhor que correspondia à descrição, mas seguiu em frente... Qd 15 minutos depois, tentei que um empregado bronco fosse perguntar àquele senhor se era o doutor Álvaro Melo e Sousa, a movimentação levou-o a vir à minha mesa. A dúvida que lhe ficou tinha a ver com o meu fato, que para ele era mesclado e não castanho... (na verdade era as duas coisas...)
A relação de trabalho foi esplêndida - era uma simpatia e tratava-me regiamente. Qd era preciso alguém madrugar para vigiar testes, lá ia ele! Mais outro "patrão" ideal...
Os estudantes eram bem mais agitados do que os que viria a encontrar no ano seguinte em Coimbra, apesar de vivermos o PREC (a capital e a província distinguem-se nestes pequenos detalhes).

206 - Nunca tive problema com nenhum aluno! Visto retrospectivamente, muito me admiro, pois deveria ter havido ao menos uma excepção. Não me lembro de nenhuma. 
(nem mesmo qd, fazendo júri com Fº Noguueira, tive de chumbar um longa sucessão de cábulos, todos juntos no mesmo dia - para alarme do Doutor Alarcão, adepto de quotas. "vamos ser sanaeados". "Não vamos - todos mereciam igualmente o chumbo"- Ninguém, de facto se manifestou).)
Com colegas, sim, tive diferendos em Coimbra - coisa rara, foi a tal excepção a confirmar uma regra da boa convivência.
Coimbra, tempo feliz - primeiro nos cinco anos de curso, com romance à mistura, depois como assistente mais dois anos... Colegas excepcionais, o Cordeiro Tavares, o Fernando Nogueira, o Proença...


207 - Inesperada tb a forma como consegui o meu 1ª emprego, em 1967.
Depois, o  primeiro convite para assistente da universidade (Católica de Lisboa) em 1973, ou o  convite para assistente da Univ de Coimbra (1974) - posse a 23 de Abril, averbamento no BI a 24 de Abril...

208  - O convite do Prof Eduardo Correia
Encontrei-no numas jornadas sobre desenvolvimento económico, ou coisa semelhante e fiquei admirada de ver um insigne criminalista naquele meio. Mais admirada fiquei qd , de imediato, me convidou para assistente da Fac de Economia de Coimbra-
 "Não sabia que  já havia economia em Coimbra!"
"Há. Eu sou o Director"
Que gaffe, a minha! Emendei a mão, aceitando prontamente o convite. Logo ali ficou assente que trataria da burocracia a partir do dia seguinte.
Demorou mais do que o esperado - não era funcionária pública, apenas contratada pelo Centro de Estudos, que estava integrada na "Junta de Acção Social (Antes do 25 de Abril já havia, assim, uma espécie de "recibos verdes"). Tive de fazer vacinas, e eu sei lá mais o quê. foram mais de dois meses e, por isso, tomei posse só nas vésperas do 25 de Abril. Regressei de Coimbra a Lisboa precisamente a 24... 


209 - O convite do Prof Ferrer Correia

 Encontrei, por acaso, o Doutor Ferrer Correia nos Gerais. Quando soube que eu estava em Coimbra, na tão jovem, jovem fac de Economia, nem queria acreditar: "Venha para a sua Faculdade!" Respondi imediatamente: "Claro que vou!"
O Doutor estranhou a rapidez da decisão: "Eu não estou a brincar" (coisa que também era possível, porque o Doutor Ferrer era bem capaz disso  -  mas naquele caso dava para perceber que falava  muito a sério, embora em tom ligeiro...)
"Nem eu, Senhor Doutor. Não tenho dúvida em aceitar".
Diferente seria, certamente, a decisão se o Doutor Eduardo Correia se mantivesse á frente da Faculdade. Não o iria desapontar - impensável. Era um querido Mestre! A cadeira em que me examinou correu-me muito bem. Ganhei até ex-aequo (salvo erro, com o Manuel Porto e o Gomes Canotilho), o Prémio Beleza dos Santos de Direito Criminal.
A verdade é que em Direito tinha os meus antigos professores, os meus amigos, as minhas matérias preferidas, as minhas raízes, e até uma antiga frustração, que me acompanhava ainda, de não ter sido contratada como assistente qd acabei o curso - talvez apenas por ser mulher. Era, assim, um regresso a casa ( ocupando, finalmente, a minha "cadeira de sonho"...).
À Economia nada me prendia - acabava de chegar e de encontrar caras novas. Para eles, eu também não era mais do que isso, uma recém-chegada. Foi entrar e sair, sem causar dano!
--------------------------------------------------------------------------------------------------------



210 - Não tardou nada, aliás, o reencontro com o Doutor Eduardo Correia, regressado após a queda brusca do 1º Governo Constitucional - e regressado a Direito, não a Economia. Pouco depois, vi-me, com ele, num conselho universitário, não o pedagógico - (de momento não me lembro da exacta designação - envolvia o corpo docente e o discente).  Fiz parte da sua lista, que foi a vencedora.
Para outro órgão, candidataram-me... Outro dos candidatos era Fº Nogueira, também não  muito interessado no cargo. Eu fiz campanha por ele, ele por mim Consequência: empatámos!
Com muito esforço, consegui convencê-lo a aceitar, (afinal, para mim era mais difícil, passava metade da semana em Lisboa, no gabinete do Rui Machete - a trabalhar directamente com a Branca, que era a chefe de gabinete).

211 -  Um dos diplomas em que dei parecer nesse gabinete foi o anteprojecto dos transplantes! Não podia adivinhar que o meu primo Mário viria a ser um dos seus grandes defensores, e o iniciador dos transplantes no Hosp Sto António, no Porto.

212 - O 1º emprego
Foi, pois, assim que as coisas aconteceram e se encadearam: Em Janeiro de 1967, estava na entrada de um Instituto, onde o Pai era trabalhador/estudante, fazendo uma diatribe feminista contra a minha situação de desemprego. O Sec Geral (Dr Carneiro Leão) surgiu lá de dentro, sem que o visse, ouviu, por puro acaso, veio perguntar-me pormenores sobre o meu curriculum académico, e, em 2 ou 3 dias,  transmitiu-me uma oferta de colocação num Centro de Estudos - exactamente o que eu gostaria...

Um 2º emprego
No início de 1974, fui a um colóquio, encontrei num átrio um antigo professor e acabei na fac de Economia de Coimbra. Semanas depois, atravessei um corredor na Universidade, encontrei outro antigo professor e mudei para a Fac de Direito...

Mais (em regra,via telefone):

 - em 1973, o do Doutor Álvaro Melo e Sousa, que fez questão de me levar como assistente para a Católica
 - em 1974, o do Doutor Alarcão, que me convidou para ser sua assistente na cadeira de de Teoria Geral
 - em 1976, o da Branca Amaral, em nome do Ministro Rui Machete, a perguntar se estava interessada em ser requisitada como assessora do Provedor de Justiça. Claro que estava (uma instituição nova, de inspiração nórdica. Bela oportunidade!
- em Novembro de 1978, o do meu colega João Padrão, a sondar-me para integrar o Governo Mota Pinto, na Sec  de Estado do Trabalho
 - em Janeiro de1980, o do Primeiro Ministro Sá Carneiro, a convidar-me para o seu  Governo.
 - em 1987, o do prof Victor Crespo, para  fazer parte da sua "chapa" para a AR, como Vice-Presidente (outro cargo a que nunca me ocorreria candidatar-me, por iniciativa própria...).
 - e, entre outros, muitos anos mais tarde, o do Dr. Artur Jorge, a convidar-me para a sua lista à Federação Portuguesa de Futebol, como candidata à presidência da AG (batendo, talvez, o record da imprevisibilidade)


213  -   Mário Neves, meu antecessor como SEEmigração ( no governo Pintesilgo).
O almoço com o Dr Godinho. A oferta de uma publicação sobre Maria Lamas, de quem foi muito amigo (o feminismo deve ter sido discutido ao almoço, talvez até o Dr Godinho tenha comentado o meu parecer sobre o serviço militar para mulheres, mas já não me lembro...). E depois, discreta, mas firmemente, pedi a conta, para grande desconforto dos dois (O Dr G confessou que nunca uma senhora lhe tinha pago um almoço, em quase 70 anos de vida...).

214 - Ruth Escobar
Conheci-a num jantar na residência do Cônsul-Geral em S Paulo. Convidou, para me receber na residência, um grupo variado de notáveis da comunidade, entre os quais, ela, actriz, política, activista de muitas causas. 
O diplomata era um homem interessante e uma simpatia - estou a vê-lo distintamente, com todo o seu charme e um bonito sorriso, mas ainda não me recordei do nome. Teve nessa noite muitas razões para sorrir. Ruth e eu fomos a alma da festa, qual de nós a mais efusiva. Qd, já depois do café, quase à despedida, se apercebeu  de que tínhamos acabado de nos conhecer, nem queria  acreditar - julgou que éramos amigas de infância. Mas não, apenas ambas do Porto, muito nortenhas e extrovertidas, feministas e deputadas (ela na Assembleia do Estado de São Paulo, a 1ª mulher a ser eleita - e, ainda por cima, ao abrigo do Estatuto de Igualdade, pois nunca se naturalizou brasileira  - eu na AR).
Vi -a pela última vez, em 2002 ou 2003, num outro jantar em São Paulo - muita da sua  vivacidade perdida, com visíveis sinais de doença. Uma pena!

215 -  Nesse jantar (com numerosos convivas) encontrei o antigo MNE de Marcello Caetano Dr. Rui Patrício. Esse, muito vivo, muito divertido. Estávamos numa das mesas redondas, lado a lado, o que nos permitiu falar do Tratado de Igualdade, que, em contextos e momentos diferentes da política, ambos defendemos. Les beaux esprits...
Altura tb para recordar seu irmão António, antigo Sec Geral do MNE, com quem sempre tive um excelente relacionamento.

216 - Anos 80
Ainda como SEE, em Mainz, no Festival da Canção Migrante do Padre Cabral.
 Depois de uma tarde inteira  de audições, entra em palco o Rancho Gonçalo Sampaio e chamam-me para aquela gracinha de dançar um vira minhoto. O pior é que fiquei a actuar com eles durante meia hora!!! (goradas várias tentativas de discreta retirada...)

217 -  Paris, 1969/70
O meu período argentino começou depois de ter sido "corrida", tal como uma "trintena de residentes",  que o Director da Casa de Portugal considerava os "católicos progressistas" (nisso vendo um perigo para a paz e estabilidade da Casa!). Cada um foi parar a uma residência diferente, o que, aliás, não nos impediu de nos encontrarmos regularmente na da Gulbenkian, onde do nosso grupo restava o Padre Mário e, talvez, mais um ou dois . 
Coube-me em sorte a Fundação Argentina, edifício antigo, mas agradável, mesmo no centro da Cité, com  vista para o Blv Jourdan e o parque Montsouris. Uma sorte! Um director fantástico, o Prof Covian, a filha, a engraçadíssima Morita, e outros argentinos e sul-americanos de muitas Repúblicas desse continente, com quem rapidamente fiz amizade. Foi como se tivesse emigrado para a Argentina, que passou a ser, para mim, um país muito especial. Claro, eu sei que lidei com elites - mas, depois, de visitar o país, por diversas vezes, a partir de 80, convenci-me que o cosmopolitismo é um traço da cultura argentina que as elites partilham com o povo.
Na altura achava os colegas argentinos uns simpáticos exagerados, qd me diziam: "Tens de ir a BA! É uma cidade incomparável, com parques como os de Londres, mas maiores, e avenidas maiores do que as de Paris". 
Muito me lembrava dessas comparações, ao percorrer, anos depois, por exemplo, a Av. 9 de Julho...
Sim. BA é incomparável, o que não tem a ver apenas com a dimensão de ruas  e jardins, teatros e palácios...
Numa dessas visitas, o Embaixador Baptista Martins fez-me uma grande surpresa: localizou a família Covian, de quem lhe tinha falado, e convidou-os para uma noite de fado (com António Bernardino e Durval Moreirinhas). Foi um belo e emotivo reencontro, com os pais da Mora  - e seria a última vez que estaria com eles. Mas não mais perdi o contacto com a Morita - telefono-lhe e ela aparece sempre, ou para um jantar ou mesmo para os eventos da comunidade, como aconteceu com os "encontros para a cidadania" na Biblioteca Nacional (no anfiteatro Jorge Luis Borges).


218  - Paris 68/70
 Eduarda Cruzeiro -  a descoberta de Agustina. 
Ao serão, contava histórias de família - e, na minha família, histórias insólitas são sempre no feminino. E ela comentava:"essas tuas antepassadas parecem personagens  dos romances de Agustina". Havia que ler Agustina, que se tornaria a minha escritora favorita.

O Padre Mário Lages e a descoberta de PG Wodehouse. 
O primeiro Bertie Wooster, que me emprestou, pareceu-me um pouco desmesurado, caricatural, mas logo me converti ao seu fantástico mundo de humor num movimento imparável de aventuras hilariantes. Tão britânico, que não imagino que possa ser traduzido. Sei que há traduções, mas nunca tive a curiosidade de ver como se cumpriu a missão que me parece impossível...
Também não imaginava que fosse o erudito Pe. Mário, Doutor em Estudos Arménios, a "apresentar-me" PGW, quinta essência do "non sense" britânico. Mas foi.
O Pe. Mário e o Pe. Micael terão sido, em grande parte, os "responsáveis" pela designação do nosso grupo de amigos como os "católicos progressistas".  Nada de mau nessa apressada caracterização, mas o certo é que nenhum de nós estava empenhado em "incendiar" a casa. Só mesmo no obsessivo ambiente português de época se podia tomar a nossa procura de são e despreocupado convívio por vontade de intervenção revolucionária... À volta do café arménio do Pe Mário falávamos de tudo e mais alguma coisa, mas não conspirávamos contra ninguém.
Foi um grupo esplêndido, um tempo feliz.  Uma tertúlia quotidiana, depois que regressávamos das aulas, depois das aulas.
Às vezes, apareciam o Alfredo de Sousa, via Eduarda, de quem era compadre, e o Padre Januário Torgal Ferreira. Ambos viviam fora da Cité, em diferentes "quartiers".
Ou um residente já então famoso, que não era propriamente da "tertúlia", mas de quem todos gostávamos, Nadir Afonso. Animava sempre imensamente qualquer reunião. Por mim, nunca tive dúvida sobre a sua genialidade como pintor...

219 -  A Ani Bettencourt, que depois reencontrei, como deputada na AR e, mais recentemente em Espinho, onde veio fazer uma interessante palestra sobre Educação (tema central nos programas da 1ª República, e, naturalmente, nas rememorações  do "centenário"). Lembrava-se bem do meu proclamado feminismo, e também do facto de ter nas paredes do quarto enormes "posters" dos Kennedy (John e Robert), num tempo em que estava mais na moda a imagem de Che Guevara.

220 - Os quartos individuais eram pequenos, mas práticos, com a mesa de trabalho junto à janela (de onde avistava a Igreja de Gentilly), e uma cama/sofá ao fundo, enquadrada lateralmente entre a parede e uma estante, que também servia de mesinha de cabeceira. Foi aí que instalei um gira-discos, que funcionava automaticamente com o simples premir de uma tecla. Adormecia ao som do mesmo disco, pois enquanto estivesse acordada ia sempre accionando o botão. De princípio, os discos eram poucos, o que não tinha importância, porque a qd gosto, gosto - e ouço, vezes sem conta...
Serge Reggiani, Barbara, Léo Ferré, Aznavour, Piaf...
Na Casa da Argentina, o quarto era enorme, a mobília mais antiga, mais simpática...
Tinha uma cafeteira eléctrica, tomava imenso café. Se estava de manhã no quarto era interrompida pela mulher a dias, que vinha zelosamente fazer a limpeza, e aproveitava para lhe oferecer um cafézinho. Ela aceitava sempre. Sentava-se e contava histórias de sabor popular, às vezes téctricas. Era uma francesa  de meia idade, gordinha  e pesada, simpática, rural, apesar de décadas de vivência parisiense.  Começava muitas frases com "Et bas bien"...
É curioso como me recordo dela e não das empregadas ou empregados da Casa de Portugal, com excepção do porteiro, um francês detestável, que controlava entradas e saídas e todas as movimentações dos residentes...

221 -  Nesse 1º ano, a Mãe foi visitar-me a Paris e ficou uma semana. Andei a ver os hotéis da vizinhança, mas depois achei mais fácil e mais prático convidá-la para o meu quarto (pus o caso à direcção) enquanto eu me mudava para a Casa da Noruega, onde havia uma vaga. A Mãe gostou muito - conviveu com todos os meus amigos. O Padre Micael e o Padre Mário foram os principais "cicerones".

222 - Depois do regresso a Portugal  ainda mantive contacto com o grupo dos "católicos progressistas" durante alguns anos. Depois, apenas encontros esporádicos, com a Maria Emília, a Laura, a Adelaide, o Padre Mário, muito recentemente com a Luísa e o António, (no lançamento de uma bela publicação de homenagem ao Prof Mário Lages, na Universidade Católica, onde fez, como previsto, uma grande carreira académica).

223 - Iamos muito, em grupo, ao cinema, menos vezes ao teatro ou a concertos - no Bobinno, por exemplo.
Ao "Parc des Princes", fui sózinha, ver o SLB perder por 3-0 com os holandeses do Ajax (suponho que era o Ajax...). Um vizinho de bancada (francês) deu-me boleia de volta para o centro de Paris. Muito simpático, elogiando o meu francês, mas corrigindo a pronúncia de um "maintenant" com accent de Marseille (influência dos discos de Mireille, certamente...).
Na tv da casa de Portugal, vi muita televisão - na sala, porque nos quartos não havia esse luxo, agora corrente, mesmo num hotel pífio. Vi o homem pousar na lua, o Eddy Merkxs, meu herói belga, ganhar o Tour...
Outro grande divertimento nas noites de fim-de-semana, não regularmente, mas de vez em quando: a canasta! Eduarda, eu e algumas das outras, quando jogávamos, não conseguíamos parar. Sobretudo quem estava a perder, queria mudar de sorte. A luz, na parte social, era cortada às 3.oo. Continuávamos à luz de velas...

224 - Em criança, em jovem, gostava muito de jogar cartas, damas, dominó. Em Espinho, nos cafés, em tardes de nortada não fazíamos outra coisa. a Madalena, a Rosa Maria, as primas, eu...
Alguns anos, vinha connosco, para ajudar a criada e tomar conta de nós. a Ana Sousa, vizinha da tia Rozaura. Era uma óptima parceira para a sueca e a canasta: perdia sempre...
Também me lembro de jogar, de longe a longe, com o Avô Manuel, com o Pai. Acho que a mãe não jogava (só no casino e pouco...) e as Avós ainda menos.
Há muito que isso não acontece. A última vez, foi em Connecticut, com o nosso cônsul  Dr Seabra da Veiga, um Padre e um empresário amigos dele. Faltou um outro senhor padre, que era parceiro dos serões de sueca, à 4º feira.
Rita, a mulher de Adriano, é americana, nem sabe o que é a sueca. Aprendeu a falar muito bem português, mas não certas minudências da nossa cultura, uma das quais é esta.
Estavam os 3 em simples conversa, as cartas quietas sobre o pano verde, quando Adriano olha para mim e faz uma afirmação mais do que interrogação: "A Manuela joga sueca"
Tem alguns inconvenientes o não gostar de mentir, mesmo em coisas pequenas. Eu queria dizer que não, mas fiquei apenas embaraçosamente calada por alguns segundos a mais e , depois, entrei com desculpas fracas, embora verdadeiras: há muito que não jogava, fora experiência de infância e nunca tinha sido grande perita, preferia a canasta...
Fui imediatamente "arrematada" como parceira do empresário, enquanto cônsul e padre formavam uma dupla, em quem eu via os vencedores anunciados... mas por sinal, quem ganhou fomos nós, o par improvisado. Fiz um enorme esforço de concentração  e memória. Não gosto de perder (nem a "feijões", como diz o povo e o Passos Coelho, previsivelmente).
Ali, como em Espinho ou em Paris, era assim que jogávamos - a dinheiro foi coisa que nunca tentei. O gozo era ganhar a competição, não ganhar umas moedas

225

1987 - Porto campeão europeu.
Estava a jantar em casa da Fernanda Quintanilha, com a Mª Luísa e a Cipriano, creio que também a Fernanda Mota Pinto. Um grupo esplêndido, ríamos o tempo todo. O marido da Fernanda contava histórias engraçadíssimas. Às vezes convertiamo-nos numa espécie de "Eixo do Mal" da política da época.
Nessa noite, ao serão, houve uma incomum separação de H/M. As senhoras na sala à conversa. Os homens ao lado numa salinha mais pequena a ver o jogo... (eu só lá não estava porque o jogo me "stressava" demais.) Só quando me anunciaram o 2º golo do Porto, o de Juary, me juntei ao grupo do futebol. E, sendo a única portista, ninguém festejou mais do que eu...


No fim do ano nova vitória, no Japão, num campo coberto de neve. Contra o Penarol do Uruguai. Na semana seguinte, inusitados festejos numa embaixada (era VP da AR, os convites sucediam-se e acetá-los e representar a AR era parte do meu trabalho - agradável, diga-se, bem mais agradável do que dirigir as sessões qundo o Prof Crespo se recolhia ao gabinete). Mal entrei veio na minha direcção o Embaixador do Uruguai, de braços abertos a dizer:
"Manuela, estou feliz com a vitória do Porto!"
Fiquei tão surpreendida, que não devo ter conseguido esconder o espanto. Para mim, pensava: Estarei confundida? Será ele do Chile, ou do Paraguai?
Mas logo ele desfez a dúvida: "Yo soy sempre contra Penharol!"
Era um velho Senhor, muito alto e magro, diplomata de nomeação política, antigo presidente do parlamento, creio, com ar definitivamente "upper class" - um aristocrata e, como se via, pouco dado a hipocrisias, em matéria de futebol. Era bem simpático - gostava muito dele, sempre bem disposto!