quarta-feira, 27 de dezembro de 2023

Nota Introdutória PARA REVER 1 - Para olhar o nascimento do “Conselho” à distância de quarenta anos, privilegiarei a data da sua primeira reunião mundial, realizada em Lisboa, de seis a dez de abril de mil, novecentos e oitenta e um, e não a da promulgação do diploma jurídico pelo qual foi criado (DL nº 373/80 de 12 de setembro) porque, na minha perspetiva, esta lei pode considerar-se uma declaração de intenções, uma esperançosa expetativa com futuro incerto, entregue ao poder fático da reunião constituinte. Crucial é o momento de passagem da esfera normativa do Direito à realidade da vida das pessoas ou das instituições, e no caso do CCP, esse trânsito foi muito além da boa aplicação da lei, pelo facto de ser, à partida, uma lei a rever, para melhor se ajustar à vontade dos destinatários, um convite a que eles próprios a reformulassem, nela vertendo, porventura, outros conteúdos. É nessa procura de reconfiguração, no ponto de equilíbrio de vontades e estratégias, que se corporiza o Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP). Este segundo tempo foi, assim, o que contou mais. O Governo, na sua primeira consulta, convidou os Conselheiros a uma livre ponderação de alternativas às linhas do modelo institucional para que apontava originariamente. Não colocou obstáculos a deslocar o seu centro de gravidade da interlocução da Diáspora para a da emigração recente, dando espaço ao debate dos problemas prementes do quotidiano. E com isso entrou o Conselho num domínio que, continuando a ser de reencontro pelo diálogo, não mais escaparia à turbulência e à confrontação, verbalmente violenta, que marcou a segunda década de setenta e os primeiros anos de oitenta, em Portugal. Tempos ainda próximos da dinâmica e das contradições da revolução de 1974, que, já então, entrara numa via reformista, apoiada por larga maioria constitucional e popular, mas entre profundos conflitos Maria Manuela Aguiar | pag. 14 sociais e choques político-partidários. Saindo da área da dominante cultural (com a sua facilidade de consensos naturais, já que a Cultura é sempre o máximo denominador comum) o CCP avançava em terreno aberto às arrebatadas pulsões que agitavam a sociedade portuguesa, dentro e fora de fronteiras por igual - quando não mais ainda em algumas das comunidades do estrangeiro do que no País. Naqueles poucos dias da Reunião Mundial do Palácio Foz, o Conselho mudaria de natureza, de vocação, de estilo, e consequentemente, de destino. 2 – O manifesto eleitoral da Aliança Democrática, em 1979, tratava com o mesmo relevo, mas em rubricas autónomas, a “Emigração”, com referência a políticas públicas de apoio social e jurídico aos emigrantes e aos seus descendentes, e as “Comunidades Portuguesas no Mundo”, com a ênfase colocada na preservação dos laços históricos e culturais ao País, na criação de um “Conselho das Comunidades Portuguesas no Mundo”, onde estas se fariam representar. No que concerne às políticas públicas para as migrações de saída e regresso apostava-se na continuação de esforços iniciados em 1974, visando sobretudo, a melhoria de meios e a sua eficiência. No que respeita às “Comunidades”, a principal promessa eleitoral era inovadora, encarava de frente uma das falhas mais extraordinárias que, bem vistas as coisas, a sociedade civil partilhava com o Estado: a inexistência de uma plataforma internacional de união entre os portugueses no estrangeiro. No panorama europeu, note-se, esta constatação convertia-nos em caso raro entre países de emigração, mesmo entre aqueles cuja tradição migratória se não podia, quantitativa e qualitativamente, comparar com o peso e significado da nossa. Em todos esses países encontramos, desde fins do século XIX, ou inícios do século passado, movimentos federativos das associações atuantes nas diversas regiões do mundo da sua imigração, maioritariamente O Conselho das Comunidades Portuguesas | pag. 15 oriundos da iniciativa privada, nalguns casos apoiados ou enquadrados num organismo de cúpula governamental. A lacuna é tanto mais de estranhar, quanto se sabe que a propensão associativa dos emigrantes portugueses foi enorme, nas várias épocas e latitudes. Da parte do Estado, o descaso não poderá surpreender-nos, sabido que as primeiras medidas de apoio aos emigrantes datam de meados do século passado e se limitam ao acompanhamento da viagem de ida, em travessias transoceânicas realizadas em condições de grande risco, ficando depois os cidadãos entregues a si próprios. Face a essa total e multissecular “ausência do Estado” nas comunidades da emigração, nasceu e cresceu, enraizado em fortes laços de entreajuda e solidariedades, um impressionante associativismo, no domínio social e cultural, que tanto refletia a relação afetiva com a terra originária como ajudava a integração no país de acolhimento. Poucos foram, no passado, os governantes ou os académicos que se aperceberam da dimensão do fenómeno associativo enquanto esteio de comunidades estruturadas e perenes. Os que podemos apontar como exceção (caso de Afonso Costa) atribuem-lhe um caráter fugaz ou transitório, identificando-o como forma de combater o sentimento de isolamento e a saudade por parte de uma emigração temporária. Porém, ao contrário do que previa (e queria) o Estado, grande número de indivíduos e famílias escolheram o não retorno, mantendo essa vontade de pertença coletivamente expressa no grupo nacional. Neste contexto, que apresenta traços comuns a outras migrações europeias, cumpre indagar quais os motivos, as circunstâncias, as eventuais especificidades que contiveram, então e ainda hoje, o nosso associativismo dentro dos limites de cada um dos países de destino, como se fossem desconhecedores ou desinteressados da existência dos demais. Esperamos de futuras investigações, o aprofundamento da compreensão das caraterísticas de um Maria Manuela Aguiar | pag. 16 associativismo português fechado dentro de fronteiras e das causas que porventura o condicionaram ou acantonaram. A larga predominância, ao longo de séculos, da emigração para o Brasil (país imenso, um mundo em si, uma sociedade aberta e acolhedora, onde a língua e a cultura tornavam mais fácil as relações sociais e o enraizamento) surge como hipótese de trabalho. No Brasil se situam as mais grandiosas manifestações do espírito associativo português, em número e em dimensão sem paralelo em quaisquer outras comunidades - os “Gabinetes de Leitura”, os Hospitais e os Lares das “Beneficências”, os clubes sociais, as agremiações desportivas... Aí existe uma importante Federação das Associações Portuguesas e Luso-brasileiras, que representa as nossas maiores instituições no mundo, sem, contudo, ter pretendido transpor as fronteiras do Brasil. 3 – Ao longo dos últimos dois séculos, registamos somente um conseguido ensaio de agregação das comunidades de língua e cultura portuguesas por iniciativa do Prof. Adriano Moreira, à frente da Sociedade de Geografia, na década de sessenta do século passado. Foi o primeiro a compreender a importância dos laços que a História tecera (não apenas a História do Império em declínio, mas a do êxodo sem fim dos portugueses que consigo levaram e expandiram a fala e a cultura em todo o planeta), e a mostrar capacidade de agir, reunindo em congresso mundial os representantes dessas comunidades de língua, cultura e afeto. O primeiro Congresso das Comunidades de Cultura Portuguesa teve Lisboa como palco, o segundo, Moçambique, o terceiro estava projetado para o Brasil. Seria, porém, adiado sine die, porque o regime, que, de uma forma mais ou menos neutral, aceitara o avanço deste movimento da sociedade civil, se fechou, em definitivo, após a ascensão de Marcelo Caetano ao poder. As atas do 1º e do 2º Congressos foram publicadas pela Sociedade de Geografia em seis volumes e documentam o espantoso e O Conselho das Comunidades Portuguesas | pag. 17 pioneiro trabalho levado a cabo. Ao lê-las, mais de meio século depois, constatamos que não foram as últimas manifestações de saudosismo colonial, na sua 25ª hora, mas o prenúncio de uma CPLP ainda informe e distante - não a que mornamente subsiste, no novo século, mas a que sonhou José Aparecido de Oliveira. Ao grande político brasileiro, como a Adriano Moreira, os meandros da Política e da História não deram tempo de levar a obra por diante. E não houve, a meu ver, até hoje, quem a soubesse retomar com a mesma visão da lusofonia policêntrica e universalista. 4 - A revolução de 1974 tardou sete anos a convocar os expatriados ao diálogo e à cooperação global no Conselho das Comunidades Portuguesas. Desta feita, a iniciativa pertenceu ao Estado. Os representantes de organizações da sociedade civil foram chamados ao encontro com o Governo, num exercício de democracia que revestiu a forma de proposta à coparticipação na definição das políticas para as comunidades do estrangeiro. O Conselho foi, desde o início, concebido como instância consultiva do Governo da República e dos Governos Regionais e como órgão representativo dos seus eleitores, dotado, consequentemente, do direito de iniciativa. Comparando o movimento da Sociedade de Geografia e o CCP instituído pelo Governo da Aliança Democrática, poderemos concluir que coincidiam no objetivo fundamental de federalizar o movimento associativo das comunidades do estrangeiro, igualmente se aproximando no propósito de colocar o foco na área da cultura e nos laços afetivos. Todavia, o momento político em que o diploma criador do Conselho foi trabalhado exigiu atenção a outros aspetos, que viriam a determinar o seu alargamento à vertente sócio laboral das migrações. O facto de o Governo anterior, no último mês do seu mandato, ter posto em marcha a organização de um Congresso das Comunidades Portuguesas (ao abrigo do Decreto-Lei nº Maria Manuela Aguiar | pag. 18 462/79 de 30 de novembro) colocou o VI Governo Constitucional perante o dilema de cumprir o seu próprio programa ou de o compatibilizar com os objetivos de projeto alheio. Não foi surpreendente a decisão de propor à Assembleia da República a ratificação do diploma de 30 de novembro, com o propósito de deslocar o Congresso da esfera de influência presidencial para a do executivo e de impor o seu adiamento para 1981. O cancelamento dos preparativos no ano de 1980 provocou fortes reações nas comunidades em áreas onde a oposição partidária era mais forte (sobretudo em França, onde o movimento associativo estava bastante politizado) e terá contribuído para o ambiente conturbado em que se gerou o CCP, e, em resposta, levou a uma tentativa de conciliar o «Conselho de Diáspora», previsto no Programa da AD, com a ideia de um «Conselho de Emigrantes», que o governo anterior visava criar no contexto do seu Congresso. O articulado do Decreto-Lei nº 373/80 de 12 de setembro era suficientemente flexível para abarcar a problemática das migrações antigas e recentes, e, de facto, o CCP encontraria a sua identidade servindo ambas as vertentes. O pedido de ratificação do Decreto-Lei nº 462/79 pelo Governo da AD e o atraso na publicação do diploma que instituía o CCP, implicaram o adiamento de ambos os eventos, no ano de 1980. Seria, por isso, o VII Governo Constitucional que, no começo do ano seguinte, dinamizou o processo de constituição das “Comissões de País” por áreas consulares, e através delas, da eleição dos seus representantes à 1ª Reunião Mundial do CCP. A reunião foi organizada por Secções onde seriam debatidos, em profundidade, os pareceres ou recomendações ao Governo, e por Plenários, onde estes seriam submetidos a votação final. À lista de Secções resultantes de prévia consulta aos eleitos, o Governo acrescentou uma Secção destinada à análise do articulado do Decreto-Lei nº 373/80, um espaço de diálogo em que as suas disposições podiam ser repensadas e reajustadas, como foram, e O Conselho das Comunidades Portuguesas | pag. 19 não de uma só vez, mas por consensos alcançados nas sucessivas etapas, em que se foi moldando a instituição. 5 – Houve, à partida, a preocupação de delinear um diploma jurídico abrangente e flexível que pudesse ser a plataforma jurídica onde os representantes das comunidades iriam protagonizar a aventura irrepetível de criar a instituição - um complexo e exigente processo de procura e de consecução de consensos bastantes para a alicerçar, através de pontes lançadas entre posições políticas, geografias e tipos de emigrações muito diversos, que se desconheciam e, por se ignorarem, se antagonizavam - a Europa contra o resto do mundo, migrações recentes contra as migrações antigas, mais os descontentes com o adiamento do 1º Congresso do Governo Pintasilgo e os simpatizantes do novo Governo Sá Carneiro. Por fim, na mútua aceitação de opostos sedimentou-se uma instituição abrangente e original. O grupo de trabalho que preparou a legislação foi buscar inspiração a um modelo estrangeiro do único país onde funcionava, já com largos anos de existência, um órgão governamental de audição de emigrantes - a França, o “Conseil Supérieur des Français de l’ Étranger” (CSFE). Comparemos o CSFE com o CCP: um e o outro estavam sediados no Ministério dos Negócios Estrangeiros e eram presididos pelo Ministro. Neles tinham assento membros natos, membros eleitos (por um colégio eleitoral associativo) e membros nomeados. No caso do CCP, estes últimos foram escolhidos numa lógica bastante mais restritiva dos poderes discricionários do Ministro, visto que os representantes sindicais e patronais eram indicados pelas respetivas centrais. Os peritos escolhidos pelo Governo constituíam um reduzido núcleo e sempre desempenharam de forma extremamente discreta a sua missão de apoio técnico. O Decreto-Lei nº 373/80 era um documento sintético, assente em arquitetura minimalista. Não especificava, por exemplo, os diferentes papéis de cada uma das três categorias referidas. Maria Manuela Aguiar | pag. 20 Todavia, a sua prática não deu margem a quaisquer dúvidas: os membros natos - Governo da República, Governos das Regiões Autónomas, Deputados – promoviam simplesmente a audição dos eleitos. Face a face, em diálogo, ficavam os detentores do poder público e os eleitos da sociedade civil, delegados das associações e “observadores” da Comunicação Social (aceites como iguais, na sua veste representativa e consultiva). Mais difícil de definir, antes de tudo por ser menos óbvia numa leitura literal do diploma, era a função dos “membros nomeados” - representantes dos sindicatos e do patronato e especialistas convidados pelo governo. A chamada das centrais sindicais e associações patronais tanto podia significar a aposta numa instância tripartida de concertação, porventura inspirada na CITE (Comissão para a Igualdade no Trabalho e Emprego, criada no ano anterior) caso em que seriam um segundo patamar de auscultação, somando-se à vertente principal (a da Emigração e Diáspora), ou, como veio a acontecer, remeter-se a uma função coadjuvante no debate (de suporte técnico e jurídico à formulação de recomendações e pareceres). Os “delegados” dos parceiros sociais (que o eram, na realidade, apesar de o despacho de nomeação caber ao MNE) fizeramse ouvir mais a esse nível, nos bastidores e nos “media” que lhes eram afetos – sobretudo a CGTP/Intersindical, perante a mais discreta atuação da UGT e a invisibilidade quase total dos representantes das associações patronais. “Conselheiros” eram, pois, os dirigentes associativos que integravam as “Comissões de País” e os “Observadores” da Comunicação Social. A presença dos “membros natos”, não só nas sessões solenes de abertura e de encerramento, como em muitas das reuniões de trabalho, foi garantia de acessibilidade a parceiros de diálogo. E, por isso, paradoxalmente, o primeiro Conselho seria, mais do que o segundo (1996/2021), um espaço de interlocução direta O Conselho das Comunidades Portuguesas | pag. 21 entre os Conselheiros e os responsáveis políticos. E quer o CCP “associativo”, quer o CCP refundado em 1996, se ergueram sobre uma legitimidade democrática – no primeiro alicerçada no voto de um colégio eleitoral, formado por representantes do movimento associativo; no segundo em processo de sufrágio direto, secreto e universal dos portugueses pertencentes a um determinado universo cuja dimensão foi variando - de princípio, coincidia com os cadernos de inscrição consular (mais de dois milhões de cidadãos nacionais), depois, viu-se circunscrito aos cadernos eleitorais dos círculos de emigração, então com pouco mais de 170.000 recenseados e, em data mais recente, cresceu de novo enormemente pela via do recenseamento automático dos expatriados detentores do cartão de cidadão (cerca de 1.500.000 eleitores). 6 - Do ponto de vista de funcionamento do Conselho, comparando os dois modelos que se sucederam - o que constituía um fórum presidido pelo Ministro dos Negócios e o que atualmente forma um coletivo com presidência eletiva - constatamos que nas sessões em que o Governo está presente continua a assumir protocolarmente a sua direção. A diferença reside no facto de essa presença quase se limitar às solenidades de abertura e encerramento dos trabalhos. De facto, a presença do Governo no 1º CCP responsabilizava-o na dação de respostas e justificações, enquanto no Conselho atual se converteu em ritual de boasvindas e de despedida, libertando os governantes da pressão exercida numa relação direta. E, como temos visto, em alguns casos, até da necessidade de abordar a problemática contida nas Recomendações caídas em semiesquecimento. Para isso também terá contribuído, no seu início, uma menor mediatização, face àquela de que gozou o Conselho associativo. Nos meios de comunicação social, eram menos as notícias sobre as reuniões, as propostas, a vida do CCP. Todavia, gradualmente, o Conselho tem vindo a afirmar-se, também, neste campo e com uma imagem pública muito mais positiva. Ainda aquém Maria Manuela Aguiar | pag. 22 do desejável, dirão alguns. Em qualquer caso, os progressos são inegáveis. Certo é que o CCP há muito deixou de ser um cenário privilegiado de confrontação, imagem de marca dos seus primeiros anos e causa mais provável do seu eclipse em 1990 (eclipse quase total, visto que, na sua segunda vida, que se prolongou até 1996, o “Conselho” modificado pela Lei nº 101/90 funcionou, essencialmente, a nível local). Em 1996, o Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, José Lello, relançou o Conselho, dando continuidade ao que tinham sido as suas formas de cooperação tradicionais. Embora eleito por sufrágio direto e universal, o atual CCP acolhe uma plêiade de dirigentes associativos – e estranho seria que assim não fosse, pois é, em regra, através da atividade cívica e do voluntariado no interior das comunidades que os cidadãos ganham prestígio e notoriedade entre os seus pares. Esse é um dos fatores que lhe tem permitido manter o seu perfil e espírito original. 7 - No balanço de 40 anos de vida desta instituição, tão sólida na vontade coletiva de existir e nas solidariedades que dela emergiram, avulta, no lado mais negativo, uma certa desvalorização do seu trabalho pela falta de resposta, assaz frequente, das Recomendações, assim como omissões, também frequentes, de consulta do Órgão em matérias de relevo para os cidadãos emigrados e para o futuro da Diáspora. Matérias que transcendem largamente o âmbito de uma Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, hoje desprovida dos meios de que dispunha até à década de noventa do século passado, o Instituto de Apoio à Emigração e às Comunidades Portuguesas (organismo dotado de autonomia administrativa e financeira, e o seu escol de técnicos, especialistas e dirigentes) e a Comissão Interministerial para a Emigração, à qual eram levadas as Recomendações dirigidas pelo Conselho a cada um dos departamentos da Administração Pública. O Conselho das Comunidades Portuguesas | pag. 23 Que futuro para o CCP? Autonomia face ao Executivo e ligação preferencial ao Parlamento? Consagração constitucional? O poder discricionário do Governo no relacionamento com a instituição dele dependente marcou várias fases do seu percurso, chegando praticamente a neutralizá-lo entre 1988 e 1996. Quase dez anos decorreram entre a última reunião do “Conselho associativo”, em fins de 1987, e a primeira reunião do Conselho renascido em 1997. Este longo hiato de invisibilidade, a nível global, não correspondeu, é certo, à inexistência jurídica da instituição, mas ao incumprimento da legislação em vigor (caso da não convocação das reuniões anuais, entre 1988 e 1991) ou uma nova estrutura, que se revelou, em larga medida, inexequível, devido à fragmentação dos colégios eleitorais, consagrada na Lei nº 101/90 e à irregularidade de funcionamento dos Conselhos de País. No 40º ano da acidentada vida do Conselho das Comunidades Portuguesas, é hora de repensar as condições jurídicas e fáticas para o pleno aproveitamento do seu imenso potencial e de o reconhecer como a instituição que levou a democracia, ressurgida em 1974, às comunidades portuguesas no estrangeiro. Nesta coletânea de alguns escritos sobre esta temática, quer sobre a origem e a história dos mecanismos de representação de emigrantes em espaços transnacionais, quer sobre o CCP, dou conta de ocorrências e de reflexões pessoais, ancoradas no acompanhamento da sua vivência. Uma visão subjetiva (como Presidente do Conselho, na primeira fase, entre 1980 e 1987, e como Deputada da Emigração, de 1997 a 2005) à qual subjaz a crença nas suas virtualidades, a par de algum ceticismo, que o passado justifica, quanto à capacidade de as projetar inteiramente no atual quadro da dependência governamental. Foi esse moderado ceticismo que me levou a dar, na Assembleia da República, em 2004, um último contributo para a valorização do CCP, através da organização de um colóquio promovido pela Maria Manuela Aguiar | pag. 24 Subcomissão das Comunidades Portuguesas, a que presidia, sobre possíveis modelos alternativos ao Conselho atual. Nessa audição foi aventada, por alguns dos mais prestigiados juristas portugueses, a consagração constitucional do CCP, a fim de garantir a sua autonomia, com ou sem uma eventual transição para a órbita da Assembleia da República. Um passo em frente no seu trajeto, para cumprir a vocação originária de ser uma assembleia verdadeiramente representativa e influente, o grande fórum da Diáspora e da emigração portuguesas. Espinho, 6 de abril de 2021 Maria Manuela Aguiar

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