sexta-feira, 25 de julho de 2014

Cidadania Feminina

Quando se fala em direitos da cidadania para as mulheres, é comum pensar directamente no sufrágio, na capacidade eleitoral activa e passiva. E, embora este Encontro ponha o enfoque sobre outras formas essenciais de a Mulher se expressar, como igual ao Homem, em diversos domínios, não deixámos de começar pela sua intervenção no mundo, ou, como prefere dizer a Drª Maria Augusta, nos mundos da política.
 Afinal foi justamente neste espaço que se desenrolaram as primeiras lutas das nossas avós sufragistas, aqui bem  lembradas  pela deputada Maria João Ávila, numa excelente introdução que tantas pistas nos dá para o debate
Desde logo com a citação de Abigail Addams, que já em 1776 se dirigia ao Congresso americano nestes termos:
 
"Se as senhoras não receberem cuidado e atenção especiais, estamos determinadas a fomentar uma revolta e não nos consideraremos obrigadas a cumprir a lei , diante da qual não temos voz ou representação".
 
Em Portugal, nos inícios do Século XX, Ana de Castro Osório diria praticamente o mesmo:" Não podemos considerar nossa uma República onde não temos direitos, onde não temos voz para protestar"
 
O eco longo do mesmo sentimento de injustiça e exclusão, tantos anos depois, era o sinal de que muito poucas tinham sido as mudanças...ou os ganhos!
E, agora, no século XXI, depois de mutações radicais, no que respeita às leis da igualdade, mas perante números de gritante" imparidade" de género no campo da participação concreta, do acesso a cargos políticos, em quase todos os países, a pergunta é: o que fazer,  no País e nas comunidades da emigração?

ENTREVISTA DE J RODRIGUES E Mª DO CÉU CAMPOS


1 - A "Mulher Migrante, Associação de Estudo, Cooperação e
Solidariedade" (AEMM) tem esta designação muito longa a fim de chamar
a atenção para as três vertentes em que trabalha, tanto em favor das
estrangeiras em Portugal como das portuguesas no estrangeiro. Grande
parte da sua actividade desenvolve-se dentro do país em colóquios, em
debates, na promoção de estudos e de informação sobre a emigração e a
imigração, em campanhas de sensibilização para a vivência da cidadania
pelos estrangeiros, e, em particular, pelas mulheres. A AEMM está
eleita, por larga margem de votos, para a Comissão Municipal de
Interculturalidade e Cidadania (da Câmara de Lisboa) e para o Conselho
Consultivo da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, é
reconhecida pelo Alto Comissariado para para a Imigração (ACIDI),
colabora com outras associações, com Universidades, centros de
investigação, escolas, Câmaras Municipais. Uma agenda cheia, com a nossa
diáspora feminina sempre presente!
Fora do País, mantemos contacto e cooperação permanente com uma rede de
parceiros, que começou a desenhar-se num Encontro Mundial de Mulheres
da Diáspora, que realizámos em 1995, em Espinho, e que contou com mais de 300
participantes. Ficámos, desde, então, com interlocutores e
representantes em países de todos os continentes. Temos núcleos nos EUA, em
Newark, no Brasil (Rio e São Paulo) e "associações irmãs" na Argentina - já com
um longo e notável percurso - e na Venezuela, esta constituida há poucos meses.
Depois de um novo Encontro Mundial em Novembro de2011, na cidade da Maia, o
ano de 2012 foi um período de expansão, nas Américas, e na Europa, onde destaco o
movimento que se está a iniciar na Inglaterra - as "Lusófonas de
Londres" - e a criação de Academias Séniores em Toronto e Buenos Aires.
Na AEMM, acreditamos nas virtualidades do chamado" congressismo", que
foi tão importante nos inícios do movimento feminista, desde fins do século XIX.
E continua a ser! Debates, seminários, reuniões internacionais, têm-nos servido para
apresentação de estudos e teses científicas, para partilha de experiências, para dar uma visão
comparatista dos problemas e de soluções possíveis. Mas, à força das palavras,
das ideias, tem de seguir-se a força das acções - o que nem sempre se
consegue. Nós podemos levar sugestões, propostas a círculos das
comunidades, mas a obra, quando se afirma, é mérito de quem trabalha
em concreto para implementar os projectos, quer de forma autónoma, quer
com a nossa em colaboração.


2 - A emigração têm feito parte da minha vida ao longo dos últimos 25
anos. É um domínio que me interessa pessoalmente, humanamente, muito
para além de cargos politicos que exerci no passado, cada vez mais
distante. Não pretendo ser uma autoridade na matéria, mas reconheço
que tenho observado, acompanhado e procurado agir em favor da melhoria
do estatuto de direitos e da abertura efectiva à participação
igualitária dos emigrantes, sem esquecer as mulheres.
Vejo a emigração, ao contrário do que se previa e dizia, como uma via
de emancipação das mulheres, porque, em geral, lhes dá acesso ao mundo
do trabalho, e, com isso, autonomia e uma boa integração na nova
sociedade, que acaba por influenciar poderosamente a integração de
toda a família.
Na Europa essa é, de facto, a regra. Nos EUA e no Canadá, também. Por
isso, nesta parte do mapa das nossas migrações há mais semelhanças do
que diferenças, no que respeita à situação das portuguesas. Nos outros
continentes há mais mulheres que se mantêm nas funções tradicionais.
Quanto mais elevado é o rendimento ou estatuto do marido, mais isso
tende a acontecer... Mas praticamente só na 1ª geração. As jovens
enveredam, quase todas, por carreiras profissionais, para orgulho de
suas mães.
No que respeita ao percurso feminino no nosso associativo, os obstáculos têm
sido enormes, embora haja progressos, aqui e ali, não ainda genericamente. Este
é um dos dados de facto que explica a subsistência do associativismo feminino e
que justifica a necessidade do seu crescimento. Pessoalmente, penso
que o equilíbrio de género no dirigismo associativismo é o ideal, a meta final.
Nós, na AEMM, temos como membros de pleno direito mulheres e homens, que,
lado a lado, lutam pelas mesmas causas. As questões de género
respeitam a todos e todos devem contribuir para sociedades mais
justas, mais inclusivas e, por isso, também mais eficazes e até mais
felizes...


3 - A ideia da igualdade de género faz hoje um percurso triunfante em
sociedades democráticas, mas não podemos esquecer que é coisa muito
recente - décadas, menos de um século - e que em grandes regiões do
mapa-mundi, persistem situações de verdadeira escravatura das mulheres.
A revolução democrática passa pelo interior da família, que agora assume o seu
governo em diarquia de marido e mulher, iguais em direitos e em poder
de decisão. Famílias mais dialogantes também em relação aos filhos.
Com os homens a assumirem crescentemente a parentalidade, as
obrigações no lar e as mulheres a intervirem, como cidadãs e
profissionais, fora de casa, onde estavam tradicionalmente
"emparedadas" .
Eu adiro ao adjectivo que usou:equilíbrio salutar! O equilíbrio é sempre
salutar. Permite a cada um escolher o seu caminho, sem a barreira dos
preconceitos, que predeterminavam as funções de cada sexo. É no
pluralismo de opiniões, de sensibilidades e de culturas, no qual se
engloba a componente de género e geração, que a democracia caminha e
se aprofunda. Por isso, para acelarar o ritmo das transformações, no
campo da política, sempre defendi o sistema de quotas para chegar à
paridade, com base na presunção realista da igualdade de capacidades entre os
sexos. Como costumo dizer, "à sueca"! Os resultados estão à vista,
tanto na Suécia e outros países nórdicos, como no sul da Europa, com a
Espanha à frente.. A recente introdução de quotas para mulheres e
homens na administração de empresas privadas, em países pioneiros,
como a Noruega ou o Canadá, traduziu-se em ganhos enormes de
produtividade e de lucros. Mostram-no os números, objectivamente. E
não creio que sejam fruto de uma superioridade feminina, mas sim da
conjugação criativa de modos diversos de ver e de actuar de homens e
mulheres. É o efeito do equilíbrio salutar, que a AEMM tanto se
empenha em promover em clubes e associações.


4 - Ao longo dos anos, fizemos várias visitas semelhantes, quase
sempre preparadas com antecedência, mas concentradas no tempo de
estadia, que é sempre breve. A forma como decorrem, o número e qualidade
das intervenções podem ser um bom preságio, mas o mais importante é o dia seguinte...
É a sequência! Temos essa experiência vivida desde os "Encontros
para a cidadania", que levamos a cabo em vários continentes e países,
entre 2005 e 2009, com o apoio muito directo do Secretário de Estado António
Braga. Uma forma de parceria que prosseguimos com o Dr José Cesário.
Devemos-lhe o estímulo e o apoio para a realização do Encontro
Mundial de Mulheres da Diáspora em Novembro de 2011. A partir daí, a
convite de participantes desse Encontro, relançamos iniciativas de
mobilização das mulheres das comunidades, para maior intervenção, com
desenvolvimento de projectos, como o das universidades seniores (ou
academias e tertúlias de convívio para os mais idosos), ou a recolha
de narrativas de vida, que são meio insubstituivel de fazer a própria
história da emigração no nosso tempo.
Ultimamente, temos posto o acento também no domínio cultural, na
defesa da língua, nas artes pláticas, na escrita - aquele em que as
mulheres são já iguais aos homens. Há que realçar esse facto, para
que sirva de estímulo a outras mulheres. Foi o que procuramos fazer em
2012 em diversas comunidades, em algumas já com resultados visíveis.
Noutras, caso da Alemanha, que foi a última do ano, é cedo para fazer
o balanço. Foi através da Maria do Céu Campos, uma das mais activas
participantes no Encontro Mundial de 2011 e a nossa principal
interlocutora na Alemanha, que obtivemos o contacto de Maria Kosemund
e das outras organizadoras das reuniões de Mainz e Wiesbaden. Acredito
que tentarão concretizar as principais propostas aí apresentadas. E queremos
continuar o trabalho noutras regiões, com outras comunidades.

5- A meu ver, na Alemanha, como um pouco por todo o lado, há no
associativismo lugar para maior intervenção feminina, em outros
moldes, em outros patamares. Estar na cozinha, assegurando uma das
principais fontes de receita dass colectividades, manter "a casa em
ordem", como acontece na sua própria casa, é certamente importante.
Mas porque não poderão também pertencer às direcções? Aí poderão
inovar, tornar as sedes mais atraentes para os jovens, que tendem a
afastar-se, para os mais velhos (que lá poderiam, como em algumas já
acontece, ter o seu "centro de dia", a sua "universidade sénior", a
sua margem de intervenção), para as próprias mulheres, para acolher os
emigrantes que estão a chegar... Hoje, em muitas regiões do mundo,
fala-se de decadência do associativismo, da dificuldade de encontrar
dirigentes. Dar lugar às mulheres duplica o campo de recrutamento e
pode trazer interessantes propostas, num novo relacionamento de género
e geração.
Acredito que isso aumentará a convivialidade e o dinamismo social, que
pode igualmente ser favorecido por esquemas mais informais de
organização, como grupos de reflexão e de intervenção social, círculos
culturais, literários, musicais, simples tertúlias de amigos, vindos
dessas "minorias" mais marginalizadas, se souberem atraí-las à sede
das associações.
Na nossa mais recente publicação,, uma revista que tem por título
"Entre Portuguesas num mundo sem fronteiras", entrevistámos o Dr José Cesário
e fizemos manchete com esta sua declaração "sem Mulheres, não há reforma no
associativismo". É verdade e é bom que os governantes o reconheçam.


6 - A história da emigração portuguesa mostra que os laços de ligação
ao País não se perdem com o enraizamento noutras sociedades. Pelo
menos no que respeita às primeiras gerações. E, às vezes, também até
nas gerações seguintes, muito por mérito e influência das Mães e das
Avós, que ensinam aos jovens a sua língua e a afeição à sua cultura.
Os governos não conseguem alterar isto! Sabemos bem que não só a
Alemanha, mas quase todos os países europeus de imigração desenvolvem,
mais ou menos abertamente, políticas de pura assimilação dos estrangeiros,
ao contrário do que acontece nas Américas, em países construidos por gente
de todas as origens e, por isso, conscientes de uma identidade nacional feita de
diversidade étnica e cultural.
Ao longo da minha vida na política lutei sempre pela dupla nacionalidade, dentro
e fora do país, na Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, na
qual fui representante de Portugal durante 13 anos. Considero que dupla nacionalidade
corresponde à dupla ligação genuina, sentida a duas Pátrias, unidas no percurso
migratório individual. Como nós amamos Mãe e Pai a 100%, também podemos
amar duas culturas e dois países a 100%.
Acredito que as Portuguesas da Alemanha serão sempre portuguesas e
espero que se sintam, também, alemãs, correspondendo à vontade da
Alemanha de as tratar como tal. E ainda bem - ainda bem que superou a tese
dos imigrantes como "trabalhadores convidados".


7 - Gostaríamos de contribuir para um melhor conhecimento do papel das
portuguesas na sociedade alemã, para um movimento de cooperação entre
elas e de poder dar testemunho dessa realidade nas nossas
publicações, divulgando-a junto das nossas associadas em outros
países. De ser um elo de ligação entre as Portuguesas da Alemanha e as
Portuguesas com quem já cooperamos noutras latitudes.
Referirei alguns dos projectos que lançámos para cumprir as
recomendaçõe do Encontro Mundial de 2011: as Academias Séniores de
Artes e Saberes (ASAS). a recolha de histórias de vida, de que já
falei, o levantamento da situação das mulheres no dirigismo
associativo, o acompanhamento da nova emigração, com estudos,
estatísticas, abordagem dos seus problemas, enfoque nas suas realizações,
debate sobre as duplas pertenças e a capacidade muito
feminina de preservar o património cultural (as mulheres guardiãs da
cultura e promotoras de integração, como disse), e ligado a este
aspecto, a preservação da memória, a homenagem a mulheres
excepcionais, que foram forçadas ao exílio, como Maria Lamas e Maria
Archer, jornalistas, escritoras, que dedicaram a vida à luta pelos
direitos da mulher, e pela liberdade e democracia para Portugal e que
nós lembrámos, recentemente, numa sucessão de colóquios, no Teatro da
Trindade, em Lisboa, no Guarani, no Porto, em bibliotecas, em escolas,
com publicações, cujo lançamento é ocasião para novos debates. Isso tem
acontecido no país, de norte a sul, e é nosso propósito estender a
iniciativa às comunidades, destacando exemplos da emigração do passado
para pensar a do futuro.
Há muito mais a fazer, na linha das propostas feitas pelas Emigrantes no
congresso de 2011! Pergunta-me como resolvemos a questão de encontrar
locais para as nossas reuniões. Em regra, contamos com outras instituições
que nos abrem as portas, em salas de associações, anfiteatros de municípios
ou universidades, bibliotecas públicas... E Embaixadas e consulados
que nos têm apoiado de forma extraordinária, sempre que pedimos a sua mediação.


8 - Sim , nós somos uma associação que não faz política partidária. O
nosso partido são as mulheres, as emigrantes, os seus direitos, como
dizia a notável republicana e feminista Ana de Castro Osório. Estamos
unidas pela causa da plena cidadania feminina e temos trabalhado bem
com governos de diferentes partidos, contribuindo para a execução de
programas para a emigração. com a componente de género - num ambiente
de consenso e com uma constância, que não se verificará em outros
aspectos das políticas para as comunidades. Continuamos o espírito de
um memorável 1º Encontro de Mulheres, na cidade de Viana do Castelo,
em 1985, que foi, por sinal, o primeiro convocado por um governo de um
país de emigração. Esse Encontro veio a inspirar a criação da AEMM,
alguns anos depois, em 1993. Na sua matriz está a vontade de
cooperação Estado- Sociedade Civil, com respeito pela autonomia das
respectivas esferas.. Uma herança que queremos continuar e que tem encontrado
receptividade nos sucessivos governos..


9 . Um jornal prestigiado, um jornal que vive no centro das
comunidades portuguesas e lhes dá voz, é, evidentemente, um
interlocutor esplêndido! Queremos contribuir para transformações de mentalidades
e atitudes a imprensa é instrumento fundamental para atingir esses fins, para
promover a mudança de opiniões, o combate aos preconceitos.
Estou a lembrar-me de uma série de debates que realizámos, há alguns
anos, nos EUA e no Canadá sobre "acção e representação das mulheres
nos media" - e em que foi bem destacado o papel dos jornalistas e dos
jornais nos avanços registados na forma de ver e reconhecer as
emigrantes.
Em nome da AEMM agradeço esta oferta de cooperação e, desde já,
manifesto o nosso desejo de corresponder. À Maria do Céu Campos e ao
José Rodrigues já os consideramos aliados para muitas futuras acções.

 
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terça-feira, 17 de junho de 2014

A REVOLUÇÃO DO 25 DE ABRIL

O mundo de emigração e da Diáspora


A minha primeira palavra é de agradecimento à Prof Doutora Maria Fernanda Rollo pelo convite para participar neste grande congresso sobre a revolução do 25 de Abril, sobre o seu significado para Portugal e para os Portugueses, com a promessa, que viria a ser cumprida, de liberdade e de democracia. Para todos os Portugueses, também para os da emigração e da Diáspora. Deles falarei em breves palavras.
A revolução do 25 de Abril é, neste domínio, uma data maior, a maior de todas, porque veio trazer a liberdade, rompendo com os obstáculos de ordem jurídico- administrativa à decisão individual de emigrar, rompendo com políticas multisseculares de limitação ou proibição das saídas - mais ainda para as mulheres do que para os homens.
 Na verdade, o êxodo sem fim dos portugueses pelo mundo, num contínuo encadeamento de ciclos, não fora, nesse passado longo, nunca, inteiramente livre.
E a democracia nascente vinha também restituir aos emigrantes o seu direito de cidadania, de participação política, contra uma tradição de absoluta exclusão da comunidade nacional, uma verdadeira "capitis diminutio", que os atingia mal atravessavam a fronteira terrestre para viver no estrangeiro. Foi, pois, uma revolução de princípios e conceitos, com imediato reflexo a nível dos direitos individuais.
A centralidade dada às questões da emigração revela-se, na cronologia das medidas políticas tomadas nesta área, antes de mais, pela criação, logo em 1974, de uma Secretaria de Estado da Emigração. A nova Secretaria integrava os serviços preexistentes do Secretariado Nacional da Emigração, a partir dos quais se haviam planificado e executado, nas vésperas da Revolução, as primeiras medidas de apoio social e cultural às comunidades do estrangeiro, sobretudo na Europa. Todavia, é com o novo regime que essas políticas embrionárias se vão desenvolver, nomeadamente no que respeita à representação política, à aceitação da dupla nacionalidade, à defesa activa dos direitos dos portugueses, à atenção dada ao associativismo, ao ensino da língua, à informação (alguns anos mais tarde, potenciada com as emissões da RTPI, um privilegiado instrumento ainda hoje subaproveitado),  ao apoio ao regresso voluntário ao País, através de um conjunto de benefícios fiscais e de empréstimos a juros bonificados. para aquisição de casa própria ou para lançar empreendimentos - medidas cuja eficácia se viria a comprovar nos anos seguintes. A reinserção de centenas de milhares de portugueses, vindos, sobretudo, de França e de outros países do nosso continente, foi de tal modo por eles planeada neste contexto, que se consumou numa infinidade de regressos "invisíveis”.
Estou já a pensar na década seguinte, antecipando  avanços  conseguidos: a revolução significou, no imediato, a vontade de consolidar um  “estatuto dos expatriados”, mas só depois este foi sendo materializado, em novas configurações de direitos, e em práticas, a um ritmo lento, que é o ritmo a que mudamos preconceitos e mentalidades. Há ainda muito por fazer para uma "cidadania de iguais",  fora das fronteiras geográficas, isto é, para corporizar o projecto de representação política e de igualdade de direitos no campo social e cultural, erradicando, de vez, o "paradigma territorialista" dominante até 1974. Até então, a ausência no estrangeiro implicava a perda de todos os direitos políticos e da própria nacionalidade (se os portugueses voluntariamente adoptassem a de outro país e, no caso das mulheres, mesmo contra sua vontade, automaticamente, pelo casamento com estrangeiros) e\ de outros direitos, como o do acesso ao ensino da língua, de que o Estado nacional não curava - as primeiras políticas de intervenção, em meados do século XX,  limitavam-se ao acompanhamento da viagem atá ao ponto de chegada, onde os emigrantes ficavam entregues a si próprios. Foi a dinâmica do associativismo, que, nos países de acolhimento, soube, quase sempre e por todo o lado, substituir-se ao Estado.
O trânsito para o" paradigma personalista", na definição de Bacelar de Gouveia, ir-se-á concretizando num estatuto de direitos de cidadania à medida da Nação e não só da terra portuguesa.
Um novo Direito, um "acquis" da Democracia.
 O nº 1 do art. 46º da Constituição de 1976 estabelece que : "Todos os cidadãos têm o direito de tomar parte na vida política e na direcção dos assuntos políticos do país, directamente ou por intermédio de representantes livremente eleitos". Pela primeira vez, os portugueses emigrados são eleitores de representantes na Assembleia da República, mas não ainda com um “voto igual”. De facto, o nº 2 do art. 152º, restringe a aplicação do sistema proporcional aos círculos territoriais e o regime de exceção vai servir para impor, na lei eleitoral, um teto de apenas quatro representantes em dois círculos próprios da emigração, europeia e transoceânica, com menos de 2% do total dos membros da Assembleia, para uma população que se estima em 30% - embora se deva reconhecer que são muito menos de 30% os potenciais recenseados no estrangeiro.
Nos outros actos eleitorais, a Constituição de 1976 exigia a residência no território nacional (art. 124 para o PR) ou na área territorial da autarquia (art. 246º nº1 para as freguesias e art. 252º para os municípios). No que respeita às regiões autónomas, não há dispositivo semelhante, mas a questão não foi  equacionada nos respectivos estatutos político administrativos.
O sufrágio na eleição presidencial viria a ser alcançado, entre públicas controvérsias e difíceis negociações inter partidárias, na revisão Constitucional de 1997,  com as exigências formuladas no nº2 do art. 121: "A lei regula o exercício do direito de voto dos cidadãos portugueses residentes no estrangeiro, devendo ter em conta a existência de laços de efectiva ligação à comunidade nacional".
 Mais restritivo é ainda o nº 2 do artº 115, que prevê a sua participação nos "referenda" apenas "quando recaiam sobre matéria que lhes diga também especificamente respeito". Nos referendos já realizados os emigrantes não foram consultados, por terem sido vencidas as propostas que lhes davam esse direito.
 Não poderei alongar-me, aqui, sobre as vicissitudes de processos de legiferação, em que fui interveniente, ao longo de mais de 20 anos, sempre em favor do alargamento do estatuto político dos expatriados, a nível nacional, autonómico e autárquico, com base em exemplos do direito comparado -  como o de Espanha que atribui aos seus expatriados o direito de voto a todos os níveis. Direi, apenas, em síntese que, a meu ver, entre nós, os partidos atuaram, regra geral, de acordo com as suas subjectivas expectativas sobre o sentido de voto dos emigrantes. Os que se consideravam por ele prejudicados desenhavam o cenário fatal de uma enorme expansão do eleitorado da diáspora, artificialmente engendrada pelos prosélitos do sufrágio. Ao fim de 40 anos de experiência democrática já não restam dúvidas sobre o irrealismo dos receios: no estrangeiro o universo eleitoral é reduzido e estável, com cerca de 260.000 recenseados e cada vez maiores taxas de abstenção.  Na Espanha, só a Galiza tem muito mais eleitores do estrangeiro e, sobretudo, muito mais votantes.
 Creio que o clamor sobre a anunciada avalanche de votos "de fora", que, redobrou a partir da aprovação da Lei nº 73/8, popularmente chamada "lei da dupla nacionalidade",  se ficou a dever a confusão entre emigrantes recentes  - os que, tendo passaporte português, podem recensear-se voluntariamente e, em larga maioria, note-se, não o fazem -  e os da Diáspora, cuja ligação ao País passa por laços afectivos e pela intervenção cultural, não pela política. A meu ver, há que deixar aos próprios emigrantes e seus descendentes a escolha da forma de manifestação dos seus sentimentos de pertença, não sendo, pois, legitimo nem desvalorizar nem pretender retirar à minoria de participantes na vida política os seus direitos inalienáveis, em nome de uma maioria que se reconhece em outras formas de "ser português".
Um organismo criado na confluência destas diferentes vertentes de afirmação de pertença foi o Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP), nos moldes originalmente propostos pelo DL nº 373/80. Nele tinham assento representantes eleitos das associações, independentemente de serem ou não de nacionalidade portuguesa. Era uma órgão consultivo do Governo, presidido pelo MNE, uma plataforma de encontro e articulação de acções entre comunidades dispersas e praticamente desconhecidas entre si, e de co-participação nas políticas destinadas a um mundo tão plural. Um órgão de consulta pensado para as duas vertentes, para a emigração antiga, com a força das suas aspirações e projectos culturais, e para a mais jovem, com a pressão dos seus problemas e reivindicações sociais.  Nem sempre foi fácil o diálogo entre ambas e teria sido talvez  preferível, como continua a propugnar Adriano Moreira, a instituição de estruturas específicas para cada uma delas.
No CCP,  a última acabou por ter mais visibilidade e mais voz, deixando na sombra os consensos naturais no domínio cultural - que é sempre, por excelência, o lugar de uma solidária partilha das raízes matriciais - e focando, essencialmente, as questões laborais, sociais e políticas do quotidiano, as divergências ideológicas e partidárias, que, fora como dentro do país, se confrontavam na sociedade portuguesa. Foi, assim, o espaço de uma esplêndida vivência democrática, que, porém, desde a primeira hora, marcou o Conselho com uma imagem de conflitualidade mais do que de cooperação e solidariedade, que, por sinal, existiram em muitas matérias. Terá sido essa aparência mediática que, a partir de 1988, levou o governo a suspender as suas convocatórias, a silencia-lo, antes de o substituir por uma estrutura insólita, composta  de múltiplos colégios eleitorais, que era patentemente inoperacional.
 Em 1997, o CCP ressurgiu em novo figurino, passando a ser eleito por sufrágio directo e universal, ou seja, reservado a emigrantes com nacionalidade portuguesa.
O Conselho teve, assim, várias vidas entrecortadas, um percurso acidentado, em cuja fase inicial pude intervir mais diretamente, como membro do governo, em representação do MNE. Depois, por inerência de funções, como deputada do círculo de “Fora da Europa”,  continuei a colaborar nos trabalhos de conjunto, acreditando sempre na sua capacidade de ser o grande "forum" democrático da emigração. Uma espécie de 2ª Câmara consultiva, uma "assembleia"  - título que passou a assumir, ultimamente, o antigo "Conséil" francês. Uma instituição que deveria ser consagrada na arquitectura da Constituição, para ficar ao abrigo do poder discricionário dos governos. O tema foi discutido na AR, em 2004, por iniciativa da Sub comissão das Comunidades Portuguesas, a que eu, então, presidia . A ideia persiste,  foi ali analisada construtivamente por eminentes constitucionalistas e pode vir a ser lei, um dia, não sabemos se e quando...
 No domínio das políticas da emigração e da diáspora avança-se a par e passo. Falar de uma e outra, em conjunto, não significa esquecer que há uma gradação no conhecimento e reconhecimento público, que subvaloriza a realidade da diáspora face à da emigração do presente.  Os movimentos migratórios sempre foram vistos, e ainda o são, numa perspectiva principalmente economicista. -  envio das remessas, investimentos e benfeitorias locais, o chamado "comércio étnico", tudo o que é materialmente palpável - desvalorizando outros aspectos, como o esforço para expandir o espaço cultural português na densa rede de instituições, de que são feitas as comunidades portuguesas. Na ligação entre movimentos migratórios e diáspora, aqueles surgem como causa (ou concausa) e esta como sua dimanação, graças à enorme propensão associativa, com que nos  temos singularizado, em todos os tempos e lugares. Comunidades organizadas, espaços de vivência nacional...
Sabemos que a revolução de 74 veio derrubar uma ditadura, pôr fim ao impasse de uma guerra sem sentido e sem futuro, fechar um ciclo colonial e repor o Estado nas suas fronteiras geográficas europeias. Não veio, antes pelo contrário, pôs fim a essa presença universal dos portugueses, que sempre teve "vida própria" numa espontânea convivialidade, em relações de vizinhança e de cooperação, à margem dos desígnios ou poderes do Estado.
É certo que a nossa tradição migratória começou o seu curso ligado ao projecto do Estado de expansão marítima e de colonização de possessões, mas logo o transcendeu. Um projeto estatal  aparentemente desmesurado e para o qual não havia paradigma, não havia lições a aprender... Era enorme o risco de perder o certo pelo incerto, mas nunca faltou gente para servir a incerteza  da aventura, indo cada vez mais longe, dominando um todo geográfico cada vez mais vasto, a partir de uma população de somente cerca de um milhão pessoas. Logo no século XVI, o movimento envolve quase um terço da população total – mais de 280.00 homens, segundo Vitorino Magalhães Godinho. Uma impressionante média anual, que sobe no século seguinte para cerca de 8.000, no século XVIII para 40.000 e atinge novos máximos nos séculos XIX e XX. Estamos a falar, globalmente, de números na ordem de milhões. E as partidas assumiam, como disse, cada vez mais, o carácter de aventura individual, privilegiando o imenso Brasil. As políticas que procuravam regular os fluxos migratórios iam inevitavelmente no sentido de os restringir, ou mesmo de os proibir. Movimentos incessantes,  uma autêntica cultura de expatriação...
Talvez por isso os historiadores da emigração portuguesa (Joel Serrão, por exemplo) não resistam a olhar as partidas ininterruptas  de 500 anos e não apenas de 150 ou 200 anos de migrações, em sentido estrito. De facto,  não se consegue traçar, com precisão, os contornos da passagem de um ao outro dos fenómenos – o último a suscitar maior confronto entre vontade do Estado e a do povo, entre uma emigração que os governos não pretendiam naquela dimensão, ou para aquelas paragens. Ou que queriam apenas temporária, mas que os protagonistas converteram em definitiva, sobretudo quando se generalizou a saída de mulheres, de famílias inteiras. O regresso definitivo era a parcela menor  e não aumentou após a independência do Brasil, que continuou a atrair vagas (crescentes...) de portugueses.
As duas grandes migrações de retorno aconteceram só na segunda metade do século XX: a da Europa, voluntária,  bem preparada, gradual, ano após ano, atingindo o auge nas décadas de oitenta e noventa -  e a de Africa, no curto período da descolonização, súbita e dramática, com cerca de 800.000 retornados a Portugal e muitas dezenas de milhares a reemigrar. O Brasil foi, então, único país que abriu as fronteiras a todos os portugueses, sem olhar a idade, formação profissional, saúde  ou fortuna. Um gesto de fraternidade muito concreto, a não esquecer!
O retorno de África vinha em contra corrente, depois da maior emigração de sempre, que fora a dos anos cinquenta e sessenta, apenas estancada, em setenta, pela crise económica mundial. Saíram então quase 2 milhões (para a Europa mais de 1.200.000, para novos destinos transoceânicos, como a Venezuela, Canadá, RAS, Austrália, mais de 500.000). A chegada, em 74/75, de quase um 1.000.000 de portugueses parecia uma situação impossível de gerir. Não foi. Fica para a nossa história e para exemplo geral, o modo como superaram perdas e mágoas inenarráveis, encontraram lugar no país e contribuíram para o seu desenvolvimento. Sucesso assente em políticas de integração, na solidariedade familiar, mas principalmente nas próprias pessoas, no seu perfil empreendedor, na sua vontade de recomeçar a vida, num meio tão diferente, relativamente tão pequeno. Impressionante foi a sua aceitação local, o seu ascendente, revelado no número dos que foram eleitos para cargos autárquicos, logo nas primeiras eleições livres. Um tema a merecer mais estudo e mais destaque do que o que lhe tem sido dado.
  É sobre as causas sociais e económicas da emigração portuguesa que as atenções se têm concentrado. Há as estatísticas das partidas dos homens, a que se juntam as do retorno das remessas. Por trás dessa densa cortina de números, mal se adivinhavam outros feitos, outras verdades. A Diáspora era praticamente ignorada, não só pelos políticos, como pelos tratadistas e investigadores da nossa emigração. Até à convocação dos Congressos das Comunidades de Cultura Portuguesa, em 1964 e 1967, por iniciativa de Adriano Moreira, presidente da Sociedade de Geografia, ninguém dedicara mais do que uns breves parágrafos à existência de comunidades portuguesas, organizadas numa base institucional, que lhes garantia a sobrevivência, para além das primeiras gerações de imigrantes (coisa que ninguém imaginara possível).
Ora, de facto, tudo o que políticos e académicos viam como compensação de um êxodo de tamanha dimensão - as riquezas do comércio, da exploração de recursos de vastas possessões, e, em cada época, as remessas de emigrantes, tiveram o seu tempo e com ele se desvaneceram. O que resiste é a parte que escapou à perceção de todos -  a criação pelos Portugueses de um incomensurável espaço de lusofonia e de lusofilia, a língua, as comunidades portuguesas, e para além delas, um mundo de memórias que hibernam, à espera de uma chamada, de uma aproximação, para ressurgir. Citando Jorge de Sena :“solúvel e insolúvel este povo, na memória dos outros e na sua própria”.
 Serão estas as  maiores das retribuições de um êxodo excessivo - a virtude do excesso…
 Em primeiro lugar, a língua. A língua, viva em todos os continentes, é muito mais o resultado desta expatriação voluntária, em massa, e do relacionamento quotidiano entre os portugueses e os seus vizinhos de outras falas, do que do poder soberano exercido num território. O uso da língua não se decreta sem falantes!
 Veja-se o caso paradigmático do Brasil, para onde foram tantos portugueses, contrariando leis e ditames dos governos, que procuravam canalizar essa corrente migratória para as colónias de África (onde, aliás, nem sequer estavam criadas as condições efetivas para o seu aproveitamento). Medidas polémicas, contra as quais se insurgiram os que viam nas novas correntes migratórias condição necessária para preservar a herança linguística e afetiva num Brasil independente, aberto ao acolhimento de outros europeus. Afonso Costa foi um dos que tomou partido, claramente: "Não cometamos o crime de lesa pátria de embaraçar a emigração para o Brasil ou de ali nos deixarmos vencer por qualquer outro povo migrante".
 Em causa via, certamente, a língua, sobre a qual Joaquim Nabuco, discursando no Gabinete de Leitura do Rio de J, no 4º centenário de Camões havia proclamado:
“A tua glória não precisa mais dos homens. Portugal pode desaparecer, dentro de séculos, submergido pela vaga europeia, ela terá em 100 milhões de brasileiros a mesma vibração luminosa e sonora ”  (100 milhões, então, mais de 200 milhões agora!).
António Cândido, no 4º centenário da Descoberta do Brasil, celebrado a 19 de Maio, no Teatro de São João, do Porto, enunciara, por outras palavras, a mesma ideia - força: “Temos uma longa vida nacional. Não nos escasseiam meios de a nutrir, não nos falece a coragem para a defender. Mas, se, por fatalidade acabássemos, se (…) uma terrível catástrofe geológica submergisse esta parte do continente europeu (…) lá ficariam no Brasil para sempre, o seu sangue, a sua alma, a sua língua.
E, noutro passo: “Poderá a história ser esquecida, poderá o interesse volver-se contrário: resistirá a tudo a afinidade espiritual, a aliança pela língua será eterna.”
Língua europeia, americana, africana, asiática, universal. Legado de partilha de vida, de convivência de gente comum, que a força do poder imperial não contaminou…
 Uma última referência às comunidades da emigração - comunidades inteiramente construídas pelos cidadãos, perante o absoluto descaso do Estado.
O fim do império coincide com a atenção dada às comunidades, antes apenas se podendo excecionar as realizações de Adriano Moreira, os dois grandes Congressos, dos quais emergiram a “União das Comunidades de Cultura Portuguesas" e a "Academia Internacional de Cultura Portuguesa".
Vitorino Magalhães Godinho afirmou numa celebração oficial do dia 10 de Junho: “Há um Portugal maior do que o Império que se fez e desfez e que é constituído pelos portugueses, onde quer que vivam”
Também Sá Carneiro vê um  Portugal maior :“Foi uma Nação de colónias. Hoje não é apenas uma Nação territorial, é uma Nação populacional, uma Nação de povo (...)“uma Nação de Comunidades”. “É uma cultura, mais do que uma organização rígida”.
  A existência da nossa Diáspora precedeu, assim, em vários séculos o seu conceito, o seu reconhecimento. Diáspora que soube organizar-se, para sobreviver, através de um poderoso impulso associativo. No Brasil, o primeiro e o máximo paradigma, com os Gabinetes de Leitura, os Liceus e os Grémios Literários, instituições muito prestigiadas, com as Beneficências e os seus hospitais, que estão entre os maiores e melhores do país, com grandes clubes sociais e desportivos. Por todo o lado onde se fixaram, os portugueses deram vida duradoura a organizações centradas naquelas três áreas (cultura, apoio social, tradições de convívio),  associações idênticas nos seus propósitos, apesar de se ignorarem entre si. Semelhança que se deverá ao facto de se inspirarem em modelos da terra de origem.
Portugal, o país das migrações sem fim...  Assistimos hoje a um dramático recomeço de ciclo , a exigir dos governos o cumprimento dos seus deveres constitucionais em políticas de defesa dos direitos dos emigrantes e de difusão da língua e da cultura.
O êxodo dispersa agora os portugueses por uma multiplicidade de países em todos os continentes, acentuando a que já era uma das características da nossa emigração.
Mais emigrantes, mais mulheres, esperança de mais diáspora futura, mais Portugal no mundo.

Maria Manuela Aguiar

Teatro Nacional Dona Maria II
21 de abril de 2014

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Para Isabel Saraiva

Com este precioso livro que pertence mais do que a duas línguas, ou a duas artes, verdadeiramente a dois mundos, vem agora Isabel Saraiva abrir novas vias de diálogo intercultural luso-nipónico,  Com os seus poemas, a sua pintura...

Como escrevia Wanceslau de Morais," a pintura japonesa é como uma invocação [...] é como se dissesse que aquele pincel inteligente, não pinta, pensa e recorda".

As aguarelas suavemente polícromas e as estrofes breves e significativas dos poemas "hai-ku" de Isabel Saraiva convertem-se em talentosa invocação de um passado longo de atração recíproca entre dois países  e dois povos que tantos mares separam. 
 
 São, assim,  como que uma nova viagem por espaços que guardam memórias de naus e caravelas, do primeiro encontro desse pequeno junco perdido na tempestade, que, por providencial acaso, aporta em ilha tão acolhedora, da primeira "embaixada" que de Nagasaki, em 1582,  trazia dois jovens, os primeiros japoneses a verem à Europa...
 Nas viagens, se foram construindo pontes feitas de afinidades redescobertas, de convergência da visão de coisas essenciais - olhares e expressões que se cruzam num inesperado entrelaçamento de culturas, num mesmo sentimento de admiração pelas infinitas singularidades do outro, numa vontade de compreensão e de intercâmbio...
Nela se funda a amizade multissecular, indestrutível, entre o Portugal da odisseia  marítima e o "Dai Nippon", que a geminação do Porto e Nagasaki, cidades antigas e modernas, renova e simboliza.
Nas palavras de Isabel Saraiva,:

Traço de arco de uma ponte
comércio de olhares
 - rostos serenos

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

sobre a Bienal"Mulheres d'Artes


A 1ª Bienal Mulheres d'Artes foi uma ideia original, logo levada à pratica numa iniciativa inédita em Portugal, e de que não se conhecia precedente em qualquer  outro País. Não se quis organizar apenas uma grande exposição colectiva de Mulheres, que se reuniam em Espinho, num tempo datado: a intenção foi, desde o início, a de a projectar nos horizontes do  futuro, a de a convocar repetidamente, animada pelo mesmo espírito e propósito, que é, antes do mais, o de testemunhar capacidade de criação artística e de inovação no feminino
Uma Bienal é sempre um desafio de resistência ao efémero, ao ocasional, como o exige a etimologia da palavra, a sua lógica diacrónica, a sua vontade de institucionalização - ou seja, de ganhar vida própria, num percurso longo, a fazer história das Artes.
Em boa verdade,uma 1ª Bienal é uma declaração de intenções - para ser mais do que isso, exige a seguinte, ou as seguintes, só elas lhe dão a certeza de existência, lhe acrescentam corpo à alma...
O sucesso da colectiva de 2011 ficou, assim, à espera do sucesso  da de 2013, que aparece desde já assegurado num crescendo de adesões, na sua internacionalização, na atracção de novas presenças da nossa Diáspora.
Uma aventura de descoberta ou de confirmação de talentos  e de novos caminhos para as Artes no feminino. E, também, da procura de novas respostas para questões que a 1ª Bienal viera colocar em agenda;
Porquê só Mulheres?
Talvez pela mesma razão que levou, nos anos 40, Maria Lamas a organizar uma grande mostra mundial de livros escritos por mulheres...Para recentrar a História na Humanidade toda e não apenas numa metade, que em todos os dominios e, também no das Letra e das Artes, tem marginalizado o outro, ainda que mais no passado do que no presente
Ou, simplesmente, porque é sempre interessante mostrar as expressões artisticas de quem aceita a ideia de o fazer num determinado contexto, , de sintonias de género ou de geração ou de correntes, ou de de regiões, países, cidades...
No 40ª ano de elevação a cidade, a Bienal parece poder tornar Espinho na cidade das artes, das mulheres, das mulheres d' artes...

Natália sobre Gardel

 Sobre a influencia de pintar a Carlos Gardel, é porque o Fado e o Tango têm similitude, na melancolia da sua letra. E, depois, era um homen bem bonito para a época.
Pintar a Gardel foi para mim um grande  prazer por ter logrado, com muita humildade , um retrato parecido com ele, Pintar caras nâo é nada fácil... Também lhe mandei a obra pintada a óleo  de Jorge Luis Borges e da María Kodama , por mail.
 E estou acompanhada na Fotografia tirada no Museu por María Kodama   e pela minha grande amiga a Escritora  Ana María Cabrera.

Relato de uma despedida - em Montreal como deputada, pela última vez



MANUELA AGUIAR:

NO CÍRCULO DA EMIGRAÇÃO

Reportagem de
Vitália Rodrigues

Manuela Aguiar, deputada pelo círculo da Emigração e Carlos Oliveira, cônsul-geral de Portugal em Montreal

Círculo de livros ao centro da mesa. Livros que Manuela Aguiar ofereceu aos presentes.



Francisco Salvador, Conselheiro das Comunidades Portuguesas no Canadá, ladeado por Manuela Aguiar e Corinne Descombes

Manuela Aguiar autografa o seu último livro


Dr. Carlos Oliveira em amena cavaqueira com o docente do Instituto Camões, dr. Luís Aguilar


Mário Conde e Corine Descombes ladeiam o representante de Portugal em Montreal, dr.Carlos Oliveira, retribuindo-lhe a visita que o diplomata fez aos Estudos Portugueses da Universidade de Montreal
Vitália Rodrigues e Manuela Aguiar
Luís Aguilar com alguns dos Representantes da Comunicação Social de Montreal presentes: Luís Tavares Belo, Conseição Rosário e Sylvio Martins

É difícil, numa figura humana, política, social, artística, económica e, até literária, como é vista Manuela Aguiar por aqueles que tiveram o privilégio de com ela contactar, acreditar na sua partida da vida política activa. Um retiro, local para onde os descendentes de Viriato, muitas vezes querem remeter figuras incómodas, que configuram uma postura independente, não-alinhada e, sacrilégio maior, pensam pela sua própria cabeça, descarrilando vezes de mais, das correias de transmissão do partido a que pertencem.
É quase consensual ter sido Manuela Aguiar a conseguir a mais significativa actuação, quer como Secretária de Estado da Emigração, quer como deputada pelo círculo da emigração, nas várias localidades deste país da América do Norte, em particular e por todo o reino da Emigrolândia, em geral.

E ela cá esteve, de novo, desta feita, para lançar um livro que reúne documentos que testemunham a sua permanente batalha em prol das comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo: No Círculo da Emigração. Na última quinta-feira, dia 6 de Janeiro de 2005, na sala multiusos do Consulado-Geral de Portugal em Montreal, no círculo restrito dos órgãos de informação deste círculo da emigração portuguesa que acaba de comemorar o seu cinquentenário. Incansável, com uma energia bastante superior à que demonstrou na anterior visita a Montreal, Manuela Aguiar foi questionada sobre a sua
anunciada retirada. Uma resposta simples e imediata: - Não, eu não me retiro de coisa nenhuma. Eu apenas saio do Parlamento, o que, afinal, é muito pouca coisa.
Manuela Aguiar decide, fazer perguntas que ninguém colocou, apesar do bombardeamento de questões a que foi submetida pelos jornalistas da diáspora:
- O que falta para que se consiga fazer uma Federação Internacional das Comunidades Portuguesas Espalhadas pelo Mundo? Se ninguém perguntou, naturalmente, ninguém se mobilizou para responder a este apelo à unidade, cooperação e solidariedade.
É uma iniciativa que muitas comunidades de polacos, italianos, romenos, gregos, etc., têm levado a cabo, estranhando-se que as associações portuguesas não sigam a ideia de criar uma Federação Internacional que tanta falta faria para articular iniciativas, desenvolver projectos de cooperação, etc. Mas é a trica política - lá como cá- que mobiliza os lusos para o debate. É que Manuela Aguiar, com as questões que coloca, politicamente incorrectas, insiste numa série de medidas ameaçadoras para alguns reumatismos que habitam a comunidade portuguesa de Montreal em particular e as comunidades portuguesas, na sua generalidade.
Manuela Aguiar demonstra uma certa incompreensão, ou mesmo desespero, pelo abandono de mulheres de todos os partidos que muito ajudaram à construção de uma estranha forma de fazer política e intervir socialmente. Sente-se, por ventura, incompreendida quando olha para cada um dos presentes e percebe o desfile de olhares que se escondem por detrás de cada cumplicidade com aqueles que julgam que a diferença que marcou (e esperamos que continue ainda a marcar) um outro modo de ver as coisas, foi derrotado pela cartilha de compressão de obediências, que o politicamente correcto quis e quer impor. Com efeito, Manuela Aguiar tem um pensamento límpido, obsessivo e grávido de coerência que compagina dificilmente com o alinhamento que se espera de um político, geralmente, o oposto disso mesmo.
Respira-se outro ambiente na sala multiusos do Consulado-Geral de Portugal, ambiente a que não será alheia a postura discreta, mas empenhada, disponível, experiente e humorada do novo cônsul-geral de Portugal, cuja curiosidade pelas pequenas e grandes coisas também não cessa de espantar quem a tal não está habituado na diplomacia portuguesa. Faz-nos falta, a dinâmica presença da Maria Luísa Fernandes que, temos a certeza de que, num contexto destes, se sentiria como peixe na água.
Admiramos a extrema paciência que detém, a nossa deputada e Secretária de Estado, como muita gente de todos os quadrantes políticos gosta de chamar-lhe aqui em Montreal, para, com a pinderiquice lamecha de alguns representantes de um Portugal queixinhas, trajado de pobreza franciscana, que se esgueiram da varanda da hipocrisia, sempre a verter lágrimas de crocodilo, penduradas da algibeira oportunista.
Manuela Aguiar, entende Portugal como uma nação de comunidades e, quanto a nós, entende aquilo que, afinal, de Portugal, se espera, porque, foi esse sempre o grandioso, misterioso e glorioso significado que tem e que sempre teve como Nação do V Império visionário de Pessoa ou religioso do Padre António Vieira ou mesmo profético do sapateiro Bandarra. Isso mesmo leva um número crescente de estudantes universitários, luso-descendentes ou estrangeiros a estudar a língua de Camões e a cultura lusitana.
Foi nesse sentido que dois estudantes do programa de Mineur en langue portugaise et cultures lusophones da Universidade de Montreal, acompanharam o docente de língua portuguesa, Luís Aguilar, a este encontro: o Mário Conde, de origem galega e a Corinne Descombes uma gaulesa da Haute-Savoie que ficaram fascinados, tanto com a deputada Manuela Aguiar como com o dr. Carlos Oliveira. Foram acolhidos com simpatia os estudantes de Português, pelos dois políticos, num encontro que ficou pautado pela espontaneidade, por uma dinâmica de troca, de curiosidade e até por um certo carinho por serem eles aprendentes da nossa cultura e magna língua.
Nenhum dos dois representantes de Portugal correspondeu à imagem que eles têm dos políticos e diplomatas, pois a deputada manteve um discurso frontal e desprovido de superioridade e snobismo e o cônsul-geral, constantemente à procura da novidade e a não faltar a uma possibilidade de dois dedos de conversa que lhe apeteça.
O livro de Manuela Aguiar, cujo lançamento serviu de pretexto para este Encontro informal, mais parecido com uma tertúlia do que uma conferência de imprensa como foi alcunhado, apresenta documentos escritos na primeira ou na terceira pessoas, a actividade parlamentar da deputada e os percursos percorridos nos tempos de exercício de funções e de avidez de comunicação. Nele podemos encontrar o que escrevíamos na edição do jornal LusoPresse do dia 1 de Janeiro de 2000, a propoósito do lançamento do seu livro anterior, Manuela Aguiar. Migrações sem Fim ( Manuela Aguiar, cita-nos na página 168 deste seu novo livro):
]...[ Os temas abordados durante cerca de duas horas foram variados, mas com vincada insistência sobre o problema da nacionalidade. Manuela Aguiar voltou a esclarecer a importância da lei de

No Círculo da Emigração
1981, que veio acabar definitivamente com a lei salazarista e fascista de 1959, a qual retirava automaticamente a nacionalidade portuguesa a qualquer indivíduo que optasse por outra. Com esta nova lei, velha de 18 anos, é possível através de um processo burocrático, infelizmente moroso, reaver a nacionalidade portuguesa e manter a dupla nacionalidade. Lei libertadora, mas não menos discriminatória para todos os portugueses que se naturalizaram Canadianos entre 1959-1981. Antes de partir a deputada prometeu fazer tudo o que estivesse ao seu alcance a fim de facilitar e diminuir este processo burocrático. Esperemos que consiga obter a aprovação de um decreto, de uma alínea, de algo que permita restabelecer de uma forma simples e rápida a nacionalidade portuguesa. Boa sorte.
Hoje, aqui estamos a anunciar e a render homenagem a quem soube levar a bom porto, uma batalha de Bom Senso e Bom Gosto, mas nem por isso fácil. Cinco anos depois.
Aplica-se a Manuela Aguiar o que o povo muitas vezes diz: Água mole em pedra dura tanto dá até que fura. Furou! As pedras duras que são a burocracia lusa e a ociosa e sonolenta actividade parlamentar portuguesa.
E à Manuela Aguiar dizemos, como habitualmente, até à próxima e Boa Sorte com o seu No Círculo da Emigração, e com o novo Círculo da Emigração por e para onde não concorre desta vez, mas que, nem por isso, estamos certa, deixará de marcar o caminho desta emigrolândia, onde muito se ressona, pouco se inova, muito se grita, quase nunca se reconhece e, permanentemente se insiste em agir de costas voltados uns para os outros. Uns porque são do Benfica e outros do Sporting, uns porque são de São Miguel e outros da Terceira, uns porque são da Voz de Portugal e outros do LusoPresse, uns porque são da Escola Portuguesa do Atlântico e outros porque são da Escola de Santa Cruz, etc. Enquanto, paralelamente, todos se queixam da falta de meios e de recursos humanos. Não parece.