sábado, 7 de maio de 2022

CCP - na Entrevista à revista DESCENDÊNCIA (2021)

CCP - ENTREVISTA a DESCENDÊCIA A Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP) era o instrumento que, no verão de 1979, o Programa Eleitoral da coligação AD (PSD, CDS , PPM e Reformadores) apresentava para levar a cabo novas "políticas de reencontro", de proximidade com os Portugueses da Diáspora. Sabia-se que o associativismo nas nossas comunidades constituia a base da sua vida coletiva, da preservação da língua, dos costumes e tradições, da identidade - fortíssimo a nível de cada cidade, ou, quando muito, de cada país, todavia, sem dimensão internacional. No panorama das migrações europeias do século XX éramos uma exceção, faltava-nos essa plataforma de ligação e colaboração entre comunidades dispersas. Os principais objetivos da criação de um Órgão representativo e consultivo das Comunidades foram, por isso, por um lado,favorecer a federalização do movimento associativo, à nível mundial, sem a interferência do Estado, e, por outro, a audição da voz livre dos emigrantes, que pudesse trazer ao Governo a valoração das políticas públicas, na sua maior ou menor adequação a realidades diversificadas, com um apelo à sua cooperação em projetos partilhados. Em suma, um fórum para o pleno exercício da democracia participativa! Com ele, o estatuto de cidadania que a Revolução de 1974 já reconhecia aos expatriados dava um passo em frente - o espírito da revolução igualitária ultrapassava fronteiras, chegava às comunidades extra-territoriais. Esta ideia de um diálogo, de igual para igual, Governo/Sociedade Civil para a definição e execução de políticas públicas, no campo das migrações, vinha contrariar uma longa tradição de paternalismo (quando não de indiferença) do Estado e não foi fácil de compreender, até por governantes da mesma área partidária. Um deles decidiu extingui-lo, em 1990, justamente com o argumento de que a prática do CCP se tornara invasiva da área da "soberania do Estado" e "anti constitucional". Para além desta dificuldade de aceitação de um relacionamento democrático, que alguns políticos viam como demasiado "civilista", o desafio maior que o CCP enfrentou foi a convivência entre as "geografias" da nossa emigração, entre portugueses de estratos sociais e económicos e, sobretudo, de convicções ideológicas muito diversos. Foi deveras inesperada e excelente a forma como, logo em 1981, eles souberam derrubar estereótipos, criar solidariedades, procurar e conseguir compromissos e acordos. O consenso sobre o próprio Conselho e a seu papel tem sido o fio condutor, que o manteve, com idêntico espírito, através de múltiplas reestruturações, durante 40 anos. E é nele - nesse "pacto" entre os próprios Conselheiros - que antevejo o melhor do seu futuro. O CCP, a funcionar assim, nunca envelhecerá! É como uma organização parlamentar, onde o rejuvenescimento se opera pela permanente atualização das matérias tratadas, pela renovação dos eleitos, e pela qualidade dos seus contributos voluntários. Na emigração e na Diáspora, a língua e, mais latamente, a Cultura estão sempre no centro das preocupações, com um reflexo direto na vida do CCP, que é, verdadeiramente, uma grande instituição do mundo da lusofonia. E espero que, para além de agregar os Portugueses de passaporte, possa, também, unir, um dia, outras comunidades lusófonas e lusófilas, como propunha a legislação original, ao não exigir aos Conselheiros o requisito da nacionalidade. Um caminho possível para atingir essa meta será promover o grande encontro das migrações lusófonas (no espaço da CPLP), ou, em alternativa, no eixo bilateral, com o Brasil, Cabo Verde e as demais nações da nossa língua. A reforma que mais ambiciono, e há muito defendo, para o Conselho das próximas décadas é a sua "constitucionalização", um maior grau de autonomia e de recursos funcionais e a obrigatoriedade de ser consultado em matérias relevantes para as comunidades portuguesas. Episódios? Estou a lembrar-me da última vez em que, na nossa embaixada, em Paris, estive com o Dr. Francisco Ribeirinho, um histórico, um dos ideólogos do 1º Conselho (1981/90), e uma das vozes mais importantes e mais críticas, na relação com o Governo. Estávamos em vésperas de relançamento do CCP, em novo formato, e ele surpreendeu-me ao dizer, nostalgicamente: "Oh, Manuela, o nosso Conselho é que era!..." Mas, apesar das diferenças, o Conselho seguinte manteve, no essencial, o ânimo e o ritmo de trabalho que o carateriza desde o início. O segredo da sua sobrevivência, afrontando tantos obstáculos e situações de rutura, é, a meu ver, a originalidade matricial de ser de todos, sem controle ou supremacia de uma das partes. Ser "nosso".

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