quarta-feira, 21 de novembro de 2018

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MARIA MANUELA AGUIAR DIAS MOREIRA

Nasci em 1942, na casa grande ada avó materna - uma das chamadas casas grandes de brasileiros -
no centro de Gondomar. Aí vivi os anos felizes da infância, num ambiente em que o Brasil estava bem
 presente e mais nas memórias, nas narrativas, na música, na gastronomia do que na traça da casa.
Aguardei, com impaciência, a entrada na escola, onde me sentia realizada a aprender as letras e os números.
Depois de dois anos na escola pública, sete no colégio do Sardão (onde tinha ótimas condições para a prática
do desporto, que era a minha paixão maior) e dois no Liceu Rainha Santa Isabel, fiz o curso de Direito na
Universidade de Coimbra. Era excelente aluna, estudava com entusiasmo, embora sofresse por demais com
 todos os exames, que acabavam por correr a contento. Terminei o liceu com 18 valores, em 1960, e Direito c
om 17, em 1965.
Voltei à vida de estudante, como bolseira da Fundação Gulbenkian, em Paris, entre 1968 e 1970.
 O lugar e o tempo certo para me iniciar na Sociologia do Direito, em mais do que um sentido... Conclui o ano
de "titularização" na École Pratique des Hautes Études, com Alain Touraine. vários certificados na revolucionária
 Vincennes e o "Diplôme Supérieur d' Études et de Recherche en Droit" da Faculdade de Direito do Instituto
Católico. Residi na cidade universitária, na Casa de Portugal, depois na Fundação Argentina, como se estivesse
 em vários países, em simultâneo, e em todos fazendo amigos para sempre.
Aquando desta minha espécie de emigração parisiense, já era Assistente do Centro de Estudos do Ministério
das Corporações (1967/74), onde tive colegas que foram, e são, nomes famosos na comunidade académica e
na política (em vários dos seus quadrantes) e dois diretores de boa memória, que
me deram ampla liberdade de expressão e de circulação (com bolsas da OIT, da OCDE, das Nações Unidas...).
 Um era um homem do regime (Cortez Pinto), o outro um professor progressista, cultíssimo e muito divertido
 (António da Silva Leal).
Os títulos de sociologia trouxeram-me um inesperado convite de Álvaro Melo e Silva para ser sua assistente
na Universidade Católica. Um segundo convite, igualmente inesperado, levou-me para a Faculdade de Economia
de Coimbra, onde tomei posse a 24 de abril de 1974, e um terceiro para a "minha" Faculdade de Direito. Fui
assistente de Rui Alarcão, futuro Reitor, e de Mota Pinto, futuro Primeiro-Ministro. Uma época agitada e auspicios
a, em certos aspetos semelhante à vivida a de Paris, nos meses seguintes a uma revolução... Eu não tinha
 filiação partidária, era social-democrata "à sueca", como Sá Carneiro e os amigos de Coimbra, ideólogos do
 PPD.  
Em 1976, antecipando saudades sem fim, troquei a Faculdade por uma instituição completamente nova, o
Serviço do Provedor de Justiça. Fui assessora de dois grandes democratas, o primeiro Provedor, Coronel Costa
Braz, e o segundo, Dr José Magalhães Godinho, um fantástico exemplo de humanismo e de  alegria de viver.
Só na década de noventa me reencontrei em salas de aulas, como docente convidada da Universidade Aberta
 (mestrado de Relações Interculturais).
A minha experiência nas três universidades foi esplêndida, ajudou-me a a rejuvenescer e a interagir com
audiências estimulantes e numerosas. Uma aprendizagem sem a qual não teria conseguido fazer caminho no
 terreno mais agreste da política, coisa que, aliás, não estava nos meus planos. Desde sempre tive à vontade e vontade para discutir questões políticas no círculo da família e de amigos, era uma feminista declarada nas coimbrãs tertúlias de café. E, por isso, o Doutor Mota Pinto me
 lançou, em 1978, o desafio de passar à ação: ou aceitava ser Secretária de Estado do Trabalho ou seria
responsável pelo défice feminino do seu governo (de independentes). Aceitei - era serviço público, por alguns
 meses apenas, até eleições já no horizonte.
Em agosto de 1979, reocupei o mais tranquilo gabinete na Provedoria, tendo deixado pronto para publicação,
 na Praça de Londres, o diploma que criava a CITE (Comissão para a Igualdade no Trabalho e Emprego) -
inspirada no "Ombudsman para a Igualdade" da Suécia. Contudo, não resisti a uma nova e surpreendente
chamada para o governo de Sá Carneiro, na pasta da emigração. E acabei ficando na arena política, em quatro
 governos e no parlamento durante mais de um quarto de século, ligada às questões da emigração, da Igualdade
 de género, dos Direitos Humanos
Entre 1987 e 1991, com quatro sucessivas eleições para Vice.Presidente da Assembleia da República, tornei-me
 a primeira mulher a presidir às sessões plenárias ou a delegações parlamentares (começando logo por uma
 visita oficial ao Japão) . Em 1991, fui eleita para a Delegação Portuguesa à Assembleia Parlamentar do
Conselho da Europa (APCE) e à União da Europa Ocidental (AUEO), das quais, durante 14 anos, membro, seria
 presidente de diversas subcomissões, presidente da Comissão das Migrações, Refugiados e Demografia,
Vice Presidente da AUEO e da bancada parlamentar e, nos últimos anos, Presidente da Delegação Portuguesa.
 Um trabalho especialmente gratificante, em parlamentos onde se pensa o futuro, onde até é permitida a utopia,
 sem nenhum dos constrangimentos dos parlamentos
nacionais.
Sai, quando quis sair, da Assembleia, em 2005. De 2005 a 2011, fui  Vereadora na Câmara de Espinho e, até
hoje, continuei o meu trabalho cívico, nos mesmos domínios de intervenção, sem abrandar o ritmo. Este 
percurso de vida, no início, não uma escolha minha, acabou sendo, talvez, uma boa escolha. Feito de movimento
, de incontáveis viagens de descoberta pelo do mundo das comunidades da emigração e da Diáspora, 
de encontros, diálogo e amizades em tantos continentes e países e, em Portugal, de convívio, em alguns casos,
 inesquecível, com os grandes protagonistas da história da Democracia, na minha geração. E ainda me deixou 
algum tempo livre para coisas de que tanto gosto, como futebol, cinema, praia, música e um bom livro.
Livros, escrevi alguns sobre emigração portuguesa e coordenei a publicação de revistas e atas de colóquios da
 AMM
As condecorações são, em regra, o último capítulo, dos CV's. Muitas recebi em função do cargos. Referirei só
 as que me foram atribuídas de forma mais personalizada, como a Grã-Cruz da Ordem do Infante Dom Henrique
 pelo Presidente Jorge Sampaio, a Grã-Cruz da Ordem do Cruzeiro do Sul (Brasil), a Grã-Crus da Ordem do Rio 
Branco (Brasil), a Ordem da Estrela Polar (suécia, no grau de Grande Oficial, o título de "Cidadão do Rio de
 Janeiro", a Medalha Tiradentes, a  Medalha de Mérito Cívico da Câmara de Gaia (classe ouro", a Medalha de
 Honra da Câmara de Espinho e o "Dragão de ouro" do FCP

 1.   ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O MEU MODO DE VER E DE TRABALHAR PARA OS OBJETIVOS FUNDAMENTAIS.
Sou  uma das fundadoras da Associação.
Acredito na força dos movimentos associativos, na sua influência para a mudança do estado de coisas imperfeito e injusto, que herdámos do passado. No início de 90, envolvi-me no trabalho de promover a criação de organizações para a igualdade em diversos domínios, sem esquecer o das migrações, tradicionalmente tão marginalizado  - até nas reivindicações das feministas, desde o século XIX. A AMM é contemporânea da "Associação das Mulheres Parlamentares", da "Associação Ana de Castro Osório" ou do Forum Internacional das Migrações, entre outras de que fui fundadora. Em comum tinham o facto de se situarem numa perspetiva supra-partidária. Não fiquei à frente de nenhuma, porque na altura viajava constantemente, para reuniões no Conselho da Europa e nas nossas comunidades do estrangeiro, mas colaborei ativamante, desde a primeira hora, sobretudo, com a AMM. No seu arranque, a Associação contou com o entusiasmo e a eficácia da empresária luso-brasileira Fernanda Ramos, e de Rita Gomes, que acabava de se aposentar. Seria a única capaz de fazer um caminho ascensional, ao longo destes últimos 25 anos  - prova real de que é fácil ter uma ideia e lançar um projeto, o difícil é continuá-lo!
Neste caso, tratava-se, mais precisamente, de relançar ou retomar um projeto, pensado e proposto durante o histórico 1º Encontro Mundial de Mulheres no Associativismo e no Jornalismo de 1985: o da união das mulheres portuguesas no mundo. Intenção esplêndida e pioneira, que não puderam, então, concretizar, mas inspirou a criação da "Mulher Migrante Associação de Estudo, Cooperação e Solidariedade", em 1993. De facto, no ato da sua constituição vemos os nomes de muitas das participantes do pioneiro Encontro Mundial. A nova ONG, (ao contrário do modelo delineado em 1985 e adotado no associativismo feminino da Diáspora), é aberta aos dois sexos, a todos os que se preocupam com as particularidades de género nas migrações e com quaisquer formas de discriminação e xenofobia. Esta absoluta singularidade, converte-la-ia, numa fase inicial, em parceira importante da Comissão da Igualdade, (que tinha um historial de insuficiente atenção às mulheres expatriadas), e, depois, também da Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, a partir de 2005, data em que passou a desenvolver, sistematicamente, políticas de emigração com a componente de género. Pude intervir em todos os colóquios e congressos organizados no pais e no estrangeiro, nomeadamente nos "Encontros para a Cidadania" (2205-2009), presididos pela Dr-ª Maria Barroso, e coordenei, juntamente, com outras colegas, várias das nossas publicações. Neste momento, estou empenhada em colaborar com a presidente Arcelina Santiago e com as/os demais colegas na execução do ambicioso programa para o ano de 2019.
É bom pertencer a uma coletividade, onde independentemente da nossa posição nos órgãos sociais, temos o mesmo direito de iniciativa, temos voz, somos ouvidas/os. Em suma, somos iguais, numa ONG que se bate pela igualdade! 


2. Os meus planos de ação no domínio das migrações e da Diáspora, com especial enfoque nas femininas, em colaboração com a AMM

 Nos últimos anos, sobretudo desde que cessei funções oficiais, tenho procurado, sempre que possível, destacar a minha pertença à AMM, nas sínteses curriculares, assim como enquadrar as minhas intervenções, mesmo as que são solicitadas a título pessoal, no programa de atividades da Associação. As frequentes deslocações ao estrangeiro deram-me, e de algum modo continuam a dar-me, oportunidades de incentivar uma maior participação cívica e política das emigrantes, seja pelo seu acesso ao patamar do dirigismo associativo geral, seja, em alternativa, pelo desenvolvimento de movimentos cívicos, e pela aproximação, entre si, de mulheres de diferentes comunidades e delas com a AMM, assim potenciando uma vertente internacional, que é, bem vistas as coisas, a sua vocação originária
 1.   ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O MEU MODO DE VER E DE TRABALHAR PARA OS OBJETIVOS FUNDAMENTAIS.
Sou  uma das fundadoras da Associação.
Acredito na força dos movimentos associativos, na sua influência para a mudança do estado de coisas imperfeito e injusto, que herdámos do passado. No início de 90, envolvi-me no trabalho de promover a criação de organizações para a igualdade em diversos domínios, sem esquecer o das migrações, tradicionalmente tão marginalizado  - até nas reivindicações das feministas, desde o século XIX. A AMM é contemporânea da "Associação das Mulheres Parlamentares", da "Associação Ana de Castro Osório" ou do Forum Internacional das Migrações, entre outras de que fui fundadora. Em comum tinham o facto de se situarem numa perspetiva supra-partidária. Não fiquei à frente de nenhuma, porque na altura viajava constantemente, para reuniões no Conselho da Europa e nas nossas comunidades do estrangeiro, mas colaborei ativamante, desde a primeira hora, sobretudo, com a AMM. No seu arranque, a Associação contou com o entusiasmo e a eficácia da empresária luso-brasileira Fernanda Ramos, e de Rita Gomes, que acabava de se aposentar. Seria a única capaz de fazer um caminho ascensional, ao longo destes últimos 25 anos  - prova real de que é fácil ter uma ideia e lançar um projeto, o difícil é continuá-lo!
Neste caso, tratava-se, mais precisamente, de relançar ou retomar um projeto, pensado e proposto durante o histórico 1º Encontro Mundial de Mulheres no Associativismo e no Jornalismo de 1985: o da união das mulheres portuguesas no mundo. Intenção esplêndida e pioneira, que não puderam, então, concretizar, mas inspirou a criação da "Mulher Migrante Associação de Estudo, Cooperação e Solidariedade", em 1993. De facto, no ato da sua constituição vemos os nomes de muitas das participantes do pioneiro Encontro Mundial. A nova ONG, (ao contrário do modelo delineado em 1985 e adotado no associativismo feminino da Diáspora), é aberta aos dois sexos, a todos os que se preocupam com as particularidades de género nas migrações e com quaisquer formas de discriminação e xenofobia. Esta absoluta singularidade, converte-la-ia, numa fase inicial, em parceira importante da Comissão da Igualdade, (que tinha um historial de insuficiente atenção às mulheres expatriadas), e, depois, também da Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, a partir de 2005, data em que passou a desenvolver, sistematicamente, políticas de emigração com a componente de género. Pude intervir em todos os colóquios e congressos organizados no pais e no estrangeiro, nomeadamente nos "Encontros para a Cidadania" (2205-2009), presididos pela Dr-ª Maria Barroso, e coordenei, juntamente, com outras colegas, várias das nossas publicações. Neste momento, estou empenhada em colaborar com a presidente Arcelina Santiago e com as/os demais colegas na execução do ambicioso programa para o ano de 2019.
É bom pertencer a uma coletividade, onde independentemente da nossa posição nos órgãos sociais, temos o mesmo direito de iniciativa, temos voz, somos ouvidas/os. Em suma, somos iguais, numa ONG que se bate pela igualdade! 


2. Os meus planos de ação no domínio das migrações e da Diáspora, com especial enfoque nas femininas, em colaboração com a AMM

 Nos últimos anos, sobretudo desde que cessei funções oficiais, tenho procurado, sempre que possível, destacar a minha pertença à AMM, nas sínteses curriculares, assim como enquadrar as minhas intervenções, mesmo as que são solicitadas a título pessoal, no programa de atividades da Associação. As frequentes deslocações ao estrangeiro deram-me, e de algum modo continuam a dar-me, oportunidades de incentivar uma maior participação cívica e política das emigrantes, seja pelo seu acesso ao patamar do dirigismo associativo geral, seja, em alternativa, pelo desenvolvimento de movimentos cívicos, e pela aproximação, entre si, de mulheres de diferentes comunidades e delas com a AMM, assim potenciando uma vertente internacional, que é, bem vistas as coisas, a sua vocação originária

terça-feira, 20 de novembro de 2018

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Maria Manuela AGUIAR DIAS MOREIRA


 Nasci  em 1942, na casa grande da avó materna - uma das chamadas "casas de brasileiros" -  no centro de Gondomar, muito perto do
 Porto. Aí vivi os anos felizes da infância, num ambiente em que a cultura brasileira estava realmente presente, e mais nas narrativas,
 nas memórias, na música, na gastronomia do que propriamente na traça do edifício, ao gosto dos anos 20 do século XX.  

Depois de dois anos na escola pública, sete no Colégio do Sardão, e dois no Liceu Rainha Santa Isabel do Porto, completei o curso de
 Direito na Universidade de Coimbra. Era excelente aluna, estudava por gosto, e com entusiasmo, embora sofresse o mais que é possível sofrer
antes de todos os exames, que acabavam por correr bem. Terminei o Liceu com 18 valores, em 1960, e Direito com 17, em 1965. Como bolseira
 da Fundação Gulbenkian, voltei à vida de estudante, em Paris, entre 1968 e 1970.  Parecia-me o lugar e o tempo certo para me iniciar na sociologia
do Direito e foi-o em mais do que um sentido. Conclui o ano de titularização na École Pratique des Hautes Études, com Alain Touraine , vários
 certificados avulsos em Vincennes, e o Diplôme Supérieur d' Études et de Recherche en Droit, na Faculdade de Direito e Ciências Económicas
do Instituto Católico de Paris (única instituição onde os ventos da revolução não tinham chegado).
 Residia na Cidade Universitária, primeiro na Casa de Portugal, depois na Fundação Argentina – senti-me em vários países, em simultâneo, e
 em todos fiz amigos que ficaram para sempre. O que António Vitorino de Almeida diz de Viena, posso eu dizer desta outra geografia : "A França
 não é o meu país, mas Paris é a minha cidade". (a par de Coimbra e só perdendo para o Porto).
Aquando da minha migração parisiense, já era assistente do Centro de Estudos do Ministério das Corporações e Segurança Social (1967/74), onde
tive colegas excecionais e dois diretores de boa memória, que sempre me deram liberdade de expressão e de circulação (com bolsas
da OIT, da OCDE, da  Nações Unidas…). Um homem do regime (Cortez Pinto), o outro progressista e genialmente inteligente (António
 da Silva Leal).
Os meus incipientes estudos de sociologia proporcionaram-me um inesperado convite de Álvaro de Melo e Silva para ser sua assistente
na Faculdade de Ciências Humana da Universidade Católica de Lisboa(1972/73). Um segundo convite, não menos
 inesperado, levou-me  para Faculdade de Economia de Coimbra, (onde tomei posse no último dia do velho regime,
24 de abril de 1974), e um terceiro, no mesmo ano, para a Faculdade de Direito. Fui assistente de Rui Alarcão e Mota Pinto, regi o curso
 de Introdução ao Estudo de Direito, integrei a linha de investigação de Direito de Família de Pereira Coelho. Tempos felizes
 e agitados, nos dias seguintes de uma outra revolução singular, vivida por dentro na comunidade académica! Não tinha partido, era social-democrata “à sueca”, como Sá Carneiro, que não conhecia, e como os meus caríssimos amigos de Coimbra e ideólogos do PSD ´
Em 1976, deixei a Faculdade para ser assessora do Provedor de Justiça, instituição inspirada no “Ombudsman” sueco, que acabava de abrir as portas.
Aí trabalhei com o primeiro Provedor, um dos grandes “militares de Abril” , Coronel Costa Braz e, poucos meses depois, com o segundo, o mais
 admirável de todos os notáveis dirigentes  com quem colaborei - o Dr José Magalhães Godinho
Só muito mais tarde, no início da década de 90, regressei ao ensino, como docente convidada na Universidade Aberta, (mestrado de Relações Interculturais).

O contacto com os jovens nessas três universidades foi simplesmente esplêndido – ajudaram-me a rejuvenescer com eles
 e a interagir com audiências numerosas. Considero que sem essa aprendizagem, não teria conseguido fazer caminho no campo
 da intervenção política no governo e no parlamento – coisa que não estava nos meus planos … Era, sim, uma feminista assumida
nas coimbrãs tertúlias de café, em círculos fechados, e foi o Doutor Mota Pinto que me lançou o desafio de passar da teoria à prática,
 no seu governo de independentes. Ou aceitava ser Secretária de Estado do Trabalho ou ficava responsável pelo défice feminino
 no seu Executivo. Aceitei. Seria por alguns meses, serviço público, não carreira política. Em Agosto de 1979, estava, de volta,
à Provedoria, deixando como legado, bem delineada e negociada com os parceiros sociais, a Comissão para a Igualdade no
 Trabalho e Emprego (CITE). Mas não resisti a mais uma surpreendente chamada à política, por Sá Carneiro.
 (para a pasta da Emigração). Fui e fiquei na arena da política, em mais três governos e no parlamento durante mais de 25 anos,
 sempre ligada à problemática das migrações, dos Direitos Humanos, da igualdade de género

.

 1992,  fui eleita em sucessivas legislaturas como representante de Portugal na Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa (APC
E) e da Assembleia da União da Europa Ocidental (AUEO), Chefiei a Delegação portuguesa nessas organizações, a partir de 2002 .
No plano nacional como internacional, a minha prioridade de ação foi invariavelmente a luta 

Na política a nível local, fui deputada na Assembleia Municipal do Porto, nos anos noventa, e vereadora da Câmara de Espinho (200
5/2011).

Das condecorações e distinções ligadas ao trabalho na emigração, refiro algumas, como a Grã- Cruz da Ordem do Infante Dom Henrique, atribuída pelo Presidente Jorge Sampaio, em 1998, a Grã Cruz da Ordem do Cruzeiro do Sul e a da Ordem do Rio Branco (Brasil), o Título de "Cidadão do Rio de Janeiro", em 1990, a Medalha de Mérito Cívico da Câmara de Gaia (classe ouro), em 2014. E embora não esqueça, pelo significado que têm para mim, outras condecorações, e muitos títulos de sócia honorária de associações portuguesas, não poderei nomeá-las, como gostaria.


domingo, 21 de outubro de 2018

PAI abril 96


Maria Manuela Aguiar mariamanuelaaguiar@gmail.com

sexta, 13/04, 00:25
para Maria
1996

 ESPINHO, 5ª feira, 4 de abril

Vim de Lisboa no rápido da manhã. Às 2.00, lá estava o pai, o seu vulto familiar a dirigir-se para a minha carruagem, a pegar no meu pequeno saco de viagem, que trazia mais papeis do que roupa.
Foi há quase 22 anos. Ainda hoje sempre que parto ou chego à estação de Espinho sinto uma imensa saudade da sua companhia. Nunca me lembro de ter faltado a essas despedidas ou receções, que se repetiam todas as semanas. No curto trajeto, (muito mais curto do que o atual, que levou a estação da rua 15 para a 25) conversávamos animadamente, trocávamos as novidades mais ou menos rotineiras, Nesse dia terei contado as minhas histórias de Praga, de onde acabava de voltar de um seminário do Conselho da Europa. O almoço com a mãe foi breve. Já era tarde, saímos logo para tomar café. Café e cigarros, os seus vícios de estimação, Quis saber se gostava dos Camel Light, que tinha trazido do "free shop". Apesar de militante do anti-tabagismo. nunca deixava de lhe trazer um pacote de cigarros mais leves do que a sua marca habitual.
 Um erro, pois de certeza que os fumava a contra-gosto e faziam-lhe o mesmo mal.... Na verdade, só vale a pena dar prioridade ao vício sobre a saúde, para ter o máximo de prazer. 
O que achava dos Camel, fiquei sem saber, Não teria tempo de os experimentar, ainda estava a fumar maços de outro brando pacote dos meus, quando nos deixou.
Por associação de ideias, parou um momento para me mostrar o lado direito de uma gabardine nova.
 - "Olha o que me aconteceu - a cinza do cigarro caiu aqui e fez  este buraco. Parece.me que não tem conserto". 
 - "Oh Pai, não se preocupe com isso. Nem é preciso  tentar. É coisa tão pequena que não se vê, ainda por cima nesse sítio".
Não ficou muito convencido. Era definitivamente contra nódoas ou buracos na sua roupa e riscos nos seus carros, por menos visíveis que fossem. Dele herdei essa reação, que, contudo, nos automóveis suporto melhor (de tanto carro despreocupadamente amolgado que via em Paris, quando lá vivi).. Para o animar, disse-lhe que talvez não tivesse sido ele a causar o desastre, mas um incauto fumador ao seu lado, pois eu, que abomino cigarros, sofri desastre semelhante, há anos, num estimado fato de malha vermelho e cinzento - sem que pudesse pedir contas ao fumador distraído..
 Deixei-no no café do Sr Vieira (que eu chamava sempre assim, porque o seu nome na tabuleta era mau demais: "Ninho de amor" - o simpático Sr Vieira já recebera o café com a ambígua designação que se manteve, quando o trespassou, aó tendo mudado em 2018, há pouco tempo). O pai ficou entregue à leitura de jornais, ao café e aos cigarros, inimigos da sua tensão alta, e eu fui ao apartamento da esquina da rua 7 com a 64, onde embora eu não morasse, moravam muitos dos meus livros. Passei uma hora, ou talvez mais, em arrumações até ir ao reencontro do pai no Café Vieira. Já escurecia em Espinho. Quando cheguei, lia não os jornais, mas um dos  policiais de Patricia Wentworth, que eu descobrira num alfarrabista de Lisboa. Wentworth pertence à escola de Christie, que não fazia o género preferido do pai, mais apreciador de Raymond Chandler ou Ross MacDonald. e de Sara Paretsky, de quem eu lhe ofereci tudo o que saiu no mercado livreiro nacional.
Ou para ser simpático, ou porque lhe agradava mesmo, disse-me que estava a gostar, depois de umas quantas páginas a adaptar-se às originalidades de uma tradução brasileira´.
O serão dessa noite não teve nenhum ponto alto. Vimos juntos televisão, achámos, graça a "má lingua" ("noites da má língua", com Sousa Tavares e outros?). Depois, a mãe foi-se deitar, eu ainda lhe fiz companhia mais algum tempo. O pai, como de costume, deixou-se ficar no seu "maple" grande de linho inglês, em frente ao ecrã, a ver um filme, a ler ou a dormitar... até às duas ou três da manhã.

6ª feira, dia 5
Manhã no "Nosso Café", à conversa com as duas amigas da mãe, ambas farmacêuticas e donas de farmácias -  Maria do Rosário e  Margarida. 
Depois de tomado o café, o pai e eu subimos, vagarosamente, a Rua 19 para irmos à CGD levantar dinheiro, ele com a caderneta, eu com o cartão. Havia que tomar precauções, no longo feriado, as caixas multibancos esgotavam  muitas vezes. O pai comentou que tinha o cartão em casa e ainda não se servira dele. Já não voltamos ao café. Viemos para casa pela rua 16. A mãe chegou logo depois.
O Dr Espanhol recomendava ao pai que fizesse sempre uma sesta. Outro dos conselhos médicos que seguia pouco. Quando muito, adormecia em frente à televisão.  Nessa tarde, acordei-o, insistindo que fosse deitar-se uma hora.
- "Não, não! Agora já é tarde. Vou ao café". 
Partimos juntos, mas o pai não quis ir comigo ao cinema, ver um "Woody Allen". Sentou-se na sua mesa habitual  no "Vieira", enquanto segui para o Casino. Combinei passar no café, logo depois do cinema, mas dei a volta pela esplanada, em vez de atravessar logo para a rua 8 e encontrei o primo Alexandre (Toninho, em criança -  tem os dois nomes, António Alexandre e escolheu o menos comum). Já não o via há muito, demorei uns minutos e , quando cheguei ao café, o Sr Vieira disse.me o pai tinha saído há pouco, julgando que me tinha esquecido da nossa combinação..
Nessa noite o tema foi o futebol. Sempre um pouco pessimista, sobretudo em relação ao bem amado FCP, que era paixão  de infância, que soube transmitir-me, comentou:
 - "O campeonato ainda não está ganho e a equipa tem jogado mal"
Respondi com a minha absoluta certeza:
 - "Que  ideia, pai! Claro que ganha, tem meia dúzia de jogos para fazer dois ou três pontos!"
(bons tempos em que estávamos habituados a ser campeões a várias jornadas do fim...)
Outra preocupação eram as casas e campos de Avintes - como hoje são para mim. É o constante desconforto, pequenos problemas e não raramente, grandes despesas. As rendas dos caseiros não pagam os prejuízos. O pai queria ir lá falar com o Sr Pedro, que fazia o favor de arejar a casa do Paço e a da quinta da Pena, e de ver o que era preciso.
 - "Se não for hoje, vou lá na 2ª feira. Pode ser que o Helder. vá comigo. É preciso pintar a casa, arranjar algumas das janelas e dar uma solução à varanda.
Tinha morrido o caseiro que ocupava essa parte da casa mais degradada, mas a restante continuava ocupada, com rendas ridiculamente baixas.
Estávamos em tempo pascal, o Sr Pedro tinha um filho pequeno,  que como todas as crianças gostava de pequenos presentes. Fui à Rua 19, comprar uma lembrança .
(2ª feira seguinte, o dia do seu velório, em Gondomar...).
Em questão de obras, veio, de novo, à baile, a substituição da porta da minha garagem - mais uma aborrecida trivialidade.  Por porta automática, o especialista consultado pedira 100 contos. O pai considerava o preço excessivo . Era a terceira ou quarta vez que  que repensávamos o assunto. Repetiu a frase de sempre:  - "Sabes, acho demais!".
 Ao que  respondi: " Pode ser, mas não quero pensar mais nisso, Vamos chamar o homem"
 O pai preocupava-se demasiadamente com os meus problemas, pedia orçamentos, tentava conseguir o melhor e. por isso, hesitava, hesitava... 
Eu, sem ele, descuidei o ferrugento portão da garagem, ao longo de vinte anos. Só no ano passado tratei de o substituir... 
 A 6ª feira Santa, foi, assim, um dia tranquilo. Recordo que lhe pedi conselho sobre a hipótese  de comprar um faqueiro de prata promovido por uma daquelas empresas que acompanham o contrato de interessantes bónus. CoPor vezes mais interessantes do que o próprio objeto principal -   no caso a oferta  uma aparelhagem "hi-fi" apresentado dentro de uma cómoda, pequena e discreta,  para a qual tinha um lugar na sala... O pai não olhou para o bónus. mas, avisadamente, para a coisa em si. Era um faqueiro de prata com  o mínimo possível do precioso metal. Todo o conjunto pesava menos do que as 6 peças de um faqueiro a sério, que os pais me iam oferecendo de data festiva em data festiva. Desisti de imediato  do "hi-fi" e do seu apêndice...Foi a última vez que ele me salvou de engodos em que facilmente costumo cair....

Sábado, 7

O encontro habitual no "Nosso Café", com a Drª Margarida e o marido, e a Maria do Rosário , Um pequeno grupo, o que restava de tertúlias bem mais numerosas, o que nunca faltava nas manhãs de sábado. Tinha comigo a máquina fotográfica, com mais de 30 fotos tiradas  na semana anterior em Praga, durante um colóquio da Comissão das Migrações do Conselho da Europa, (a que,na altura, eu presidia). Praga é, a meu ver, uma das cidades mais bonitas da Europa, a par de São Petersburgo. Com pressa de mostrar a minha reportagem, ali acabei o rolo, que fui de seguida revelar à rua 23. As da República Checa são hoje as de nenhum relevo, preciosas são as de Espinho, as últimas do meu Pai. Numa delas, a ler atentamente o seu jornal. Nas outras, em conversa à mesa do café. 
A revelação foi rápida, ainda estivemos todos a admirar o esplendoroso barroco leste europeu, a famosa ponte e a sua estatuária. Ao que o pai menos dava importância era à sua própria imagem. Por sorte, captaram a realidade daqueles convívios, as coisas de que gostava, como o café - espaço, o café-bebida, a leitura, a fala com os amigos
A tarde foi, também, bem passada, com a visita da sobrinha Teresa, com o filho, o Tozinho, que considerava verdadeiramente o seu bisneto. Com ele brincava, infindavelmente, e estava sempre pronto a dar-lhe uma moeda para as tentadoras máquinas, que davam prémios envolvidos em bolas transparente, Nem sempre saia o que a criança desejava, caso em que tinha de continuar a abastece-lo de moedinhas. 
Nesse dia, estivemos em casa, a jogar dominó. Fiz as minhas filmagens de video, nas quais o pai só aparece fugidiamente, quando a mãe lhe pediu para ir a  compras (amêndoas e outras delícias pascais). Combinámos ir ter com ele, no regresso das compras, ao café Vieira, mas era tarde, não demorámos...Chegámos à rua 7 todos juntos e a Teresinha entrou no carro, para voltar a São Cosme. O pai estava muito preocupado, por a ver partir, ao volante de um robusto veículo, com um rapazinho de 4 anos atrás e à espera de uma menina, a dias de nascer. 
"Que impressão me faz vê-la assim sozinha, naquele estado, a conduzir o jeep até Gondomar".
Tranquilizei-o, ou, pelo menos, tentei:
"Ela não tem problemas, é toda despachada, adora guiar o jeep, bem mais seguro do que um carro pequeno"
Na verdade, a qualquer momento podia entrar em trabalho de parto. Aconteceu oito dias depois. Aos primeiros sintomas foi calmamente para a Ordem da Lapa e, mal chegou, a criancinha veio ao mundo sem mais espera. 
O resto do dia foi pacato, jantar, serão, conversas  banais, esquecidas..
Só me lembro de ter dado ao pai, como presente, uma gravata. De Praga vim via Orly , onde comprei três
 ou quatro gravatas, para o pai escolher. Nenhuma em tons de vermelho, que ele não usava. Era a sua única superstição. E não era coisa ligada ao futebol, embora  parecesse. O pai apontou para a mais tristonha, ás riscas pretas e azuis.. Comentei que era muito semelhante a tantas, guardadas no armário...Optou então por uma vistosa Cerruti 1881, em tons de azul e dourado. A Mãe discordou.
"Ele não vai usa-la, não é o género dele. Tu estás a influenciá-lo..."
Talvez, mas ele deixou-se influenciar, resistindo à pressão da mulher, em regra, a influência maior...Subiu as escadas e foi colocá-la junto da sua bela coleção de gravatas. Não a usou, de facto, não teve tempo. Só lhe restava um domingo . Nesse domingo, com um fato de tweed cinzento pôs a sua gravata preferida, de riscas verdes e azuis, que a mãe lhe tinha oferecido há muitos anos.

Domingo, 7

Foi à missa das 10.00, na capela da Senhora da Ajuda, como sempre,.Passou pelo café, leu o seu jornal e veio até casa. Encontrei-o apenas ao almoço. Tirei umas fotos à mãe, nas escadas, e descurei fotografa-lo. Achava as fotos reveladas na véspera boas recordações da efeméride, não me preocupei em guardar para a posteridade a sua imagem desse dia. Que pena!
Hoje, olho essa omissão como um prenúncio de partida..
No domingo de Páscoa era costume antigo estrearmos roupa. Para ir a Gondomar, eu usei um fato beige e branco e a mãe um conjunto de saia e casaco vermelho e preto, recém comprados, mas o pai levou o seu casaco cinza e a gravata, com que andava muitas vezes. A mãe e eu protestamos. Achámos que devia ir de fato completo, mais formal, para a reunião de família e o "compasso" em casa do Mário. Não conseguimos demovê-lo.
Tinha, na altura já o meu Peugeot 307, que gostava muito de guiar, apesar de não ter direção assistida. O pai foi busca-lo à garagem do prédio de apartamentos da rua 7, que é tão íngreme que eu nunca ousei usá-la...
E, depois do almoço da Olívia, lá partimos para Gondomar, eu munida da minha máquina de video, com que filmei mais de uma hora.

sábado, 25 de agosto de 2018

segunda-feira, 13 de agosto de 2018

DR CARLOS LEMOS - UMA HISTÓRIA DE VIDA

A História de uma Vida - o Homem e o Livro Tem estado em Espinho, desde Setembro, um dos portugueses mais cosmopolitas e mais viajados do nosso tempo - o Doutor Carlos Pereira de Lemos. Veio da Oceânia, com a Mulher, uma ilustre académica sul-africana, a Doutora Molly Murray de Lemos.. São emigrantes nesse continente tão distante, há largas décadas. Ele tem 90 anos, ela é mais nova, mas da mesma geração. Em janeiro de 2016, ela recebeu, pelos seus trabalhos de investigação no campo da educação, uma honraria rara, a Ordem da Austrália. ele, meses depois, em Dili, as insígnias da Ordem de Timor Leste, pela sua inteligente e incansável luta pela causa timorense. Carlos de Lemos é o nosso cônsul honorário em Melbourne, e todos esperam que se mantenha, futuramente,, porque tem sido um extraordinário representante do País, da lusofonia e dos seus Povos. Nesta visita a Portugal trouxe consigo um livro, uma autobiografia, que apresentou em vários lançamentos, de Lisboa a Melgaço. Não se pense, pois, que está no sossego de um confortável apartamento de Espinho, repousando nas nossas esplanadas, gozando a vista do nosso mar. Também está, mas não sempre.... As solicitações são tantas e de tantos quadrantes geográficos, que o vai vem é constante. Está habituado - de movimento se fez " a história de uma vida", que parecia condenada ao confinamento em pequenos povoados serranos do Alto Minho. O Homem Carlos de Lemos quase não teve infância - saiu da escola com a 3ª classe e logo precisou trabalhar, como um adulto. A partir dos 12 anos ficou entregue a si próprio e as grandes decisões, que moldaram o caráter do Homem e o conduziram num destino prodigioso, foram da sua inteira responsabilidade. O perfeito exemplo de "self made man" que, contra todas as probabilidades, chega longe - mas não no tipo de sucesso que quase exclusivamente se associa ao conceito: o sucesso material, a fortuna contabilizada em milhões.. Não era isso o que procurava. Queria ir longe no sentido literal de abrir horizontes geográficos, mas também os horizontes do conhecimento e da Cultura. Foi o que conseguiu, numa dimensão, à partida, verdadeiramente inimaginável.... Ele mesmo o afirma no epílogo da autobiografia: "eu não acumulei dinheiro. Mas acumulei riqueza de ter vivido uma vida cheia de experiência variadas". Sózinho vai para a cidade, ou melhor, no plural, cidades, uma após outra. É empregado de café em Melgaço, em Monção. Já aí um dos doutores que frequentava as tertúlias do café, lhe diz: "Rapaz, tu és um verdadeiro diplomata". E diplomata viria a ser, ao serviço da República Portuguesa|. Mas, antes, o seu percurso passa por Lisboa e Cascais. É já adjunto de topógrafo - um jovem bem parecido, bem falante, facilmente aceite em tertúlias de universitários e de intelectuais, Discretamente, aí vai a exame da 4ª classe. Como topógrafo, percorre o pais, do Algarve ao Minho. Espinho, Figueira da Foz, Póvoa, são praias onde o leva a bem escolhida profissão. Na Póvoa, num só ano, completa o antigo 5º ano do liceu. Em todo o lado, convive e dialoga à vontade com elites da cultura. Está pronto para "correr mundo", até ao limite das fronteiras de um "império", que entrava na sua derradeira fase, vai "do Minho a Timor".Primeiro, Moçambique - o vale do Limpopo, o Rio dos Elefantes, com esporádicas visitas à capital. Aí se torna amigo de Paulo Valada, de João Maria Tudela (com quem frequenta o seleto "Clube de Lourenço Marques"). e de... Samora Machel! Com as poupanças amealhadas no Limpopo, tira licença sem vencimento, não para se divertir, mas para estudar em Universidades da África do Sul. Quando o pecúlio se esgota procura nova ocupação, ainda mais a oriente. É o novo topógrafo -Chefe no projeto de construção do porto de Dili e no reconhecimento hidrográfico de outros pontos do litoral timorense. Anos felizes, já com a Mulher. Molly, que conhecera nos bancos da Universidade. Na África do Sul pertence ao "inner circle" de Alan Paton (cujo filho era seu colega). Na sua casa encontra outros famosos oposicionistas ao "apartheid", como Oliver Tambo, Mandela, Walter Sisulu. Em Timor, o especial amigo é Rui Cinatti - quem mais haveria de ser? Um novo capítulo se inicia, quando a carreira académica de Molly os leva à Austrália. Serão, doravante, emigrantes. Como topógrafo, ele atravessa os desertos do norte australiano, em voltas que totalizam mais de 34.000 km, por territórios onde homem algum tinha posto o pé. Melbourne é a cidade onde se enraízam, onde Molly prossegue a carreira académica e. Carlos de Lemos, depois de terminar os cursos de Sociologia e de Ciências Políticas, é professor, correspondente de bancos portugueses, e um cidadão ativo numa emergente comunidade portuguesa. Lidera, mobiliza, cria a escola de português, o programa de rádio, a "comissão" de atividades sociais e culturais. Antes de ser, formalmente, acreditado como cônsul honorário de Portugal (em 1988), já era o grande defensor dos imigrantes portugueses - e dos timorenses! - perante a sociedade e as autoridades do país. O seu prestígio e simpatia, a sua capacidade de comunicação e relacionamento convertem-no no mais notável paladino da cultura e da história portuguesas em toda a Austrália. Consegue o "impossível" - erguer um padrão de homenagem aos navegadores portugueses em Warrnanbool, onde terão aportado as caravelas lusas, 200 anos antes de Cook.. Kenneth Mc Intire, o investigador que veio comprovar a primazia da descoberta portuguesa, é visita assídua de sua casa. .Warrenanbool, cidade situada na chamada "costa dos naufrágios", recebe, desde então, muitos milhares de turistas, sobretudo por altura do "Portuguese Festival", que se realiza anualmente. Outra ideia Cônsul de Portugal - brilhante e pragmático, como sempre. À inauguração do Padrão, ele soubera assegurar a cobertura dos mais importantes "media" australianos, a presença do Governador- Geral e dos titulares dos mais altos cargos políticos, mas não quis que fosse - o que já seria muito - um evento isolado. O Padrão, com o Festival, converteu-se em autêntico "lugar de culto" para a nossa gente e para muitos australianos . A cidade agradeceu, dando a uma das ruas, o nome do Dr Lemos. O Presidente Sampaio distinguiu-o com a comenda da Ordem de Mérito. O Livro É uma narrativa fantástica do percurso deste Homem extraordinário, a mostrar mais um dos seus talentos: escrever num português límpido, simples e expressivo, um texto que nos encanta e nos convida a ir com ele pelo mundo fora, numa viagem contada em mais de 370 páginas - uma viagem que atravessa épocas, mares e continentes. Mais do que um detalhado relato de factos e realizações é uma partilha de memórias, de confidências, de observações e comentários sobre muitos lugares e muitas pessoas, com imenso interesse antropológico, histórico, sócio - político. É o retrato de um português de hoje que encarna, realmente, as virtudes que atribuímos aos antigos portugueses - o gosto pela aventura, a curiosidade e a aceitação da alteridade cultural, o dom de conviver com todos os povos. É o retrato de um emigrante que deixa por onde passa um rasto de simpatia e admiração por si e por Portugal, porque sempre soube "dar um sentido humanista e fraternal ao movimento incessante da sua vida". Com estas palavras terminei o prefácio que é seguido por três mensagens, de personalidades dos três países a que ele pertence afetivamente. Por Timor fala o Dr. Ramos Horta, reconhecendo que : "A sua tem sido, e sei que será, uma vida de serviço prestado à causa de Portugal, dos Portugueses e dos Timorenses". Pelo nosso País, o Dr. Rui Quartin Santos, antigo Embaixador em Canberra, realça "as suas qualidades humanas e profissionais, o prestígio que soube conquistar junto de portugueses e australianos". Pela Austrália, Sir James Gobbo, ex- Governador do Estado de Victoria e Juiz do supremo Tribunal de justiça, agradece, antes de mais, ao diplomata: "I think particularly of your role as Honorary Consul of Portugal and your admirable leadership of the Consular Corps in Melbourne".. Aqui fica um convite à leitura de uma história de vida, que é também uma história do País e e de outros Países.

segunda-feira, 2 de julho de 2018

ANCESTRY - SERÁ MESMO?

Iberian 61.2% Portugal Italian 7.3% French & German 2.1% British & Irish 0.2% Broadly Southern European 13.2% Broadly Northwestern European 12.3% Broadly European 3.5% Western Asian & North African 0.3% North African & Arabian 0.2% Broadly Western Asian & North African 0.1%