segunda-feira, 13 de agosto de 2018

DR CARLOS LEMOS - UMA HISTÓRIA DE VIDA

A História de uma Vida - o Homem e o Livro Tem estado em Espinho, desde Setembro, um dos portugueses mais cosmopolitas e mais viajados do nosso tempo - o Doutor Carlos Pereira de Lemos. Veio da Oceânia, com a Mulher, uma ilustre académica sul-africana, a Doutora Molly Murray de Lemos.. São emigrantes nesse continente tão distante, há largas décadas. Ele tem 90 anos, ela é mais nova, mas da mesma geração. Em janeiro de 2016, ela recebeu, pelos seus trabalhos de investigação no campo da educação, uma honraria rara, a Ordem da Austrália. ele, meses depois, em Dili, as insígnias da Ordem de Timor Leste, pela sua inteligente e incansável luta pela causa timorense. Carlos de Lemos é o nosso cônsul honorário em Melbourne, e todos esperam que se mantenha, futuramente,, porque tem sido um extraordinário representante do País, da lusofonia e dos seus Povos. Nesta visita a Portugal trouxe consigo um livro, uma autobiografia, que apresentou em vários lançamentos, de Lisboa a Melgaço. Não se pense, pois, que está no sossego de um confortável apartamento de Espinho, repousando nas nossas esplanadas, gozando a vista do nosso mar. Também está, mas não sempre.... As solicitações são tantas e de tantos quadrantes geográficos, que o vai vem é constante. Está habituado - de movimento se fez " a história de uma vida", que parecia condenada ao confinamento em pequenos povoados serranos do Alto Minho. O Homem Carlos de Lemos quase não teve infância - saiu da escola com a 3ª classe e logo precisou trabalhar, como um adulto. A partir dos 12 anos ficou entregue a si próprio e as grandes decisões, que moldaram o caráter do Homem e o conduziram num destino prodigioso, foram da sua inteira responsabilidade. O perfeito exemplo de "self made man" que, contra todas as probabilidades, chega longe - mas não no tipo de sucesso que quase exclusivamente se associa ao conceito: o sucesso material, a fortuna contabilizada em milhões.. Não era isso o que procurava. Queria ir longe no sentido literal de abrir horizontes geográficos, mas também os horizontes do conhecimento e da Cultura. Foi o que conseguiu, numa dimensão, à partida, verdadeiramente inimaginável.... Ele mesmo o afirma no epílogo da autobiografia: "eu não acumulei dinheiro. Mas acumulei riqueza de ter vivido uma vida cheia de experiência variadas". Sózinho vai para a cidade, ou melhor, no plural, cidades, uma após outra. É empregado de café em Melgaço, em Monção. Já aí um dos doutores que frequentava as tertúlias do café, lhe diz: "Rapaz, tu és um verdadeiro diplomata". E diplomata viria a ser, ao serviço da República Portuguesa|. Mas, antes, o seu percurso passa por Lisboa e Cascais. É já adjunto de topógrafo - um jovem bem parecido, bem falante, facilmente aceite em tertúlias de universitários e de intelectuais, Discretamente, aí vai a exame da 4ª classe. Como topógrafo, percorre o pais, do Algarve ao Minho. Espinho, Figueira da Foz, Póvoa, são praias onde o leva a bem escolhida profissão. Na Póvoa, num só ano, completa o antigo 5º ano do liceu. Em todo o lado, convive e dialoga à vontade com elites da cultura. Está pronto para "correr mundo", até ao limite das fronteiras de um "império", que entrava na sua derradeira fase, vai "do Minho a Timor".Primeiro, Moçambique - o vale do Limpopo, o Rio dos Elefantes, com esporádicas visitas à capital. Aí se torna amigo de Paulo Valada, de João Maria Tudela (com quem frequenta o seleto "Clube de Lourenço Marques"). e de... Samora Machel! Com as poupanças amealhadas no Limpopo, tira licença sem vencimento, não para se divertir, mas para estudar em Universidades da África do Sul. Quando o pecúlio se esgota procura nova ocupação, ainda mais a oriente. É o novo topógrafo -Chefe no projeto de construção do porto de Dili e no reconhecimento hidrográfico de outros pontos do litoral timorense. Anos felizes, já com a Mulher. Molly, que conhecera nos bancos da Universidade. Na África do Sul pertence ao "inner circle" de Alan Paton (cujo filho era seu colega). Na sua casa encontra outros famosos oposicionistas ao "apartheid", como Oliver Tambo, Mandela, Walter Sisulu. Em Timor, o especial amigo é Rui Cinatti - quem mais haveria de ser? Um novo capítulo se inicia, quando a carreira académica de Molly os leva à Austrália. Serão, doravante, emigrantes. Como topógrafo, ele atravessa os desertos do norte australiano, em voltas que totalizam mais de 34.000 km, por territórios onde homem algum tinha posto o pé. Melbourne é a cidade onde se enraízam, onde Molly prossegue a carreira académica e. Carlos de Lemos, depois de terminar os cursos de Sociologia e de Ciências Políticas, é professor, correspondente de bancos portugueses, e um cidadão ativo numa emergente comunidade portuguesa. Lidera, mobiliza, cria a escola de português, o programa de rádio, a "comissão" de atividades sociais e culturais. Antes de ser, formalmente, acreditado como cônsul honorário de Portugal (em 1988), já era o grande defensor dos imigrantes portugueses - e dos timorenses! - perante a sociedade e as autoridades do país. O seu prestígio e simpatia, a sua capacidade de comunicação e relacionamento convertem-no no mais notável paladino da cultura e da história portuguesas em toda a Austrália. Consegue o "impossível" - erguer um padrão de homenagem aos navegadores portugueses em Warrnanbool, onde terão aportado as caravelas lusas, 200 anos antes de Cook.. Kenneth Mc Intire, o investigador que veio comprovar a primazia da descoberta portuguesa, é visita assídua de sua casa. .Warrenanbool, cidade situada na chamada "costa dos naufrágios", recebe, desde então, muitos milhares de turistas, sobretudo por altura do "Portuguese Festival", que se realiza anualmente. Outra ideia Cônsul de Portugal - brilhante e pragmático, como sempre. À inauguração do Padrão, ele soubera assegurar a cobertura dos mais importantes "media" australianos, a presença do Governador- Geral e dos titulares dos mais altos cargos políticos, mas não quis que fosse - o que já seria muito - um evento isolado. O Padrão, com o Festival, converteu-se em autêntico "lugar de culto" para a nossa gente e para muitos australianos . A cidade agradeceu, dando a uma das ruas, o nome do Dr Lemos. O Presidente Sampaio distinguiu-o com a comenda da Ordem de Mérito. O Livro É uma narrativa fantástica do percurso deste Homem extraordinário, a mostrar mais um dos seus talentos: escrever num português límpido, simples e expressivo, um texto que nos encanta e nos convida a ir com ele pelo mundo fora, numa viagem contada em mais de 370 páginas - uma viagem que atravessa épocas, mares e continentes. Mais do que um detalhado relato de factos e realizações é uma partilha de memórias, de confidências, de observações e comentários sobre muitos lugares e muitas pessoas, com imenso interesse antropológico, histórico, sócio - político. É o retrato de um português de hoje que encarna, realmente, as virtudes que atribuímos aos antigos portugueses - o gosto pela aventura, a curiosidade e a aceitação da alteridade cultural, o dom de conviver com todos os povos. É o retrato de um emigrante que deixa por onde passa um rasto de simpatia e admiração por si e por Portugal, porque sempre soube "dar um sentido humanista e fraternal ao movimento incessante da sua vida". Com estas palavras terminei o prefácio que é seguido por três mensagens, de personalidades dos três países a que ele pertence afetivamente. Por Timor fala o Dr. Ramos Horta, reconhecendo que : "A sua tem sido, e sei que será, uma vida de serviço prestado à causa de Portugal, dos Portugueses e dos Timorenses". Pelo nosso País, o Dr. Rui Quartin Santos, antigo Embaixador em Canberra, realça "as suas qualidades humanas e profissionais, o prestígio que soube conquistar junto de portugueses e australianos". Pela Austrália, Sir James Gobbo, ex- Governador do Estado de Victoria e Juiz do supremo Tribunal de justiça, agradece, antes de mais, ao diplomata: "I think particularly of your role as Honorary Consul of Portugal and your admirable leadership of the Consular Corps in Melbourne".. Aqui fica um convite à leitura de uma história de vida, que é também uma história do País e e de outros Países.

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