quarta-feira, 23 de novembro de 2022

AS POLÍTICAS DE DESAPOIO AOS PENSIONISTAS 1 – Neste ensombrado mês de novembro de 2022 assistimos a um ataque, com precedentes na substância, mas sem precedente na forma e no estilo, aos rendimentos dos pensionistas. Estamos habituados à cíclica aparição do fantasma da sustentabilidade da segurança social, que serve de pretexto aos Governos para o corte de pensões, que é uma redistribuição de riqueza entre gerações, em prejuízo dos mais fracos – que são aqueles que, regra geral, não têm meios para recuperar do prejuízo. (não podem voltar ao mercado de trabalho, nem emigrar e não têm sindicato que os defenda). O que para além do mais, significa um esbulho, (com todas as letras, um roubo) a todos aqueles que tiveram uma carreira contributiva, com princípio, meio e fim. Para só falar de tempos recentes, do primeiro quartel do século XXI, podemos começar por José Sócrates, que cortou aos mais velhos a possibilidade de concorrer ao mercado de trabalho – penalizando-os com proibições radicais ou cortes de pensões. O que, a meu ver, é uma discriminação inconstitucional. Se o montante da pensão é a contrapartida de descontos feitos ao longo da vida profissional, com que direito pode o Estado impor novas condições para o pagamento a que se obrigou? O que diríamos de o mesmo fizesse a entidade que contratou um seguro privado? Mas, se assim é, porque poderá a autoridade pública permitir-se expedientes que seriam considerados aberrantes para os privados? Sócrates merece, pois, ser situado como o verdadeiro precursor de uma infamante “capitis diminutio” dos mais velhos na história da segurança social no nosso país. O seu sucessor, Passos Coelho ira transportar a novos patamares a discriminação ”idadista” (há que acrescentar o termo ao revisor de texto do computador, rejeitando, firmemente, as alternativas que nos aconselha desde “ida .dista”, que não sei o que seja, a “sadista”, que é, por sinal, bem adequada para adjetivar a intenção governamental). Todos estamos lembrados de como, em flagrante atentado à Constituição, (relevado pelo Tribunal Constitucional de então, com honestos votos contrários) lançou sobre esta categoria de cidadãos, o “imposto extraordinário de solidariedade”, levando como oferenda à toda poderosa “troika” uma grossa fatia das pensões. Não era, porém, uma exigência externa, dentro da austeridade global, mas uma opção muito portuguesa, muito PSD/CDS (ou Passos Coelho/ Paulo Portas). Aqui ao lado, na Espanha, um governo não menos conservados ou direitista (o de Rajoy), e também intervencionado em nome do desequilíbrio das contas públicas, fez questão de honra de salvaguardar e proteger, em especial, os reformados e até de aumentar pensões, nem que fosse simbolicamente, com um euro – das pensões mais baixas às mais altas! Confesso que, na altura, nada me chocou mais do que este contraste ibérico. Em termos de “idadismo”, esse tinha sido, até à data, o período mais negro – quem pode esquecer que um dirigente do PSD falou, sem vergonha e sem sanção, dos velhos como “a peste grisalha”. Sem castigo, sem pública reprovação no interior do partido - que não no eleitorado … De facto, o CDS deixou de ser, para sempre, o “partido dos reformados”, antes mesmo de desaparecer do Parlamento. E o PSD perdeu, (não sabemos ainda se para sempre), esse importante, cada vez mais importante num país envelhecido, esse segmento do universo eleitoral. E quedou-se, ano após ano, por votações muito abaixo da sua média. Terá agora, face ás inusitadas medidas do Governo PS, uma oportunidade de recuperar o “voto grisalho”? Muito vai depender do que Luís Montenegro pretende acordar com António Costa… 2 – A golpada discursiva em que germinou o anúncio do que pode vir a ser o mais brutal corte de pensões é coisa inédita, pelo menos, em democracia… No primeiro ato desta comédia trágica, surge o Primeiro Ministro a confirmar o que outras vozes do seu Governo já haviam aventado nos media: o maior aumento de pensões jamais concedido em Portugal. Meia pensão, oferecida de mão beijada, já em outubro e grandes aumentos a consagrar no orçamento para 2023 e nos seguintes. Eis o aliciante pacote para reformados, elevado à condição de equivalente a um outro pacote para famílias e para trabalhadores com rendimentos abaixo de certos limites. O ufanismo governamental era de tal ordem, o “slogan”, aparentemente traduzido em número de euros tão dilatado (se abstrairmos, claro, de uma tremenda inflação…), e toda a trama tão bem urdida que tinha tudo para dar certo, num país onde os grandes “media” costumam ser excelentes câmaras de eco. Bem podiam os especialistas questionar, esmiuçar, desmascarar a solução em todas as suas consequências futuras. Não tinham acesso ao mesmo vasto palco, não usavam a mesma linguagem primária, linear, a única que, na convicção do Governo, o cidadão comum entende. As probabilidades de Costa levar a melhor, com a costumeira benevolência presidencial eram colossais, mas para meu espanto (e, suponho, para espanto dos governantes também, aconteceu o inesperado. As oposições da extrema esquerda à extrema direita, por uma vez na vida, falaram em uníssono e explicaram a coisa tão bem que todos perceberam. As medidas para famílias e trabalhadores uma tentativa, ainda que insuficiente, de combater a inflação, de que os reformados são os únicos excluídos. Receberam uma mão cheia de nada (uma mera antecipação em outubro, de uma só vez, do que lhes era devido a partir de janeiro) e a certeza do decréscimo e erosão de pensões futuras. Fica como mancha indelével no currículo deste Governo a mais cínica e despudorada comunicação de um corte de pensões sofisticadamente disfarçado de benefício! 3 – Os reformados sabem doravante com quem não podem contar… (e será que podem contar com algum partido político da área do Poder?). O PS, com a sua larga maioria e os cofres cheios de impostos, agora por efeito do processo inflacionário ´não tem desculpa alguma, nem externa, nem interna para um tal dislate. Dirão alguns que já não há geringonça. Eu penso que sim, mas dentro do partido. Há um PS que escolhe sacrificar os reformados e poupar os lucros excessivos das grandes empresas. E há um outro que faria, com certeza o contrário…

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