terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

OLHARES , DE ONTEM E DE AGORA, SOBRE A AUSÊNCIA "Não nos admiremos. Eram as ideias do tempo".
Afonso Costa
O fenómeno das migrações envolve, do ponto de vista em que o queremos abordar, componentes muito diversas, em que as formas de ausência e de presença (presença se não física, afectiva, sentimental, económica, cultural...) se combinam, se interligam ou sobrepõem, no plano individual como colectivo e vão sendo percebidas, ao longo das épocas ou de ciclos, muito diferentemente. Numa abordagem tradicional, a ausência parece implicar fatalmente uma ruptura, muitas vezes conotada com o abandono ou a desistência de fazer vida e carreira na própria terra. Olhada a emigração por parte de quem fica, assim foi e, em certa medida, ainda é na opinião pública, no sentir comum do povo, dos vizinhos, como na avaliação de algumas correntes doutrinais ou ideologias políticas - e, naturalmente, como consequência disso, na sua transposição para o universo jurídico, porque o legislador mais vezes reflecte conceitos e preconceitos preexistentes do que procura fazer pedagogia ou induzir transformações (intenção sempre ao seu alcance, mas mais denunciada em períodos de mudança radical de regime político e constitucional, a expressar um voluntarismo vanguardista (entre nós, tal nem sempre sucedeu, mas sucedeu, neste preciso domínio, no bom exemplo da revolução de 25 de Abril de 1974...). Creio que bem menos mutável na transição de regimes ou de tempos é o sentir comum dos próprios emigrantes. A sua atitude, o seu relacionamento com o País, visto de longe, com saudade e paixão, com proximidade, nele estando sempre em pensamento, terá sido uma constante na longa história das migrações portuguesas. Nem por isso deixaram de ser, ao invés daquilo a que, por esse mérito faziam jus, "cidadãos sem os direitos da cidadania"... Nas migrações dos últimos dois séculos e, a meu ver, também nos períodos antecedentes - visto que o móbil individual de procurar longe progresso ou riqueza é compatível com qualquer dos enquadramentos que conhecemos historicamente - o esforço de colonização ou a procura de trabalho em terras estrangeiras - como já reconheciam no passado distante Oliveira Martins, Marnoco e Sousa ou Afonso Costa (Costa, 1911:243) ou como parece admitir, na mesma linha de pensamento, o contemporâneo Joel Serrão (Serrão, 1974: ) . Porém, essa postura dos expatriados ou era praticamente ignorada ou considerada pouco mais do que irrelevante. A saída para o estrangeiro era vista, pura e simplesmente, como um corte, um voluntário afastamento, se não mesmo, como dissemos, uma deserção.
Tais eram os significados da ausência, ainda que temporária, da família e da comunidade, com repercussão imediata na esfera do Direito: antes de mais, a total suspensão do exercício de direitos políticos - acompanhada da cessação de quaisquer prestações e apoios do Estado, no campo social e cultural. Para além da protecção consular, da concessão de meios para o repatriamento em casos extremos, o Estado começou por se preocupar apenas com o acto ou momento da partida, fiscalizando as condições de transporte marítimo, motivo, como é sabido, de muitas queixas, sofrimentos e fatalidades, que faziam notícia frequente nos jornais. Uma política de "trajecto de ida", na expressão de Maria Beatriz Rocha Trindade. Depois, os homens ficavam por sua conta e risco... Daí que, não obstante o peso que a emigração teve e tem na sociedade portuguesa, com cerca de um terço da população a viver fora do País, não é tradicionalmente dado tratamento autónomo e sistematizado aos efeitos da ausência dos cidadãos no exterior, com destino conhecido e ligação a família e à comunidade local e nacional. A temática da ausência, que ocupava o seu espaço no Código Civil de 1867, era apenas a que configurava o desaparecimento em parte incerta ( artigos n.os 55º a 96º do Código Civil de 1967). A"ausência", nesse sentido, tanto podia verificar-se no contexto da emigração como não, pois o facto de uma eventual saída, não se sabe para onde, em direcção a um país estrangeiro, não precludia a aplicação da lei geral. Não era, e ainda hoje não é, de resto, em primeira linha, no Código Civil, mas em outras leis, nomeadamente as eleitorais, as que regem a segurança social ou o ensino em termos, que terá de se procurar, a regulamentação específica de um "estatuto dos ausentes" ou emigrantes - ou a sua omissão...
É artigo a artigo, em normativos dispersos, que se traça o quadro dos seus direitos - que o mesmo é dizer as formas de valoração jurídica da ausência ("hoc sensu"). Ou mesmo a sua licitude da partida - questão não despicienda, pois a liberdade de emigrar, afirmada, como princípio, desde a Carta Constitucional à Constituição de 1911, era obstaculizada por expedientes vários, regulamentação prevendo taxas e alcavalas, ou um custo desmesurado de passaportes (Costa,1911:166) e apenas se alcança real e incondicionalmente, com a Constituição de 1976. Aliás, a emigração clandestina só deixou de se configurar como crime, numa moldura penal, no fim dos tempos do chamado "Estado Novo". A ida para o estrangeiro representava uma verdadeira "capitis diminutio" - com o interesse dos indivíduos, incluindo o seu direito de emigrar, a ser subordinado ou sacrificado ao interesse público, tal como foi, em concreto, entendido, quase sem contestação, até ao retorno do país à democracia em 1974. Políticas da emigração representando efectivamente mais do que a proibição ou a limitação dos fluxos migratórios (ou, já num segundo tempo, mais do que a sua protecção dos homens no "trajecto de ida") são contemporâneas e foram determinadas, fundamentalmente, pelo dramatismo, que caracterizou o início do ciclo das migrações intra-europeias, a partir dos anos 60, pela sua maior proximidade e, em consequência disso, pelo mais completo informação sobre infamantes situações de vida em barracas, nos "bidonville, de exploração no trabalho e de miséria. Um começo de ciclo, que não deixava adivinhar uma futura boa integração... O desconhecimento dos factos, ou a sua deformação a partir de generalizações apressadas, tem a sua quota parte parte nas insuficiências ou desfazamento do Direito.
No Código Civil de 1967, não haverá disposições mais reveladoras do modo de ver o emigrante, enquanto "grande ausente", do que as que determinam a perda e reaquisição da nacionalidade portuguesa. Perda automática, em caso de aquisição de nacionalidade estrangeira. Uma cominação que era, então, a regra em direito comparado, com uma argumentação que ainda hoje sustenta, em muitos países do mundo, a mesma solução. Antes de mais, o dever de lealdade ao Estado, visto como "exclusivo" e "individual". Uma partilha de sentimentos e afectos em relação a dois países, ironizam alguns autores, assumia um caracter semelhante à do crime de bigamia: "In this concept, dual nationality is viewed as analogous to bigamy, amounting to a kind of cheeting in both polities" (Aleinikoff e Klusmeyer, 2002:29). E, hoje, é precisamente em nome dessa natural capacidade e vontade de dupla pertença que se concebe a ideia da dupla cidadania, como a mais próxima do ser e querer das pessoas.
O princípio da unicidade da nacionalidade (que, sendo a única se conservava, por mais longa que fosse a "ausência"), manteve-se, em Portugal, através de reformas sucessivas, até 1981. E subsiste em outros países da Europa e do mundo, onde os portugueses se encontram imigrados - cada vez menos, porque felizmente se desenha, a nível internacional, a tendência contrária. Todavia, em razão dessa divisão de escolas doutrinais e do ordenamento jurídico dos Estados (numa divergência norte-sul e até,também, leste-oeste, o Conselho da Europa ainda não consegue ir além de uma posição de neutralidade nesta matéria, após ter revogado a Convenção de 1963, que impunha a unicidade de cidadania. Ao tempo a que nos reportamos, a dupla cidadania era puramente utópica. Nada de extrordiário, pois, na sua denegação. Extraordinário é, sim, o disposto neste mesmo artigo, no que respeita à sua reaquisição. Após estipular que "perde a qualidade de cidadão português o que se naturalizar em país estrangeiro" diz o artº 22º que "pode, porém, recuperar essa qualidade, regressando ao reino com ânimo de domiciliar-se nele, e declarando-o assim perante a municipalidade do lugar, que elegeu para domicílio". O artigo seguinte, sobre os efeitos da recuperação da nacionalidade, não dá a esta reaquisição, qualquer eficácia retroactiva: "... as pessoas só podem aproveitar desse direito desde o dia da sua reabilitação". Não fora a denegação da retroactividade e o normativo mais pareceria enformado pela ideia de uma de "hibernação" ou hiato no exercício dos direitos de uma identidade nacional intocada. A não retroactividade acentua, assim, o carácter de ruptura temporária mas, de qualquer modo, irreparável da ausência. O emigrante era desprovido dos seus direitos de cidadania, porque se reputava como pura "utopia" o poder de os concretizar à distância. Mas verdadeiramente não se "desnacionaliza", pois o retorno e uma simples manifestação da vontade o reinveste no seu estatuto de nacional, sem o "direito de oposição" do Estado. Não seria tão englobante a solução consagrada em futuras leis da nacionalidade, visto que introduziam, para além de complexa e quase sempre morosa tramitação burocrática, o "direito de oposição" do Estado à recuperação da nacionalidade. Um poder discricionário que foi mantido na vulgarmente chamada "lei da dupla cidadania" - já que, desastradamente, e, a meu ver, atraiçoando, a inequívoca expressão usada pelo legislador, faz, pela via da regulamentação, uma leitura restritiva da Lei nº 37/81 de 3 de Outubro, que, no seu articulado previa a reaquisição por "mera declaração do interessado", sem mais ...). O caracter automático da resposta positiva ao pedido de recuperação da nacionalidade só veio a ser reposto em 2004, pelaLei Orgânica nº 1/2004 de15 de Janeiro. O mecanismo de recuperação automática da nacionalidade, previsto no Código Civil de 1867 - alargado às situações de permanência no estrangeiro, dando à mera inscrição consular o mesmo efeito da declaração produzida em caso de regresso, perante as autoridades locais - seria retomado no projecto de lei nº 140/VIII, que foi debatido em plenário sem alcançar vencimento (Aguiar, 1999: 156). Nem por isso deixou de constituir um exemplo raro de procura da "modernidade" que pode vir do passado e da originalidade das nossas tradições - jurídicas, neste caso... O "direito de oposição" (que uma tal tradição precludia ), tornando uma contingência e não uma faculdade livremente exercida a reaquisição da nacionalidade, foi abolida, mas não sem controvérsia, entre parlamentares de diferentes quadrantes políticos - no novo século algo inesperada. Um resquício desse "velho poder" do Estado de sopesar o interesse público e privado no condicionamento da emigração , por um lado, e, por outro, de sobrevalorizar os efeitos jurídicos do afastamento do país, com integração num outro... Até 1974, o Estado pôs em prática políticas limitativas ou proibitivas das saídas, ( Costa, 1911: 161) antes de mais, no interesse do Estado - isto é, do seu entendimento do "bem comum", com prevalência histórica de uma perspectiva predominantemente economicista. Assim, tanto o direito à emigração, hoje explicitamente consagrado na Constituição de 1976, como os direitos dos emigrantes, enquanto cidadãos residentes no estrangeiro - o que Barbosa de Melo, no colóquio do Conselho da Europa , sobre????? "os laços dos emigrantes com a país de origem" ,em 1997, chamou "O Direito dos Expatriados" - são construções jurídicas recentes e em progresso.
Assiste-se, na nossa época, à deslocação do centro de gravidade do normativo jurídico constitucional não só da "totalidade" para o indivíduo, como também do Estado territorial para a Nação de Comunidades ou "Nação populacional". Estamos perante duas novas centralidades: do "cidadão" - com a afirmação dos direitos inerentes à qualidade de nacional, viva ele onde viver ; da Nação - que obriga à reestruturação do Estado, das suas instituições e das suas leis para que correspondam à verdadeira dimensão nacional . Neste quadro, que as consequências da ausência física perdem terreno, constantemente, e a ideia de viver, com direitos iguais, na comunidade transnacional portuguesa, passa da utopia para a realidade das relações sociais e dos conceitos e estipulações jurídicos .
No referido colóquio do Conselho da Europa um neologismo é adoptado para expresssar, com o devido vigor, as novas ideias do tempo quanto ao "estatuto dos expatriados": "desterritorialização" ( "deterritorialisation", na versão inglesa) dos seus direitos e das políticas que os protegem , face ao Estado de origem. Assim se exprime a radical diversidade das soluções tradicionais e moderna para a emigração. Perspectivada como uma evidência, a privação do exercício de direitos políticos não foi objecto nem de controvérsia, nem de referência até à revolução d 1974. Em Portugal, que eu saiba, com a excepção de um comentário, onde, como era previsivel, se nega a possibilidade: "sem pretendermos erigir em sistema as fantasias de um deputado italiano que, na Revista Económica Internacional aventava a ideia de que ao parlamento do seu país viessem representantes das colónias italianas em países estrangeiros..." (Silva, 1917: 211). Como salientamos. o afastamento privava o cidadão não só de direitos políticos, mas de apoios vários que, no domínio social ou cultural, o Estado ("Welfare State"), crescentemente, ia concedendo dentro de fronteiras, assim aumentando, do mesmo passo, o número e grau das discriminações dos expatriados face aos residentes. A mudança das leis far-se-á, entre nós, gradualmente, no sentido inverso, combatendo discriminações, diminuindo o fosso que separa aqueles e estes, em consonância com as lições do direito comparado, e não sem que antes se tenha operado uma evolução de mentalidades e atitudes perante a "ausência", neutralizada por grande diversidade de meios de redescobrir a " presença" de mais de um terço da Nação, que a vive fora dos limites das fronteiras da soberania , do Estado. II - AQUEM DA AUSÊNCIA: A PROGRESSIVA AFIRMAÇÃO DE FORMAS DE PRESENÇA
"Portugal está onde estiverem os Portugueses"
Manuel Cerejeira
Para chegarmos à constatação dessas múltiplas formas de presença, fomos fazendo caminho. Um percurso nosso, português, com semelhanças e diferenças em relação a outros povos migrantes. Vamos, nesta reflexão, à procura do que contribuiu para a mudança de perspectiva sobre o relacionamento entre Portugal e a sua "diáspora" - as características das nossas migrações, trajectos de vida em concreto, nas terras de destino, existência de uma relação íntima com a Pátria... Primeira constante, que só há pouco se alterou: a emigração portuguesa envolvia quase exclusivamente homens, que partiam sós. Mas, como se tornou uma evidência pelo relacionamento que sempre viriam a manter o País, numa grande maioria dos casos, a decisão de zarpar não era um acto individual de distanciamento ou abandono, mas, pelo contrário a implementação de um plano familiar de melhoria das condições de vida, gizado de comum acordo por mulher e marido e por este realizado com espírito de solidariedade e sentimento de apego aos seus, à comunidade e à cultura de origem.
O primeiro sinal de presença dos emigrantes é o envio maciço de remessas - para as famílias a garantia de uma nova prosperidade, para o Estado uma inesgotável fonte de divisas, indispensável ao equilíbrio das contas externas. O reconhecimento da enorme importância para a economia do País deste comportamento padrão dos expatriados converte o enfoque económico no principal, a polarizar o discurso, em matéria das migrações, ao longo de cerca de dois séculos, sem contudo haja vontade de dar aos emigrantes uma qualquer contrapartida no plano dos direitos individuais. E não só no discurso, mas também nas políticas, que, mesmo quando parecem levantar barreiras ao livre curso dos fluxos migratórios, na prática, em larga medida, os permitem. Uma "ambiguidade" que Miriam Halpern Pereira admite resultar da dependência das remessas da emigração... Já no primeiro quartel do século XX, Fernando Emygdio da Silva escrevia: "...É da emigração de miséria que a Pátria tira, depois, o ouro com que salda a conta da sua desorientação económica e dos desperdícios financeiros. É da miséria que vem a nossa maior riqueza: do pária nostálgico e atavicamente aventureiro ... é que vem o ouro". "... não se esquecem de nos enriquecer com as remessas, que ainda ali não representam um excesso, mas, a maior parte das vezes, a privação, ao menos nos primeiros anos." (Silva,1917: ?) Enriquecimento das famílias, das aldeias das regiões, do país, através de verbas astronómicas e incessantes, provindas, como este estudioso bem sabia, não de grandes investimentos ou de grandes fortunas, mas de uma multiplicidade de pequenos envios, que, sem dúvida, vão em crescendo, à medida que a integração dos trabalhadores se processa, mas que raras vezes ultrapassam a mediania de rendimentos. Oliveira Martins, Afonso Costa, Anselmo de Andrade, Artur Bello, Vieira da Rocha, Egmydio da Silva são alguns dos autores que nos dão, em estimativa, a expressão desses números fabulosos, em fins do século XIX e inícios do século passado (Silva, 1917: 105). Este contributo decisivo é o modo mais antigo e mais forte de os emigrantes aqui estarem presentes, não estando... E vai condicionar as políticas relativas à emigração familiar, à emigração de mulheres e de menores, que é combatida en toda a medida do possível. A razão dessa diferença de tratamento é evidente, como não hesita em explicitar um dos autores citados, qualificando a saída das mulheres como "uma depreciação do fenómeno migratório", porque: "é quando a família do emigrante fica na Pátria, que ele envia mais regularmente as suas economias" (Costa, 1913: 182). Não anda longe desta preocupação Emygdío da Silva. para quem o aumento do número de mulheres expatriadas, que, se verifica entre 1906 e 1913 (127% de aumento) "...é uma constatação tremenda". A justificação é a mesma:" perigo de desnacionalização e cessação de remessas"... (Silva, 1917: 132). Quando os homens estavam ausentes, eram as remessas que mais visivelmente marcavam a sua reaparição em cena...
O regresso desejado, e muitas vezes, consumado com êxito, não esbate necessariamente as marcas da emigração. Par além da influência no progresso, na modernização - de costumes, de comércio, de lazer, de consumo - subsistem, muito visíveis, nas casas, na sua importância, no seu porte, no gosto arquitectónico, inspirado, eventualmente em modelos estrangeiros e tantas vezez objecto de críticas, mais ou menos aceitáveis.
Os palacetes dos "brasileiros (Rocha Trindade, 2008: ). Casas que pelos telhados negros e inclinados, ou por outros sinais particulares ou "exóticos" se destacam na paisagem rural. ( )
Nada de muito diverso do que ocorre, por exemplo, na vizinha Galiza. ( )
De todo isto muito se falou - e fala. Mas há outras formas de presença, não menos relevantes, mas como que "descobertas" mais recentemente.
Poucos foram, ni século XX, os estudiosos que tiveram a percepção de outras maneiras de "estar na comunidade nacional", lá fora, resistentes a mudanças de circunstâncias, ao decréscimo dos fluxos migratórios e à fixação definitiva nas sociedades de destino. As "comunidades portuguesas" do estrangeiro, quando definidas como organizações dinâmicas e coesas, como espaços de cultura portuguesa, alicerçados em instituições que resistem ao passar do tempo, porque se continuam ou se renovam, de geração em geração. (Aguiar, 1987: ?)`. É o fenómeno de transplantação para novas terras de espaços de vivência da sua cultura própria, não só no interior das suas casas, mas no exterior, colectivamente, através do impulso associativo (com Pessoa, diríamos "um ímpeto de Portugal"). Assim constroem instituições que são a réplica das que, entre nós, guardam a identidade dos lugares e que ali vão guardar as de todos . No campo social e cultural, começam por suprir a absoluta falta de políticas de apoio dos governos de Portugal. Existiam, é certo, os consulados, mas sem meios de actuação nesta vertente. Nos começo do século passado, Emygdio da Silva, constando a omissão, escrevia que o emigrante deve ser "protegido no local de destino por entidades diversas do cônsul". E Affonso Costa chegou a delinear o contorno de políticas sociais e culturais, que ainda hoje poderíamos subscrever (Costa, 1911:133). Porém, não foram empreendidas...Teríamos de esperar até data recente para que tal acontecesse, sempre subsidiariamente, quando muito complementando a acção das organizações das comunidades.
Desde o século XIX e XX, no Brasil, as Misericórdias - em modelo idêntico ao que, dentro de fronteiras, implementou as primeiras políticas de saúde - as Beneficências, com os seus Hospitais, que são hoje dos melhores da América Latina ( uma outra designação, para prosseguir, depois da independência do Brasil, as mesmas finalidades das "Santas Casas", no campo da saúde e da entreajuda, embora no círculo mais restrito da imigração portuguesa) ou, nos EUA, as associações de socorros mútuos, as Sociedades Fraternais. Actualmente, em todos os continentes do mundo, centros sociais, lares de idosos, lares de dia são exemplos de empreendimento e de agregação da comunidade, que projectam uma esplêndida imagem de uma componente portuguesa nas sociedades de destino. Na defesa da língua e da cultura e tradições portuguesas os gabinetes de leitura, os grémios literários, os centros culturais, as escolas e liceus, os clubes recreativos e desportivos, acabam tendo, para além dos resultados visados, em primeira linha, pelos seus planos e programas de actividades, este efeito de afirmação de uma existência ou realidade portuguesas, que, alias, em muitos casos constituiu um seu objectivo estratégico. Primeiro, sem dúvida, do próprio movimento associativo, sozinho no esforço de ganhar visibilidade, agora, intermitentemente, em certas latitudes e em certos casos, do Estado também.
Muito curiosa e plena de actualidade, quase um século decorrido, é uma opinião do Professor de Direito Emygdio da Silva, ao identificar a acção dos portugueses do Brasil, no campo cultural e social, estabelecendo uma comparação, fazendo um projecção no futuro: "... A língua e a generosidade ficam para sempre, e talvez mesmo a generosidade fique menos adulterada do que a língua, atendendo aos múltiplos exemplos dados pela nossa colónia do Brasil." "...Têm os olhos postos no fazer bem... ao lembrar-se da sua pátria...".
A generosidade dos portugueses de grande fortuna traduziu-se numa "presença" em termos de obras extraordinárias, nas suas terras, quando não quase no País inteiro, como foi o caso de muitos dos chamados "brasileiros" - portugueses ricos regressados do Brasil em oitocentos e início de novecentos.
Talvez, por isso, a história de sucesso colectivo seja bem menos divulgada do que o paradigma do êxito individual - a imagem de marca dos "brasileiros", hoje, a dos "empresários de sucesso", de qualquer parte do mundo, que passa a estar no centro do discurso político, desde os anos 90. Sendo, pois, tão admirável o movimento associativo mais do que secular, curiosamente, não foi, na data do seu aparecimento e desenvolvimento, objecto de mais atenção do que agora é: alguma, mas escassa.
Entre os estudiosos da emigração portuguesa do princípio de século, poucos são os que se dão conta desta realidade. Entre as excepções, estão os que vimos citando, Affonso Costa e Emygdio da Silva (Aguiar,1986: ). Afirma o primeiro; "... além disso, formaram-se colónias portuguesas em São Francisco, Oackland, em New Bedford e Providence, Boston e Brooklin, tendo com principal fonte da emigração os Açores". A caracterização dessas "comunidades", como diríamos, na expressão agora corrente, é feita nestes termos: "As colónias portuguesas resistem, têm individualidade, mantêm o nome, a língua, os usos portugueses". A constatação seguinte é do maior relevo, para a compreensão do fenómeno desta "presença dual" da emigração em dois países, a ultrapassar o confinamento geográfico da ausência em uma delas, pois considera que a formação das colónias: "... torna a emigração útil para a Pátria, perdendo o carácter de abandono da Pátria". Inteiramente actual esta perspectiva de que o carácter de "abandono da terra" desaparece pela integração numa "colónia" ou "comunidade" de vivência e cultura portuguesas. Por seu lado, Emygdio da Silva salienta "o sentimento associativo geral" entre os colonos portugueses do Brasil e, vai ao ponto de dizer que "a generosidade é a mais alta tradição da colónia portuguesa".(Silva,1917: 278) Apresenta uma relação circunstanciada das associações mais importantes, algumas das quais ainda hoje o são, por exemplo: no Rio de Janeiro, a Caixa de Socorros Mútuos Dom Pedro V, o Gabinete de Leitura, o Clube Ginástico Português, o Clube Internacional de Regatas (Vasco da Gama). Em Santos, a Sociedade Portuguesa de Beneficência e o Centro Português de Santos. Em Recife e em Salvador, os Gabinetes de Leitura (referindo o impressionante número de muitos milhares de livros que este último já possuía). Belém, Belo Horizonte, Manaus, São Luís de Maranhão e Curitiba constam também deste elenco de instituições que chegaram a nossos dias e prosseguem caminho . Todavia, não creio que ambos estes grandes conhecedores das comunidades oriundas da emigração, na sua época - e muito menos quaisquer outros... - tenham tido consciência de que estavam perante instituições duráveis, susceptíveis de terem tão longa vida própria, para além do fim dos tempos da emigração - há largas décadas. Isto é, que pudessem ser sustentadas por comunidades radicadas definitivamente - por aquela modalidade de emigração que se queria evitar a todo o custo: a que não tinha retorno, a que se considerava inevitavelmente votada à "desnacionalização". (Aguiar, 1987). Encorajada era - quando o era... - a emigração temporária, no sentido que acabamos de referir - com um projecto de reinserção na Pátria, ainda que no longo prazo. Uma realidade que hoje não conceptualizamos deste modo, reservando a qualificação de temporária para a de curto prazo. O temor da radicação e "desnacionalização" explica a vontade de impedir a emigração de mulheres e a denegação de um direito à reunificação familiar, que é na perpectiva actual, um direito fundamental da pessoa humana. Uma outra visão do direito à vida em família. Nos anos 70 e 80, quando estanca a emigração, o movimento continua ao abrigo do direito a reunificação familiar Fala-se, e pode, no rigor dos números, falar-se em "feminização da emigração".
Nem os investigadores destes fenómenos nem os políticos dos países dadores e receptores de migrantes ignoram as importantes consequências desta "feminização" na modificação de muitos projectos migratórios, que, sendo inicialmente de retorno, se transformam em projectos de inserção definitiva na sociedade de destino - tal como, de resto, se antevia no passado. Estamos longe do ideal da abolição de fronteiras, excepto em determinados espaços transnacionais, que se vão criando na Europa e em outros continentes, mas estes são passos que se registam como positivos, como um avanço civilizacional. E, se os autores portugueses, que referimos, e que julgamos serem representativos de um pensar moderno no seu tempo, estavam certos quanto ao decréscimo de retornos no quadro da emigração familiar, ficariam, por certo, surpreendidos com a resistência à "dissolução cultural" das comunidades formadas por terceiras e quartas gerações de portugueses, que, por exemplo, na Califórnia - um destino de não regresso, por excelência - continuam a falar a nossa língua e a manter vivas as tradições portuguesas. Aconteceu, pois, neste domínio, o esperado e o inesperado...
Esta outra e insuspeita da forma de presença - a das comunidades orgânicas, a que as mulheres e os jovens é que deram densidade e futuro - só vem a ser reconhecida, e a influenciar as políticas de emigração, nos anos seguintes ao 25 de Abril de 1974. Mais exactamente, a partir de 1980, com a criação do Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP), um órgão representativo das organizações dos portugueses do estrangeiro, destinado a ser um interlocutor privilegiado na definição e execução das políticas culturais e sociais para os cidadãos, individualmente considerados, e para o movimento associativo. O modelo associativo do CCP mal durou uma década. O seu papel foi-se esbatendo, a partir de 1988, e acabou por se extinguir com a ruptura de diálogo pelo Governo e a experiência ensaida ao longo de meia década nunca mais seria retomada. Um órgão com a mesma designação, mas natureza totalmente diversa foi criado em 1996 - eleito por sufrágio directo e universal, à maneira de uma assembleia, com poder de iniciativa, ainda que com meras funções consultivas. Pode ter um relevante papel ao dar voz aos cidadãos que o elegem, mas não representa esta forma de existência institucional que o CCP "associativo" privilegiou. (Aguiar, 2009: 260) Correspondeu a um curto ciclo em que no pensamento, no discurso, e na interacção com o Estado as comunidades organizadas - representadas no CCP - ocuparam o centro da vida política, co-participando na elaboração das das leis e medidas destinadas à emigração. III - AS POLÍTICAS DE REENCONTRO
"Portugal é mais uma cultura do que uma organização rígida...
Francisco Sá carneiro
O reconhecimento da pertença dos emigrantes a uma Nação populacional ou "Nação de Comunidades", como afirmava Sá Carneiro, uma Nação que extravasa as fronteiras territoriais, é coisa recente. Não ainda direitos iguais. Não são ainda iguais na atenção e na consciência dos seus concidadãos, como eles próprios reclamam. Mas o seu estatuto vai-se, consolidando, gradualmente, em "novos direitos" culturais, sociais e políticos. Direitos Culturais : em primeiro lugar, o direito ao ensino da língua portuguesa, "símbolo de identidade étnica e veículo de cultura" (Teixeira, 1999:49), consagrado no texto constitucional, muito embora seja imperfeitamente garantido - e mais em determinados quadrantes geográficos do que noutros. Mais na Europa do que nas comunidades transoceânicas, a levantar a suspeita de que encontra fundamento, encapotadamente, numa intenção de privilegiar a emigração temporária, na visão oitocentista - isto é, a emigração de retorno, como é (ou se pensava que fosse...) a do nosso continente. Por outras palavras: a língua parece ser ensinada na perspectiva do apoio à reinserção dos jovens de 2ª geração e negligenciada como instrumento de preservação das comunidades de cultura portuguesa no mundo.
Depois de uma extensão do ensino oficial e gratuito na RAS, anuncia-se agora identico gesto, em direcção ao norte da América.
Se a nível individual não há igualdade de tratamento neste domínio priotitário, também o mesmo acontece no plano institucional. O mundo associativo de que falámos, tendo embora finalidades semelhantes ao que lhe serve de modelo inspirador em Portugal, e prosseguindo, para além disso, em simultâneo, o singular escopo de alargar o espaço da presença portuguesa universal (enquanto o que existe em Portugal não vai além da ocupação, organização e animação de espaços do nosso pequeno território, por muito importante que se mostre) deve-se inteiramente aos cidadãos. Dentro de fronteiras poucas organizações - ONG's - atingiriam os seus objectivos sem a forte componente do apoio estatal, a ponto de se falar a seu respeito, frequentemente, de "subsídio dependência". Fora do País, pelo contrário, a verdade é que nenhum centro social e cultural, nenhum clube ou beneficência existiria sequer, se tivesse esperado por verbas do erário público... Mesmo quando algum apoio acabam por receber, no conjunto, ele é particamente negligenciável. Direitos sociais: Tradicionalmente, o Estado limitava-se a apoiar o repatriamento dos seus nacionais, em situações de extrema miséria. Um vislumbre de solidariedade que não configurava um direito, e ainda hoje se não encontra regulamentado como tal, apesar de ter sido, em , aprovado, na generalidade, um diploma que não chegou a ser apreciado em comissão e objecto de votação final global. (Aguiar, ?????). Em anos recentes, pelo menos desde a década de 80, a Secretaria de Estado da Emigração concedia apoios pontuais em outras situações de necessidade, através dos seus serviços no estrangeiro, mas só em 1999 o Governo instituiu o Apoio Social a Idosos Carenciados (ASIC). Uma prestação de montante variável, de país para país, atribuída, com restrições excessivas, longe de ser o equivalente pensões não contributivas ou de rendimento mínimo que são garantidos dentro de fronteiras... E, agora, não faltam, em Direito comparado, em comunidades de emigração com caracteristicas semelhantes à nossa, e residentes nas mesmas regiões (sobretudo no sul da América), bons exemplos sistemas de assistência na doença e na velhice - nomeadamente, os de Espanha ou da Itália. A este tipo de "novos direitos" acrescem, desde o restabelecimento da democracia em 1974, direitos de participação na vida pública.
Direitos políticos: Os emigrantes são chamados a votar, pela primeira vez na nossa história, na escolha dos deputados à Assembleia da República. Elegem quatro deputados, em dois círculos eleitorais próprios - uma excepção ao princípio constitucional da proporcionalidade, pelo método de Hondt, mas, nessa data, uma singularidade no panorama europeu, pois nos demais países os representantes ao parlamento eram (e, maioritariamente, ainda são) escolhidos em círculos territoriais. Em 1980, foi criado um órgão consultivo de representação específica de emigrantes, ou melhor do movimento associativo das suas comunidades, que funcionou por quase uma década - e que admitia à participação os membros das organizações comunitárias, tivesse ou não a nacionalidade portuguesa. Uma instituição à medida da diáspora, não apenas de uma 1ª geração de emigrantes. Com a adesão à CEE os portugueses , como cidadãos europeus, votam nas eleições para o Parlamento Europeu, embora só desde 2004 esse direito tenha sido alargado aos que vivem fora do espaço da União Europeia (Aguiar, 2005:?????). Só na revisão constuticional de 1997 é, depois de uma longa luta, que passou, em larga medida pelo CCP, concedido aos expatriados o direito de voto na eleição do Presidente da República, mas de forma restrita, apenas para aqueles que comprovem "laços de ligação efectiva" a Portugal. Com dois cadernos eleitorais distintos, para os dois orgãos de soberania, estão, assim, do ponto de vista jurídico, criados dois conceitos de "comunidade nacional": um mais lato, que abrange todos os portugueses "de passaporte" e a todos, mediante o simples acto de inscrição no recenceamento, dá o direito de participação na AR (e actualmente também para alguns dos "referenda" e para O CCP, desde 1997, eleito por sufrágio directo e universal pelos cidadãos inscritos nos consulados. Outro, muito mais restrito, que alguns chamaram, - não com inteira propriedade - o da "comunidade política nacional": o dos eleitores do PR, excluindo os que tenham a nacionalidade do país estrangeiro onde residem e os que estão ausentes há um certo número de anos - ainda por cima, número variável, conforme os continentes ou Estados onde vivem. Para além desta dualidade de universos eleitorais, há ainda uma outra dualidade de modos de votação - presencial ou por correspondência - nas três eleições referidas - legislativas, presidenciais e europeias. (Machado, 2009??????) Um sistema que prima pela incoerência, insuficiência e irrealismo - desde logo porque é sabido, que antes de introduzidas as actuais limitações, em 2005 (????), os eleitores menos abstencionistas eram justamente os mais velhos, há mais tempo emigrados, e até, em muitos casos os dos países onde agora são mais discriminados... - a ausência passa, de novo, a implicar, em determinado condcionalismo, uma "capitis diminutio". Surpreendente retrocesso, sem solução à vista, no quadro parlamentar, conhecidas que são as divisões partidárias nesta sede e a necessidade de uma maioria qualificada para a encontrar. De qualquer modo, estamos chegados à construção de dois discursos absolutamente distintos sobre a mesma realidade migratória. Menos de meio século os separa... A mesma realidade, no que respeita ao que essencialmente nos interessa - a organização de uma rede de relações de toda a ordem, de formas de entreajuda e de vivência em "colónias", na designação antiga, ou "comunidades", na de hoje. De uma avaliação positiva das migrações pela orientação ou canalização dos seus ganhos materiais para o território e pelo desejado fim de ciclo com a reinserção dos homens na sociedade de origem, chegamos, no início dos anos 60, se não à própria "descoberta" do património constituído pela sedimentação de vagas sucessivas de emigração sem retorno, pelo menos, à sua teorização. À sua teorização como parte de um todo - como presença cultural a equivaler à presença física no território.Julgo que poderemos situar o ponto de viragem no I Congresso das Comunidades Portuguesas, da iniciativa da Sociedade de Geografia, realizado em Setembro de 1964. Pelo empreendimento, inédito na nossa história das migrações, pela consciência da existência de um património que havia que preservar e potenciar, pela estratégia de criação de uma base institucional, para prosseguir esse intento (com a criação da União das Comunidades e da Academia Internacional da Cultura Portuguesa). E, sem dúvida pela chamada ao País, de muitos das principais personalidades e dirigentes das organizações com as quais nasceu e se consolida esse espaço universal da cultura portuguesa. Aqui tiveram, então, presença viva e voz dirigentes dos cinco continentes - da Federação das Associações do Brasil, da União Portuguesa Continental, de Boston, das associações poprtuguesas da Baia, do Liceu Literário do Rio de Janeiro, da Missão Católica de Buenos Aires, de Paris, entre tantas outras... Individualidades como Sam Levy, Rodrigo Leal Rodrigues, os Professores Yves Gandra Martins ou Tito Lívio Ferreira, ou, de Portugal, António Quadros, os Professores Jorge Dias ou André Gonçaves Pereira. Uma lista longa de nomes e de esplendidas comunicações (Academia Internacional de Cultura Portuguesa, volumes I, II, III).
Foi um primeiro grande "encontro" entre estes portugueses ou lusófilos e Portugal, para usar, por antecipação, o "leit motiv" que viria a caracterizar as políticas de oitenta para as comunidades: as "políticas de encontro ou reencontro". Adriano Moreira, Presidente do I Congresso, falaria na sessão de abertura de "...manifestação de respeito da nação que peregrina pelo mundo alheio" (Moreira, 1973/74/75: 57).E a ideia de "nação peregrina", com essa ou outra designação - o "Portugal maior" de Vitorino Magalhães Godinho ou a "nação de comunidades", a "nação populacional", "...mais uma cultura do que uma organização rígida" de que falava Francisco Sá Carneiro - entrou no léxico político a significar uma nova visão de nós, e da nossa emigração.Após o 25 de Abril de 1974 o "dia de Portugal" que o Estado Novo designava por "dia da raça", não tarda a receber outras componentes, a cultural e a da "diáspora". É agora o "dia de Portugal de Camões e das Comunidades Portuguesas", a traduzir a percepção de que a cultura e o Povo não estão simplesmente acantonados dentro de fronteiras.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

SURPRESA EM TONS DE AZUL E BRANCO

Já não se pode esperar confiar na família mais próxima parauma pequena inconfidência...
O Tózinho, a Teresinha e até a minha Mãe sabiam e não me disseram nada.
Na Câmara, pelo menos nas antevésperas, também sabiam e guardaram segredo.
Num país onde toda a informação escapa a qualquer controlo, esta notícia não saiu à rua.
Fui assim totalmente surpreendida com a entrega do "Dragão de Espinho" na festa do 10º aniversário da Casa do FCP de Espinho.
Primeira entrega para o Bruno Alves, como era há muito do conhecimento público. E, depois, subiu ao palco o Dr. Sardoeira Pinto e eu pensei que fosse discursar, como às vezes acontece, na qualidade de representante do Clube - o presidente da Assembleia Geral. Achei um pouco estranho que começasse por falar de mim, mas mesmo assim não suspeitei do que viria a seguir. Talvez avançasse com o meu nome por ser a única representante de Executivo da Câmara que estava presente... Quando continuou a falar intensivamente do meu trajecto de vida despontou uma suspeita, ainda nebulosa, porque custava a crer que fosse eu a homenageada, para além do Bruno. Nem me estava a ocorrer a habitual distinção de um associado... Mas quando do tempo de estudante de Coimbra o Dr. Sardoeira passa, elegantemente, para a época governamental, fez-se, emfim, luz no meu espírito. Tarde, mas fez-se... Foi muito simpático.
Para mim tudo o que está relacionado com o Dragão tem um significado especial. E, sendo de Espinho, mais ainda.
Não me achava muito merecedora, mas fiquei muito sensibilizada com o gesto!


quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

EM PARIS - OUTUBRO 68



As minhas tentativas de escrever um diário nunca foram além de uma semana - são diários, sim, mas de poucos dias.
Ir para Paris, com uma bolsa da Gulbenkian, estudar soci0ologia, no pós Maio de 68, parecia uma experiência de vida merecedora do esforço, do pequeno esforço, de um registo continuado. Começou ... mas durou pouco e não foi mais retomado. Uma pena! Não porque tenha ponta de interesse do ponto de vista político, ou literário, mas porque me fez relembrar episódios completamente desaparecidos da memória. E, por isso, estes poucos dias estão cheios de recordações que em quase todos os outros se perderam, sem remédio. São dias "sobreviventes"...



PORTO - Outubro 1968
Sábado, 26
À tarde, iniciei a minha ronda de despedidas, em Gondomar: à Avó Maria, Tia Lina e Tio Serafim, Xaninha, Meira, meninos (muitos meninos!)... À noite, continuei no Porto: Tia Clarinha, Margarida - uma última vista de olhos à pequena afilhada Madalena.

Domingo, 27
De manhã foi a vez da Tia Lena e Tio David (e lá encontrei o Tio Manuel, que, na véspera, não estava em casa na hora da visita); almoço em Espinho, os Avós, os gatinhos, apareceram a Tia Lena e o Tio David - estava uma bela tarde na esplanada. (O Manel ficou, como sempre, a dormir a sesta no entretanto). Regressamos ao Porto em caravana, vimos um pouco de hipismo - México 68 na televisão, com um intervalo para levar o Manel a casa, depois à estação (uma breve despedida do marido, pois estava na hora do comboio).
A tosse não me deixou dormir normalmente.

Segunda-feira, 28
De manhã, mais despedidas pelo telefone - Ferreira Marques, Padre Leão, Rosinha Saraiva, Dona Arlette, Rosinha e Inês. Últimas provas de roupas na Maria do Carmo. Almoçamos cedo. Sob chuva ininterrupta viemos, sem pressas, até à Pampilhosa, com uma paragem em Águeda para um café.
Chegados à Pampilhosa, pôs-se-nos o poblema de como passar o tempo. Se a estação não oferece atractivos, menos ainda oferece a terra. Meia dúzia de lojas, se tanto, ao longo duma curta rua, mais ou menos encerradas durante a tarde, talvez por falta de clientela.
Amedrontados com o aspecto do único café à vista, refugiamo-nos na estação durante umas horas. Vimos e revimos fotografias, conversámos, comemos o que havia no bar, a Mãe repetiu as suas recomendações ...
Enfim, chegou o comboio!
O Pai entrou com as malas, a Mãe também, mesmo sem pretexto, pois queria ver como eu ia instalada. Com grandes acenos de mão acompanhamos todos , eles e eu, a saída do comboio. Apreciei a paisagem e investiguei o meu compartimento-cama, onde seguia sozinha. Depois de algum tempo, surgiu um simpático empregado espanhol, que tratou de fazer a cama - pouco passava das 7 horas. A partir de então - durante perto de 14 horas - deitei-me e deitada fiquei. Não há melhor processo de viajar!
Até à fronteira espanhola, receando ter de abrir a porta e as malas aos carabineiros, mantive-me completamente vestida para o caso de ter de me levantar e receber a visita algandegária- limitei-me a estender com um cobertor sobre as pernas. Um pouco desiludida por não ter sido incomodada, depois de tal sacrifício, passei então, de pijama, ao interior dos lençóis e teria dormido às mil maravilhas se me tenho lembrado de pedir ao espanhol que me acordasse na manhã seguinte. Assim, com a preocupação de acordar cedo, para não perder a ligação francesa, fui despertando, periodicamente, ao longo da noite. De qualquer modo uma noite agradável e confortável! Em Hendaye, e ainda para satisfazer uma recomendação da minha Mãe, entabulei conversa com uma menina portuguesa de quem ela tinha gostado, durante a espera na Pampilhosa. A consequência foi a menina "cravar-me" o dinheiro do transporte da mala dela, pois não tinha francos... Isto depois de uma conversa desinteressante e insípida - como a própria menina - até Paris, só interrompida na hora e meia que passei fazendo as honras a um almoço pelo qual paguei 32 francos e comi uns 8 a 10 na melhor das hipóteses... Em Austerlitz depois do emprétimo à portuguesa - que logo se sumiu com uma amiga francesa - apanhei um táxi para a Cidade Universitária . Foram 12,50 francos, mas cheguei rapidamente ao meu destino. Um edifício com bom aspecto, moderno, branco,sóbrio, um funcionário da Secretaria extremamente amável na recepção. Fui logo apresentada ao Director da Casa de Portugal, que me surpreendeu pelo seu aspecto simples e pela objectividade e serenidade com que fez decorrer aquela primeira entrevista. Contente, fui acompanhada até ao meu quarto - no último andar, como não podia deixar de ser, tentativa do destino para me curar da fobia das alturas , mas aqui, ao contrário de Genebra, de uma maneira penosa, pois não há elevador... Acompanhada por
um dos porteiros, por sinal, um francês com aspecto muito suíço.
A minha primeira preocupação foi desfazer as malas e seguir para o correio. Tinha-me comprometido a telefonar à mamã. Segui vagamente as instruções confusas que o porteiro me dera para lá chegar, e efectivamente cheguei. Após um compasso de espera, um empregado de aspecto cilíndrico informou-me ser impossível chamar Portugal antes da hora de fechar o correio - faltavam duas horas. Mandei um telegrama, regressei à residência, comi umas bolachas e deitei-me cedíssimo.
Na quarta-feira de manhã, após uma conversa com a Secretária da Casa, iniciei a longa "batalha da burocracia" em Paris. Assinei compromissos, tirei fotocópias de documentos, escrevi cartas ao patrão da Cité, mandei para Coimbra (Prof. Pereira Coelho) um pedido de referências sobre as minhas qualidades intelectuais e morais (estas sublinhadas) - tudo para conseguir a "carte de résidence", coisa que estava ainda dependente de um certificado médico de boa-saúde e da inscrição numa faculdade ou instituto.
Tendo-me sido dito que o exame médico seria uma formalidade, dirigi-me, imediatamente, ao hospital desta zona. Mandaram-me voltar à tarde, pelo que, munida duma "carte provisoire de résidence" fui ao restaurante da Maison International - um edifício imponente, de telhados pretos.
Passei o meu tabuleiro ao longo das mesas, àquela hora ainda quase desertas, e engoli tudo o que me apresentaram - muito, em quantidade - sentindo-me uma reclusa de penitenciária a comer o bife numa travessa de alumínio e a partir a fruta com a faca única que me foi dada. Apenas uma faca e um garfo para o prato do dia, numerosos acompanhamentos, vegetais e a fruta. Espantou-me só que não me obrigassem também a beber a água pela tigela da sopa! Ai, que saudades da cantina de Coimba!... ( talheres à farta!).
Voltei a subir o Boulevard Jourdan até ao Hospital. Rodeada de adolescentes, esperei longos minutos pela abertura das portas. Por fim, entramos. Fichas amarelas para os veteranos e cor-de-rosa para a primeira visita - o meu caso. Fui chamada, preenchi uns papéis. A partir de então, senti-me a escorregar, sem "way out" pelas retortas dum processo de produção fabril, altamente mecanizado. Habituada àqueles saudosos exames médicos artesanais de "chez moi", comecei por me despir da cinta para cima, meter a roupa num saco de lona, vestir uma túnica azul, entregar o saco de lona e receber uma ficha em troca, enfiando um elástico no pulso. Depois, para deslizar sem problemas ao longo daquela "maquinaria" implacável, bastava seguir a indicação das setas nas paredes.
Radiografia. Dois ou três corredores depois, tirar os sapatos, pesar-me e medir-me. Mais uns metros, aguardar em fila até que um quadro luminoso me indicasse o número do gabinete do médico que iria proceder a um exame médico pessoal. Calhou-me uma mulher - auscultou-me, viu-me a tensão, organizou um dossier - um pouco desconsolada com a parca história das minhas doenças passadas. O pior estava para vir! Após mais umas voltas ao labirinto, caí numa "chaise longue" com um tubo de vidro e um papel na mão, que passei a uma risonha cara asiática do outro lado de uma divisória de vidro. O meu braço já não passou para o lado de cá, sem que me enfiassem uma agulha nas veias e me tirassem uma boa quantidade de sangue. Horrível! Mais uns passos, e novo recanto com "chaises longues". Sentei-me e deixei-me ficar à espera de nova tortura. Uma velha acercou-se e perguntou-me "sente-se mal? Respondi negativamente e levantei-me logo. Aquilo era mesmo apenas um recanto onde só os fracos recobram forças! Desemboquei noutro pátio cheio de cabines - troquei de novo uma ficha pelo saco de campanha onde estava a parte de cima da minha indumentária. Vesti-me, sai pelo outro lado da cabine para outra sala, onde devolvi o saco e a bata azul e com um outro papel que ainda segurava na mão, achei-me num gabinete com uma francesa desagradável. Quando lhe disse que estava no ensino superior, pregou-me o maior dos sustos, ao dizer: " Não era a este hospital que devia vir!" Respondi-lhe que me tinha feito o que me recomendaram. Ela perguntou quem. Eu disse quem e esclareci que queria um certificado médico para permanecer na Cité. Ela declarou, então: Ah, bom, nesse caso é aqui.
Uf! Por um momento pensei que todo aquele calvário fora inútil!
Outra funcionária perguntou-me, logo depois, se já fizera o B.C.G. e quando respondi afirmativamente -especificando o ano (1965). Recebi um papel cor-de-rosa e subi ao primeiro andar. Lembrava-me de uma pavorosa inoculação de um líquido branco, que me causara calafrios em Coimbra. Mas o papel cor-de-rosa salvou-me dessa provação. Fiz apenas a prova "tuberculinica" - uma raspagem no braço, seguida de uma pincelada indolor. Deram-me, então, outro cartão para voltar no sábado, a mostrar o braço, e pude, finalmente, procurar o caminho da porta de saída!
Segui para o metro, com destino à Escola Prática de Altos Estudos. Chegada à estação, porém, sem qualquer mapa na mão, não sabia o que fazer. Recorri a uma loira jovem, que se revelou inglesa logo que abriu a boca e que foi extremamente gentil. Puxou de um guia e, com toda a paciência, localizou o meu percurso, com três correspondências de metropolitano. Seguimos juntas até à mudança de Montparnasse, maldizendo os quilómetros subterrâneos que se percorrem no metro de Paris. A inglesa, que anda no Conservatório e carrega habitualmente um violoncelo é ainda mais sensível a este facto.
Nos Altos Estudos, no alto de uma escada, depois de ter saído de um elevador pré-histórico (onde só cabe uma pessoa magra e onde, à saída, uma minúscula porta "à bar do Texas" ensarilha as pessoas), esperei largo tempo até ser recebida por um rapazinho de ar indolente que se limitou a dar-me uns impressos para preencher. Chegada ao lar, tive a ideia de perguntar pela Eduarda Cruzeiro, de quem a Lurdes me tinha falado no Ministério. Causou-me uma excelente primeira impressão - uma rapariga despretenciosa, natural, comunicativa. Combinamos ir juntas, no dia seguinte, à "École Pratique". Cumprimos o combinado e, na quinta-feira de manhã, depositamos as nossas inscrições - eu no seminário do G. Friedman (com receio da erudição de Touraine), ela no do Bourdieu. Seguimos para o "Bon Marché", onde experimentamos "collants" para ginástica. Separamo-nos à saída. Vim almoçar a casa e, receando desperdiçar uma bela tarde de sol, que poderia não se repetir durante muito tempo, senti-me na obrigação de ir visitar a Torre Eifel. Já a conhecia, de baixo para cima, mas ainda não subira. Desta vez, aliás, não fui além do 1º andar. Uma vista já muito interessante. Bons ângulos para fotografias turísticas. Tomei um café no bar da torre, olhando o Sena, e depois desci a pé umas infindáveis escadinhas. Fui fazer olhar os "bateaux-mouche", depois tomei a direcção do metro, dando no caminho uma vista de olhos a um centro comercial.

Novembro - Sexta-feira, 1
Mudou o tempo. Almocei, como de costume, na Cité e depois fui até "Notre-Dame", Saint-Germain, etc. Turismo, à espera de que me dessem condições para trabalhar...
Vim cedo para casa e passei a tarde a ler um Ellery Queen muito chato (à falta de melhor!).

Sábado, 2
Estive à conversa no quarto da Eduarda. Depois, ela decidiu fazer uma sesta antecipada e eu fui mostrar ao hospital o resultado da minha prova "tuberculinica" - última étape daquela inesquecível jornada de quinta-feira!
Quando ia a sair do restaurante a Eduarda, atrasada, chegava. Retrocedi com ela e passamos a tarde juntas. Acompanhei-a ao cabeleireiro, fizemos compras alimentares (leite e café em pó, biscoitos, etc.). Depois do jantar na cantina, fomos ao bar do Brasil, onde o ambiente é alegre, descontraído. Não há mais nada do género nesta cidade-dormitório. E acresce ainda que lá o café é mesmo bom! Estivemos à conversa com dois compatriotas. Entre outras coisas, fui forçada a sair em combate "feminista".
Um elemento altamento positivo resultou daquele encontro: soube que a maneira eficaz de conseguir uma carta "copar" (= refeições a 1/2 do preço) era matricular-me na École Pratique - secção das religiões, escolhendo uma religião supostamente de pouco interesse, para não porem dificuldade à inscrição. Optei, por jogar pelo seguro, pela religão que o rapaz indicara: "estudo comparado das religiões da Índia e do Tibet".
Estivemos depois, até tarde, no quarto da Eduarda (ela, a Zé e eu), discutindo religião, política, literatura, etc.

Domingo, 3
Dia sem história. Levantei-me tarde, saí só para almoçar e jantar dentro da Cité. Escrevi cartas.

Segunda-feira, 4
De manhã, fui à Sorbonne tratar da preciosa "carte copar" pela via religiosa. Estudei cuidadosamente o programa dos cursos , para jogar pelo seguro escolhi mesmo as do Tibete e da China, com Mr. Stein como director de estudos, e avancei timidamente até um pequeno cubículo improvisado que uma tabuleta designava por "secretaria". Sentia-me tão comprometida como se na minha cara se dislumbrasse, a olho nú, o total desinteresse pelas religiões orientais. Para disfarçar escolhi ainda mais um seminário adequado ao do Mr. Stein (China, salvo erro) e tudo decorreu muito bem. Deram-me logo o impresso "copar". Voltei à tarde com o impresso preenchido e expliquei às senhoras o exotismo do sistema de nomes português - dois nomes de família, um da mãe e um do pai, nenhum do marido. Isso não conseguiu impedir a falsidade com que a carta copar me designa M.me "De Queiroz", née "Aguiar Moreira". Não joga certo com mais nada, mas as senhoras tranquilizaram-me a esse respeito, pois o cartão destina-se unicamente a franquear a porta dos restaurantes para universitários e o contínuo nem para o nome olha. De Queiroz ou não, passei a alimentar-me por 1,60 francos, na segunda-feira seguinte. Se atendermos às delongas que ainda pendem sobre as minhas inscrições em sociologia, concluo que o Mr. Stein me poupou uma pequena fortuna!
Nesse dia, haviamos almoçado a Eduarda, a Zé e eu com um amigo delas, assistente na Faculdade de Economia de Paris, o Alfredo de Sousa, que nos levou, de carro, até perto de St. Michel. Aí separei-me da restante comitiva, mas reencontramo-nos no Centro Albert Chatelet. Comunicaram-me secamente, na Sorbonne, que as inscrições estavam encerradas e por isso resolvi desistir - não vi alternativa.
A Eduarda , já que ali estávamos, achámos por bem aproveita e assistir a um "meeting", numa sala escura e fria: meia dúzia de rapazinhos acalorados em discussão com um representante da classe docente - o Mr. Lapassade.
Jantamos tarde, em grupo alargado, e finalizamos o dia com um cafézinho na Casa do Brasil.


domingo, 27 de dezembro de 2009

Em Elizabeth, NJ

Vinda expressamente para estar presente nas celebracoes das bodas de ouro sacerdotais do Padre Jose Manuel Fernandes - uma personalidade notavel no mundo da nossa diaspora.
Conheci-o ha quase 30 anos! Estava ele a frente da paroquia portuguesa de Caracas e iniciva eu os meus periplos pelas comunidades. O seu entusiasmo por tudo o que era trabalho para os portugueses e vivencia portuguesa tornavam-no um exemplo dee como se deve estar em comunidade e ajudar os outros em todas as dimensoes da vida colectiva. Dentro e fora da Igreja (se e que a Igreja verdadeiramenter nao deve estar em todo o lado, como Cristo esta, e por isso o trabalho nas areas cultural ou social, e ocasiao de dar forma a uma mesma missao!)

A missa e as 11.30 h.
Depois conto.

domingo, 20 de dezembro de 2009

Coimbra, há tanto tempo!...

Meio século.
Foi há meio século que atravessei, pela primeira vez, a Porta Férrea. Já como estudante da Faculdade de Direito. Ou melhor, futura estudante porque estava dispensada do exame de aptidão à faculdade e fui acompanhar uma amiga que se apresentava a essas provas - a Maria Emília.
Estava ela apaixonada por um amigo, que ali andava, pelo mesmo motivo. Apresentou-mo.
Foi, por isso, o primeiro colega que conheci em Coimbra. Cinco anos depois, acabei por ser eu, não ela, a casar com ele. Preferia que as coisas tivessem corrido bem entre eles, mas assim não aconteceu.
Estudávamos os três juntos, íamos para todo o lado juntos.
Mas logo ele começou a fazer-lhe confidências - gostava de mim...
Confidências que ela me "inconfidênciava", cada vez mais, pragmaticamente, curada da antiga paixoneta. A solidariedade feminina funcionava, pelo que só ele não sabia que eu sabia.
Um dia, a meio do ano, terminei com aquele "jogo de enganos", pondo tudo a claro. Ele não imaginava que eu estava a par dos seus benditos sentimentos por mim e, muito menos, dos da Mª Emília por ele.
Havia subentendidos das nossas conversas que lhe escapavam, pequenos remoques emilianos ou manuelinos... Ou não lhe escapavam inteiramente, deixando-o um pouco desconfortável (era um rapaz esperto e intuitivo...).
Tempos muito divertidos. Há meio século!...
Por essa altura, ainda eu escrevia um "diário" - não diariamente, diga-se. É dele que vou falar.
O Diário de Anne Frank impressionava, enormemente, as jovens da minha geração. Não tínhamos uma réstea de talento, mas achávamos que devíamos deixar ao futuro as impressões e os sonhos dessa nossa idade, igual à dela, que, por desgraça, nunca teve outra...
Eu, sim. Envelheci. E não olho, hoje, com excessiva benevolência essa tentativa falhada de transmitir, de uma forma literária, os meus estados de alma.
Melhor teria sido, à maneira do Blogue Círculo Aguiar, ater-me a factos do quotidiano, a comentários curtos sobre pessoas e acontecimentos.
Os meus diários intermitentes, muito mal escritos ao correr da pena, só ganham algum interesse quando lembram episódios que jaziam no esquecimento.
Esta semana trouxe comigo de Lisboa o diário que vai de Maio 1962 a Janeiro de 1963.
Li-o de ponta a ponta e a única expressão que sublinhei respeita à guerra colonial, que então ensombrava a nossa natural alegria de viver - aos rapazes, porque tinham na linha do horizonte o dantesco espectáculo de uma guerra muito real, agendado para o "dia seguinte". Às raparigas, porque estavam preparadas para os acompanhar, de longe ou de perto, e partilhavar a sua sorte, sentimental e afectivamente.
Era o meu caso...
Escrevi, pois, a 21 de Janeiro de 63, uma 2ª feira:
"Bafiento e miserável país este! Não só porque é pobre, mesquinho de mentalidade, como tem um governo de megalómanos com a obsessão das caravelas a navegar dentro das cabeças".
Gosto da idéia das obsessivas "caravelas a navegar dentro das cabeças" do governo de então!
Porém, como se vê, muito deficientemente enroupada, nas palavras, na própria construção da frase...
É ela escrita no contexto de um episódio completamente esquecido. Figura central: Álvaro, colega goês.
Transcrevo:

"... Estudei umas 2.30 horas de tarde e às 5.30h fui ao cinema ver mais um filme do ciclo (Umberto D), por sinal, muito bom, mas também muito triste. Em seguida, estive à conversa com o Álvaro, que embora tenha passado o verão em Coimbra, tem a época de Janeiro (para exames) por ser goês."
Segue-se a frase já citada...

"...O Álvaro bem quer ir para a França ou a Inglaterra, mas não lhe dão passaporte, porque os goeses querem continuar portugueses até ao fim dos séculos, e estes que estão cá dentro são reclames vivos, slogans dessa idéia.
Mandam-no escrever para o Governador de Goa (em Lisboa), com um ar muito sério, como crianças ou doidos num manicómio..."

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Maria Luís, uma inesquecível presença na RTP

Não apenas a exibição de dança no gelo sobre patins!
Foi igualmente expedita e a mostrar grande à-vontade na resposta às perguntas das entrvistadoras.
Estava bem vestida e bem penteada.
Elegante, ágil e graciosa a deslizar sobre o gelo.
Sorridente, simpática e inteligente no diálogo. Como momento alto da umaa ainda curta, mas já notável, carreira de desportista amadora escolheu o seu 3º lugar no campeonato europeu de patinagem.
Venceu a competição com uma colege mais velha e experiente e vai voltar ao programa!

António Aguiar, grande vencedor do concurso comemorativo do 1º aniversário do Círculo Aguiar

No "Círculo Aguiar", por altura do 1º aniversário do blogue, lançamos um concurso aberto aos mais jovens, para os envolver mais na história da família, na narrativa do seu e nosso quotidiano, e para premiar a arte de bem escrever português.
Um dos prémios era puramente quantitativo (bastava escrever o maior número de comentários), o outro qualitativo.
Ambos foram ganhos, sem margem para dúvidas, pelo António Aguiar, de 16 anos!

A Maria Teresa, de 13 anos, também se destacou, ganhando uma série de outras categorias em concurso.

Foi uma experiência bem sucedida. É para continuar!