domingo, 10 de maio de 2015

NOVA EMIGRAÇÃO, EMIGRAÇÃO VELHA


1 - A nova emigração surgiu, há poucos anos, com o seu ineditismo,
como uma primeira grande saída de quadros (ou de cérebros), de
mulheres e homens em pé de igualdade - coisa inteiramente nova, pois
até então a chamada "feminização" da emigração portuguesa acontecera
quase sempre pelo exercício do direito ao reagrupamento familiar.
É, de algum modo comparável à primeira vaga de imigração do Brasil, no
início do chamado "Cavaquismo". Imigração que nos trouxe, para além do
problema (mais corporativo do que político) dos excelentes dentistas
da Escola brasileira, sem mais problemas,
engenheiros,gestores,informáticos designers, publicitários e outros
profissionais de reconhecida competência... Depois, veio, na segunda
fase, um conjunto bem mais numeroso e heterogéneo de candidatos do
mesmo país.
Era o tempo, logo após a adesão à CEE, em que o governo anunciava o
"fim dos tempos" da nossa emigração e apresentava Portugal como um
País que deixara de ser ponto de partida, para se converter em porto
de chegada de imigrantes. Que melhor símbolo de uma parceria plena no
"clube dos ricos" em que estávamos, e de confiança no futuro, poderia
o discurso político converter em bandeira?
Porém, para essa nossa imigração (da América do sul, da Europa de
leste, da África) as coisas iriam mudar na primeira década deste
século, com uma abrupta interrupção ou retrocesso do vai-vem de
gentes, E, em números bem mais avassaladores, ressurgia a emigração
dos portugueses.
Depois dos 20 anos em que a tese oficial do termo do processo
histórico das migrações portuguesas teve a sua aparência de
ajustamento à realidade (e à crença nofuturo de imparável avanço
económico e social, dentro da UE, do espaço Schengen e da zona Euro),
eis que um volte face vem pôr em causa duas décadas de" ilusão
europeia", e revelar que houvera apenas um mero hiato entre ciclos
migratórios... Aquela Europa já não existe, aquele Portugal, também
não ,(talvez não por uma fatalidade histórica... é verdade, que talvez
pudessem existir ainda, mas não com os protagonistas que tomaram em
mãos o seu destino...)
E nós, retrocedemos 40 anos. à época do último imenso êxodo de fuga à
pobreza, num Portugal, que, antes de tudo, perdeu a esperança.


Numa conjuntura em que Primeiro Ministro não hesita em fazer do
empobrecimento uma meta do seu programa, e em incitar à expatriação
(num gesto rigorosamente supérfluo de quem desconhece a cultura de
expatriação do povo que governa.) a " velha emigração" logo vem,
espontâneamente, somar-se a "velha emigração". Não são só os jovens
que saem,com os seus mestrados e doutoramentos, mas todos os que podem
fugir à crise portuguesa, à destruição da economia e das classes
médias: os mais e menos qualificados, os mais e menos jovens, as
mulheres e os homens .Em proporções variáveis, desmentindo os
estereótipos que vão ocultando a verdade inteira das situações...
Assim, por exemplo, as migrações actuais estão longe da sua imagem de
marca da "paridade", visto que os homens são a quase totalidade das
migrações temporárias, e, mesmo no segmento mais "elitista" da
emigração permanente, a componente feminina é de cerca de metade da
masculina.
O ter, mesmo assim, alcançado visibilidade tão positiva só pode ser
valorizado como um bom sinal, entre tantos de sentido contrário, se
pensarmos que, ao longo dos séculos, a emigração feminina foi sempre
fortemente combatida. A masculina, também, mas menos, porque os
homens, que partiam sós, mandavam para as famílias as remessas com que
o Estado equilibrava as contas externas,uma infinidade de pequenas
poupanças, que cresciam, atingindo números colossaias
Portugal, que vivia largamente à custa deles, olhava as mulheres como
um fator de integração em sociedades estrangeiras, de não retorno dos
homens...e das divisas. Afonso Costa, o professor, com tese de
doutoramento nesta matéria, e o político de primeiro plano, deplorava
(nessas duas vestes, certamente) a saída das mulheres, que tanto se
acentuara no início do século XX, como "uma depreciação do fenómeno
migratório".
Era o espírito do tempo. Não é, obviamente, o do nosso tempo.


2 - O longo ciclo da emigração transoceânica, predominantemente para o
Brasil, em muito menor dimensão para os EUA e outros países
longínquos, estava a terminar em meados do século. Assumira,
realmente, uma faceta familiar,embora quase sempre em duas fases - com
o homem a sair à frente - mas não provocara, como se receava, uma
grande contração das remessas, e servira, (o que ninguém soubera
prever...), para uma transformação qualitativa do movimento
associativo. numa vivência coletiva, de famílias inteiras,que se
reuniam, à volta de projectos culturais - música, teatro, desporto,
recriação de ambientes, festas religiosas ,tradições... Com esta nova
dinâmica se construíram verdadeiras "comunidades portuguesas", no seu
sentido orgânico, institucional - como espaços extra territoriais de
lusofonia.ou, polo menos, de lusofilia. A"Nação dos afectos", na
expressão de Adriano Moreira
A "nova emigração", da segunda metade do século passado,. dirige-se,
pela primeira vez, em massa, para países próximos e é na Europa que se
centram as atenções, com a França a converter-se, aos olhos dos
portugueses, no"novo Brasil"
Como sucederia na " nova emigração" do século XXI, toma-se a parte
(uma parte muito importante, sem dúvida, mas uma parte...) pelo todo.
De facto, a emigração para novos destinos transoceânicos - a
Venezuela, o Canadá - começa precisamente na mesma altura, nas
décadas de 50 e 60, e o movimento continua para os EUA, a África, a
Oceânia... Embora,nestas regiões, há que reconhece-lo, sem a faceta de
fuga clandestina, de aventura dramática que marcou o "salto" através
dos Pirinéus.. O chamado ciclo europeu, (o tal, (que parecia destinado
a ser o último, mas não foi...) acabou. E acabou bem. É a minha
subjectiva opinião. É também a de muitos especialistas deste período,
é a de Eduardo Lourenço, que do seu posto de observação, em Paris, 30
anos depois dos anos do "salto", falava dos viajantes da "mala de
cartão" como uma "geração de triunfadores".
O balanço só pode fazer-se no fim de um ciclo. No princípio de outro
tudo são interrogações...
A nova geração conseguirá os mesmos níveis de satisfação pessoa e
profissional da que a antecedeu - na Europa, no Brasil ,em
Angola, numa dispersão planetária?
Neste novo ciclo, certezas não há... Nem sobre o sucesso individual,
que é função de expectativas mais altas, nem sobre o futuro do
associativismo, das comunidades portuguesas nele fundadas, que vai
depender da capacidade das organizações existentes se abriram à
participação dos grandes excluídos, que têm sido as mulheres e os
jovens. Vai depender fundamentalmente, da vontade destes, da atitude
com que partem : como" desistentes", deixando o país para trás, ou
como" resistentes", levando Portugal com eles..

Sem comentários:

Enviar um comentário